sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Apesar de fortes, grupos coreanos são vulneráveis


Autor(es): Por Christian Oliver | Financial Times
Valor Econômico - 06/01/2012
 

Pouco admira o fato de autoridades japonesas criticarem o governo da Coreia do Sul por aquilo que eles veem como intervenções cambiais injustas para manter o won fraco em favor dos grandes exportadores do país.
À primeira vista, muitas das maiores companhias coreanas estão pulverizando suas concorrentes japonesas. A Samsung registrou no terceiro trimestre um lucro quatro vezes maior que as 19 principais companhias japonesas de tecnologia e produtos eletrônicos de consumo de capital aberto juntas. Os estaleiros da Coreia do Sul ultrapassaram os do Japão recentemente, tornando-se os maiores do mundo, embora agora estejam sendo eclipsados pela China. A Hyundai Motor está se mostrando uma concorrente poderosa para a Toyota, especialmente com seu modelo Sonata desafiando o Camry nos Estados Unidos.
Mas o sucesso dos "chaebol" (grandes conglomerados) sul-coreanos esconde um quadro complexo. Os "chaebol" dependem de peças das companhias especializadas de engenharia do Japão. Em 2010, a Coreia do Sul registrou um déficit comercial de US$ 36 bilhões com o país vizinho. Essa é uma grande preocupação estratégica para a Coreia que, diante da ascensão da China, gostaria muito de ter as pequenas e médias empresas de alta qualidade que atendem tão bem o Japão e a Alemanha.
Por enquanto, a Coreia do Sul tem vantagens produtivas sobre as companhias chinesas, na qualidade e no gerenciamento ágil de projetos, mas isso não vai durar indefinidamente. Os planejadores econômicos sul-coreanos prometem que o governo não ficará preso em um limbo entre a China e o Japão, e pretendem ajudar a criar pequenas e médias empresas. Mas pouco há em termos de políticas práticas para quebrar a dependência dos "chaebol", que são vulneráveis à ascensão da China. As pequenas empresas reclamam que nunca terão a força das congêneres japonesas e alemãs porque os "chaebol" as compram para desmontar seus staffs e ativos assim que elas se tornam bem-sucedidas.
Além disso, acrescentam elas, é difícil conseguir fontes sólidas de financiamento. Contribuindo para o problema, o sistema educacional do país não está passando pelas mudanças necessárias para estimular a imaginação e a inovação.
Enquanto a Coreia do Sul não criar pequenas e médias empresas melhores, os "chaebol" terão de inovar rapidamente para permanecer um passo à frente da China. A Hyundai Heavy Industries, a maior construtora naval do mundo, está se transformando em uma companhia geral de engenharia que produz turbinas eólicas e geradores elétricos, além de navios de carga. Também está se concentrando em navios de maior valor para a exploração de petróleo offshore e o transporte de gás natural liquefeito.

Indústria japonesa enfrenta ameaça de declínio irreversível

Autor(es): Por Jonathan Soble | Financial Times
Valor Econômico - 06/01/2012
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/1/6/industria-japonesa-enfrenta-ameaca-de-declinio-irreversivel
 

Sob pressão das políticas domésticas e dos concorrentes estrangeiros, o setor por trás do milagre japonês do pós-guerra está transferindo suas atividades para outros países, aumentando as preocupações com a capacidade da nação de vencer uma estagnação que já dura duas décadas.
Em junho, Akio Toyoda, presidente da Toyota Motor do Japão, fez uma dura avaliação ao ativo econômico mais estimado de seu país: sua competitividade enquanto potência econômica. "Se olharmos a situação de uma maneira lógica", disse ao anunciar uma reorganização das operações domésticas da Toyota, que estavam no vermelho como resultado da valorização do iene, "veremos que não faz sentido produzir no Japão".
Os sinais de alerta estão soando nos escritórios e fábricas do Japão corporativo. O câmbio, os cortes no fornecimento de energia provocados pelo tsunami de março, políticas fiscais e comerciais desfavoráveis e a ascensão implacável da China e da Coreia do Sul estão pressionando os outrora incontestados fabricantes de automóveis e produtos eletrônicos nipônicos a abandonar o país por paragens onde os custos são menores.
Políticos, líderes empresariais e a imprensa alertam que, se nada for feito, os setores responsáveis por grande parte do crescimento do Japão após a Segunda Guerra Mundial poderão mergulhar num declínio irreversível - e acabar com as chances do país de sair de uma estagnação econômica de 20 anos. "Corremos o perigo sem precedentes de esvaziamento da economia", disse em setembro o primeiro-ministro Yoshihiko Noda.
Lamentar o declínio do setor industrial não é novidade, nem uma característica única do Japão. A parcela da população envolvida na produção de objetos físicos, assim como acontece em outros países ricos, vem encolhendo há anos: de 27% em 1970 para os atuais 17%. Isso deixa o país em algum lugar entre o Reino Unido e os Estados Unidos, onde apenas um em cada dez trabalhadores está no setor industrial; e a Alemanha e a Itália, onde esse número é de aproximadamente 20%, segundo estatísticas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sediada em Paris.
Mesmo assim, para o Japão a perspectiva da irrelevância industrial é especialmente preocupante. Desde o estouro da bolha econômica do país na década de 1990, a renda real por trabalhador caiu 10% e a perda de mais empregos bem pagos no setor industrial vai acelerar a tendência de queda. Embora a taxa oficial de desemprego permaneça baixa, em pouco mais de 4%, o governo calcula que ela poderá aumentar mais de três vezes se as empresas reduzirem suas forças de trabalho para se adequar aos atuais níveis da demanda.
Até agora, isso foi adiado por leis trabalhistas favoráveis aos trabalhadores, subsídios empregatícios do governo, às vezes chamados de esmolas para funcionários ociosos, e o legado dos esquemas do pós-guerra de "emprego para a vida toda", mas é improvável que seja evitado para sempre.
De um modo amplo, os problemas industriais coincidem com o papel menor do país no cenário mundial. Duas décadas atrás, sua produção econômica respondia por 14% do PIB mundial; hoje, esse número é inferior a 9%. Até mesmo na Ásia ele vem sendo eclipsado pela China enquanto potência econômica e diplomática.
Talvez ainda mais preocupante seja o fato de que muitos parecem acreditar que o país não tem para onde retroceder se o setor industrial fracassar; que seus trabalhadores são adequados unicamente ao "monozukuri", o conceito quase místico de "fazer coisas". Essas pessoas apontam para uma escassez de campeões nacionais em setores como o de softwares e o de finanças, e no ineficiente setor de serviços, onde a produção por trabalhador é menos da metade do nível dos Estados Unidos. Quando as companhias do setor industrial tropeçam - como aconteceu com a Toyota nos recalls de 2009 ou com o escândalo contábil em andamento na Olympus -, cresce a sensação nacional de embaraço.
"A identidade do Japão está ligada ao setor industrial", diz Yoshikazu Tanaka, fundador da Gree, uma companhia de jogos sociais. "Se você não produz objetos materiais, as pessoas o tratam com se estivesse fazendo algo duvidoso."
De fato há evidências de que a transferência da produção para fora do país sofreu uma aceleração. Desde que o iene começou sua valorização de 40% em relação ao dólar, em meados de 2007, as saídas líquidas de investimentos estrangeiros diretos passaram de uma média de US$ 30 bilhões a US$ 50 bilhões na primeira metade da década de 2000, para US$ 130 bilhões em 2008. Elas continuam acima da tendência de longo prazo. Em termos domésticos, os investimentos pelas empresas vêm caindo.
A diferença de desempenho entre as companhias que transferiram agressivamente operações para fora e as que não fizeram isso é grande. A Toyota produz cerca de 50% de seus carros no Japão, onde vende menos unidades do que exporta, e a expectativa da companhia é que seu lucro líquido cairá pela metade no ano fiscal que se encerra em março. Por outro lado, a Nissan, que produz no Japão apenas um quarto de seus veículos, prevê um queda nos lucros de 9%.
"Se o Japão quiser empregos, terá de fazer alguma coisa para estabelecer uma taxa de câmbio normal", alertou recentemente o presidente-executivo da Nissan, Carlos Ghosn. Ele quer que o governo desista das esporádicas, e na maioria das vezes ineficientes, intervenções no mercado, como vem fazendo desde o fim de 2010, em favor de um teto cambial ao estilo suíço, que defenderia a todo custo.
Os problemas foram agravados pelos desastres naturais do ano passado. O terremoto seguido de tsunami, em março, e as enchentes mais recentes na Tailândia, danificaram fábricas japonesas e provocaram uma confusão nas cadeias de fornecimento. Muitas companhias se recuperaram mais rapidamente que o esperado - a produção industrial nacional retornou para perto dos níveis normais em agosto, após cair 15% em abril -, mas os efeitos sobre os negócios no país serão prolongados.
Um dos problemas é o custo da energia. A destruição da usina nuclear de Fukushima Daiichi pelo tsunami levou a cortes no fornecimento de energia em todas as partes do país, uma vez que outras usinas foram forçadas a se desligar para testes de segurança. Isso levantou a possibilidade de racionamentos por longos períodos e alta dos preços num país onde as empresas já pagam 40% mais pela energia do que as empresas americanas, e 2,5 vezes mais que as companhias sul-coreanas, uma consequência, em parte, da estrutura monopolista do setor energético.
A Tokyo Electric Power, dona da usina de Fukushima, quer aumentar as tarifas em Tóquio e áreas subjacentes em 15%, para cobrir seus custos de compensação e limpeza - uma proposta que vem enfrentando resistência das empresas. "O problema da eletricidade é tão grande quanto o da força do iene", diz Minoru Usui, presidente da Seiko Epson, fabricante de impressoras e projetores de vídeo.
Tsunamis e os mercados de câmbio podem estar fora do controle, mas a indústria e autoridades também vêm provocando seus próprios problemas. Muitas empresas, por exemplo, apoiaram as chamadas tecnologias galápagos - dispositivos eletrônicos japoneses que têm pouco apelo porque são elaborados tendo em vista principalmente as exigências locais.
Um caso clássico é o telefone celular. O Japão já tinha celulares capazes de surfar na internet quase dez anos antes do surgimento do iPhone, mas mesmo assim os produtores locais nunca pensaram nos mercados internacionais e não atualizaram seus projetos. Hoje, eles perdem participação até mesmo em casa, onde o mundialmente popular aparelho da Apple é o modelo mais vendido.
Enquanto isso, empresários afirmam que a política do governo desencoraja os investimentos e as contratações em casa. Eles citam as regras trabalhistas onerosas, os altos impostos corporativos (41%, em comparação à média de 26% dos países da OCDE), e o fato de que os exportadores pagam tributos maiores que os concorrentes de Coreia do Sul e outros países.
O custo enorme dos reparos da costa de Tohoku depois do tsunami contribuirá para o endividamento público já sem paralelos do Japão de 200% do PIB, dificultando ainda mais a redução da carga tributária das empresas.
Mas é claro que nem toda a indústria do país está "condenada". Paradoxalmente, os desastres de 2001 serviram de lembrete que o país mantém vantagens competitivas em áreas importantes, mas frequentemente subestimadas, como a de materiais e componentes de precisão. Muitas pessoas ficaram surpresas ao tomar conhecimento, por exemplo, de que uma única fabricante japonesa de semicondutores, a Renesas, fornece quase metade dos microcontroladores usados em automóveis em todas as partes do mundo.
Quando a fábrica, que produz dispositivos que movem assentos, fecham portas e acionam vidros, foi paralisada pelo terremoto, as linhas de montagem de centros automobilísticos como o de Nagoia no Japão e do Alabama, nos EUA, também foram paralisados.
A força dos fabricantes de componentes japoneses também ficou evidente no voo comercial inaugural do jato 787 Dreamliner da Boeing, em outubro, do qual um terço das peças de alta tecnologia é fabricado no Japão. A Toray, companhia que fornece os elementos leves de fibra de carbono que tornam o modelo mais eficiente do ponto de vista de consumo de combustível, pode não ser um nome tão conhecido como a Sony, mas representa o que indiscutivelmente é a parte mais competitiva do setor industrial japonês.
Até agora, a maioria das empresas vem optando por continuar produzindo seus produtos mais sofisticados e de alto valor agregado no Japão, transferindo a produção de produtos de margens menores para países onde os custos são mais reduzidos. A estratégia vem funcionando em maior ou menor grau para grupos independentes, mas especialistas duvidam que isso vá preservar empregos em grande escala, especialmente na medida em que grandes economias emergentes, como a China, sobem degraus na cadeia industrial de valor, para fabricar produtos cada vez mais sofisticados.
Waichi Sekiguchi, articulista do jornal japonês "Nikkei" e membro do Beyond Galapagos Study Group, uma associação de especialistas do setor industrial, afirma que a competitividade dos custos e o iene são problemas secundários, uma vez que as próprias mudanças tecnológicas tornaram o modelo de negócios dos fabricantes japoneses, focado na engenharia, obsoleto. "Esse modelo funcionou maravilhosamente bem quando a competição global girava em tornos de produtos individuais e os vencedores eram as companhias que fabricavam os melhores produtos aos preços mais baixos", diz ele. "Mas isso não faz tanto sentido no mundo da eletrônica digital, onde quem manda é a rede."
Sekiguchi demonstra seu ponto de vista em "Reimagining Japan" (repensando o Japão), uma coletânea de análises e recomendações de políticas publicada no ano passado pela consultoria McKinsey. Outros colaboradores do livro afirmam que o foco excessivo em salvar o setor industrial pode até ser danoso se atrair recursos de alternativas mais promissoras para fugir do beco sem saída econômico. "A fabricação de porcas a parafusos é o passado do Japão, e não seu futuro", afirma Masayoshi Son, fundador do grupo japonês de telecomunicações Softbank. "Nenhum setor que depende muito de mão de obra pode revitalizar o Japão. Para o país, setores que exigem muito conhecimento são o único caminho à frente. E mesmo assim as políticas de nosso governo não estão dirigidas para esses setores."
A política oficial é voltada principalmente para a preservação do que sobrou do "monozukuri". No fragmentado setor eletrônico, o governo está tentando acelerar a consolidação e criar campeãs nacionais: recentemente apoiou a fusão das pequenas operações de produção de telas de cristal líquido da Sony, Toshiba e Hitachi. Ele espera que a nova empresa possa competir melhor com os grupos da Coreia do Sul e Taiwan.
Mesmo assim, os planejadores econômicos também reconheceram a necessidade de diversificação e estão mirando outras áreas além do setor industrial, como as de turismo, produção de mangás (as histórias em quadrinhos japonesas) e moda. O estilo de vida japonês é popular em todas as partes do mundo, mesmo assim sua indústria cultural exporta apenas cerca de 2% da produção.
Yoshihiko Miyauchi, presidente-executivo da Orix, uma companiha de serviços financeiros e defensor da liberalização do altamente protegido setor de serviços, lista outras áreas em que o país é forte, mas que está pouco representado globalmente - serviços de entrega a lojas de conveniência e o segmento de cuidados médicos. "O Japão poderia ter a Clínica Mayo da Ásia", diz ele, referindo-se ao renomado hospital privado de Minnesota, que atrai pacientes de todas as partes do mundo.
Quanto ao setor industrial, ele prefere ver as companhias transferindo a produção para fora do país e prosperar, do que ficar e enfraquecer. "Quando as companhias japonesas saem para o mundo, elas ficam mais fortes. São as companhias que tentam brigar em casa que estão tendo dificuldades."

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