segunda-feira, 28 de junho de 2010

AS ENCHENTES





SOBRE A SITUAÇAO DE PERNAMBUCO
Estimados companheiros/
de nosso movimento
Na verdade a Situação é desastrosa. Muitas Cidades foram completamente
destruídas
Todos os assentamentos nesta região do Agreste
meridional e mata Sul ( região de dois Grandes rios que nascem no
Agreste, Rio Una e rio Ipojuca) foram atingidos, mas as  perdas foram
mais em termos de Produção, estradas e casas.
O assentamento mais atingido foi o assentamento Serra dos Quilombos em Bonito, Praticamente todas
as casas foram cobertas pelas águas.




Nos assentamentos agora é deixar as águas baixarem e ver a
possibilidade do INCRA e governo do estado recuperar os prejuizos  em
infra- estruturas.
A nossa preocupação está em  como ajudar a
recuperar as cidades e as vilas, aonde o povo foi mais atingido, e perdeu tudo.
Os dirigentes da região estão mobilizados , colocamos os Tratores e alguns poucos caminhões para
apoiar as famílias nos Bairros e pequenas cidades.
Agora, estou coordenado duas turmas do Pé no Chão no Centro de formação e estamos aguardando a
possibilidade de deslocar brigadas para a região. mas o problema é por
onde começar esta tudo virado de perna pro ar.
As doações  e todo o processo de triagem esta sendo feito pela policia militar e corpo de
bombeiros. As famílias queperderam tudo já estão alojadas em espaços
públicos, aguardando para reconstruir as vidas
Temos uma reunião da direcção estadual neste sábado e domingo, vamos
avaliar a situação e ver o que podemos fazer a mais.
Mas acho que se houver possibilidade de contribuição, vamos aproveitar
para organizarmos um fundo nacional para este tipo de emergência.

volto a comunicar segunda feira depois da nossa reunião
Abraços
Jaime






SOBRE A SITUAÇAO DO ESTADO DE ALAGOAS
Prezados companheiros e companheiras,
Como sabes muitos municípios de Alagoas foram vítmas de enchentes.

Vitimas das enchentes por assim falar, na verdade vítimas deste modelo de sociedade, degradadora e genocída de muitos por poucos.

E mais uma vez as vitimas são os pobres, sim pois são os que vivem às margens, nas áreas de risco, nas encostas, ou mesmo no centro destas cidades, que são tão carentes de infra-estruturas e cuidados quanto as periferias de grandes cidades.

Por mais que falemos ou vejamos nos noticiários, não dá para dimensionar todos os estragos e  dificuldades 

Recebemos noticias e histórias, nas quais identificamos 

Há cidades como Branquinha e Santana do Mundáu, onde todos os prédios públicos que deveriam servir de apoio estão no chão. Em Branquinha o que ainda está de pé é a igreja, onde estão amontoando as pessoas. E frente a tal situação o risco de uma epidemia é eminente.

As regiões afetadas são regiões onde temos muita gente, acampadas e assentadas: União dos Palmares, Branquinha, Santana do Mundaú, Murici, Matriz, São Luiz. 

Ainda não é possível dimensionar tudo, são poucas as informações ainda, pois nem em todos os lugares conseguimos chegar, as pontes foram levadas, há riscos de desabamentos. Telefones não funcionam, falta energia. Muitas pessoas nossas e das cidades, conseguiram sair antes e ir para municípios vizinhos pra casa de parentes.

Em Santana do Mundaú nossos acampamentos foram levados, não existem mais. As pessoas estão dispersas, foram para casa de parentes distantes, outros alojados onde é possível.  Nos assentamentos os danos foram menores, do ponto de vistas das moradias, as perdas são das lavouras, os bichos e os acessos. Se na nossa realidade o acesso já é bem limitado no período das chuvas, com pontes de pau, de troncos de coqueiro, improvisadas, depois disto tudo, já não mais existem.  A água levou.

Frente a tudo existe toda uma movimentação para ir ajeitando, socorrendo, remediando. Mas muito insuficiente, pois a alimentação é pouca, na maioria dos casos para quem esta nos abrigos, mas quem ainda ficou coma casa em pé, também não tem o que comer. Para terem uma idéia parte da alimentação que é distribuída com as famílias acampadas, que estava na Conab, foi suspensa, para destinar aos municípios. Mesmo entendendo a situação, e somos solidários, pois estamos no meio disto tudo, é como dizemos por aqui, é:  descobrir um santo para cobrir outro.Mas isso é o de menos, estamos dialogando para resolver.

Neste momento há todo um processo de SOLIDARIEDADE. Essa talvez seja um dos mais fortes traços do povo alagoano, mesmo com toda a miséria e perversidade a que historicamente fomos submetidos.

A preocupação é com o depois. Sim depois que deixar de ser noticias nacionais, e as águas estiverem mais calmas. Em especial falando de ações dos governos para reconstruir o que foi ao chão.

O governo federal chegou a anunciar que liberaria o FGTS para estes municipios, onde as pessoas pudessem reconstruir suas casas (e quem sabe continuar a vida), isso não resolve  1% da situação. Essa é uma região pobre, onde carteira assinada, emprego certo... ISSO ESTÁ EM EXTINÇÃO!

Por fim precisamos ter claro que as enchentes não são desastres naturais, ou obra de Deus que muito deixou chover e os pobres sofrerem.  As enchentes são os resultados de uma região canavieira, onde a Mata Atlântica ao longo dos anos foi sendo substituída pela monocultura da cana-de-açúcar. As arvores derrubadas poderiam neste momento serem nossas aliadas, ajudando a segurar as águas.

O êxodo rural  outra marca forte, onde milhares de famílias foram expulsas das usinas e fazendas, e aos poucos foram sendo amontoadas nestas cidades, e ainda são tachadas como culpadas nestes momentos, pois como é que pode, as pessoas vão morar em lugares que não devem. Quem já viu morar na beira de rios...

Frente as conseqüências das enchentes e toda a solidariedade presente, esperemos que no horizonte visualizemos não mais ações emergenciais ou de remediar, mas ações preventivas e estruturantes que possibilite ao nosso povo retomar a vida, com as perdas e lembranças de um momento que não queremos mais viver.

NÃO TENHO DUVIDA QUE A REFORMA AGRÁRIA, POSSIVELMENTE COMO NUNCA,  TEM UM PAPEL FUNDAMENTAL, E O MST TERÁ UMA TREFA GRANDE PELA FRENTE.  
Abraços
Debora,
Maceio, 23 de junho de 20100maceio,



Áreas das enchentes são marcadas pelo monocultivo da cana

12 de julho de 2010

Por Plácido Junior e Renata Albuquerque*
Da Comissão Pastoral da Terra

Nas vésperas da festa de São João, festa da colheita do milho no Nordeste brasileiro, assistimos com muita tristeza as enchentes na Zona da Mata Sul de Pernambuco e Zona da Mata Norte de Alagoas. Foram vidas ceifadas, casas destruídas, escolas e hospitais sem condições de funcionarem, pontes levadas pela força das águas, um verdadeiro cenário de guerra.
As últimas estimativas falam em 57 mortes, sendo 39 em Alagoas e 20 em Pernambuco. No estado alagoano, passa de 26 mil o número de desabrigados e de 47 mil o de pessoas desalojadas. Já em
Pernambuco, são mais 26 mil desabrigados e mais de 55 mil desalojados. Mas, como todo cenário de guerra tem sempre inimigo e culpados, escolheram desta vez a Natureza como responsável.
Não podemos negar que existem fatores climáticos por trás da tragédia ocorrida. Durante quatro dias choveu mais de 400 mm³ nas regiões afetadas. Precipitação essa, provocada, segundo os especialistas, pelo aquecimento do Atlântico.
No entanto, é preciso ter um olhar mais profundo do ocorrido. As regiões atingidas pelas enchentes são marcadas pala concentração da terra, pelo monocultivo exportador da cana-de-açúcar, pelo trabalho precarizado e análogo ao trabalho escravo e pela degradação ambiental. Municípios da Zona da Mata Pernambucana, por exemplo, possuem índices GINI de concentração de terras que chegam a atingir 0,9 (pelo índice de GINI, quanto mais próximo do número 1, maior é a concentração de terras).
O modelo de des-envolvimento, historicamente e geograficamente implementado no Brasil e, em especial no Nordeste, tem sacrificado o meio ambiente e empurrado populações empobrecidas para lugares menos propícios para a ocupação humana.
Na Zona da Mata de Pernambuco, nos últimos 30 anos, mais de 150 mil trabalhadores perderam seus trabalhos no setor canavieiro e estima-se que mais de 40 mil sítios foram destruídos durante os primeiros anos do Pró-álcool (1975) - um dos maiores períodos de expansão da cana no Estado e no Brasil. As matas foram "dando" espaço à cana e as populações, sem trabalho, privadas das terras e sem alternativa econômica foram sendo empurradas para as periferias das cidades, para as chamadas áreas de risco e "pontas de ruas", como é chamado por eles.
As cidades da Região canavieira, como é chamada por muitos, se transformaram em um verdadeiro confinamento de populações empobrecidas e privadas dos seus direitos. Pernambuco aparece com o quinto pior IDH do País, e é justamente na região da Zona da Mata que se concentra um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano do Estado e um dos piores índices de saneamento e água em rede domiciliar.
As populações das cidades desta Região vivem com saneamento básico precário, sem abastecimento de água potável regular, sem assistência médica que atenda as necessidades das pessoas, ou seja, sem uma minima infraestrutura social eficaz.
Foi justamente nessa região que os usineiros cometeram um dos piores crimes ambientais da humanidade. Da mata Atlântica original, resta apenas menos de 3%. Em 2008, depois de muitas denúncias de movimentos sociais no estado, o IBAMA, autuou as 24 usinas pernambucanas por
crime ambiental: por elas não terem os 20% de reserva legal e as matas ciliares estarem quase que dizimadas em todas usinas fiscalizadas pelo Instituto.
Não há matas nos topos de morros e nas encostas para facilitar a infiltração das águas no solo e diminuir o escoamento superficial das águas de chuvas. Não existe mais matas ciliares, que servem, entre outras coisas para proteger os rios e servir de "barreiras" para a contenção dos grandes volumes de águas. A Mãe terra não merece e não deve ser culpada pelas consequencias desta catástrofe, que é muito mais de responsabilidade do modelo de des-envolvimento, do que de uma ação incontrolável da natureza.
Vale apena lembrar Josué de Castro, no livro "Geografia da Fome", que denuncia a Região da Zona da Mata de Pernambuco, como uma Região de maior pobreza e fome no Estado. O "cidadão do mundo" denunciava também a concentração de terra e o sistema do monocultivo da cana como um dos elementos principais da fome e da pobreza na Região. A combinação de fatores climáticos com as ilhas de pobrezas no "mar" de cana, que é a Zona da Mata em Pernambuco, tornou vulnerável as cidades da Região às catástrofes ditas "naturais". A Mãe terra é quem nos culpa.
*Plácido Junior é geógrafo e agente da CPT NE2 e Renata Albuquerque é jornalista e do setor de comunicação da CPT NE2

sábado, 26 de junho de 2010

Lodo de esgoto substitui adubo mineral na cana-de-açúcar

Por Da Redação - agenusp@usp.br
Da Assessoria de imprensa do Cena – email contato@engenhodanoticia.com.br
A utilização de lodo de esgoto na adubação de cana-de-açúcar pode substituir em 100% o uso do adubo mineral nitrogenado necessário para a cultura da planta. Além dos benefícios ambientais e ecológicos, a técnica pode aumentar a produtividade e diminuir custos. Essas são as conclusões da pesquisa coordenada pelo professor Cassio Hamilton Abreu Junior, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, em Piracicaba.

Adubação de cana com lodo, em fazenda em Rio das Pedras, interior de SP
Pela vantagem de eliminar ou minimizar o uso de adubos minerais, a utilização do lodo de esgoto no solo brasileiro para fins agrícolas é estudada há quase 30 anos. “Apesar desse tempo todo de estudo, o assunto é relativamente recente no Brasil quando comparado com EUA, Europa e Ásia, onde a prática é mais antiga”, informa Abreu Junior. Porém, a preocupação do pesquisador do Cena em estudar o assunto ultrapassou o processo de produção agrícola: abordou a contaminação do solo, dos lençóis freáticos e dos próprios alimentos.
Segundo o professor, a atividade humana nas cidades gera dois importantes resíduos: lixo urbano e lodo de esgoto (oriundo do tratamento dos esgotos domésticos). “Lembrando que os solos brasileiros são pobres em matéria orgânica, a utilização de composto do lixo para fins agrícolas vem sendo difundida por estudos acadêmicos porque, além de rica fonte de matéria orgânica, elimina ou minimiza o uso de adubos minerais”, destaca. “No caso do uso agrícola do lodo de esgoto doméstico, sua aplicação é controlada por autorização da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). “Apesar de o lodo possuir matéria orgânica e nutrientes importantes para o crescimento das plantas como nitrogênio e fósforo, também pode conter patógenos, metais pesados e compostos orgânicos”, explica.
Outra importante vantagem ambiental é o prolongamento da vida útil dos aterros sanitários, destino dos resíduos domésticos. “Se o lixo e o lodo possuem matéria orgânica e nutrientes benéficos para o solo, além de atenderem as normas para uso agrícola, por que jogar no aterro algo que é nobre?”, questiona Abreu Junior ao se referir sobre os altos custos de implantação de aterros controlados. “Isso sem contar o impacto ambiental causado por estes locais, que são males necessários. Ninguém quer um aterro perto de casa”, completa.
Os estudos do Cena são conduzidos em plantações de eucalipto em parceria com a empresa Suzano Papel e Celulose. Na cultura de cana-de-açúcar, os testes são em áreas cultivadas do Grupo Cosan. Dados já confirmados nessas culturas dão como certa a capacidade de o lodo substituir o adubo mineral que contém nitrogênio e fósforo.
Os experimentos com cana estão mais adiantados em comparação ao ciclo do eucalipto, que dura sete anos. “Na cana, há o aumento de 12% da produtividade nos locais que receberam o lodo aplicado como substituto do nitrogênio e complementado com adubo contendo potássio (o lodo é pobre nesse nutriente), conforme a norma do Conselho Nacional do Meio Ambiente [Conama], órgão do Ministério do Meio Ambiente”, esclarece o professor. “Com relação à cana, podemos afirmar que 100% do adubo mineral nitrogenado que deveria ser aplicado pode ser substituído pelo lodo de esgoto”, afirma o pesquisador, ressaltando que as doses de fósforo são supridas em até 30%.”
Eucalipto
As pesquisas também indicam outros números promissores quando verificados os efeitos da adubação com a utilização de lodo de esgoto no plantio das árvores. Em eucalipto, esse tipo de adubação substitui totalmente o uso de nitrogênio e supre 66% do fósforo necessário. O pesquisador alerta que os resultados devem ser interpretados com cautela. “Apesar do volume crescente de estações de tratamento de esgoto, que significa farta abundância deste produto, o lodo deve ser aplicado seguindo os critérios exigidos pela norma do Conama”.
Outro subproduto gerado pelas estações de tratamento de esgoto e que pode ser muito utilizado na agricultura é a água residuária, rica fonte de fertirrigação por conter nutrientes. “O lodo e a água provenientes de estações de tratamento, quando gerados de forma correta, têm uso agrícola interessante. Basta tratá-los de forma adequada. O mais importante é que o esgoto seja urbano e não industrial”, alerta Abreu Junior.
Mais uma vantagem ambiental destas pesquisas são as alternativas para a substituição do fósforo na adubação, material que está se tornando escasso. “Como as reservas naturais de fósforo tendem a acabar, o estudo visa buscar alternativas ambientais e ecológicas para retornar o nutriente em solos pobres”, conclui. A pesquisa teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
imagem: Engenho da Notícia



Lodo de esgoto aumenta produção de madeira de eucaliptos
O lodo de esgoto, em uma dose de 7,7 toneladas por hectare, aumenta 8% o volume de madeira com casca em sistemas florestal de eucalipto em relação ao uso somente de adubos minerais.
Lodo de esgoto, em 7,7 toneladas por hectare, supre 100% do nitrogênio necessário
O lodo, em 7,7 toneladas por hectare, supre totalmente o nitrogênio necessário
Esse foi um dos principais resultados que a engenheira agrônoma Lúcia Pittol Firme constatou em sua tese de doutorado, que faz parte de um experimento realizado pelo Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) da Escola Superior Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba.
No tratamento com adubo mineral de modo convencional, com aplicação de 84 quilos (kg) por hectare de fósforo e 142 kg por hectare de nitrogênio, o volume de madeira foi de 150 metros cúbicos (m³) por hectare. Já com aplicação de 7,7 toneladas por hectare de lodo e 28 kg por hectare de fósforo, sem adição de nitrogênio, foi estimado volume de madeira de 162 m³ por hectare. Além de aumentar a produtividade, a aplicação de lodo nessa dose permite reduzir o uso de adubos de nitrogênio e fosfato em, respectivamente, 100% e 66%.
Além disso, se observou que, conforme se aumentava a dose de lodo, também crescia a quantidade de minerais, como ferro, cobre, zinco e magnésio. A quantidade desses elementos aumentava tanto no solo como na biomassa total da planta, que é composta por lenha, folha, casco e galho.
Apesar disso, Lúcia afirma que o lodo não possui todos os minerais necessários para a adubação. Por exemplo, no experimento, devido ao baixo teor de potássio no lodo, foi aplicado 175 kg por hectare desse mineral. Em compensação, a pesquisadora diz que o lodo não causou a contaminação do sistema solo-planta.
Experimento
Com parceria da Suzano Papel e Celulose, empresa de base florestal, o experimento foi conduzido em área comercial da empresa, em Itatinga (SP). Para verificar os efeitos do lodo de esgoto, Lúcia preparou quatro doses diferentes para lodo, quatro para nitrogênio e quatro para fósforo. “Primeiro aplicamos o lodo sozinho. Depois, para cada tratamento foi aplicada uma quantidade de fosfato e nitrogênio”, explica Lúcia.

Da combinação das doses de cada um desses componentes do experimento, se obteve 64 tratamentos. Acrescentando que houve uma repetição das combinações para verificação dos dados, houve um total de 128 tratamentos.
Feitas as aplicações das doses, após 43 meses do plantio, Lúcia coletou os dados. No final, se chegou à quantidade de 7,7 toneladas por hectare como dose ideal do lodo. Segundo Lúcia, foi estabelecida essa quantidade não somente pela produtividade, mas também porque é a dose que contém a quantidade limite de nitrogênio (de 142 kg por hectare), de acordo com o critério estabelecido pela resolução 375 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) do Ministério do Meio Ambiente.
O trabalho de Lúcia faz parte de um dos dois projetos de pesquisa coordenados pelo professor do CENA Cássio Hamilton Abreu Junior, que envolvem o estudo da aplicação de lodo no sistema florestal de eucaliptos. Além da tese de Lúcia, uma dissertação de mestrado e outra tese de doutorado do CENA foram frutos dos projetos. O experimento de campo, que começou em 2004, ainda está em andamento e deverá ser encerrado no fim de 2011. O professor diz que o experimento exige esse tempo por causa do ciclo dos eucaliptos, que dura sete anos.
Vantagens e desvantagens
Lúcia lista alguns benefícios da aplicação de lodo de esgoto. Ela destaca o aumento na produtividade e diminuição dos custos, visto que a utilização do lodo não é cara e, com ele, se usa menos adubos minerais, que têm um preço elevado.

Porém, Abreu Junior ressalva que, dependendo da origem do lodo, ele pode conter metais pesados, resíduos orgânicos tóxicos e outros componentes danosos à produção agrícola e à saúde humana. No caso do experimento, foi utilizado lodo de esgoto da Estação de Tratamento de Jundiaí (SP). O professor acredita que a utilização do lodo como adubo depende do município de origem e, principalmente, do tratamento que teve: “Com adequado tratamento, (o lodo) poderá ter um aproveitamento na agricultura”.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Afetados pela companhia Vale realizam encontro mundial

10 de fevereiro de 2010

Representantes sociais e sindicais do Canadá, Chile, Argentina, Guatemala, Peru e Moçambique realizam entre os dias 12 a 15/4, no Rio de Janeiro, o 1º Encontro de Populações, Comunidades, Trabalhadores e Trabalhadoras afetados pela política agressiva e predatória da companhia Vale - antiga Vale do Rio Doce.
A mineração é uma atividade extrativa que fomenta um cipoal de impactos ambientais e sociais nas comunidades onde os projetos são instalados.
Várias modalidades de assédio, saúde, violação de direitos, demissões arbitrárias e danos ao meio ambiente estão entre os pontos de pauta da reunião.
A seguir, leia a íntegra da convocatória para o encontro e entenda os motivos que levaram comunidades de diferentes regiões do globo a se unirem contra a companhia.

Encontro Mundial dos afetados pela Vale
Nós, organizações e movimentos sociais e sindicais do Brasil, convocamos e convidamos organizações sociais e sindicais do Canadá, Chile, Argentina, Guatemala, Peru e Moçambique para o I Encontro de Populações, Comunidades, Trabalhadores e Trabalhadoras afetados pela política agressiva e predatória da companhia Vale do Rio Doce, em abril de 2010 no Rio de Janeiro.
A Vale, dona que quase todo o minério de ferro do solo brasileiro, é hoje uma empresa transnacional, que opera nos cinco continentes, 14a companhia do mundo em valor de mercado, explorando os bens naturais, as águas e solo, precarizando a força de trabalho dos povos em todo o mundo.
Ela foi uma empresa estatal até 1997, quando foi privatizada de maneira fraudulenta pelo governo Fernando Henrique Cardoso a um valor sub-avaliado de R$ 3,4 bilhões de dólares. Desde então gerou lucro de 49 bilhões de dólares, e distribuiu a seus acionistas 13 bilhões de dólares, êxitos que obtém às custas da exploração dos bens naturais, das águas e solo e pela precarização da força de trabalho dos povos nos países que explora.
A propaganda da Vale nos lembra todos os dias que ela é brasileira e que trabalha com “paixão” para promover o “desenvolvimento sustentável” do Brasil e para garantir um futuro para nossas crianças. Utiliza em suas propagandas a imagem de brasileiros ilustres e artistas famosos. Em 2008, a Vale gastou R$ 178,8 milhões em propaganda (Ibope Monitor). As bonitas imagens omitem a face oculta da empresa, construindo no imaginário do brasileiro comum a imagem de uma Vale patriota e paternal. Não é isso, contudo, o que pensam as pessoas que vivem nos territórios explorados pela Vale, seja no Brasil ou nos outros países em que a companhia está presente. Os trabalhadores e as comunidades afetadas, no entanto, não têm o poder e o dinheiro da Vale para ocupar a mídia brasileira e mundial com as suas opiniões e relatos sobre a influência da empresa sobre suas vidas
A exploração de minério e outras atividades da cadeia de siderurgia têm causado sérios impactos sobre o meio ambiente e a vida das pessoas. A poluição das águas com produtos químicos, a intervenção direta na destruição de aqüíferos, a produção de enormes volumes de resíduos em suas atividades de mineração (657 milhões de toneladas por ano), a emissão de dióxido de carbono na atmosfera, o desvio de rios que antes atendiam comunidades inteiras para uso da companhia, o desmatamento de florestas e matas, a destruição de monumentos naturais tombados, a mineração em áreas de mananciais de abastecimento público, o impacto sobre as populações indígenas e tradicionais, a poeira de minério levantada em suas atividades, a desapropriação forçada de comunidades, rebaixamento do lençol freático, a associação da empresa com projetos industriais e energéticos que têm interferido na destruição da Amazônia e do Cerrado brasileiros, a eliminação de trechos ferroviários seculares em Minas Gerais, os acidentes nas minas e envolvendo trens da empresa, cuja vítima ou família não tem nenhuma assistência por parte da companhia – tudo isso, ainda que não sejam mencionadas nas propagandas, são as marcas mais fortes da Vale nos territórios em que ela atua. A extração nociva de bens naturais, destruição dos patrimônios culturais, e os danos causados ao meio ambiente são, em alguns casos, irreparáveis, e produzem danos permanentes à vida.
A despeito dos visíveis danos, suas atividades continuam respaldadas com investimentos e parcerias lucrativos. No Rio de Janeiro, por exemplo, com a associação da Vale com a Thyssen Krupp, através da TKCSA, está previsto um aumento de 12 vezes na emissão do poluente CO2 na cidade do Rio (O Globo, 5/11/09). Além disso, a Vale é uma das principais empresas consumidoras de energia, mas quase não paga por ela: a empresa paga menos de R$ 5,00 por 100kwh, enquanto a população em geral, assim como pequenos e médios comerciantes e indústrias, pagam mais de R$ 45,00kwh no Brasil.
Seus trabalhadores sofrem com demissões sem justificativa, com ausência de medidas de segurança do trabalho e com pressões de diversas naturezas que, muitas vezes, levam-nos ao suicídio. Dois em 100 trabalhadores foram afastados por acidentes em 2008, 9 morreram. A cidade de Itabira (MG), onde nasceu a Vale e o poeta Carlos Drummond de Andrade, tem o maior índice de suicídios do Brasil. É também muito alta a terceirização do trabalho, que desresponsabiliza a companhia e precariza as relações de emprego (146 mil empregos, 83 mil são indiretos).
A Vale tem usado a crise econômica mundial para pressionar os/as trabalhadores em todo o mundo, reduzir salários, aumentar a jornada de trabalho, demitir, e rebaixar direitos conquistados com anos de luta. A greve iniciada pelos trabalhadores e trabalhadoras canadenses desde junho de 2009 é um exemplo importante de luta e resistência contra a arrogância e a intransigência da empresa, e, ao mesmo tempo, de construção da nossa unidade internacional. A greve dos trabalhadores e trabalhadoras no Canadá conta com todo o nosso apoio e solidariedade ativa para garantir sua vitória!
A Vale usa as mesmas táticas com as populações em todo o mundo. Ela pressiona, ameaça, coopta agentes públicos e locais, chegando até a fazer uso de milícias e forças militares para garantir seus “investimentos”. Em muitos lugares, a empresa financia campanhas eleitorais, zoneamentos ecológicos e planos diretores de municípios, numa completa inversão do princípio da gestão política e governamental soberana dos interesses públicos pela sociedade.
Os cidadãos e cidadãs comuns também são atingidos, uma vez os recursos públicos gerados pelos seus impostos são repassados para a Vale pelo BNDES e outras agências estatais. Enquanto os impostos são altíssimos para a população comum, e também pequenas e medias empresas, grande corporações como a Vale recebem anos de isenção fiscal. Os serviços públicos para onde deveriam ser direcionados os impostos, como hospitais e escolas, continuam em péssimas condições. Assim, sua atuação aprofunda a dívida financeira, ecológica e social com as populações afetadas. Cada centavo de dinheiro público que é destinado à Vale poderia ser investido na criação de fontes de trabalho que não prejudicassem a vida no planeta.
É com o objetivo de mudar este quadro que estamos organizando o encontro internacional dos afetados pela Vale. Nós iremos demonstrar com fatos concretos e estudos de caso o que realmente vem acontecendo à população que vive no entorno dos empreendimentos, e aos trabalhadores da Vale. Nosso objetivo é dar voz àquelas pessoas que sofrem diariamente com a atuação da mineradora, sejam comunidades próximas, desapropriadas ou áreas em que a empresa busca se instalar, sejam os trabalhadores e trabalhadoras da empresa.
Além de expor o comportamento agressivo da Vale, nós também iremos trabalhar instrumentos e estratégias comuns para contestar seu poder absoluto e fortalecer os trabalhadores e comunidades atingidas. Estes instrumentos podem incluir acordos coletivos dos trabalhadores da Vale com demandas em comum, monitoramento independente do impacto ambiental, monitoramento independente dos contratos governamentais sobre impostos, royalties, entre outros.
A articulação dos povos e movimentos nos diferentes países em que há exploração da mineradora é fundamental para fortalecer nossas lutas locais, nacionais e internacionais. Precisamos nos unir para construirmos juntos nossas estratégias, e pressionarmos nossos governos para que nossos direitos de vida, trabalho, terra, moradia, saúde, e de um ambiente justo e saudável sejam garantidos. E para que a Vale cumpra mundialmente com padrões ambientais, tecnológicos e trabalhistas elevados, e que respeite e não tente retroceder as legislações vigentes. Não vamos deixar que a Vale rebaixe nossos direitos conquistados e destrua nossas vidas!
Os bens naturais e dos solos de cada país são patrimônio soberano dos povos, não dos acionistas nacionais e internacionais da Vale!
O leilão de privatização da Vale foi ilegal. Nós exigimos a anulação deste leilão, como disseram cerca de 4 milhões de brasileiros no Plebiscito Popular sobre a privatização da Vale e a dívida pública realizado em 2007. Nós defendemos a devolução ao povo brasileiro dos “direitos minerários” não contabilizados na operação de venda, sua re-estatização e o seu controle pelos trabalhadores!
Assim, convocamos as comunidades que atualmente sofrem com os grandes empreendimentos mineradores, a sociedade civil, os trabalhadores e trabalhadoras da Vale, movimentos e organizações sociais, pastorais sociais, estudantes e professores para participar da construção desse encontro, na expectativa de uma sociedade mais justa e ambientalmente equilibrada.
Assinam:
Campanha Justiça nos Trilhos

Movimento pelas Serras e Águas de Minas
Comitê Mineiro dos Atingidos pela Vale
Fórum Carajás
CONLUTAS
PACS
Rede Justiça Social e Direitos Humanos
Rede Brasileira de Justiça Ambiental
MST
MAB
ILAESE (Instituto Latino Americano de Estudos Sócio-Econômicos)
CEPASP Marabá (Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular)
Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos
Sociedade Paraense dos Direitos Humanos
Instituto Madeira Vivo
CPT nacional
Associação Paraense de Apóio às Comunidades Carentes
Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia
Forum de Mulheres da Amazônia Paraense/AMB
Movimento Artístico, Cultural e Ambiental de Caeté - MACACA
Sindicato Metabase Inconfidentes - Congonhas MG
Justiça Global
Assembléia Popular Nacional
Jubileu Sul Brasil
Grito dos Excluídos – Brasil
Grito dos Excluídos Continental
Associação de Favelas de São José dos Campos/SP
IBASE
Consulta Popular
Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD)
Associação de Pescadores de Pedra de Guaratiba (AAPP)
APESCARI
Fé e Política – Sepetiba
Núcleo Socialista de Campo Grande (RJ)
Coletivo Baía de Sepetiba pede Socorro
FASE/ Amazônia

Ainda o BNDES

Assembléia Popular aponta para Brasil planejado pelo povo

26 de maio de 2010
Comunicação AP

Desde esta terça-feira (25/5), cerca de 500 delegados de todos os Estados do país participam da II Assembléia Popular Nacional – Na construção do Brasil que queremos, em Luziânia (GO).
Com a exposição que analisou o contexto conjuntural e estrutural da sociedade, ficou clara a polarização entre os projetos em disputa em nível global.
Em resposta a estes contextos, os movimentos presentes se posicionam não apenas formulando uma agenda de direitos a serem conquistados, mas estabelecendo estratégias para atingir centralmente a política da classe que hoje domina econômica e ideologicamente o planeta.
O antagonismo entre a classe burguesa e as classes populares segue como principal foco das lutas políticas.
Nas análises, existem mais de dois projetos em jogo no cenário mundial. Num primeiro plano, as estratégias do grande capitalismo, capitaneado pelas potências do Norte, principalmente os Estados Unidos, continuam a intervir diretamente nos povos que pretendem dominar, com a permanência da política de guerras e consumo desenfreado. Este Imperialismo estadunidense é capaz de intervir, a partir de suas mil bases militares em todos os continentes, em menos de uma hora em qualquer ponto do globo.
Recentemente, se viu sinais de um revigoramento dessa brutalidade, com a instalação de sete novas bases militares na Colômbia, o anúncio de mais bases no Panamá, a reativação da Quarta Frota da marinha dos EUA para monitoramento dos mares da América e as políticas de relação com o povo hondurenho e haitiano.
A novidade entre os atores é o próprio Brasil e seu projeto neodesenvolvimentista. Com uma aliança com outros países emergentes (o Bric – Brasil, Rússia, Índia e China) que juntos devem ter PIB (Produto Interno Bruto, ou a soma de todas as riquezas do país) superior ao G-7 em 2030, nosso país já exporta seu próprio modelo de capitalismo, novamente baseado no financiamento público de empresas privadas, saqueando o Fundo de Amparo ao Trabalhador alocado no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), e em grandes obras, como as contidas no PAC (ou“Planos para Acabar com as Comunidades”, segundo Sandra Quintela, da coordenação nacional da AP) e na Integração da Infra-Estrutura Regional da América Latina (IIRSA).
Para Irmã Delci, das Pastorais Sociais/CNBB, “O planeta não resiste a mais desenvolvimento. Não consegue mais dar respostas ao consumo de matérias e energias. Mas o capitalismo insiste em sugerir a infinitude deste crescimento.”
Do lado de cá, o surgimento da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba) representa uma alternativa a estas propostas, por fora do capitalismo. “Temos uma coisa da qual podemos nos orgulhar a vida inteira por termos conquistado”, salienta Ricardo Gebrim, da Consulta Popular.
Continua: “a derrota da Alca foi uma vitória do projeto popular. A mobilização dos povos americanos conseguiu dar fim a uma proposta estratégica de nosso inimigo.” Também a inspiração da organização dos povos indígenas foi lembrada por Ivo Poletto, assessor de pastorais e movimentos sociais, para basear qualquer projeto alternativo de sociedade.
“Estes povos trazem na sua concepção, na sua espiritualidade, um acúmulo político-econômico de 15 mil anos. Sempre se relacionaram em equilíbrio com a Mãe-Terra e, após terem sobrevivido ao massacre declarado pelos povos europeus, merecem toda nossa abertura e humildade.”
Para encaminhar os debates nos eixos de aprofundamentos, Sandra Quintela sugeriu o questionamento a uma prisão quase secular de nosso povo, a dívida pública. A dívida externa hoje gira em torno da cifra de R$ 282 bi e a interna, em torno de R$ 1 trilhão.

Aumenta violação de direitos cometida por hidrelétricas

24 de novembro de 2009
Do Amazônia.org
Um relatório, que está sendo elaborado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em conjunto com a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, constata que tem aumentado, nos últimos anos, a violação de direitos humanos das populações afetadas pelas grandes hidrelétricas no Brasil.
Segundo informou à Agência Brasil Luiz Dalla Costa, da coordenação nacional do MAB e membro da rede de organizações da sociedade civil Plataforma BNDES, todas as denúncias formuladas desde 2005 foram confirmadas.
Dalla Costa disse que foram registradas violações do direito ao trabalho, à moradia, à livre circulação e, inclusive, ao acesso à água e à energia. Até o início do próximo ano, o relatório estará concluído e será divulgado pela SEDH.
A Plataforma BNDES realiza entre os dias 23 e 25/11, no Circo Voador, no Rio de Janeiro, o 1º Encontro Sul-Americano de Populações Afetadas pelos Projetos Financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Dalla Costa destacou que o BNDES é o principal financiador das grandes obras no país. “Praticamente, todas as obras de construção de barragens no Brasil têm 70% a 80% de recursos públicos vindos do BNDES.” Por isso, o MAB entende que o banco é responsável, ou corresponsável, pelas consequências que essas obras causam na vida das populações.
“A gente acha que o banco, ao financiar, tem responsabilidade de se preocupar para que haja novos critérios de financiamento dessas obras, e não só hidrelétricas, mas de obras que envolvem mineração, investimentos na produção de carne que avança sobre a floresta amazônica, na celulose, na siderurgia, que afetam a vida de muitas pessoas, que não têm o tratamento social e ambiental devidamente equacionado”, expôs Dalla Costa.
Ele defendeu que o banco busque informar, de forma isenta e direta, as populações afetadas, para que elas possam se organizar e reivindicar seus direitos. “Nós queremos que haja maior transparência do banco para que as populações sejam previamente informadas.”
O MAB pede também que o BNDES estude formas de apoiar as populações situadas ao redor das obras que, muitas vezes, ficam inteiramente desassistidas. “Nós queremos mudanças nessas posturas e achamos que o banco é responsável por isso.”
Dalla Costa lembrou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu que o Estado brasileiro tem uma dívida com os atingidos por barragens e observou que esse reconhecimento é importante. “E necessário que haja políticas e, no caso do BNDES, que haja transparência e outros critérios, discutidos com a população, para que haja, de fato, mudanças substantivas nas políticas atuais.”

Foco de investimentos não mudará, aponta BNDES

4 de dezembro de 2009
Da Repórter Brasil

Representantes de comunidades e populações atingidas por empreendimentos financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se reuniram esta semana com o intuito de pressionar por mudanças na conduta do principal banco estatal brasileiro de fomento. Após três dias na capital fluminense para o encontro organizado pela Plataforma BNDES - rede de mais de 30 organizações e movimentos sociais que acompanha os impactos da atuação do banco, eles ouviram do presidente do banco, Luciano Coutinho, apenas uma promessa de "reiterar o compromisso de levar a sério o documento [elaborado pelos participantes]".
Na audiência entre as partes realizada nesta quarta-feira (25), Luciano Coutinho não deu abertura para as demandas de reorientação política e econômica sugeridas pela sociedade civil. Segundo o presidente do BNDES, a instituição tem desempenhado um papel fundamental no setor produtivo - muitas vezes evitando que empresas quebrem, o que, segundo ele, "seria pior". De acordo com ele, o banco tem atuado nos setores sociais e ambientais dos projetos onde tem participação societária e tem financiado apenas projetos com licenciamento ambiental. Advertiu ainda que "se a empresa omite ou distorce [dados sobre os impactos], isso é um problema de interlocução entre nós".
A possibilidade de debate sobre a redirecionamento do crédito e a priorização de investimentos em projetos de desenvolvimento social em detrimento dos apoios ao setor macroempresarial parece não encontrar espaço na agenda do atual presidente do BNDES. De acordo com João Roberto Lopes, coordenador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Luciano Coutinho reafirmou total alinhamento com o atual modelo, desconsiderando a Plataforma BNDES como interlocutor na medida em esta se baseia na cobrança de mudanças estruturais e não se contenta com mitigações.
O encontro da Plataforma BNDES se concentrou em questões como acesso maior a informações (disponibilização da totalidade da carteira de projetos privados, classificação de risco ambiental dos projetos e critérios de aprovação, condicionantes socioambientais e cláusulas de suspensão de contrato), participação e controle (as populações diretamente impactadas pelos projetos devem ser consideradas, informadas e consultadas durante a análise dos projetos de financiamento do Banco), e remodelação da agenda de desembolsos do banco, atualmente direcionada a grandes empreendimentos. As demandas vieram acompanhadas de depoimentos de lideranças indígenas e de agricultores sobre problemas ambientais, sociais, fundiários e econômicos gerados pelos projetos apoiados pelo BNDES.
"É difícil conversar com o senhor, que financiou a nossa desgraça", desabafou Cleide Passos, ribeirinha atingida pelas obras de construção da Usina Hidrelétrica (UHE) de Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia, que recebeu R$ 6,1 bilhões do BNDES. A família de Cleide foi uma das desalojadas pela obra, e hoje enfrenta grandes dificuldades em função da impossibilidade de praticar a agricultura de subsistência. "O senhor está financiando a nossa morte; é a nossa desgraça que o senhor assinou", acusou a ribeirinha, que não conteve o choro e teve que sair da sala para se acalmar.
Balanço
João Roberto Lopes, do Ibase, frisou também a falta de implementação de medidas acordadas no primeiro encontro do presidente do Banco com a Plataforma BNDES em 2007. Na ocasião, o presidente do banco prometera reexaminar financiamentos do setor de papel e celulose, um dos mais impactantes do ponto de vista socioambiental.
De acordo com João Roberto, apesar de um pequeno avanço no quesito transparência - o BNDES passou a publicar, trimestralmente, dados sobre os financiamentos ao setor privado referentes aos últimos 12 meses, mas retira da pagina eletrônica as informações anteriores a cada nova publicação -, todas as demais demandas, e principalmente um estreitamento do diálogo com as entidades da sociedade civil, pouco avançaram e não apresentam nenhuma realização concreta.
Como resultado do I Encontro Sulamericano de Populações Afetadas por Projetos Financiados pelo BNDES, que reuniu cerca de 200 representantes de comunidades atingidas de todo o país, o coordenador do Ibase apresentou ao presidente do banco a exigência de que assuma as responsabilidades e co-responsabilidades pelos problemas causados por obras como as usinas do Madeira, e projetos de empresas como Aracruz e Votorantim (papel e celulose), bem como da Vale (mineração) e dos setores sucroalcooleiro e da pecuária, recordistas na exploração de mão-de-obra escrava.
Em resposta às organizações sociais, Luciano Coutinho refutou a falta de abertura para o diálogo e mencionou as recentes audiências com ambientalistas e com o Ministério Público Federal (MPF) para discutir mitigações e compensações dos impactos causados pelo agronegócio. De acordo com o presidente do BNDES, o banco está preparando uma série de manuais para os diversos setores em que atua - guias que deverão estabelecer protocolos e regras de conformidade para a observação de direitos sociais e ambientais das populações.
Uma nova rodada de negociações foi marcada para meados de dezembro, quando deverão ser apresentadas as considerações oficiais do banco de fomento sobre o documento do "I Encontro Sulamericano de Populações Afetadas por Projetos Financiados pelo BNDES".
Na avaliação de Gabriel Strautman, secretário executivo da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, apesar da superficialidade e da falta de compromisso que marcaram o posicionamento de Luciano Coutinho durante a audiência com os atingidos pelos empreendimentos, "ele ouviu as nossas considerações com atenção". "Mas o diálogo com o BNDES só vai avançar com pressão e sob exigência contundente da sociedade", prevê.

Odebrecht compra usina de cana e cria gigante do etanol

18 de fevereiro de 2010

A ETH Bioenergia, empresa transnacional do grupo Odebrecht, anuncia hoje a compra da Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco).
A operação criará uma das maiores produtoras de etanol do mundo, com capacidade inicial de três bilhões de litros/ano e geração de 2.500 gigawatts-hora (GWh) de energia a partir da queima do bagaço de cana.
A transnacional Brenco, que tem como dois de seus sócios, o ex-presidente do Banco Mundial (Bird) James Wolfensohn, o BNDESpar (setor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES) e o ex-presidente da Petrobras Henri Philippe Reichstul, é uma das empresas que figuram na “lista suja” do trabalho escravo elaborada pelo Ministério do Trabalho.
Com a operação, o setor sucroalcooleiro caminha a passos largos para as mãos de um grande oligopólio. Isso porque no início deste ano, também as transnacionais Cosan e Shell fecharam um acordo voltado para produção de etanol. Estima-se que no prazo de cinco a dez anos o número de produtores no Brasil caia de 300 para 15 ou 20 no máximo.
De 60% a 70% da companhia devem ficar com a Odebrecht. No ano passado, a Brenco previa a inauguração de dez usinas até 2015, com investimentos superiores a R$ 5 bilhões. Deste montante, R$ 1 bilhão saiu dos cofres do BNDES. Instaladas na região Centro-Oeste do país, teriam como objetivo principal produzir etanol para exportação. Até agora, R$ 700 milhões foram gastos, porém nenhuma instalação ainda começou a operar.
Financiando o trabalho escravo
A injeção de capital feita pelo banco público ocorreu meses após fiscais do trabalho terem encontrado trabalhadores em situação degradante em Goiás e Mato Grosso. Durante a ação, realizada no início de 2008, foram registrados 107 autos de infração por violações à legislação, segundo o governo federal, como alojamento precário, falta de equipamentos de proteção e transporte irregular.
(Com informações do jornal O Globo)

O controverso papel do BNDES

O BNDES na visão dos movimentos sociais

23 de novembro de 2009
Do IHU On-Line

“Nós (dos movimentos sociais) temos conversado com o BNDES, mas achamos que deve haver mais avanços. Queremos que o BNDES seja um banco público, de interesse público e popular e o mais democrático possível”. Assim, Luiz Dalla Costa aborda as relações entre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e os movimentos sociais, formados por pessoas atingidas por obras financiadas pelo banco. Em entrevista, por telefone, à IHU On-Line, o coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no Rio Grande do Sul abordou os impactos trazidos pelas grandes construções custeadas pelo BNDES, as mudanças ocorridas no banco com a transição de governos e os setores da economia que produzem os impactos mais graves na sociedade.
Sobre as reivindicações das populações impactadas, Dalla Costa fala sobre o “Primeiro Encontro Sul-americano de Populações Afetadas por Projetos Financiados pelo BNDES”, que discutirá a transparência nas informações dos financiamentos e as políticas sociais por parte do banco. “Queremos que o banco se coloque como responsável por esses empreendimentos, pois entendemos que ele passa a ser responsável ao ceder os empréstimos dos recursos para as obras. O BNDES tem que se preocupar tanto se esse grande projeto não irá afetar as populações quanto, se afetar, o que deve ser feito e colocado como política de financiamento”, afirma Dalla Costa.

Confira a entrevista.
O movimento social tem criticado o BNDES pela formação de uma nova categoria de brasileiros: os “impactados”. O senhor poderia explicar quem são eles e qual é a responsabilidade do banco?
O BNDES se tornou, nos últimos anos, o principal banco financiador dos grandes projetos no Brasil. E os grandes projetos, como hidrelétricas, mineradoras e rodovias, atingem muitas pessoas. Muitas famílias têm que ser deslocadas em função das construções. Portanto, o banco, na medida em que financia essas obras, passa a ser corresponsável pelo impacto que estas causam na vida das pessoas. Tivemos casos de hidrelétricas que atingiram de duas a três mil famílias, e até mais que isso. Um exemplo: já houve a construção de seis hidrelétricas na divisa do Rio Grande do Sul com Santa Catarina, no Rio Uruguai, e essas hidrelétricas tiveram financiamento de quase seis bilhões de reais por parte do BNDES. Hoje as famílias que foram afetadas e que moram ao redor dos lagos das Usinas de Itá, Machadinho e Campo Novos não têm nenhum programa de desenvolvimento regional e de recuperação das comunidades por parte do BNDES, e foi o próprio banco que financiou a obra. Por isso que vamos organizar agora um primeiro encontro nacional dos atingidos por esses grandes projetos financiados pelo BNDES. O banco também tem atingidos, tem pessoas que são impactadas por esses projetos financiados. E, inclusive, o BNDES é sócio de vários desses empreendimentos.

No final de novembro, será realizado, no Rio de Janeiro, o “Primeiro Encontro Sul-americano de Populações Afetadas por Projetos Financiados pelo BNDES”. Virão pessoas de que países? Qual é o objetivo do encontro?
Estamos convidando pessoas da Bolívia, Peru e Equador, onde já houve projetos financiados pelo BNDES. Alguns envolveram empresas brasileiras, como a Odebrecht no Equador, e tiveram vários problemas na obra ou porque tem financiamentos através do banco. Também vamos reunir pessoas afetadas de todo o Brasil. Virão representantes de vários empreendimentos financiados na área da cana, e nas questões da pecuária extensiva, das hidrelétricas e da mineração. Reuniremos essas pessoas que sofrem impactos dessas grandes obras ou projetos onde tem investimentos do BNDES, para discutir que políticas o BNDES desenvolve, e quais as que ele não desenvolve, no sentido de qualificar melhor nosso trabalho e nossa crítica. Até hoje existiram muito poucas informações para a população que é afetada. Nós queremos um maior acesso às informações, chamamos isso de transparência nos financiamentos. Queremos também que o BNDES adote critérios que levem em conta os impactos sociais e ambientais causados pelas obras. Queremos que o banco se coloque como responsável por esses empreendimentos, pois entendemos que ele passa a ser responsável ao ceder os empréstimos dos recursos para as obras. O BNDES tem que se preocupar tanto se esse grande projeto não irá afetar as populações quanto, se afetar, o que deve ser feito e colocado como política de financiamento. Além disso, entendemos que o BNDES também peca por omissão no sentido do que não faz. O banco financia uma grande obra, mas não se preocupa com que a população, afetada por essa grande obra, tenha as informações de forma isenta, e não pelas empresas, porque se for por essas, certamente serão informações tendenciosas. Entendemos que o BNDES deve auxiliar essas entidades de organização da própria população atingida, entidades que não estão envolvidas com a obra e até fazem críticas a ela, para que as populações sejam devidamente informadas com antecedência sobre os impactos e possam, de forma organizada, reivindicar seus direitos. O BNDES também deve assumir suas responsabilidades se no caso for constatado que houve violação de direitos, como existe de fato. Nós mesmos estamos trabalhando com uma comissão que está investigando violação de direitos humanos na construção de grandes hidrelétricas, e já está constatada essa violação de direitos em obras financiadas pelo BNDES.
Deve-se haver uma maior transparência nas atuais obras, e devem ser discutidos, com os movimentos e com a sociedade civil, novos critérios para futuros financiamentos do banco. É absolutamente justo discutir isso. Tem alguns que são atingidos por barragens, e alguns por outros empreendimentos, porque o dinheiro do BNDES é público, é dinheiro de todo o cidadão brasileiro [vem do FAT - Fundo de Ampara ao Trabalhador]. Então temos o dever de exigir, e o BNDES tem a obrigação de nos atender. E isso também fora do Brasil, já que existem pessoas afetadas por essas obras em outros países.

Na visão do movimento social, o BNDES está a serviço de que interesses?
Hoje os grandes beneficiados pelos financiamentos do BNDES são as grandes empresas. Grande parte delas produz para exportação e não paga imposto, como é o caso dos minérios. A própria energia produzida para a produção de minérios tem um grande aporte de recurso público, e quem ganha na construção, venda de equipamentos, na utilização e venda de energia, são as grandes empresas. Os grandes mineradores recebem subsídio para usar grandes quantidades de energia. Esse minério é extraído como riqueza natural do Brasil, é exportado, e não paga sequer imposto. Quem é o grande beneficiado em todo esse processo? As grandes empresas nacionais e multinacionais, entre elas a Suez Tractebel, que é uma grande empresa da agroenergia, Odebrecht, que é construtora e está na construção de grandes obras, a Votorantim e a companhia Vale do Rio Doce. Esses são os grandes beneficiados. Inclusive, nos últimos anos, só nesta área da energia, eles cobraram da população brasileira sete bilhões a mais nas contas de luz, e agora dizem que não querem devolver. Se fosse um pobre já estaria preso, mas como são grandes empresários, tem gente que diz que não foi roubo, mas sim um erro. Mas um erro de sete bilhões é algo absurdo.

Muitos dizem que, com o governo Lula, o BNDES recuperou o seu papel estratégico na formulação de um projeto de país, contrário ao governo FHC, que utilizou o banco para financiar as privatizações. Essa interpretação de que o banco estaria a serviço dos interesses do Estado, e não mais apenas do mercado está equivocada?
Houve mudanças, sem dúvida. Acho que o governo Fernando Henrique foi o pior que já vi no Brasil, porque vendeu todo o patrimônio público, sucateou grandes setores que eram de primeira linha, vendeu a Vale do Rio Doce, parte do setor elétrico, fez com que o povo brasileiro pagasse por tudo isso. Gerou um caos, o processo de privatização foi a pior coisa feita no Brasil em toda sua história, não temos dúvida disso. O que houve com o governo Lula é que ele passou a ter um outro planejamento, não privatizou aquilo que já existia, mas financiou a entrega do patrimônio. Isso tem diferença. Antes, em uma obra que já estava feita, o BNDES dava o dinheiro para uma grande empresa comprar o que já era nosso, com o nosso dinheiro, inclusive as próprias estatais eram proibidas de fazer investimentos e pegar dinheiro público do BNDES, e isso foi mudando gradativamente. Hoje o Estado brasileiro participa em obras com até 49% do valor, já o BNDES financia até 80 e 90% dessas grandes obras, mas ainda continua 51%, ou seja, o capital majoritário na mão das grandes empresas.
Toda a lógica que é implantada é a das grandes empresas, de tentar obter o máximo de lucro, que é pago pela população brasileira. O povo brasileiro que paga as taxas, as tarifas, os impostos, para que essa prática continue vigorando. Então, houve mudanças sim, mas entendemos que a lógica não mudou no essencial. Inclusive, dá pra se dizer que, nos últimos anos, o tratamento das questões sociais e ambientais piorou no governo FHC e não foi recuperado ainda pelo governo Lula. Existe de fato uma nova organização do investimento, nós sentimos isso, mas a lógica continua praticamente a mesma.

Quais são os principais setores da economia que o Banco financia que produzem impactos mais graves?
É o setor da mineração, das hidrelétricas, o investimento na produção de carne de gado, que vai avançando cada vez mais sobre a floresta amazônica, no setor de cana, de celulose, que vai transformando em deserto verde o que era de bem natural brasileiro, e vai repassando grande quantidade de terras dos rios, minérios, das grandes empresas nacionais e multinacionais. Hoje os setores siderúrgico, mineral e de energia são grandemente beneficiados pelos financiamentos do BNDES.

Qual é a relação do movimento social hoje com o BNDES? Tem ouvido as suas reivindicações?
A partir da própria discussão com essa série de organizações que chamamos de plataforma BNDES, que é um conjunto de organizações do movimento social e de entidades não-governamentais, buscamos o diálogo com o banco, para que este tivesse maior transparência, para que houvesse mudança nas políticas, então começamos a ter um contato maior. A plataforma BNDES já teve contato com o presidente do banco, Luciano Coutinho, já houve algo no sentido da transparência, da divulgação de insights na questão de algumas informações, mas não estão completas e não há contento ainda. Nós mesmos, dos movimentos sociais, já tivemos conversas com o BNDES, onde eles nos apresentaram o que fazem e o que estão prevendo. Dá pra se dizer que nós achamos que isso é a coisa certa a ser feita, que o banco deve ter essa abertura, tem que ouvir a população que é afetada pelos grandes projetos onde o banco é financiador e temos que buscar novos critérios para financiamentos do banco que favoreçam a maioria do povo brasileiro. Como eu disse, é mais fácil uma grande empresa conseguir um bilhão do BNDES, do que um grupo de agricultores ou pescadores conseguir 50 mil, pois todo o banco está montado para essa lógica do grande empresário, do grande empreendedor e capitalista nacional e multinacional. Nós temos conversado com o BNDES, mas achamos que deve haver mais avanços. Queremos que o BNDES seja um banco público, de interesse público e popular e o mais democrático possível.

Como integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), qual é a sua avaliação sobre o último “apagão”?
Primeiro, é importante dizer que não falta produção de energia no Brasil, o país tem energia de sobra, tanto é que, com a crise dos últimos anos, se diminuiu o consumo de energia, e hoje estamos no patamar de consumo que estávamos em 2007. Estamos consumindo menos que em 2008, e outras obras já foram feitas, então temos uma folga de energia muito grande. Não é necessário, para resolver o problema do apagão, fazer mais obras. Pelo contrário, com o que se tem, teremos energia por um bom tempo. Nossa visão com relação ao apagão é que complicações como esta podem ocorrer. Nenhum sistema é infalível. O Brasil tem um bom sistema energético nacional e que se torna mais eficiente se tiver gestão e controle únicos. Agora, do jeito que os últimos governos têm feito, principalmente com o processo da privatização, também foi privatizado parcelas do setor elétrico. Cada capitalista individual passou a ter um pedaço daquilo que deveria funcionar de forma única e organizada. Hoje alguns são donos de algumas barragens, outros de termoelétricas, outro é dono de um pedaço de linha de transmissão, outro de uma revenda de energia. Este compartilhamento do setor elétrico foi ruim e está aí uma das causas desse apagão. Hoje se tem mais dificuldades de ter o gerenciamento único, apesar de que o governo Lula até recuperou em certa parte essa organização. E mesmo os órgãos que foram criados, foram feitos para legitimar essa lógica de transformar a energia elétrica em mercadoria. Hoje as grandes empresas ganham rios de dinheiro vendendo energia 400% mais caro do que antes, que era do governo. Houve um aumento extraordinário das tarifas de energia no último período.
Quando a lógica é a do lucro, de transformar a energia em mercadoria e não em bem público necessário para o desenvolvimento do país, esse tipo de problema, como o apagão, tende a ocorrer de forma mais seguida. Houve três casos recentes. No primeiro caso, houve esta questão da cobrança extraordinária nas tarifas de energia, aí o governo vai lá, e as empresas dizem que não podem devolver. Alguém até disse que poderia ser imoral, mas que era legal. Lógico que é imoral, ficaram com sete bilhões de reais do povo a mais nas empresas. O segundo fato é essa falha que houve e que deixou muita gente às escuras. O terceiro é que o próprio governo reconhece que existe uma dívida. São três fatos importantes, dívida com o povo que foi atingido, cobrança a mais dos consumidores, e o problema de fornecimento. Ao nosso entendimento, isso não é uma questão pontual, é de como deve ser organizado o atual modelo de produção de energia no Brasil. O governo deveria acabar com as privatizações, ter um grande projeto de economia de energia, de eficiência energética, questionar o modelo de exportação de energia através da exportação de minérios, de celulose etc. que não paga imposto e não gera emprego para nosso povo.


Por que o BNDES não atua como banco público?

Por João Roberto Lopes Pinto
Revista Sem Terra, no. 51, Jul/Ago, 2009

1. O BNDES é o viabilizador do atual padrão de desenvolvimento, centrado na exportação de natureza e que se mostra insustentável econômica, social e ambientalmente.

Alguém já disse que na atual divisão internacional do trabalho, a China entra como oficina, a Índia como escritório e o Brasil como fazenda do mundo, isso para ficar nos Brics.
A crise financeira e suas repercussões sobre os investimentos demonstram a fragilidade e vulnerabilidade de um desenvolvimento ancorado na exportação de commodities, que estão submetidas às oscilações do mercado externo. A queda no preço das commodities e a insistência do Estado brasileiro, via BNDES, em não somente seguir financiando, mas em ampliar o apoio, socorrendo empresas exportadoras é a demonstração cabal de que não se trata apenas de uma passiva inserção no mercado global. Trata-se de uma opção deliberada de consolidar esta estratégia subordinada de inserção do país.
Os defensores desta forma de inserção a defendem com o argumento de que nos setores intensivos em natureza seríamos competitivos. Resta indagar de que competitividade se trata, quando se constata que este modelo somente se sustenta do ponto vista econômico com uma drenagem estupenda e crescente de recursos públicos para o setor privado.
Somente no governo Lula, o orçamento do BNDES quintuplicou. O BNDES direciona a maior parte de seu orçamento gigante de R$ 160 bilhões — mais de duas vezes o orçamento de investimento do governo federal! — para os setores de mineração e siderurgia, hidrelétricas, petróleo e etanol, papel e celulose e agropecuária. Some-se a isso, o BNDESPar (empresa de participações do Banco), que possui hoje uma carteira de ações no valor aproximado de R$ 70 bilhões, onde os setores de mineração e siderurgia, geração e distribuição de energia, petróleo e gás, papel e celulose representam 81% da carteira.

Em resposta à crise que atinge boa parte destes setores, além da perspectiva do socorro com a redução de taxas e ampliação do prazo de carência nos empréstimos, o banco tem atuado em favor da concentração econômica. A exemplo do financiamento de R$ 2,4 bilhões à Votorantim para viabilizar a compra da Aracruz Celulose, que perdera algo próximo de R$ 2 bilhões nas aplicações em derivativos. O BNDES, que já contava com participação nestas empresas, deverá ficar agora com 29% do capital da nova empresa. Importa dizer que estas empresas também têm participações em outras grandes do setor como Suzano Bahia Sul e Veracel.

A mesma coisa se passa no caso da compra da Sadia pela Perdigão, em que o BNDES já declarou que possui interesse em tomar parte no capital da nova empresa Brasil Foods, além de ter sido historicamente um dos principais financiadores de ambas as empresas.

O Banco participou também da aquisição da Swift pela JBS-Friboi, tornando a empresa o maior frigorífico de carne bovina do mundo, garantindo financiamento de R$ 1,1 bilhão para capitalização da empresa – o banco ficando com uma participação de 15% do capital. Sem esquecer que o BNDES é igualmente sócio dos outros dois grandes frigoríficos: Bertim, no qual possui 30% das ações, e Mafrig, em que participa com 15%. No ano passado a primeira empresa recebeu financiamento de R$ 2,4 bilhões e a segunda de R$ 700 milhões.

O banco também é acionista de grandes usinas de etanol, a exemplo da Brenco, que obteve um financiamento de R$ 1,2 bilhão e é uma das integrantes do consórcio de usinas envolvidas no Projeto Uniduto, para a construção de um alcoolduto ligando o Centro-Oeste ao litoral paulista. Desde 2003, o BNDES já destinou mais de R$ 30 bilhões para o agronegócio.

Outro setor amplamente beneficiado é o da mineração. Neste caso, destaca-se o apoio do BNDES à Vale do Rio Doce. No ano passado o Banco aprovou para a Vale o seu maior financiamento para uma única empresa, no valor de R$ 7,3 bilhões. O acionista controlador da Vale é a Valepar S.A, que possui 53% do capital. O BNDES possui 12% da Valepar e é detentor de golden shares (ações de ouro) que garantem ao banco poder de veto sobre decisões essenciais à empresa, porém jamais utilizado. A Vale possui, por sua vez, o controle acionário de gigantes da produção de alumínio, como a Alunorte (57%) e Albras (51%). Tais empresas também recebem financiamento do banco, além de serem as principais beneficiárias da energia gerada pela Hidrelétrica de Tucuruí, que igualmente foi apoiada pelo BNDES.

Na verdade, o banco está presente como financiador em todo grande projeto hidrelétrico, que tem exatamente o papel de carrear energia para estas grandes empresas e não para a população. Apenas para se ter uma idéia, a Vale consome sozinha 5% de toda a energia elétrica gerada no Brasil e possui participação em 12 empreendimentos hidrelétricos. Em outro exemplo, a Alcoa, que recebeu um financiamento de R$ 500 milhões do banco, possui participação de 26% — a Vale conta com 30% — no consórcio responsável pela Hidrelétrica de Estreito, que, por sua vez, obteve um apoio de R$ 2,6 bilhões do BNDES. A geração de energia neste caso é distribuída preferencialmente e de modo subsidiado para setores eletro-intensivos, voltados para a exportação e não para o atendimento do mercado interno.

Este exemplo demonstra como o BNDES alimenta e ordena uma verdadeira rede oligopolista, onde as empresas possuem participações cruzadas, atraindo igualmente o capital financeiro privado. A concentração econômica alimentada pelo Estado brasileiro aprofunda de forma dramática o modelo de especialização produtiva e de subordinação das populações tradicionais e da agricultura familiar, responsável por desempregar, desorganizar a produção de alimentos e impactar de modo irreversível importantes biomas.

Assiste-se, pois, ao empobrecimento da estrutura produtiva do país, reduzindo a capacidade de diversificação produtiva e geração de riqueza, renda e trabalho. Uma estrutura que depende da transferência maciça de recursos públicos e, portanto, do controle privado dos principais instrumentos estatais de financiamento e gestão econômica, a exemplo do BNDES.

2. O BNDES é corresponsável pelos graves impactos sociais e ambientais dos projetos que financia

Os setores apoiados pelo banco, além de submetidos à vulnerabilidade do mercado externo, encontram-se normalmente desconectados do mercado interno [mais ou menos...], com baixo nível de ocupação de mão-de- obra, além de altamente impactantes do ponto de vista socioambiental.

Importantes biomas do país encontram-se seriamente ameaçados pela expansão da monocultura, pecuária e mineração. Praticamente 40% da área de Cerrado no Brasil está comprometida em razão da soja e pecuária e, cada vez mais, pela expansão da cana, que vem ameaçando também a região do Pantanal. As principais áreas de fronteira de expansão da cana são exatamente o sul do Mato Grosso do Sul e de Goiás. Enquanto isso, a carteira do BNDES para o setor de etanol aproxima-se dos R$ 10 bilhões.
No bioma Amazônia, 75% da área desmatada na região é ocupada pela pecuária, como demonstrou relatório recente do Greenpeace. Boa parte dos fornecedores das empresas frigoríficas apoiadas pelo BNDES são agentes do desmatamento na região. O Brasil é o quarto país com maiores emissões de CO2 (gás carbônico), graças especialmente ao desmatamento, que é responsável por 75% das emissões. O banco é coresponsável por tais questões, à medida que segue financiando empreendimentos que comprovadamente promovem o desmatamento. Vale lembrar, por exemplo, que a Bertim sofreu antecipação do vencimento de seu crédito com o IFC, organismo do grupo Banco Mundial responsável por financiar o setor privado, por conta de ter como fornecedores pecuaristas responsáveis pelo desmatamento.
No caso da Bertim, a responsabilidade do BNDES é mais que uma responsabilidade indireta ou “solidária”. Isso porque, como visto, o banco é um importante acionista da empresa. Neste caso, a responsabilidade é direta, pois o BNDES é sócio do empreendimento, como vem inclusive reivindicando a Amigos da Terra-Amazônia junto ao ministério público.

Para além dos biomas, os investimentos financiados pelo Banco impactam diretamente as populações. É o caso, por exemplo, da Usina São João (USJ) na cidade de Quirinópolis (GO), apoiada pelo Banco com R$ 600 milhões, que foi autuada pelo Ministério Público do Trabalho por manter 421 trabalhadores em situações de trabalho análogas à escravidão. A Brenco também foi autuada por ter trabalhadores em condições degradantes de trabalho. Mais recentemente, a empresa entrou com mandado de segurança para impedir a inclusão do nome da empresa na “Lista Suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (cadastro de empreendimentos em que houve flagrante da existência de trabalho escravo), conforme informações da ONG Repórter Brasil. Novamente se tem uma situação clara e grave de responsabilidade do banco, pois neste caso, além de sócio, o BNDESPar tem assento no conselho de administração da Brenco.
A desestruturação dos meios materiais e imateriais de sustentação de povos tradicionais é outra conseqüência direta destes investimentos. A perda do acesso à terra e a poluição dos cursos d’água são os principais impactos para as populações locais na região de Barcarena (PA), onde encontramse instaladas a Alunorte e Albras.

Os povos indígenas vêm sendo igualmente afetados, como no caso do povo Kaiowá Guarani, no Mato Grosso do Sul, que perdem o controle do seu território para a expansão da cana, conforme noticiou o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Em relação às hidrelétricas, o caso de Barra Grande (SC/RS), com participações da Alcoa e Votorantim, é emblemático dos impactos gerados por financiamentos do banco no setor. Além do impacto ambiental, cerca de 2.500 famílias, entre pequenos e médios agricultores, além de trabalhadores rurais sem-terra, foram atingidos, segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

O caso da Vale merece amplo destaque, pois seus impactos são de grande amplitude. Desde o problema de trabalho escravo e da poluição nas carvoarias, do “Deserto Verde” das extensas áreas de plantação de pinus e eucalipto, passando pelo desmatamento na região de Eldorado dos Carajás e chegando ao descumprimento de normas ambientais e trabalhistas pelas siderúrgicas na região de Marabá (PA), como revela a rede Justiça nos Trilhos. Acrescente-se que, em meio à crise, a Vale foi responsável por uma série de demissões, assim como a Embraer, e ambas as empresas seguiram recebendo financiamento do BNDES.

A responsabilidade do BNDES nessas situações está configurada não apenas porque diante das situações de violação de direitos sociais, ambientais, econômicos e culturais o banco segue financiando a atividade, mas, ainda e para além disso, porque como sócio do empreendimento não atua para mudar a conduta da empresa. A responsabilidade ou a falta de responsabilidade do banco incide também no próprio processo de análise e aprovação dos projetos encaminhados pelas empresas para obtenção do financiamento. A política ambiental do BNDES, descrita em seu site, é a nosso ver amplamente insatisfatória e sem efetividade. Concretamente, o banco hoje apenas avalia a regularidade ambiental do projeto, ou seja, a observância dos licenciamentos ambientais. Não há uma atitude pró-ativa, em que pese o recém-assinado protocolo de intenções socioambientais com o ministério do Meio Ambiente.
O banco, na realidade, deveria ter um papel indutor de boas práticas sociais e ambientais pelas empresas, por meio do estabelecimento de critérios e salvaguardas para a aprovação de projetos. Contudo, o BNDES encontra-se hoje em uma posição formalista e legalista, mesmo consciente da fragilidade institucional dos processos de licenciamento.
Ao mesmo tempo, apresenta uma dificuldade injustificada e anacrônica em dar publicidade às informações sobre os projetos que financia. Comparada novamente com instituições como o IFC, que não chegam a ser exemplos de democracia, o BNDES está muitíssimo aquém de deter uma política consistente de divulgação de informações, sequer atendendo efetivamente ao princípio constitucional de publicidade de seus atos. Embora não se justifique, a não divulgação de informações é funcional, pois assim o banco se dispensa de prestar contas do favorecimento seletivo e privilegiado a determinados grupos econômicos.
Sem dúvida, esta postura do banco na área de divulgação de informação e ambiental — associada ao volume estupendo de recursos despejados nos setores depredadores do meio ambiente — reforça as atuais políticas de flexibilização da política ambiental. Como no caso da Medida Provisória 458 (A “MP da Grilagem”), que também reduz a área destinada à reserva legal na região amazônica.
Outras legislações estão para ser votadas como as que transferem todos os licenciamentos para âmbitos municipais e estaduais, fragilizando ainda mais o enquadramentos dos licenciamentos. Ou ainda as que permitem exploração mineradora em Terras Indígenas (como a que provocou os confrontos recentes no Peru), com dezenas de indígenas mortos. Como se vê, o neoliberalismo está presente em nossas arcaicas — porém liberais quando interessa —, oligarquias rurais.

3. O BNDES dá continuidade à herança neoliberal, da qual o Banco não foi apenas executor, mas também responsável pela formulação

O atual padrão de “inserção competitiva” do Brasil no mundo globalizado advém dos financiamentos e da omissão diante dos problemas obra dos anos de neoliberalismo. Enganam-se aqueles para quem o neoliberalismo está morto. Mais do que neutralizar, interessa aos liberais domesticar o Estado em benefício dos grandes grupos privados. Exemplos do papel ativo do BNDES nesse sentido foram o Programa Nacional de Desestatização, concebido no interior do banco, e a própria formulação da estratégia de “inserção competitiva” no mercado mundial. Mais recentemente, duas situações confirmam e desdobram este papel formulador e ordenador do BNDES no sentido de um desenvolvimento a serviço dos grandes grupos privados.

Em finais dos anos 90, o Banco foi responsável pela formatação dos Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento (ENID), que já apontavam para a necessidade de construção de infraestrutura regional e que, no ano 2000, redundariam na Iniciativa de Integração da Infra-Estrutura Regional Sul Americana (IIRSA). A perspectiva da integração regional adotada a partir de então segue a perspectiva do “regionalismo aberto” preconizada pelo Banco Mundial, voltada para a liberalização do comércio e de investimentos, aprofundando o modelo de inserção competitiva.

São grandes projetos viários, energéticos e de comunicações associados a medidas de “convergência regulatória”, que em verdade favorecem a desregulação, viabilizando a consolidação dos oligopólios privados na região. Os eixos e projetos da IIRSA são voltados para competitividade externa da região e não para gerar interdependência entre os países sul-americanos. Dos 31 projetos prioritários até 2010, oito projetos encontram-se em execução e todos envolvem o Brasil como contraparte, deixando claro também o papel de liderança do país na implementação desta infraestrutura regional de exportação.

Os financiamentos do BNDES na região já superam os do BID, e vão ao sentido de viabilizar, de um lado, a estruturação de corredores de ex-portação e, de outro, a expansão da base territorial do país para a exploração de recursos naturais. Para tal projeto, conta-se com investimentos de empresas brasileiras, que atuam nos países vizinhos, muitas vezes em parceria com empresas locais, como exploradoras de recursos naturais e humanos. Esta tendência à multinacionalização de empresas brasileiras, que se estende neste momento para a África lusófona, encontra exemplos a Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Côrrea, Vale do Rio Doce, Petrobras, Eletrobrás, entre outras. Estas empresas reproduzem fora, muitas vezes de forma mais dramática, impactos sociais e ambientais que já produzem no interior do país.

Em outro exemplo do papel ativo do BNDES a serviço dos grandes grupos privados, o banco liderou a organização da empresa Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP), que possui como sócios o Banco do Brasil, Banco Espírito Santo, Bradesco, Citibank, Itaú, Santander, Unibanco e Banco Votorantim. O papel da EBP é o de realizar estudos técnicos e elaborar projetos para auxiliar empresas a obterem financiamentos, no âmbito das Parcerias Público-Privadas (PPPs), no valor de até R$ 2 bilhões. O objetivo é o de contribuir na formatação de projetos que sigam especialmente o modelo project finance, onde os ganhos futuros (recebíveis) esperados com o projeto se tornam a principal garantia a ser fornecida pelo tomador de crédito. A EBP busca facilitar e agilizar ainda mais o acesso por grandes grupos econômicos aos recursos, na maioria dos casos, do próprio BNDES.

O banco se compromete, assim, com o desempenho futuro da empresa ao financiar projetos que seguem o modelo em questão. É o caso, por exemplo, do mega-financiamento para os consórcios responsáveis pela construção das usinas de Santo Antônio e Jirau no rio Madeira (foto de abertura da matéria), uma das obras da IIRSA. O Banco financiará mais de 60% do investimento, com um crédito já aprovado que ultrapassa a casa dos R$ 13 bilhões. O financiamento para os consórcios segue o modelo do project finance, comprometendo o BNDES com o cronograma de investimentos da empresa. E a despeito dos sérios e evidentes riscos ambientais, jurídicos e financeiros dos empreendimentos.

4. O BNDES é responsável pela especialização da estrutura produtiva do país e pela ausência de investimentos sustentáveis do ponto de vista ambiental e geradores de ocupações de qualidade

No nosso entender, cabe ao banco desempenhar um papel pró-ativo no sentido de financiar investimentos voltados à diversificação de estrutura produtiva do país, fortalecendo o mercado interno. Não se justifica um banco público de desenvolvimento atuar privilegiadamente sob demanda dos setores exportadores. Reorientar, por exemplo, o atual padrão de desembolsos, em que as grandes empresas recebera, no ano passado, 76% do total dos desembolsos do BNDES e as micro e pequenas empresas receberam apenas 10%. Vale dizer, que mesmo este baixo percentual está inflado, já que o Banco considera micro e pequenas empresas aquelas que faturam até R$ 1,2 milhão e R$ 10,5 milhões, respectivamente. Na Lei Geral de Micro e Pequenas Empresas, os valores são até R$ 240 mil
e até R$ 2,4 milhões, respectivamente.
Com o volume de recursos e com a taxa favorecida de juros com que opera, o BNDES poderia contribuir com uma profunda e positiva transformação do atual quadro do desenvolvimento brasileiro.