terça-feira, 22 de junho de 2010

O Brasil e a bolsa de valores: uma aposta no crescimento chinês



Autor(es): Rodrigo Constantino
Valor Econômico - 22/06/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/6/22/o-brasil-e-a-bolsa-de-valores-uma-aposta-no-crescimento-chines
O crescimento econômico brasileiro ainda é muito dependente do crescimento econômico chinês, por conta do preço das principais commodities que o país exporta. As empresas brasileiras exportam quase cinco vezes mais hoje do que faziam no começo do governo Lula, e boa parte do aumento se deve aos produtos básicos. Se isso é verdade para a economia como um todo, é ainda mais verdadeiro para o desempenho da bolsa no Brasil. O Ibovespa ainda é muito concentrado em empresas diretamente ligadas ao preço das commodities.
Quase metade do principal índice de ações do país é formada por empresas que dependem das commodities, que são cada vez mais impactadas pela demanda chinesa. A Petrobras e a Vale, sozinhas, representam algo como 25% do Ibovespa. E a China já representa quase a totalidade do crescimento na demanda mundial de petróleo e minério de ferro. Quando comparado ao índice de outros países, o Ibovespa se destaca por essa excessiva concentração em commodities.
O Dow Jones americano, por exemplo, tem menos de 15% em empresas atreladas diretamente ao preço de produtos básicos, patamar semelhante ao do CAC na França. O FTSE inglês já é mais exposto às oscilações das commodities, com quase 30% em empresas que dependem desses produtos. Já o Nikkei no Japão, o Kospi na Coreia do Sul e a bolsa de Taiwan possuem menos de 10% em empresas expostas às flutuações das commodities. São países com elevada participação de empresas de tecnologia.

Mesmo a bolsa chinesa tem baixa exposição a empresas de commodities, cerca de 20% do total. A demanda chinesa é cada vez mais relevante para determinar o preço desses produtos, mas a bolsa de ações na China possui participação maior em setores como o financeiro, por exemplo. É o crescimento chinês que dita o preço das principais commodities, mas é o Ibovespa que acaba dependendo mais de sua flutuação.
Comparando o desempenho do Ibovespa em dólar com o CRB, principal índice de commodities da bolsa de Chicago, verifica-se elevada correlação ao longo do tempo. A correlação semanal desde 2009, por exemplo, está acima de 0,95. A Austrália é outro país que acaba surfando bem esta onda chinesa, apresentando enorme correlação com o Ibovespa.
Com as principais economias desenvolvidas sem crescimento e com taxas de juros próximas de zero, os investidores buscam alternativas para alocação de capital, tentando aproveitar o crescimento ainda acelerado na China. Mas o melhor instrumento para isso nem sempre será o próprio mercado de ações chinês. Por isso o Brasil acaba se destacando como um excelente "China play", uma forma de os investidores internacionais apostarem no crescimento chinês indiretamente.
O problema disso é que o Brasil se tornou mais vulnerável a choques externos, principalmente da economia chinesa. Ninguém sabe ao certo para quanto vai o crescimento chinês. O que parece mais razoável prever é que a atual taxa não é sustentável. Existem claros sinais de espuma no setor imobiliário chinês, e até o mercado de trabalho começa a apresentar alguns problemas, pressionando os salários para cima. A inflação tem sido uma ameaça constante na China. Se o governo não for capaz de contê-la com medidas administrativas apenas, a economia poderá sofrer um baque. Não dá para descartar a hipótese de queda mais acentuada no crescimento chinês. E se isso acontecer, tanto a economia brasileira como o Ibovespa serão duramente afetados.
O ideal seria o governo brasileiro fazer as reformas estruturais para criar um dinamismo interno mais independente em nossa economia. Com a reforma previdenciária desarmando parcialmente a bomba-relógio do rombo na previdência, a reforma tributária reduzindo e simplificando os impostos, a reforma trabalhista flexibilizando o mercado de trabalho e a reforma política descentralizando o poder e oferecendo maior racionalidade à política nacional, a economia poderia decolar de forma sustentável.
Infelizmente, nenhum dos grandes partidos abraçou esta bandeira de reformas e, para agravar a situação, o governo Lula tem se mostrado muito irresponsável do ponto de vista fiscal no fim do segundo mandato. Nossa economia acaba extremamente dependente do fator China e do crédito estatal, que não pode continuar neste ritmo sem gerar mais inflação. Os gargalos internos ameaçam nossa recuperação econômica, e o Brasil acaba sendo somente uma aposta no crescimento chinês que, por sua vez, apresenta alguns sinais de esgotamento. Não é um quadro muito animador para investidores de longo prazo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário