Quando a receita lá fora já supera os ganhos no Brasil
Desde o início da crise, em agosto de 2007, companhias nacionais investiram US$ 99 bilhões na compra de empresas no exterior
Gurus
da autoajuda empresarial gostam de citar o ex-presidente americano John
Kennedy em momentos difíceis. Em 1959, ele fez uma declaração que,
apesar de equivocada, popularizou uma máxima sobre "crises". Em chinês,
disse o presidente, essa palavra é formada por dois caracteres - um
representa "perigo" e o outro "oportunidade".
Na
prática, essa não é uma afirmação que vale para todos os casos em
tempos de recessão. Mas, para as multinacionais brasileiras, até que é
bem apropriada. Apesar das dificuldades, elas conseguiram se tornar mais
globais, aproveitando o momento em que os empresários estrangeiros
estavam com a corda no pescoço por causa da crise para acelerar as
aquisições.
De
2007 até junho deste ano, as multinacionais verde-amarelas investiram
US$ 99 bilhões na compra (total ou parcial) de empresas no exterior.
Esse valor é quase o dobro do que foi investido nas duas décadas que
antecederam a crise. "Não podemos dizer que foi um período fácil para as
empresas brasileiras. Não foi", diz Sherban Leonardo Cretoiu,
coordenador do Núcleo de Negócios Internacionais da Fundação Dom Cabral.
"Mas, apesar das incertezas do mercado externo, as companhias
conseguiram manter a expansão iniciada em 2005 e se tornaram mais
internacionalizadas."
Um
exemplo emblemático do que foram esses cinco anos para as múltis
brasileiras é o da fabricante de equipamentos Romi, sediada em Santa
Bárbara D"Oeste, a 140 km de São Paulo. Em agosto de 2007, ela já se
preparava para fazer sua primeira aquisição no exterior quando veio o
primeiro soluço da crise: o banco francês BNP Paribas congelou os
resgates em três fundos de investimento baseados em títulos hipotecários
- era o "subprime". "Nossa bola de cristal da época não mostrava que o
mundo ia afundar", diz o presidente da Romi, Livaldo Aguiar.
Mesmo
assim, em maio de 2008, a companhia comprou a fabricante italiana de
equipamentos Sandretto, por 5,5 milhões. "A Romi estava com ótimos
resultados e a aquisição seria a porta de entrada para a Europa a um
preço atraente", conta Aguiar. Mas a crise derrubou o volume de pedidos e
o alto custo trabalhista fez com que a primeira fábrica da Romi no
exterior desse prejuízo (as perdas ainda não foram calculadas). Apesar
do revés, Aguiar não desistiu do plano de expansão internacional, que
visava reduzir a dependência da empresa do mercado brasileiro, onde está
75% da receita atual.
No
fim de 2011, a Romi comprou também a alemã Burkhardt + Weber e já tem
pedidos firmes para usar toda a capacidade da fábrica por um ano e meio.
"Queríamos ter acesso a uma tecnologia mais avançada, e não apenas a um
mercado", afirma Aguiar. Hoje, a Romi já faz planos de equipar a
fábrica do Brasil com as máquinas feitas pela subsidiária da Alemanha.
Desempenho.
A Romi não foi a única a ter perdas no exterior. Levantamento recente
da USP e da FGV com 95 multinacionais mostra que 80% delas não atingiram
suas metas de faturamento e margem de lucro nos últimos anos. "É
natural que empresas que estão no início do processo de
internacionalização tenham um desempenho baixo", diz Maria Tereza Leme
Fleury, uma das autoras da pesquisa. "Mas a crise também influenciou."
O
momento de maior retração da expansão internacional foi 2009, quando
mercados de todo o mundo entraram em compasso de espera até saber quanto
faltava para chegar ao fundo do poço. No ano seguinte, os investimentos
foram retomados. Agora, com mais turbulências na Europa, as
multinacionais brasileiras fizeram nova parada técnica.
A
compra de participações de empresas no exterior, que no primeiro
semestre de 2010 movimentou US$ 14 bilhões, caiu para US$ 8,3 bilhões em
2012. "O medo do desconhecido fez com que elas colocassem novamente o
pé no freio", diz Luis Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira
de Estudos de Empresas Transnacionais (Sobeet).
Além
disso, com o mercado ruim lá fora, as múltis estrangeiras têm apostado
ainda mais fichas no Brasil. "É hora, portanto, de as brasileiras
reservarem uma atenção maior para o mercado nacional", afirma Luis
Motta, sócio-líder de fusões e aquisições da KPMG.
A
Petrobrás, que iniciou sua expansão fora do País nos anos 70 junto com
gigantes como Odebrecht e Embraer, anunciou no ano passado que venderá
ativos no exterior, como blocos de exploração e refinarias, para
priorizar o pré-sal. "Essa, no entanto, é uma situação momentânea para
boa parte das empresas brasileiras, porque a internacionalização é um
caminho inevitável", diz Lima, da Sobeet.
A
última pesquisa da Fundação Dom Cabral sobre multinacionais brasileiras
mostra que, embora 28% delas não queiram iniciar uma nova operação
internacional no curto prazo, 60% planejam expandir atividades nos
mercados em que já atuam.
Alguns
fatores explicam por que é tão importante para as grandes companhias
nacionais explorar o mercado externo. Primeiro: as empresas que querem
crescer em seus segmentos precisam buscar novos mercados. "O Brasil é
grande, mas o mundo é maior", diz Alberto Mondelli, presidente da
consultoria Mercer.
Para
quem já é líder no mercado nacional, aumentar 1% ou 2% de participação
custa mais do que começar do zero em outro país. Foi o que a fabricante
de tubos e conexões Tigre, detentora de 50% do mercado no Brasil, pensou
ao ir para os EUA em 2007. "Só agora tivemos um pequeno lucro, mas não
vamos arredar o pé de lá, porque é o mercado onde podemos crescer", diz
Evaldo Dreher, presidente da companhia catarinense.
Para
sobreviver à competição global, as multinacionais brasileiras não podem
ignorar que suas principais concorrentes também são internacionais. É
preciso olhar o mundo inteiro, para saber explorar as vantagens de cada
país - como está fazendo a fabricante de motores elétricos WEG. Neste
ano, a companhia passou a comprar componentes de fornecedores indianos
para abastecer suas outras fábricas, incluindo a brasileira. Em 2011,
também fez uma aquisição nos Estados Unidos para ter acesso a
tecnologias para o setor de óleo e gás, com o objetivo de atender
clientes como a Petrobrás e empresas do Oriente Médio.
Motivações.
Ao mesmo tempo em que se tornam mais competitivas, as múltis conseguem
reduzir os danos de uma possível recessão interna diversificando suas
operações mundo a fora. Num período de crise como o dos últimos cinco
anos, fica mais fácil fazer aquisições, já que o preço dos ativos no
exterior despenca. Para quem precisa de escala para sobreviver é um bom
impulso ao crescimento.
O
caso do JBS, maior produtor de carne do mundo, é o que mais se destaca.
Com nove aquisições em sequência a partir de 2007, a empresa viu o peso
do mercado externo em seu faturamento saltar de 10% para 75% hoje.
Na
mesma linha do JBS e com a mesma motivação de ganhar escala, a
Stefanini, que atua na área de tecnologia de informação, chegou ao fim
desses cinco anos com 71 escritórios em 29 países, responsáveis
atualmente por 40% da receita do grupo. "Aproveitamos para assumir
contratos de concorrentes com problemas financeiros", conta o presidente
da empresa, Marco Stefanini.
A
estimativa da Sobeet é de que 900 empresas brasileiras estejam atuando
no exterior - três vezes mais que há dez anos. A crise nos países
desenvolvidos não é lá uma novidade para elas, já que por anos viveram
num Brasil desfavorável aos negócios. A experiência aqui dentro ensinou
que estar em vários mercados é uma proteção natural. "A capacidade de
resistência é um ativo que a crise nos dá", diz Stefanini. "O empresário
sangra, mas vira o jogo."
Ganhos na Índia compensam perdas na Rússia
O Estado de S. Paulo - 27/08/2012 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/8/27/ganhos-na-india-compensam-perdas-na-russia |
|
A
crise financeira testou a capacidade da gaúcha Marcopolo de trocar
rapidamente mercados enroscados por outros promissores. De 2007 para cá,
a fabricante de ônibus fechou suas operações na Rússia e em Portugal,
mas fez uma aquisição na Austrália e abriu uma unidade de produção de
componentes na China. Ao mesmo tempo, reforçou suas atividades em
mercados como a Índia e a África do Sul, onde as vendas não foram
abaladas pela turbulência que afetou economias mais desenvolvidas.
"Conseguimos
manter resultados positivos lá fora porque tivemos agilidade para
mudar", diz Carlos Vignani, diretor de relações com investidores da
Marcopolo. Nem em 2009, ano mais difícil da crise, a empresa registrou
prejuízo em suas operações. A fabricante de ônibus começou a se
internacionalizar na década de 90, pela América Latina. Começou se
instalando na Argentina, mas a experiência não foi das melhores. Três
anos depois de abrir a fábrica, teve de fechar as portas por causa da
crise. Em 2006, a empresa voltou para o país vizinho e fez aquisições na
Rússia - duas operações que viriam a dar problemas. "No mercado russo, a
produção total caiu de 30 mil ônibus para zero durante a crise", lembra
Vignani. A opção foi sair e manter apenas um escritório comercial no
país até que a situação melhore. Na Argentina, por conta da nova crise
política, a produção da Marcopolo registrou queda de 50% entre o ano
passado e este.
Em
2008, a fabricante gaúcha também decidiu investir numa joint venture no
Egito. O negócio ainda não deu lucro, porque a demora para se
estabelecer no país fez com que eles perdessem espaço para concorrentes
da Turquia e do próprio Egito. "Mas o Oriente Médio é um local
estratégico, porque a demanda por ônibus é muito alta."
A
escolha pela internacionalização, segundo Vignani, foi motivada por
dois fatores: o fato de a empresa já ser responsável por 46% da vendas
de ônibus no Brasil e para se proteger de futuras crises internas. Com
30% do faturamento de R$ 3,3 bilhões no mercado externo, a Marcopolo
aposta nos megaeventos esportivos para crescer internamente e na
aquisição de pelo menos mais uma fábrica no exterior.
Apesar dos riscos políticos, AL é alvo de expansão
O Estado de S. Paulo - 27/08/2012 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/8/27/apesar-dos-riscos-politicos-al-e-alvo-de-expansao |
|
Os
países vizinhos são a fronteira de expansão do Itaú como banco de
varejo. Nos demais mercados, a estratégia é ter escritórios para atender
empresas e investidores. A fórmula do banco para ganhar mercado na
América Latina é a mesma adotada no Brasil: fusões e aquisições. A
instituição se tornou líder entre os bancos privados brasileiros em
2008, quando adquiriu o Unibanco.
A
primeira aquisição no exterior foi em 1998, quando o Itaú comprou o
argentino Banco Del Buen Ayre. Mas o maior avanço internacional é
resultado de um negócio fechado no Brasil. A aquisição da subsidiária
brasileira do Bank Boston, em 2006, incluiu os ativos do banco no Chile e
no Uruguai. A unidade paraguaia veio com o Unibanco.
Para
ganhar espaço nesses mercados, o Itaú dá atenção especial às
características locais de cada região. No Chile, por exemplo, o banco
teve de, inicialmente, abandonar o laranja das fachadas, já que para os
chilenos essa cor tem uma conotação popular, incoerente com seu foco no
público de alta renda. Só depois de seis anos no país, o Itaú começou a
adotar sua cor na fachada das agências. "A América Latina não é um bloco
homogêneo. Precisamos entender cada país e atuar regionalmente", disse o
vice-presidente do Itaú na América Latina, Ricardo Marino.
O
braço latino-americano do Itaú ainda é pouco relevante - 95% dos ativos
do banco estão no Brasil. Mas a expansão é expressiva: em junho, o
banco somou R$ 35 bilhões de ativos na região, uma alta de 64% em um
ano.
Para
ganhar mais espaço entre os vizinhos, o Itaú esbarra na falta de ativos
interessantes à venda. "É difícil começar do zero no varejo. É mais
fácil começar com uma rede de clientes e agências estabelecida", explica
Marino.
O
crescimento expressivo dos países latinos e a proximidade geográfica
atrai as empresas brasileiras, mas o risco político pode atrapalhar os
negócios. Em junho, logo após o impeachment do ex-presidente Fernando
Lugo, Marino viajou ao Paraguai para encontrar autoridades do novo
governo. Apesar dos riscos, o Itaú manterá sua estratégia no Paraguai.
"Esses países são o Brasil lá atrás. Sempre tivemos de administrar
riscos, mas nunca fugimos do País."
Na crise, nasce o maior produtor de carne do mundo
O Estado de S. Paulo - 27/08/2012 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/8/27/na-crise-nasce-o-maior-produtor-de-carne-do-mundo |
|
Quando
o JBS pôs os pés nos Estados Unidos em 2007, Wesley Batista,
responsável por comandar a operação no território americano, tinha medo
de atender o telefone porque não sabia falar uma palavra de inglês.
Naquela época, já com duas unidades na Argentina, adquiridas dois anos
antes, o JBS não era sequer mencionado na lista das empresas brasileiras
mais internacionalizadas, que é divulgada anualmente pela Fundação Dom
Cabral. Hoje, ele é líder absoluto do ranking: 73% de seu faturamento de
US$ 61 bilhões vêm de suas operações no exterior. E Wesley já se vira
com o inglês.
Entre
o início da crise financeira internacional e 2010, a empresa investiu
US$ 5,6 bilhões em nove aquisições na Argentina, nos EUA e na Austrália.
"O JBS multinacional não existe fora do período da crise", diz Jerry
O"Callaghan, diretor de relações com investidores da companhia, que
conquistou nos últimos anos o título de maior produtor de carne do
mundo. "Foi em função da crise que conseguimos comprar, por um preço
melhor, a segunda maior produtora de frango do mundo, a Pilgrim"s
Pride." Em função da crise e de um sócio poderoso (e polêmico): o
BNDESPar, braço de participações do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social), financiou as aquisições do grupo no
Brasil e no exterior.
A
estratégia de internacionalização do JBS foi pensada de modo que as
bases de produção ficassem em locais mais eficientes, diz O"Callaghan.
"O problema é que, depois de tantas compras, a própria empresa começou a
dar sinais de ineficiência", diz um analista do setor. No ano passado, o
JBS teve um prejuízo de US$ 75 milhões e no ano anterior, de US$ 292
milhões. A empresa teve problemas na Argentina, onde fechou operações
por conta dos reflexos da crise política, e na Itália, onde se
desentendeu com o sócio. Enquanto termina de arrumar a casa, o JBS já
faz novos planos de expansão: quer elevar a receita em 15% este ano - e
isso pode incluir mais aquisições, dentro e fora do País.
Rumo a mercados emergentes, onde o custo é menor
O Estado de S. Paulo - 27/08/2012 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/8/27/rumo-a-mercados-emergentes-onde-o-custo-e-menor |
|
A
percepção de que o câmbio sofreria uma mudança brusca com a melhora da
economia brasileira levou a fabricante de refrigeradores comerciais
Metalfrio a transferir parte de sua produção para o exterior em 2006.
Antes, a empresa atendia clientes globais no mercado externo através de
exportações. A fábrica brasileira vendia 30% da sua produção para o
exterior até 2005, índice que hoje é de apenas 5%. "O Brasil deixou de
ser uma plataforma competitiva para exportações", diz o presidente da
Metalfrio, Luiz Eduardo Caio.
A
estratégia da companhia é produzir em países emergentes. Atualmente,
tem fábricas na Rússia, no México e na Turquia. "O frete para
refrigeradores é caro. Temos de produzir em países que oferecem
condições competitivas e ao mesmo tempo dão acesso a mercados populosos e
em expansão", explica Caio. Apesar do foco nos emergentes, a Metalfrio
já produziu em mercados maduros. Em junho de 2006, comprou a
dinamarquesa Caravell/Derby, por valor não revelado. "Queríamos acelerar
o crescimento na Europa", disse Caio.
A
empresa percebeu que produzir na Dinamarca era caro e anunciou em
agosto de 2007 uma provisão de R$ 11,4 milhões para o fechamento da
fábrica. Os ativos foram transferidos para as unidades da Rússia e da
Turquia. "Passamos a atender a Europa a partir de bases mais eficientes
de produção", explicou Caio.
Neste
ano, a empresa prepara outra adaptação para enfrentar a crise
econômica. As vendas da Metalfrio no mercado europeu, que respondem por
um terço do total, caíram 28% no segundo trimestre deste ano, na
comparação com o mesmo período do ano passado. A Metalfrio quer usar a
fábrica na Turquia, que concentra os pedidos da Europa Ocidental, para
atender clientes do Oriente Médio e do Leste Europeu. "É preciso ser
flexível."
A
regra também vale para a operação no Brasil. A Metalfrio fechou sua
fábrica de São Paulo em 2010 e transferiu a produção para Três Lagoas
(MS), onde ganhou incentivos fiscais.
|
|
|
|
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário