segunda-feira, 20 de junho de 2011

China. As misérias do crescimento

Pequim reconhece que a chuva ácida afeta mais da metade das cidades chinesas e a contaminação a sexta parte dos grandes rios do país.

A reportagem é de José Reinoso e está publicada no jornal espanhol El País, 16-06-2011. A tradução é do Cepat.

A China experimentou em 2007 mais de 80.000 “incidentes de massas”, 20.000 mais que no ano anterior. Incidentes de massas é o eufemismo que o Governo utiliza para designar protestos, greves, manifestações e outras mobilizações por motivos que vão desde as expropriações ilegais de solo até reclamações de salários não pagos e denúncias de corrupção ou abusos de poder. A partir de então, não foram publicados novos dados sobre o que os analistas consideram o crescente número de protestos que levaram emparelhado o rápido e desigual crescimento econômico do país.
Muitas destas mobilizações têm sua origem em escândalos de contaminação ambiental, em particular aquela causada por metais pesados e o vazamento das fábricas. É a ponta do iceberg do preço que o país asiático pagou desde que Deng Xiaoping iniciou o processo de abertura e reforma há três décadas, com uma máxima a tira-colo: “Enriquecer é glorioso”.
O Governo deu números a este preço ambiental na semana passada: mais da metade das cidades chinesas são afetadas pela chuva ácida e uma sexta parte dos principais rios está tão poluída que sua água não é apropriada nem para o cultivo. “A situação ambiental em seu conjunto é ainda muito grave e se enfrenta muitas dificuldades e desafios”, assegurou Li Ganjievice-ministro de Meio Ambiente, informa a agência de notícias Reuters.
A degradação que acompanhou o desenvolvimento chinês é um dos fracassos de um modelo considerado exitoso porque permitiu tirar da pobreza centenas de milhões de pessoas e situou a China como a segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.
As águas de cidades como Xangai, Guangzhou (Cantão) e Tianjin estão classificadas como gravemente contaminadas, e apenas algumas zonas ao redor da ilha turística de Hainan, no sul, e parte da costa do norte estão totalmente limpos. Apenas 3,6% das 471 cidades controladas registram ar do nível máximo de pureza, afirmou Li, que acrescentou que a China continua perdendo biodiversidade. O político insistiu em que a contaminação, em especial aquela devida a metais pesados, é “um assunto grave” porque, segundo disse, “não afeta apenas seriamente a saúde da população, mas também a estabilidade social”.
No mês passado, na Mongólia Interior foram registrados os maiores protestos vividos nesta região autônoma nas duas últimas décadas, devido ao descontentamento existente entre a etnia mongol pelo prejuízo ambiental causado às suas tradicionais pastagens pela exploração mineral. A faísca que provocou as revoltas foi a morte de um pastor atropelado por um caminhão de transporte de carvão, dirigido por um han, a etnia majoritária na China, enquanto aquele impedia a passagem do veículo. O motorista foi condenado à morte.
Muitos dos cerca de seis milhões de mongóis chineses se queixam de que o fluxo de han na região – onde estes são maioria –, atraídos pelos recursos minerais e energéticos, deslocou os pastores, prejudicou o solo, provocou a morte de gado e ameaça o seu modo de vida e sua cultura.

A contaminação por chumbo provoca protestos na China
 http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=44420

As intoxicações por metais pesados produzidos pelas fábricas alimentam as revoltas em uma sociedade cada vez mais crítica com a gestão do Governo.
A reportagem é de José Reinoso e está publicada no jornal espanhol El País, 16-06-2011. A tradução é do Cepat.

Os escândalos devidos ao envenenamento por chumbo se multiplicam na China, apesar do compromisso público do Governo para acabar com eles, e se converteram em um novo foco de instabilidade social no país asiático, onde os Governos locais com frequência ocultam as intoxicações.
Mais de 600 pessoas acusaram níveis altos, e em muitos casos perigosos, do metal pesado no sangue da população de Yangxunqiao (província costeira de Zhejiang), segundo informou esta semana a imprensa chinesa. As vítimas são trabalhadores de fábricas que produzem papel de estanho e alguns de seus filhos; 26 adultos e 103 crianças ficaram gravemente envenenados.
Trata-se do último caso de um problema que afeta muitas populações na China, onde vivem com frequência a poucos metros de indústrias com condições de segurança de trabalho mínimas e oficinas que competem entre si para produzir pelo custo mais baixo.
O escândalo se soma aos registrados nos últimos meses nesta e em outras províncias da China, onde o rápido crescimento da economia, a corrida atrás do lucro rápido, a lassidão dos controles e a corrupção causaram sérios problemas ambientais que, frequentemente, desembocam em explosões de violência por parte dos afetados.
Milhões de crianças se intoxicaram com chumbo em todo o país, segundo assegura a organização de direitos humanos Human Rights Watch (HRW), com sede em Nova York, em um informe publicado na quarta-feira e no qual afirma também que os funcionários locais minimizam sistematicamente os perigos do chumbo e negam o direito dos possíveis afetados fazerem análises médicas, para ocultar o problema.
O Governo está fazendo uma campanha contra a contaminação por metais pesados. Centenas de fábricas de baterias de chumbo e ácido foram fechadas em Zheijiang, depois que a imprensa oficial publicou casos de intoxicação. O Ministério do Meio Ambiente pediu ações urgentes, já que os envenenamentos criaram grande ressentimento entre a população.
Pequim vê com grande preocupação qualquer foco de protestos, especialmente desde que no começo do ano explodiu no norte da África uma onda de revoluções populares, que se estendeu depois ao Oriente Médio, demandando justiça social e democracia. Mas muitas vezes é incapaz de cumprir seus compromissos públicos com investimentos ou o desejo político necessários para fazer com que sejam cumpridos, já que os funcionários locais dão prioridade ao crescimento econômico e aos lucros antes que à proteção ambiental.
Nas cerca de 500 entrevistas realizadas com pais e parentes em províncias como Hunan, Henan, Yunnan, e Shaanxi, a HRW constatou que as autoridades tentavam silenciar continuamente aqueles que queriam falar ou pedir ajuda. Muitas famílias afetadas asseguraram que eram impedidas de fazerem exames para detectar os níveis de chumbo no sangue, negavam o acesso aos resultados dos exames ou lhes entregavam dados aparentemente maquiados. “Quero saber como meu filho ficou doente, mas não posso confiar nos resultados do exame”, conta uma mulher de Hunan no informe. “Pais, jornalistas e ativistas que se atrevem a falar sobre o chumbo são presos, perseguidos, e, em última instância, silenciados”, escreve Joe Amon, diretor de saúde e direitos humanos na organização não governamental. Alguns pais afirmam que depois que seus filhos apresentaram níveis perigosos de chumbo no sangue, os médicos só lhes disseram que lhes dessem leite e outros alimentos, como maças ou alho.
O clima de segredo das autoridades recorda o escândalo do contágio de AIDS pela venda de sangue contaminado no final da década de 1990, que afetou dezenas – ou centenas, segundo as fontes – de milhares de pessoas, e a epidemia de SARS [Síndrome Respiratória Aguda Grave], em 2003.
A China é o maior produtor e consumidor mundial de chumbo refinado. Embora a proibição da gasolina com este metal no final dos anos 1990 tenha ajudado a reduzir uma das maiores fontes de envenenamento, o progresso do país e o auge na produção de carros, bicicletas elétricas e aparelhos eletrônicos disparou a demanda de baterias. Cerca de 75% da produção mundial de chumbo é destinada a baterias.
A contaminação por chumbo – que frequentemente se dá pouco a pouco, devido a uma exposição continuada a pequenas quantidades – pode causar graves lesões ao corpo, inclusive ao cérebro, rins e aos sistemas muscular, nervoso e reprodutivo. As crianças são muito sensíveis ao metal porque absorvem até a metade da quantidade a que estão expostas, e podem apresentar problemas de crescimento e de desenvolvimento do cérebro, por vezes irreversíveis. Uma circunstância muito delicada na China, onde a saúde é paga e impera a política do filho único.
Em maio passado, as autoridades de Zhejiang prenderam 74 pessoas e suspenderam a atividade de centenas de fábricas depois que 172 pessoas – entre elas, 53 crianças – adoeceram devido ao chumbo. Em outubro de 2009, manifestantes irritados quebraram caminhões e cercas de uma fundição depois que se tornou público que exames de detecção do metal em mais de 600 crianças haviam dado positivo.

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