terça-feira, 21 de junho de 2011

Europa se distancia de paz social e econômica

Autor(es): Assis Moreira | De Genebra
Valor Econômico - 20/06/2011
 

Cenários: Socorros não garantirão emprego ou estabilidade na região

A reação popular aos planos de austeridade fiscal e econômica vai conturbar cada vez mais a Europa. As turbulências políticas se propagam por vários países e aumentam as dúvidas sobre a implementação de reformas. Existe uma fadiga com sucessivos planos de ajuste e a popularidade de governos está em queda livre. Pela Europa, cresce a cólera contra o que os sindicatos chamam de tratamento privilegiado para o setor financeiro, socorrido pelo dinheiro público - enquanto que para os assalariados sobraria a parte dolorosa do ajuste.
Um recente levantamento realizado pela Confederação Europeia de Sindicatos (CES), em Bruxelas, aponta os funcionários públicos como os primeiros e mais duramente atingidos por medidas que terminam por ampliar as dificuldades, ao invés de estimular a expansão econômica. Vários países europeus reduziram os salários dos funcionários, indo de 2,5% na Alemanha a 5% na Espanha, 10% em Portugal (para quem ganha acima de € 1.500), 13% na Irlanda, 2% na Grécia, 25% na Romênia e até 50% na Letônia.
Os salários nominais foram congelados por um a três anos na França, Itália, Portugal, Espanha, Bulgária, Polônia, Romênia e Eslovênia. Com a inflação em alta, a medida resulta em corte real implícito nos pagamentos.
Os empregos no setor público também estão sendo cortados: o governo conservador do Reino Unido anunciou planos de reduzir até 490 mil empregos ou quase 10% da força de trabalho total do setor público. Polônia e Bulgária já cortaram 10%, Romênia anunciou 250 mil cortes, a França congelou contratações. Na Grécia, apenas um em cinco que se aposentam será substituído.
"Os planos de austeridade [na Europa] estão sufocando nossas economias e mantendo o desemprego persistentemente alto", afirma Bernadette Ségol, secretária-geral da CES, que comandará amanhã uma "euro-manifestação" em Luxemburgo.
Após perder cinco milhões de empregos durante a recessão, a Europa poderá apagar mais 1,5 milhão a dois milhões. Isso porque os planos de socorro dificilmente ajudarão a compensar com novos empregos por um bom tempo. E os efeitos imediatos sobre a demanda e a atividade econômica serão grandes.
Como sempre ocorre em tempos de crise econômica, os sindicatos estão com posição enfraquecida. Na Itália, a maioria de seus membros são aposentados. Eles não conseguiram evitar o enfraquecimento dos sistemas de barganha coletiva na Grécia, Espanha, Estônia, França, Bulgária, Republica Tcheca e Polônia.
Outros movimentos canalizam a revolta. Os "indignados" - formados na maioria por jovens com emprego precário ou sem emprego nenhum - se propagam pela Espanha, Grécia, França e outros países, sobretudo depois que vários países europeus cortaram a duração dos benefícios para os desempregados. O benefício foi reduzido de quatro para dois anos na Dinamarca. Também diminuiu na Suécia, Alemanha, Suíça, Estônia, República Tcheca e na Espanha.
A dívida pública da Grécia aumentou 135% desde 2002, para atingir o equivalente a 157% do PIB este ano. Em Portugal, a alta foi de 69% e na Irlanda, de 242%. Até na prudente Alemanha, subiu 40% em quase dez anos.
Para organizações internacionais, as cifras mostram que os europeus não têm como escapar do fato de que o envelhecimento da população e os benefícios sociais prometidos são custosos demais para serem mantidos. "A idade de aposentadoria dos gregos, de 55 anos, é insustentável", exemplifica o economista-chefe da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Carlo Pier Padoan.
Mas os políticos não conseguem vender os planos de ajuste doloroso aos eleitores. E a insatisfação se manifestou no voto que derrubou os governos na Irlanda e em Portugal, humilhando também os socialistas no poder em eleições regionais dos socialistas na Espanha. No Reino Unido, a coalizão conservadores/liberais enfrentará greve de mais de um milhão de funcionários públicos no dia 30, a maior em décadas. A direita populista ganha terreno na Europa, sem uma receita menos dolorosa.
Enquanto as críticas aumentam sobre a incapacidade da Europa de se governar, numa verdadeira catástrofe política, o presidente do Eurogrupo (ministros de finanças), Jean-Claude Junker, adverte para o risco de contágio da crise para a Bélgica e Itália. E Kenneth Rogolf, ex-economista chefe do FMI, acusa os planos de austeridade de serem cada vez menos realistas. Ele insiste que a Europa precisa reestruturar a carga da dívida da sua periferia.

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