domingo, 21 de agosto de 2011

BC faz o oposto do que deveria, diz chileno


Autor(es): Vera Saavedra Durão
Valor Econômico - 19/08/2011
 
Para garantir uma situação especial, quase única, o Brasil necessita adotar uma política macroeconômica que lhe garanta sustentabilidade. A avaliação é do economista chileno Gabriel Palma, da Universidade de Cambridge, para quem a crise internacional será longa, no mínimo cinco anos, dado o tamanho da dívida pública e déficits fiscais que vão afetar as estruturas produtivas da Europa, Estados Unidos e Japão.O cenário externo é cinza, podendo tornar-se cinza escuro, alerta. "Só não é negro devido a países da Ásia, como a China, que têm um sentido de pragmatismo e racionalidade e sanidade mental que não existe no resto do mundo", diz. Essa é, a seu ver, a parte positiva para o Brasil. Ou seja, que Índia, China e outros países asiáticos continuem crescendo.
Segundo Palma, essa vantagem, somada à adoção de uma política macroeconômica mais em linha com os modelos dos asiáticos, ou seja, mais voltada para o mercado interno, com regras claras e previsíveis para câmbio, juros baixos, conta de capital sob controle e alta taxa de investimento público em relação ao Produto Interno Bruto, garantiria desenvolvimento e crescimento, com o Brasil continuando a ser uma exceção, com alguns outros países, nessa crise mundial.
Palma, porém, avalia que o Banco Central brasileiro, com o tipo de política que tem agora "está fazendo exatamente o oposto do que deveria fazer para que o país não seja afetado pela crise". Ele critica o fato de o Brasil ter uma política macroeconômica que ajuda a gerar incerteza, como juros altíssimos e diferenciados, câmbio sobrevalorizado imprevisível, e total ausência de controle de capitais. Para ele, "o câmbio flutuante e o juro alto e instável não ajudam a ninguém, a não ser os especuladores do mercado financeiro".
Palma considera que o Brasil está se garantindo com o boom das commodities, "uma bolha que não vai durar eternamente", adverte. Na sua opinião, a alta das matérias-primas tem uma grande base especulativa e acontece basicamente porque outros ativos, nesta hora de crise, não são tão rentáveis. "A política monetária do Banco Central e a política de câmbio alimentam a especulação com o preço das commodities e transmitem isso para a economia doméstica, sobrevalorizando o real e gerando o fenômeno da desindustrialização. E isso afeta a indústria."
O mais importante, quando se adota uma política econômica é saber se os fundamentos sobre os quais ela se assenta são permanentes ou transitórios. Na sua avaliação, a bolha das commodities é por definição transitória e a entrada excessiva de capitais, também. "No momento em que a Europa, Estados Unidos e Japão colocarem a casa em ordem e voltarem a ser mercados atrativos para o capital especulador, ele corre para lá", avisa.
Por isso, Palma defende uma política de controle de capitais de fato para o Brasil e outros países da América Latina, que evite uma inundação de dólares. Ele citou que os fundos de pensão americanos programam no curto prazo despejar 50% de seus ativos, de US$ 20 trilhões nos emergentes. "Se isso acontecer, essas economias estouram."
Diante do processo de primarização do Brasil, Palma sugere que o país passe a adotar um modelo de política industrial semelhante ao dos países nórdicos. A grande riqueza de produto natural do Brasil pode criar uma indústria muito poderosa através do processamento da matéria-prima, criando um nicho exportador importante. "A China é a fábrica do mundo, a Índia é a oficina do mundo, o México é o maquiador do mundo. A pergunta básica para se criar uma política industrial no Brasil é saber qual o nicho do Brasil nos próximos 20 anos numa economia globalizada. Para mim isso está claro: o Brasil deve se tornar processador de matéria-prima e ter uma indústria para garantir produção de máquinas e equipamentos para a indústria do minério e do petróleo."
Palma, que fez palestra ontem para o Centro Celso Furtado, destacou que o importante para um crescimento sustentável, como ensinam os asiáticos, é ter uma política macro previsível, num mundo imprevisível.

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