Autor(es): Cláudia Trevisan |
O Estado de S. Paulo - 22/08/2011 |
Mesmo que isso não ocorra, Pettis diz que demanda por commodities não alimentícias cairá, afetando o Brasil Michael Pettis, professor na Universidade de Pequim Tradicionalmente pessimista em relação à China, o americano Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim, acredita que o país vai desacelerar de maneira "dramática" depois de 2013, para inimagináveis 3% de crescimento ao ano. Mas, mesmo que isso não ocorra, ele afirma que haverá queda na demanda por commodities não alimentícias, em razão do inevitável processo de correção dos profundos desequilíbrios da economia chinesa, que se manifestam no excessivo investimento e anêmico consumo. Para o Brasil, essa eventual mudança é crucial, já que pode afetar diretamente as vendas de minério de ferro, o principal produto de exportação nacional. A seguir, os principais trechos da entrevista, feita num café em Pequim: Qual seu cenário para a China? Eu acredito que a China vai desacelerar de maneira dramática, para 3% depois de 2013. Mesmo que o crescimento fique em 9%, no que eu não acredito, o ritmo do investimento vai ter de diminuir de maneira significativa e ser substituído pela expansão no consumo, no processo de reequilíbrio da economia. Se houver a substituição do investimento pelo consumo, isso terá grande impacto sobre o Brasil. Quando os chineses consumirem, eles vão comprar roupas, ir a restaurantes, consumir serviços de saúde e construir menos metrôs e prédios. Eu acredito que a demanda total vai cair muito, mas, mesmo que ela permaneça a mesma, ela vai mudar de bens de investimentos para bens de consumo. Portanto, a demanda por commodities não alimentícias, como minério de ferro e cobre, vai cair de qualquer maneira. O agravamento da crise nos Estados Unidos e na Europa aumentou a pressão sobre a China para reequilibrar sua economia? Sim. Nos anos 70, os Estados Unidos e a Europa tiveram uma crise e o Brasil, não. Graças à reciclagem de petrodólares, houve um enorme aumento dos investimentos e um boom no preço de ativos, o que atrasou o ajuste no Brasil. Mas isso se tornou insustentável quando os níveis de endividamento ficaram muito altos. Nós vamos ver a mesma coisa. Mas por que a China vai desacelerar? Porque o que está promovendo o crescimento também está agravando os desequilíbrios. O consumo está aumentando muito lentamente, porque o rápido crescimento é gerado por transferências das famílias, por meio de baixos salários, baixa taxa de juros e moeda depreciada. Isso reduz o consumo e subsidia o crescimento, gerando dois grandes desequilíbrios. O primeiro é o fato de o consumo ser muito baixo em relação ao PIB (34%). O crescimento chinês está sendo sustentado pelo superávit comercial - e com o mundo em uma situação difícil, ele não pode continuar a crescer - e investimento, mas o investimento tem sido mal alocado. Isso significa que a dívida está crescendo, o que gera um problema de sustentabilidade. O que isso significa para países como o Brasil, que dependem da China em razão da exportação de commodities? Mesmo que o crescimento chinês continue elevado, a taxa de investimento vai cair de maneira dramática e isso vai provocar queda no preço de commodities não alimentícias. Se o consumo se expandir, o consumo de alimentos vai aumentar, já que as pessoas terão mais dinheiro para comprar comida. Se a China conseguir manter elevadas taxas de consumo, os alimentos não serão afetados de maneira dramática. Mas, se a taxa de consumo também desacelerar, isso também afetará o preço dos alimentos. O Brasil exporta os dois tipos de commodities. As não alimentícias serão afetadas dramaticamente e as alimentícias podem ou não ser afetadas. O ajuste chinês é necessariamente ruim para o Brasil? Depende do horizonte de tempo. No curto prazo, será muito ruim. Mas o que aconteceu nos últimos 10 a 20 anos no Brasil é que o País gastou grande parte dos anos 70 e 80 tentando reverter a crescente dependência de commodities. Acreditava-se que o excesso de dependência das commodities era uma das fontes de fragilidade dos países em desenvolvimento e houve um esforço para diversificar e criar uma fonte de crescimento mais equilibrada. Se eles estavam certos - e eu acredito que estavam -, a queda no preço das commodities vai forçar o Brasil a reduzir seu peso, o que será muito doloroso, mas necessário. A menos que você acredite que, desta vez, as pessoas que dizem que o preço das commodities nunca vai cair estão certas. E elas disseram isso muitas vezes nos últimos 200 anos e sempre estiveram erradas. |
quarta-feira, 24 de agosto de 2011
''China desacelerará para inimagináveis 3%''
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