terça-feira, 24 de maio de 2011

Brasil minimiza investigação americana sobre exportações

Autor(es): Assis Moreira e Mauro Zanatta | De Genebra e Brasília
Valor Econômico - 23/05/2011
 
"Pagamos o preço da nossa competência. É um momento ruim para a economia agrícola deles e eles preferem adotar factóides como esse". Assim reagiu o ministro brasileiro da Agricultura, Wagner Rossi, diante da informação de que a Comissão de Comércio Internacional dos Estados Unidos (ITC, na sigla em inglês: http://www.usitc.gov/index.htm) havia acabado de deflagrar uma investigação sobre a competitividade mundial das exportações agrícolas do Brasil e seu impacto sobre os embarques americanos para terceiros mercados.
"São apenas movimentos mercadológicos de quem se sente ameaçado pela alta competitividade da produção brasileira", afirmou o ministro ao Valor na sexta-feira. Rossi observou, ainda, que o Brasil tem o mais transparente banco de dados sobre agropecuária em todo o mundo. "Não tem nenhum país no mundo com tamanha transparência. Os dados sobre a agropecuária e informações sobre todos os aspectos, inclusive subsídios concedidos, estão disponíveis ao público", disse. Como exemplo, citou os elogios recebidos de um grupo de europeus exatamente sobre o nível de transparência das informações. "E isso é uma coisa que nem todos os outros fazem", afirmou Rossi.
    Análise dos EUA focará período entre 2006 e 2010; carnes e grãos estão na mira da comissão americana
A ITC, que se autodenomina uma agência federal "independente e não partidária", fará a investigação a pedido do Comitê de Finanças do Senado dos Estados Unidos. A análise vai cobrir o período de 2006 a 2010 e se concentrará no avanço brasileiro nos mercados internacionais de carnes, grãos e oleaginosas. Os americanos não escondem que estão preocupados porque a expansão substancial das exportações brasileiras terminou por tomar fatias de mercado dos produtores americanos em vários produtos.
Nesse contexto, um dos alvos das apurações será o avanço de multinacionais brasileiras do agronegócio no comércio de carne bovina. Empresas como JBS e Marfrig adquiriram, nos últimos anos, diversos ativos no exterior, inclusive em importantes países produtores e exportadores de carne como nos Estados Unidos, na Austrália e na Argentina.
Na carta em que solicita a abertura da investigação, o Comitê do Senado diz que as exportações brasileiras também aumentaram substancialmente nos segmentos de carnes suína e de frango, além de soja e milho - frentes nas quais os americanos mantém posições tradicionais e de destaque no comércio global. "Esse crescimento [do Brasil] alterou a paisagem competitiva nos mercados agrícolas internacionais e resultou em declínio da fatia de mercado para exportadores agrícolas americanos em certos países e produtos", afirma o texto.
A iniciativa de investigar a agricultura brasileira partiu do presidente do Comitê de Finanças do Senado, o democrata de Montana Max Baucus, e do republicano de Utah Orrin Hatch. "Com seu significativo crescimento nas exportações agrícolas nos últimos anos, o Brasil emergiu como um grande competidor dos produtores americanos no mercado internacional", reforçou Hatch no Senado.
De acordo com Baucus, os Estados Unidos e o Brasil são dois dos poucos países que podem reforçar as exportações agrícolas para atender à crescente demanda global por alimentos - uma posição praticamente consensual entre analistas, que normalmente põem o Brasil em posição de vantagem pela possibilidade de o país ter mais condições de ampliar suas áreas plantadas.
Em sua investigação, a ITC, vai se concentrar em seis pontos principais. Em primeiro lugar, fará um exame da produção agrícola brasileira, incluindo recentes tendências na produção, consumo e comércio; medirá as participações de Brasil e EUA nas exportações globais de carnês, grãos e oleaginosas, particularmente para União Europeia, Rússia, China e Rússia - além de mercados com os quais o Brasil negociou acordos preferenciais de comércio.
Também fará um exame detalhado sobre os fatores competitivos do setor agrícola no Brasil, como custo de produção, transporte e infraestrutura, tecnologia, taxa de câmbio, subsídios domésticos e programas do governo vinculados aos mercados agrícolas. Avaliará, ainda, o avanço das múltis brasileiras do setor e seu efeito na cadeia de abastecimento global de seus produtos.
Também levantará as medidas comerciais que afetam as exportações de Brasil e EUA de produtos como carnes, grãos e oleaginosas em terceiros mercados, incluindo medidas sanitárias e barreiras técnicas ao comércio, e medirá os efeitos econômicos de tarifas preferenciais negociadas pelo Brasil sobre as exportações dos EUA e do Brasil, além dos efeitos econômicos de medidas não tarifárias.
Para os senadores americanos, a investigação "ajudará o setor agrícola dos EUA a desenvolver estratégias para se manter competitivo no mercado internacional". E, na verdade, a investigação americana até que veio tarde diante do poderio brasileiro no comercio agrícola mundial - países como China e Índia já estiveram na mira da ITC.
Parece claro que, de um lado, a investigação americana mostrará que a competitividade do agronegócio brasileiro diminuiu nos últimos tempos, em grande medida em consequência do real fortemente valorizado em relação ao dólar. Em contrapartida, a força da moeda também ajudou empresas brasileiras a comprarem ativos no exterior para driblar barreiras comerciais.

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