quarta-feira, 25 de maio de 2011

Massacre da motosserra é consumado

Notícia - 24 - mai - 2011
Câmara dos Deputados transforma lei de proteção às florestas brasileiras em legislação de incentivo ao desmatamento. Compromissos internacionais do Brasil estão ameaçados


A Câmara dos Deputados decidiu hoje que o Brasil não deve ser o país do futuro. Por 410 votos a favor e apenas 63  contra, os deputados aprovaram mudanças no Código Florestal brasileiro que comprometem a biodiversidade do país e a sustentabilidade da agricultura brasileira. "O Brasil acordou hoje com a notícia do assassinato de um defensor da floresta amazônica", disse Paulo Adario, diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace, homenageando José Claudio Silva, líder seringueiro morto na véspera da votação na Câmara por madeireiros no Pará. "E foi dormir com a notícia de que a maioria dos nossos deputados aprova o assassinato de nossas florestas".
Para virar lei, o texto votado na Câmara ainda precisa passar pelo crivo do Senado. Lá, quem sabe, os senadores evitarão repetir os vexames cometidos pelos deputados federais ao longo do processo que terminou com a votaçāo de hoje à noite. Desde o começo dos trabalhos de revisāo do Código, capitaneados pelo autor do projeto de mudança, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), os parlamentares escolheram um lado da questão. E o pior dos lados, o do agronegócio que desmata e abusa dos nossos recursos naturais. Cientistas e proponentes da agricultura moderna, que não mistura produção com desmatamento, mal foram ouvidos  debaixo da cacofonia do interesses rurais atrasados que sequestraram a pauta ambiental do país no Congresso Nacional.
O projeto que passou na Câmara produziu o milagre de transformar uma legislação escrita para defender as florestas brasileiras em lei de incentivo à expansão desenfreada da agricultura e da pecuária. Ele premia o desmatamento, propondo a anistia a desmatadores, e incentiva a expansão sobre o que resta ao Brasil de matas nativas, reduzindo as exigências para que fazendas mantenham um percentual de seus terrenos com vegetação original e enfraquecendo a capacidade do governo central de gerir o patrimônio ambiental brasileiro.
Além de ameaçar a biodiversidade e a produtividade agrícola brasileira, comprometendo a qualidade dos recursos naturais que ela precisa para garantir sua capacidade de produção, o projeto de mudança da legislação florestal trará impactos negativos à diplomacia e economia do país. O texto aprovado pelos deputados federais tem consequência direta nos acordos feitos por grandes corporações consumidoras de produtos agrícolas brasileiros para livrar suas cadeias de custódia da mancha do desmatamento.
Ele também põe em dúvida a capacidade do Brasil de manter seus compromissos de redução de emissões de gases do efeito-estufa assumidos durante a conferência  do clima de Copenhague, em dezembro de 2009. O desmatamento é o principal responsável pela posição de destaque do Brasil no ranking dos países que mais contribuem para o aquecimento global (é o quinto maior emissor de gases-estufa). E depois de uma tendência de queda das taxas de derrubada na Amazônia nos últimos cinco anos, ele voltou a subir na região.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), divulgou na semana passada que o desmatamento na Amazônia em abril havia sido 570% maior do que o registrado no mesmo mês do ano passado. “Há uma clara corrida pelo desmatamento incentivada pelas modificações efetuadas no código”, diz Paulo Adario, diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace. “Quem está em campo sabe que essa explosão do desmatamento não é comum nessa época. A devastação geralmente começa no período da seca.”
A votação na Câmara Federal joga os holofotes da questão ambiental no Brasil para cima da presidente Dilma Roussef. Ela prometeu, durante a campanha eleitoral no ano passado, que vetaria qualquer legislação que implicasse em aumento do desmatamento ou anistia a desmatadores. Também assegurou que não recuaria do compromisso assumido pelo seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, de reduzir o desmatamento na Amazônia em 80%. Mas seu governo praticamente lavou as māos em relação ao que aconteceu na Câmara.
A decisão dos deputados de atropelar os compromissos do governo federal colocam em questão a credibilidade do país para sediar, no ano que vem, a Rio + 20. “A capacidade do Brasil de liderar uma ação global contra o desmatamento e as mudanças climáticas está sob sérias dúvidas”, diz Adario. “Se Dilma não agir para influenciar as decisões do Congresso no sentido de manter a proteção à nossa biodiversidade, seu governo terá sucumbido aos interesses do agronegócio, comprometendo a posição internacional do país”.


25/05/2011 00h04 - Atualizado em 25/05/2011 01h17

Base contraria governo e aprova emenda polêmica do Código Florestal

Item estende aos estados decisão sobre áreas de preservação.
Líder do governo adiantou que Dilma Rousseff deve vetar emenda 164. 

Andréia Sadi e Robson BoninDo G1, em Brasília
A Câmara dos Deputados aprovou no início da madrugada desta quarta (25), por 273 votos a favor, 182 contra e duas abstenções, a emenda 164 do novo Código Florestal, principal ponto de divergência entre o governo federal e os parlamentares.
Os deputados aprovaram a emenda três horas depois de votar a favor do texto-base do projeto do novo Código Florestal, legislação que estipula regras para a preservação ambiental em propriedades rurais.
A emenda 164, de autoria do deputado Paulo Piau (PMDB-MG), estende aos estados o poder de decidir sobre atividades agropecuárias em áreas de preservação permanente (APPs). O governo federal é contra a proposta porque quer exclusividade para definir as atividades permitidas em APPs.
debate foi tenso, com troca de acusações entre oposicionistas e governistas e mesmo entre integrantes da própria base aliada. O líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), provocou reações ao afirmar que a aprovação da emenda seria uma "vergonha" para o país.
Tudo o que a Câmara decidiu segue agora para deliberação do Senado. Se os senadores introduzirem modificações, o texto voltará para apreciação da Câmara. Se não houver alterações no Senado, seguirá para sanção da presidente da República.
A emenda 164
Na visão dos governistas, a emenda 164, aprovada pelos deputados, pode abrir uma brecha para que os estados anistiem agricultores que já ocupam áreas de preservação.
Durante toda a discussão da proposta, ministros e o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), afirmaram que a presidente Dilma Rousseff não vai admitir a anistia de desmatadores. Ex-ministros do Meio Ambiente que estiveram com a presidente nesta terça também disseram que ela manifestou a intenção de vetar.
Os defensores da emenda argumentam que, se o governo federal tiver a prerrogativa de definir sobre as áreas de preservação ambiental, pequenos agricultores que já desenvolvem suas atividades em áreas de preservação poderão ser prejudicados.
Como a presidente Dilma Rousseff já antecipou que não vai aceitar a anistia de desmatadores, os agricultores que desenvolvem culturas nessas regiões poderiam ser punidos pelo governo federal. A bancada do estado de Santa Catarina, por exemplo, estima que cerca de 80% das propriedades cultivadas no estado estejam dentro de áreas de preservação ambiental.
“Não vamos admitir qualquer agressão ao meio ambiente. Se precisar ficar sozinha nesta questão [a presidente Dilma] ficará e vetará o ponto. Esta emenda é uma vergonha”, disse o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), referindo-se à posição que a presidente Dilma Rousseff deve tomar, de vetar a emenda.
Negociações
Vaccarezza passou o dia em negociações para tentar derrubar a emenda 164, como queria o governo, mas acabou sendo derrotado em plenário com apoio do principal aliado, o PMDB.
À tarde, o líder do governo esteve na Casa Civil para discutir a questão com o PMDB, representado na reunião pelo vice-presidente, Michel Temer, e pelo líder do partido na Casa, Henrique Eduardo Alves (RN). Do lado do governo, estiveram presentes o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, e o ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio.
Após o encontro, Alves disse que o partido havia fechado posição a favor da emenda 164. Vaccarezza disse que, se o governo perdesse a questão, a presidente Dilma não hesitaria em usar seu direito constitucional de veto para impedir qualquer proposta que anistiasse desmatadores.
Votação
Durante a votação da emenda, o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves, disse não ter conversado com a presidente Dilma Roussef, sobre as negociações em torno do Código Florestal e agradeceu o respeito dos ministros da presidente com os quais manteve contato durante as articulações.
Arte Código Florestal 22h 02/05 (Foto: Editoria de Arte / G1)
“Aprendi a enfrentar questionamentos, a encarar com força desafios e a respeitar posições e oposição dos contrários”, disse o líder do PMDB.
Alves rebateu as críticas de que o governo foi derrotado por conta da emenda proposta pelo PMDB. “Eu não sou aliado do governo Dilma. Sou o governo Dilma[...] Não aceito aqui que está se derrotando o governo. Como, se a proposta é nossa? “, afirmou. “Esta matéria não é nem a favor nem contra. É do Brasil real”, completou o líder da bancada de 80 deputados.
Aldo Rebelo, relator do projeto, disse que a emenda dá segurança e proteção a agricultores que no Brasil ocupam “secularmente” as margens do rio. O relator afirmou ainda que a emenda é fruto de um acordo entre oposição e PMDB.
Novo Código Florestal
O projeto do Código Florestal, entre outras regras, prevê dois mecanismos de proteção ao meio ambiente.
O primeiro são as chamadas Áreas de Preservação Permanentes (APPs), locais como margens de rios, topos de morros e encostas, que são considerados frágeis e devem ter a vegetação original protegida.
Há ainda a reserva legal, área de mata nativa que não pode ser desmatada dentro das propriedades rurais.
Texto do relator
O relator do projeto, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) conseguiu garantir no texto o dispositivo que isenta pequenos produtores da obrigatoriedade de recompor reserva legal em propriedades de até quatro módulos fiscais – um módulo pode variar de 40 hectares a 100 hectares.
Rebelo e os líderes partidários também conseguiram amarrar no texto a garantia de que atividades consolidadas em APPs, como o cultivo de maçã ou plantio de café, por exemplo, serão mantidas pelo governo. O impasse sobre a especificação de quais culturas poderão ser permitidas, no entanto, ainda deve ser resolvido no Senado.
O artigo que trata da anistia para quem desmatou até julho de 2008, previsto no texto de Rebelo, também será discutido com os senadores. Da mesma forma, o governo também vai trabalhar no Senado para incluir no texto do Código Florestal punições mais rigorosas para quem reincidir em crimes ambientais.

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