segunda-feira, 8 de agosto de 2011

O preço dos alimentos seguirá pressionado


José Roberto Mendonça de Barros - José Roberto Mendonça de Barros
O Estado de S. Paulo - 07/08/2011



Em 2001 apresentei, junto com Juarez Rizzieri e Paulo Picchetti, uma avaliação da evolução dos preços de alimentos no País, buscando capturar parte dos benefícios da pesquisa agrícola, que induz a queda de preços. Evidentemente, nem toda queda de preços no varejo decorre da pesquisa; por exemplo, melhoras na organização da produção, na qualidade do empresário agrícola e da mão de obra e no sistema de comercialização podem levar a alimentos mais baratos. Entretanto, o nexo do sucesso da pesquisa agrícola que leva à elevação na produtividade, resultando em maior produção e queda de preços, é amplamente estabelecido na literatura.
Trabalhamos com os dados mensais do Índice de Preços ao Consumidor da Fipe para a cidade de São Paulo, para o período que vai de janeiro de 1975 a dezembro de 2000. O índice da Fipe tem algumas vantagens, em particular a sistemática revisão dos orçamentos familiares e o fato de ser o único índice onde todos os produtos têm seus preços coletados todas as semanas. Nossa cesta de produtos é composta de leite, carne bovina, frango, arroz, feijão, laranja, tomate, cebola, batata, banana, açúcar, alface, café, cenoura, mamão, ovo, óleo de soja. É um conjunto bastante representativo do item alimentação. Os preços individuais e a cesta geral são comparados com o IGP da Fundação Getúlio Vargas.
Graças ao trabalho do excelente colega Juarez, os índices foram atualizados até maio deste ano e revelam uma queda extraordinária: de 48% entre dezembro de 1974 e final de 1989; de 50% entre 90 e 99 e, finamente uma queda final de 20,8% entre janeiro de 2000 e agosto de 2006. O gráfico 1 mostra a evolução do índice. Os alimentos foram realmente ficando baratos!
Não tenho dúvidas que a primeira e mais forte razão para a elevação do poder de compra da população, especialmente de baixa renda, é a redução persistente no custo da alimentação.
É certo que uma redução de preços de tamanha magnitude é resultado de um conjunto de fatores. Entretanto, sem uma forte elevação da produtividade, que evidentemente decorre em boa parte dos efeitos da pesquisa, seria impossível aos agricultores absorver tais reduções de preços sem uma ruptura na oferta. Como se vê no gráfico 2, a produção brasileira de grãos passou de 1.258 quilos por hectare na safra 76/77 para 3.274 quilos na safra 2010/11.
Na verdade, o período coberto pela presente análise mostrou uma constante expansão da oferta de alimentos, tanto para o mercado interno quanto para exportação. Em termos de grãos, a colheita cresceu de algo como 50 milhões de toneladas para mais de 160 milhões nos dias de hoje (gráfico 3), com modesta elevação da área cultivada. Como o Brasil tem algo entre 50 milhões e 90 milhões de hectares de pastagens degradadas que podem ser reaproveitadas, o País pode produzir energia renovável sem prejudicar a produção de alimentos e sem derrubar florestas, caso praticamente único no mundo.
A queda de preços continuou forte até meados de 2006, quando houve uma reversão, de sorte que, entre setembro de 2006 e maio deste ano, a cesta de alimentos subiu 13,6% em termos reais, a despeito da valorização do real. O gráfico 4 ilumina mais claramente a reversão dos preços no Brasil, medidos na praça de São Paulo.
Como a produção e a produtividade continuaram a crescer nos anos recentes, é claro que algo mais deve explicar a elevação das cotações. A forte elevação da demanda de alimentos pelos países emergentes bem-sucedidos, liderados pela China, alterou o equilíbrio nos mercados internacionais, implicando em elevações de preços, mesmo com a oferta global crescendo, especialmente a partir de 2000, como se vê no gráfico 5.
De fato, a produção mundial de milho, soja, trigo e arroz, que foi de 1,76 bilhão de toneladas na safra de 2000/01, cresceu para 2,18 bilhões de toneladas na safra de 2010/11, uma expansão de 24%. Reforça o argumento lembrar que os estoques globais de alimentos se reduziram nos últimos anos. No mesmo período e para os mesmos produtos, os estoques caíram de 563 milhões de toneladas para 473 milhões. A maior instabilidade climática e volatilidade nos mercados futuros também tem um papel neste processo. Porém, estamos convencidos que o fundamento básico da alta dos preços é a força da demanda, que tem tudo para continuar. Como escreveu recentemente o ex-ministro indiano J Singh, "os trabalhadores da Índia e da China agora querem um padrão de vida melhor, exigência que nem o sistema político de controle rigoroso da China pode ignorar". De fato, é muito provável que a expansão asiática continue forte nos próximos anos, a despeito de riscos maiores na China mais adiante, como tive oportunidade de discutir aqui no Estado recentemente.
Dessas observações podemos tirar pelo menos três conclusões.
Em primeiro lugar temos aqui mais um exemplo de que o mundo não começou em janeiro de 2003, como querem alguns.
Em segundo lugar, o preço dos alimentos deverá continuar a pressionar a inflação, e a política econômica deveria levar isso em consideração.
Finalmente, uma boa política agrícola nunca foi tão importante. A continuidade da inclusão social também depende muito disto.
P.S.: A turbulência destes dois dias não altera minha visão do mercado de alimentos acima apresentado, embora a volatilidade vá se manter alta.
ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIADOS

O risco é sistêmico e não só de menor crescimento

Eduardo Campos
Valor Econômico - 05/08/2011
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/8/5/o-risco-e-sistemico-e-nao-so-de-menor-crescimento

O atual momento de desalento que assola os mercados mundiais não tem muita explicação além do medo de contágio financeiro em função da crise na zona do euro.
A afirmação acima é de um experiente gestor que pediu anonimato e tem uma leitura diferente do quadro atual.
Para esse especialista, mais importante do que as discussões sobre recessão ou "duplo mergulho" nos Estados Unidos é o aumento dos spreads dos títulos da dívida de Itália, Espanha e França. "Não há nada que se compare a isso. A importância histórica é essa", avalia.
O grande risco é esse contágio chegar ao sistema bancário europeu. E um sinal de que o risco sistêmico começa a preocupar veio do próprio Banco Central Europeu (BCE) que tomou medidas, ontem, para elevar a liquidez no sistema financeiro da zona do euro.
Investidores fogem do risco de olho nos bancos europeus
Ainda na visão desse especialista, Itália e Espanha não têm um problema fiscal crônico. Ao contrário da Grécia, esses países têm condição de sair dessa situação.
"A questão é política, não técnica. O esforço fiscal necessário para tornar as dívidas sustentáveis, mesmo com taxas mais elevadas, não é tão forte assim", pondera.
O que acontece neste momento, segundo o especialista, é um doloroso processo de troca de credores.
A história é a seguinte: os investidores que carregavam títulos da Itália e Espanha o faziam pelo baixo risco que eles representavam, não pela rentabilidade oferecida.
Agora, esses papéis mudaram de "categoria" e o perfil dos credores e dos investidores também mudou.
Esses papéis soberanos, que atraíam investidores por serem seguros, tornaram-se mais arriscados dada as dificuldades fiscais dos países. Quanto aos investidores, o perfil que era de quem não quer risco, passou a ser de interessados em arriscar mais.
O problema é que esse tipo de investidor mais arrojado rareia em momentos no qual a aversão ao risco parece ser a única ordem do dia.
Para esse gestor, a situação ideal neste momento seria os governos de Itália e Espanha (ou qualquer outro país em situação semelhante) subirem a meta de superávit fiscal a cada aumento no spread de seus títulos. Dessa forma, o governo "cobre" o aumento de custo de financiamento ao mesmo tempo em que paga mais para quem quiser apostar a favor dele. Modelo parecido foi adotado pelo Brasil, segundo o especialista, nos anos 90.
Olhando agora para o lado econômico da derrocada dos mercados, o chefe de economia e estratégia para o Brasil do Bank of America Merrill Lynch, David Beker, aponta que os investidores estão tentando avaliar o impacto dos ajustes fiscais que serão feitos nos Estados Unidos. "Esse ajuste fiscal de dez anos vai impor pressão de desaceleração. E isso acontece em um momento em que o crescimento já é baixo", aponta.
O mercado está "perdido", fazendo as contas de como essa redução de gastos vai bater no lado real da economia.
Tirando o foco dos EUA e passando para a Europa, Beker aponta que a situação por lá está longe de ser resolvida e também nota que o problema atingiu novo patamar.
O "jogo" que estava na segunda divisão, ou seja, Grécia e Irlanda, passou para a primeira divisão ao atingir Itália e Espanha.
"Combinando tudo isso, o risco para a economia global aumenta a cada dia. O diagnostico já está dado. Ele é de menor crescimento. O difícil é operar dentro desse ambiente", diz.
O que é fato, segundo Beker, é que tal ambiente é propício para receber juros, ou seja, ficar posicionado para a queda nas taxas. E é isso que se vê no Brasil e no mundo.
O gráfico abaixo mostra a inversão de curva por aqui, ou seja, o mercado passou a enxergar queda da Selic no médio prazo

O PIOR DIA DESDE A CRISE DE 2008

CRISE CORRÓI CONFIANÇA E DERRUBA MERCADOS
Autor(es): Javier Blas | Financial Times
Valor Econômico - 05/08/2011
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/8/5/o-pior-dia-desde-a-crise-de-2008
 

A perspectiva de nova recessão global, agravada por uma crise sem precedentes na zona do euro, que arrasta Espanha e Itália, arrasou os mercados ontem. As enormes quedas das bolsas, puxadas pelas ações de indústrias e de commodities, lembraram os dias de pânico que marcaram o desenrolar da crise financeira de 2008. A Bolsa de Nova York teve seu maior recuo em dois anos e fechou em baixa de 4,3%. A Bovespa caiu 5,7%, a maior queda desde novembro de 2008, e acumula perda de 23,8% no ano.
As principais bolsas do mundo já estão 10% abaixo de seus picos recentes, uma indicação de mudança significativa de rumo. Vários sinais de perigo iminente que assombraram os mercados ao longo da semana confluíram ontem para compor um quadro assustador. O medo de uma recessão, nutrido pela perda de fôlego da indústria nas principais economias do mundo, moveu as commodities para baixo e, com mais força, o petróleo, que teve a maior queda em cinco meses em Nova York, onde o barril do WTI foi cotado a US$ 86,83. As ações de mineradoras e dos grandes traders de commodities levaram uma surra, embora não tão forte quanto a dos bancos europeus, que estão no olho do furacão.

Temores quanto ao futuro da atividade econômica e custos crescentes provocaram fortes quedas nas ações de companhias mineradoras, petrolíferas e negociantes de commodities. Até mesmo em comparação com a recente crise financeira, a liquidação de ações nas bolsas de valores foi considerável.
Aceleraram a liquidação de ações desta semana o crescente nervosismo diante da crise da dívida na Europa, o risco de um duplo mergulho recessivo nos EUA e a avaliação de que as autoridades econômico-financeiras - incluindo o governo japonês e o Banco Central Europeu (BCE) - não conseguiram sustentar a confiança.
Os papéis mais afetados foram as ações das grandes companhias mundiais que operam com recursos naturais - mineradoras, petrolíferas e companhias que negociam com commodities. Apesar de os preços de muitas das commodities permanecerem próximos de seus picos recentes, os preços das ações correspondentes despencaram, levando as cotações aos níveis mais baixos do ano.A divergência de preços entre as ações de companhias no setor de commodities e os preços das próprias matérias-primas evoca lembranças de meados de 2008, quando investidores em ações foram mais rápidos na previsão da crise financeira mundial.
Será que os investidores em bolsa acertaram novamente? Se assim for, uma forte desaceleração econômica, ou algo pior, pode estar à espreita. Outros setores, como o de bancos, sofreram agudas quedas em suas ações, devido a preocupações com a exposição à crise da dívida soberana na Europa e o risco de mais empréstimos impagáveis.
A lista de ações de companhias no setor de recursos naturais que despencaram inclui a Xstrata, mineradora negociada em Londres, que caiu 8,5%; a Royal Dutch Shell, maior grupo petrolífero na Europa, que caiu 5,2%; e a brasileira Vale, maior produtora de minério de ferro, que caiu 6,3%.
A Freeport McMoRan, importante mineradora de cobre, viu suas ações caírem 5,9% e as da Archer Daniels Midland, um das maiores negociantes de commodities alimentícias, baixaram 4,5%.
Após duas semanas de pesadas quedas, o índice FTSE All World Mining e os índices FTSE All World Oil and Gas (petróleo e gás) registram alta de apenas 7,6% e 14,6%, respectivamente, em relação ao ano passado. No mesmo período, o índice de referência Reuters-Jefferies CRB, uma cesta de commodities que inclui petróleo, cobre e trigo registra alta de 22,1%.
A Glencore, maior negociante de commodities do mundo, cujas ações passaram a ser negociadas em bolsa numa oferta US$ 60 bilhões em maio, é uma das mais afetadas. Suas ações caíram 17,9%, até agora, nesta semana. Fecharam ontem a 391 pence, ou mais de 26% abaixo do lançamento.
Os investidores em ações parecem muito mais preocupados com a possibilidade de um renovado mergulho em recessão do que os investidores em commodities, segundo executivos do setor.
Investidores dizem que os preços elevados de petróleo e alimentos estão forçando os BCs dos países emergentes a apertar sua política monetária, freando o crescimento econômico na China, na Índia e em outros grandes consumidores de commodities.

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