Segundo especialistas, expansão mais forte e juros elevados no Brasil explicam remessas de US$ 21,7 bi para o país
ÉRICA FRAGA
DE SÃO PAULO
São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 2011
O volume de dinheiro que multinacionais brasileiras trouxeram do exterior para o país entre janeiro e julho deste ano atingiu o recorde de US$ 21,7 bilhões.
A quantia equivale a quase o dobro do valor investido por essas empresas fora do país no mesmo período (US$ 11,2 bilhões). Essas cifras são registradas no balanço de pagamentos (que contabiliza transações do país com o resto do mundo) sob a categoria de investimento brasileiro no exterior.
Mas o movimento de entrada de recursos muito superior ao de saída por meio dessa conta é incomum. "Normalmente, é de se esperar que as quantias mais significativas sejam relacionadas a investimentos feitos pelas multinacionais brasileiras fora", afirma Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências.
Os recursos que multinacionais brasileiras estão trazendo do exterior têm entrado no país principalmente com dois tipos de carimbo, que representam subdivisões da conta de investimento brasileiro no exterior.
O maior fluxo (US$ 14,3 bilhões nos primeiros sete meses do ano) representa quitação de dívidas que filiais tinham com suas matrizes brasileiras no passado.
Em segundo lugar, aparecem empréstimos novos, mas que estão sendo concedidos pelas filiais no exterior para suas matrizes no Brasil (quase US$ 5 bilhões entre janeiro e julho).
Para especialistas, esse fluxo é explicado pelo contraste entre os indicadores econômicos do Brasil e das nações desenvolvidas. Crise nos países ricos e expansão ainda forte no Brasil fazem com que alternativas de investimentos produtivos no país sejam atraentes.
Além disso, a grande diferença entre as taxas de juros praticadas no país e em nações desenvolvidas pode estar estimulando empresas a contrair empréstimos a custo baixo no exterior para fazer investimentos com retorno mais alto no Brasil.
"Esses fluxos de recursos parecem fazer sentido do ponto de vista de administração de caixa. Tomar recursos no exterior, a juros muito baixos, e aplicar aqui pode garantir retornos altos e ajudar a melhorar o resultado das multinacionais", diz Rogério Sobreira, professor da FGV.
Para José Kobori, consultor e professor do Ibmec, a maior internacionalização de empresas brasileiras ajuda a explicar o movimento. "É normal que as multinacionais brasileiras tragam parte dos lucros de volta, principalmente no contexto de demanda mais forte aqui." Segundo especialistas, caso a crise nos países desenvolvidos se agrave, é possível que o forte fluxo de entrada de recursos no país pela conta de investimento brasileiro no exterior perca força.
Um dos cenários possíveis é a ocorrência de um movimento contrário, de saídas de recursos do país sob forma de empréstimos das multinacionais brasileiras para socorrer suas filiais no exterior.
Isso ocorreu durante a crise de 2008, quando as múltis brasileiras emprestaram US$ 15,5 bilhões para suas filiais. Mas até agora não há sinal disso. Os empréstimos de múltis nacionais para seus braços no exterior somaram apenas US$ 411 milhões entre janeiro e julho.
São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 2011 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me2109201105.htm ANÁLISE REMESSAS Com crise mundial, empresas focam o mercado doméstico Brasileiras realocam portfólio de investimentos para reforçar o caixa local
ANTONIO CORRÊA DE LACERDA ESPECIAL PARA A FOLHA O volume incomum de recursos que as empresas multinacionais brasileiras trouxeram das filiais no exterior nos primeiros setes meses deste ano chama a atenção. Já chegou a US$ 21,7 bilhões, 76% a mais do que os US$ 12,3 bilhões do mesmo período do ano passado e quase o dobro dos US$ 11,2 bilhões que foram investidos no exterior no acumulado deste ano. A crise que afeta grande parte do mundo desenvolvido tem muito a ver com isso. As economias norte-americana, europeia e japonesa apresentam um quadro de estagnação, sendo que não se descarta, em alguns casos, a probabilidade de recessão. Isso significa que os projetos de expansão das empresas brasileiras nesses mercados estão sendo revisados -uma vez que a demanda, no melhor dos casos, crescerá muito pouco. Em contrapartida, o mercado brasileiro tem apresentado bom desempenho, e, apesar de desaquecimento do ritmo de expansão, comparativamente ao ano que passou, há boas perspectivas de médio e longo prazos. As empresas já perceberam que, para não perder participação nas vendas, terão de realizar novos investimentos. Portanto, há uma clara realocação do portfólio de investimentos e as companhias brasileiras estão reforçando o caixa local para fazer frente às suas necessidades de financiamento. INDUSTRIALIZAÇÃO De um país absorvedor de investimento direto estrangeiro, o que foi fundamental para consolidar a industrialização ao longo da história, o Brasil tornou-se um dos principais países investidores no exterior. As empresas brasileiras tiveram a percepção correta de que é preciso fazer parte das grandes cadeias produtivas globais, até mesmo para não se tornarem alvos fáceis de aquisições por parte de seus concorrentes. O acesso aos mercados de fora, a superação de barreiras tarifárias e não tarifárias, a busca de um "hedge" natural via geração de receitas em dólares, dentre outras, também são motivações da internacionalização. Esse é um movimento estrutural, que não deve mudar, no longo prazo. O ajuste em curso, de um certo recuo, trazendo recursos de volta, é, portanto, conjuntural. O bom momento vivido pela economia brasileira e as suas perspectivas favoráveis também explicam por que vamos receber neste ano o recorde de US$ 70 bilhões de ingressos de investimentos diretos estrangeiros. Na adversa conjuntura internacional, o mercado doméstico brasileiro tem se tornado foco das empresas interessadas em manter e expandir seus negócios. Esse é o maior ativo com o qual a economia brasileira pode contar em tempos de "vacas magras". É preciso aproveitar a maré. ANTONIO CORRÊA DE LACERDA é economista, professor da PUC-SP, doutor pelo IE/Unicamp e autor, entre outros livros, de "Desnacionalização: Mitos, Riscos e Desafios". |
São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 2011 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me2109201106.htm Entre emergentes, Brasil tem juro mais alto para grandes empresas Banco Central passa a divulgar novo tipo de dado, mensalmente DE BRASÍLIA Um novo tipo de taxa que passou a ser divulgado ontem pelo Banco Central mostra que as grandes empresas brasileiras pagam juros mais altos que os cobrados em outros países emergentes. Ainda assim, a diferença entre o custo do dinheiro para os bancos e a taxa cobrada por eles dessas empresas, o chamado "spread" bancário, é o mais baixo entre as economias emergentes. No trimestre encerrado em julho, último dado disponível, empresas do porte da Vale e da Petrobras, com baixíssimo risco de inadimplência, pagaram 17,5% ao ano. É praticamente metade da taxa média para todas as empresas no país e pouco mais de um terço do que é pago pelo consumidor. O número também está próximo da média verificada desde 2005, de 16,2% ao ano, e é o maior dentre as grandes economias emergentes: Rússia (11,4%), Índia e África do Sul (11,8%), China (6%). No período, a taxa cobrada para esses clientes preferenciais dos Estados Unidos ficou em 5,5%. No Brasil, esse resultado é explicado pelo custo que os bancos têm para captar recursos. Esse custo é definido pela taxa básica de juros do BC, a Selic. Ou seja, se o governo reduzisse a taxa básica, uma das maiores do mundo, grandes companhias encontrariam no Brasil condições de crédito semelhantes às de empresas dos demais emergentes. O "spread" bancário em empréstimos para grandes empresas é de 3,2 pontos percentuais no Brasil, abaixo do verificado na Índia (5,7 pontos), na Rússia (4,2 pontos), na China (3,8 pontos) e na África do Sul (3,4 pontos). O BC começou a fazer e divulgar esse cálculo para aumentar a concorrência no mercado. A instituição diz que também quer estimular empresas médias e pequenas a exigirem uma taxa menor dos bancos. O dado será divulgado mensalmente pelo BC, com 45 dias de defasagem, com base na média do último trimestre apurado. Em outubro, será conhecida a taxa do período junho-agosto. (EC) |
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