terça-feira, 20 de setembro de 2011

País entrega pedido de debate sobre câmbio na OMC


Autor(es): Por Assis Moreira e Sergio Leo | De Genebra e Brasília
Valor Econômico - 20/09/2011
 

O Brasil apresentou ontem na Organização Mundial do Comércio (OMC) uma "proposta de discussão" para a entidade verificar mecanismos que os países poderiam usar envolvendo câmbio, por exemplo, para aumentar a tarifa de importação a fim de compensar desvalorizações competitivas de moedas de parceiros. Ao mesmo tempo, em meio a avaliações de que o aumento do IPI sobre carros importados é ilegal, o país sinalizou que poderia ter adotado opção bem mais drástica.
A delegação brasileira protocolou sua "proposta de discussão" no grupo de trabalho da OMC sobre Comércio, Dívida e Finanças. ""Pedimos para a OMC verificar se os mecanismos existentes são adequados (para tratar de desalinhamentos cambiais nos fluxos de comércio), se é possível usá-los e como"", afirmou o embaixador brasileiro na OMC, Roberto Azevedo. "Se não, como é possível desenhar mecanismo para serem usados."
O Brasil estima que os acordos da OMC já reconhecem o impacto da taxa de câmbio no comércio. O artigo 2 do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), no exemplo usado pelo Brasil, estabelece que casos de flutuação cambial muito importantes poderiam justificar um aumento de tarifas. Essa medida, porém, precisa ser aprovada pelos países membros e em coordenação com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
"O que queremos é abrir a discussão. Não dá para fingir que não há um problema cambial, que interfere nas regras da OMC", disse ao Valor, por telefone, de Nova York, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. Ele explicou que o governo quer ter, na OMC, regras que permitam sobretaxar produtos de um país que esteja se beneficiando de um câmbio artificialmente baixo, ou de uma brusca variação cambial.
"Não estamos propondo qual a banda de flutuação admissível para o câmbio porque definir isso não é papel da OMC, tem de ser definido por algum organismo financeiro", acrescentou. "Não vamos falar em valores agora, não há acúmulo [de debate] na OMC, temos de discutir."
Pimentel afirma que não está nos planos do governo aplicar salvaguardas autorizadas na OMC contra a China, medida defendida por especialistas. "O assunto não é individual, um país contra outro", acrescentou. A possibilidade de aplicar sobretaxas a países com variação excessiva da moeda daria "margem de manobra grande", disse o ministro. "Isso tudo é tese, nem sequer discutimos os detalhes", ressalvou. "Vamos abrir uma discussão; vai levar tempo, mas, pelo menos, alguém tem de botar na mesa essa questão".
O Brasil quer, na prática, que o grupo de trabalho na OMC acabe por levar a entidade a reconhecer o impacto do câmbio nos fluxos de comércio. Se for com base na interpretação do que já existe nos acordos, isso daria o sinal verde para um país aumentar as tarifas ou impor outras barreiras contra produtos originários de parceiros com câmbio manipulado. Se não, que a OMC examine como negociar o que for necessário. O Brasil sugere que o Fundo Monetário Internacional (FMI) poderia examinar uma metodologia para identificar desalinhamentos cambiais. Sem definir o que é taxa de câmbio razoável, não dá para um país aplicar sobretaxa, nesse caso.
O Brasil não fez nenhuma proposta de negociação ainda. O que fez foi a continuação do debate aberto em um seminário no primeiro trimestre com o objetivo de esclarecer a responsabilidade da OMC num tema central hoje no comércio internacional. O diretor-geral, Pascal Lamy, foi confrontado ontem com várias perguntas sobre câmbio no fórum público da OMC que reúne uma vez por ano ONGs, entidades empresariais e acadêmicos. E sua resposta não variou: "câmbio é no FMI."
Par o debate cambial na OMC, o governo brasileiro argumenta que o sistema multilateral de comércio teve suas regras elaboradas em uma época na qual prevaleciam taxas de câmbio fixas, o que torna inadequadas as disciplinas criadas contra práticas comerciais desleais, como salvaguardas, antidumping e direitos compensatórios. Para o Itamaraty, a discussão sobre como avaliar se alguma moeda está desvalorizada ou não teria de ser discutida fora da OMC, em algum "fórum de clara competência na matéria", como o Fundo Monetário Internacional (FMI).

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