O pânico de 2008: uma crise evitável |
Autor(es): Por William C. Handorf |
Valor Econômico - 12/09/2011 |
A crise de 2008 nos EUA era evitável e seus custos para o mundo poderiam ter sido bem menores. Os brasileiros deveriam temer algo semelhante, uma bolha imobiliária? Só se os bancos adotarem estruturas financeiras de alto risco que reduzam entradas e prestações iniciais e deixem de exigir comprovação derenda. Ignorar esses sinais pode custar caro. A frase bem conhecida e muito citada de "Tale of Two Cities", de Charles Dickens, resume perfeitamente o Pânico de 2008 deflagrado pelos EUA e por determinados países europeus. Foi o melhor dos tempos, foi o pior dos tempos, foi a era da sabedoria, foi a era da insensatez. O Pânico de 2008 foi uma crise no financiamento imobiliário que levou à falência quase 400 bancos americanos e envolveu enormes investimentos em ações baratas feitos pelo governo federal para reforçara solvência dos bancos que tinham capital inadequado, a garantia da Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) sobre depósitos à vista e dívidas de instituições financeiras para aumentar a liquidez institucional eexigiu a enormes compras de títulos do Tesouro e de agências habitacionais pelo Federal Reserve (Fed, banco central americano) para irrigar o mercado e baixar as taxas de juros. A catástrofe financeira também causou perda de riqueza, emprego, renda e da posse de casas de milhões de americanos. A crise era evitável e os custos para os EUA e o mundo poderiam ter sido sensivelmente menores do que os que impactaram o governo federal, bancos e indivíduos. Como ocorreu a crise americana e quais foram os sinais de alerta que sugeriam que uma bolha estava seformando são discussões importantes para o Brasil tendo em vista a recente alta dos preços dos imóveis na mais importante economia latino-americana. Poderiam os preços das casas no Brasil cair com intensidade suficiente para precipitar um caos econômico comparável ao dos Estados Unidos? Os preços de casas, como os de qualquer classe de ativos, devem refletir a oferta e a demanda subjacentes. Problemas ocorrem quando construtores ou mutuários assumem riscos excessivos para construir imóveis ou comprar imóveis. A análise a seguir resume a pesquisa econômica de preços das casas nos EUA nos últimos 25 anos. ["Home Price Trends from a Financial Perspective", "Tendências dos preço de imóveis de uma perspectiva financeira", William C. Handorf (Real Estate Review), no prelo]. As tendências dos preços das casas americanas são derivadas do índice Case Shiller Composite para 10 cidades publicado pela Standard & Poor"s. Em média, os preços das casas valorizaram-se 4,2% ao ano entre 1988 e 2011. Os preços das casas saltaram quase 19% em 2004 e, em seguida, mergulharam quase 20% vários anos depois. Um dado importante: os preços das casas caíram em dez dos 24 anos pesquisados. Os preços das casas sobem e descem de acordo com a oferta, a demanda, o acesso a crédito e as projeções de preços futuros. Os compradores de casas americanos recorrem a financiamento hipotecário para facilitar o grande investimento em imóveis. Normalmente, 70% a 95% do preço de compra de uma casa é, inicialmente, tomado de empréstimo. Se proprietários de casas em potencial têm acesso a crédito a preços favoráveis, ademanda por casas aumenta, produzindo uma pressão ascendente sobre os preços. A correlação entre os preços dos imóveis e o crescimento da dívida hipotecária é muito alta e positiva. O crédito representa um importante fator relacionado ao mercado imobiliário. Menos casas são compradas quando o crédito não éabundante. Menor demanda resulta em menor pressão sobre os preços dos imóveis. Historicamente, as corretoras e bancos provedores de financiamento habitacional nos EUA avaliavam o crédito de acordo com os "três C do crédito": caráter, capital e capacidade. Qual é o histórico de crédito do devedor? Quanto capital o mutuário investirá na propriedade? Terá o mutuário capacidade de pagar juros ereembolsar o capital ao longo de toda a vida do empréstimo? Muitos desses princípios históricos de crédito foram ignorados ou relaxados entre 2002 e 2007, quando a bolha foi criada. Primeiro, os bancos originaram os empréstimos "alternative-A", segundo os quais os históricos de crédito ou a capacidade de honrar os empréstimos ao longo de sua vida não eram documentados e ou avaliados. Em segundo lugar, os bancos originaram empréstimos subprime (de segunda linha) a mutuários com histórico de crédito insatisfatório. Em terceiro lugar, os bancos originaram empréstimos com prazos de 40 anos, empréstimos a juros variáveis e empréstimos demandando apenas pagamento de juros. Aspirantes à compra de casas tinham de acessar esses empréstimos de alto risco porque os preços das casas estavam, à época, subindo mais rapidamente do que a renda e as novas estruturas de financiamento minimizavam as obrigações de pagamento inicial. Outros bancos ofereciam empréstimos "a reboque" ou segundas hipotecas com saldos de financiamento combinados de até, ou mesmo superiores a, 100% do valor da casacomprada, porque os compradores em potencial não conseguiam dar os costumeiros 10% a 20% habituais de entrada. Finalmente, os bancos originaram empréstimos repassados a investidores e especuladores e refinanciaramempréstimos em curso com base na valorização do imóvel. Cada um desses empréstimos de alto risco impunham taxas de juros contratuais mais elevadas do que os tradicionais financiamentos habitacionais ajuros fixos amortizado em 30 anos por mutuários confiáveis. Wall Street exigiu os financiamentos a juros altos para criar títulos lastreados em hipotecas e obrigações dedívida colateralizadas (CDO, na sigla em inglês), cujo valor posteriormente implodiu, à medida que o número de execuções hipotecárias aumentou e dispararam os prejuízos decorrentes da inadimplência e daretomada de imóveis. O acesso a financiamento habitacional de alto custo e alto risco permitiu que mais indivíduos, investidores efamílias comprassem casas; o crescimento da demanda fomentou o encarecimento das casas preços e deestruturas cada vez mais tolerantes que exigiam entradas e prestações iniciais ainda menores. A correlação entre preços de casas e crédito de alto risco é alta e positiva. Regras mais exigentes impostas pelo Congresso e agências regulamentadoras do setor bancário instituídas após o estouro da bolha no financiamento habitacional reduziram o número de mutuários qualificados a receber financiamento e ademanda por propriedades residenciais. As agências regulamentadoras bancárias mantêm um acompanhamento constante do andamento daquitação das prestações dos financiamentos assumidos. Quando os mutuários não conseguem gerar o fluxo de caixa necessário para honrar o principal e o banco precisa acionar um fiador, caso exista, para ser reembolsado, os inspetores da agência fiscalizadora avaliam a gravidade do problema e "classificam" o empréstimo como potencialmente problemático, problemático ou perdido. Os bancos precisam assegurar que dispõem de provisões para créditos de liquidação duvidosa suficientes para absorver os prejuízosesperados envolvendo empréstimos durante o ano seguinte e os empréstimos "classificados" durante suavida remanescente. Mais prejuízos com créditos concedidos e empréstimos "classificados" exigem mais provisões. Os bancos criam, em seus balanços, uma margem de segurança maior contra perdas decorrentes de empréstimos não honrados, assumindo uma maior provisão contra tais prejuízos em sua demonstração de resultados. Acimade determinado limiar, o banco registrará prejuízos operacionais que dissipam capital e aumentam aprobabilidade de a instituição ser colocada sob intervenção. Se os bancos precisam retomar um imóvel, seu patrimônio imobiliário amplia a oferta de casas definanciamento problemático no mercado, o que baixa ainda mais os preços. Quando os bancos têm maisempréstimos problemáticos, seus gestores precisam alocar mais pessoal para encontrar soluções para osempréstimos em andamento ou para retomar imóveis que tiverem grandes atrasos na quitação de seus financiamentos, em vez de originar novos empréstimos. A correlação entre os preços das casas e ativos bancários problemáticos é alta e negativa. Os problemas, para os bancos, invariavelmente crescem durante e depois de uma recessão. A soma da produção de bens e serviços em um país é conhecido como Produto Interno Bruto (PIB). Em uma economia expansionista, aumenta a demanda por casas, dada a expectativa dos indivíduos de serem capazes de arcar com os pagamentos de empréstimos contratuais para financiar uma casa. Quando a economia está crescendo mais rapidamente, empregos são criados, a renda pessoal disponível aumenta e aconfiança dos consumidores cresce. A correlação entre crescimento do PIB e os preços das casas é alta epositiva. Dada a medida abrangente do crescimento mensurado pelo PIB, não é de surpreender que fatores inter-relacionados, como a renda pessoal disponível ou variações do patrimônio líquido do agregado familiar, exibam relações comparáveis. Quando o valor dos bens cresce mais do que os passivos, as famílias sentem-se mais ricas e mais propensas a assumir obrigações financeiras adicionais. Aumenta, assim, a probabilidade de os banqueiros concederem crédito a pessoas físicas que possuam ativos adicionais de maior valor. Durante o período de 25 anos analisado, o patrimônio líquido pessoal nos EUA cresceu à taxa média de 5,4% ao ano. O patrimônio líquido declinou em quatro anos durante o quarto de século avaliado, findo em 2008, quando o patrimônio líquido mergulhou quase 20%, à medida que os preços, tanto dos imóveis como das ações, despencaram durante a forte recessão, na esteira do estouro da bolha habitacional. Tanto a renda como ariqueza pessoais são correlacionadas com a propensão a constituir novas famílias, o que também gera um incremento na demanda por bens imobiliários. À medida que as pessoas saem da casa dos pais após concluírem os estudos, casam-se ou se divorciam, ou mudam-se para imóveis onde viverão sua aposentadoria, a demanda por bens duráveis e imóveis cresce. O crescimento do número de famílias aumenta a demanda por imóveis. O crescimento da rendapessoal disponível e o aumento da riqueza líquida pessoal convertem a demanda por casas em demandaefetiva, assumindo que os bancos estejam dispostos a - e tenham condições de - oferecer crédito a preçosacessíveis. A correlação entre os preços das casas e a formação de agregados familiares é alta e positiva. À medida que as construtoras de casas preveem o aumento da demanda por propriedades, os incorporadores adquirem mais terrenos ou destroem propriedades em áreas existentes subutilizadas ecriam novas propriedades em condições edificáveis. As construtoras muitas vezes projetam a demandafutura extrapolando as vendas e os preços baseados em experiências recentes e constroem casas em número superior ou inferior à demanda, pois o crescimento do número de famílias e as condições dademanda efetiva mudam rapidamente. As construtoras colocam novas propriedades no mercado quando as projeções dos gestores sinalizam que a demanda continuará suficiente para que as propriedades sejam vendidas rapidamente com lucro. Famílias e investidores procuram comprar propriedades rapidamente quando os preços estão em alta e as projeções indicam que subirão ainda mais. Seria de prever que a oferta adicional criada pelas construtoras resultasse no barateamento dos imóveis. No entanto, as iniciativas das construtoras exacerbam as tendências dos preços das casas, que depois caem, porque um número excessivo de novas casas está à venda. A correlação entre os preços das casas e o início de construção de novas residências é muito alta epositiva. Depois que os preços das casas nos EUA começaram a despencar, em 2007, ocorreu o estouro da bolha habitacional. Os preços caíram cerca de 35% do pico ao vale; algumas regiões registraram quedas superiores a 50% nos preços. Alguns bancos faliram porque concederam empréstimos de alto risco a mutuários e a especuladores, ao passo que outros faliram porque originavam empréstimos de alto risco. Um punhado de instituições incorreuem grandes prejuízos por emitir swaps de risco de crédito (CDS, em inglês) vinculados a títulos lastreadosem hipotecas. Muitos investidores domésticos e internacionais sofreram graves prejuízos com títulos com classificação de crédito "AAA", quando mutuários que assumiram os financiamentos subjacentes aos títulos não conseguiram ou não quiseram honrar o pagamento de seus empréstimos contratuais e as quedas dos preços das casa precipitaram prejuízos ainda maiores devido à inadimplência. Centenas de bancos locais faliram quando empréstimos para aquisição, desenvolvimento e construção deixaram de ser honrados, e imóveis retomados por falta de pagamento passaram a ser vendidos por umapequena fração do valor financiado. A debacle poderia ter sido contida se tanto as agências regulamentadoras para o setor bancário como os banqueiros dessem mais atenção ao simplista, mas tradicional critério dos "três C do crédito" e verificassem se todos os mutuários em potencial tinham condições de honrar os pagamentos do empréstimo original eos refinanciamentos subsequentes, e investissem pelo menos entre 5% e 20% de seus próprios recursos na aquisição dos imóveis. Como resultado do cumprimento de regras prudenciais, a economia americana, os preços das casas, a riqueza pessoal e o emprego não teriam crescido tão rapidamente entre 2003 e2006, mas teria sido drasticamente menor o gasto do governo de quase US$ 3 trilhões para minimizar acrise. Não teria sido possível a Wall Street e às agências de classificação de crédito emitirem tal volume de títulos com atribuição de confiabilidade superior à real. A política pública focada em permitir que 70% dosamericanos possuíssem sua própria casa não teria sido concretizada. São os cidadãos brasileiros, e não os americanos, quem devem decidir se os preços dos imóveis em rápidaelevação em São Paulo, Brasília ou no Rio de Janeiro significam uma bolha que estourará. Os preços das casas aumentam quando a demanda por propriedades pode ser honrada com dinheiro proveniente de umarenda permanente que está crescendo e da classe média, que está aumentando. A economia e a classemédia brasileira continuarão em expansão à medida que empregos serão criados devido aos investimentosem petróleo, manufatura, Copa do Mundo e Olimpíada. O crescimento econômico é coerente com o encarecimento das moradias. O Brasil tem incentivado a compra de casas próprias pela população de baixa renda com o programa Minha Casa Minha Vida. A política pública brasileira é compatível com o encarecimento das casas. Embora o volume de financiamentos para aquisição de casas próprias no Brasil ainda seja muito baixo em relação ao PIB, o ritmo desses empréstimos cresceu de forma rápida e coerente. Tendo em vista que mais pessoas passam a ter casas próprias devido ao acesso ao crédito, ao crescimento econômico e a políticas públicas favoráveis, a demanda por madeira, concreto, cobre e outros materiais de construção aumenta eos preços sobem, o que provoca o encarecimento das casas. Há muitas semelhanças entre a bolha no mercado habitacional americano e o brasileiro, exceto por uma diferença muito importante. Financiamentos de casas são concedidos cautelosamente pelos bancos, no Brasil, e em grande parte permanecem nas carteiras dos próprios bancos, em vez de serem vendido ereempacotados na forma de títulos lastreados em hipotecas. Os brasileiros deveriam preocupar-se com uma possível bolha se os bancos começarem a comercializar novas estruturas financeiras de alto risco que minimizem as prestações iniciais dos financiamentos, reduzam o valor da entrada (inicial, não financiável), não exijam comprovação de renda ou de propriedades e se osempréstimos originados sejam vendidos no mercado secundário. Os custos públicos e privados decorrentes de ignorar tais sinais podem ser enormes. (Tradução Sérgio Blum) William Handorf é professor de finanças na Faculdade de Administração da Washington University e diretor do Federal Home Loan Bank of Atlanta. Foi diretor do Federal Reserve de Richmond. Este é o primeiro de uma série de artigos feitos por renomados economistas brasileiros e estrangeiros convidados pelo Valor para discutir a crise financeira internacional e avaliar seus possíveis desdobramentos. |
Origem, causas e impacto da crise
Autor(es): José Luis Oreiro |
Valor Econômico - 13/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/13/origem-causas-e-impacto-da-crise/?searchterm=Valor%20para%20discutir%20a%20crise%20financeira%20internacional%20e%20avaliar%20seus%20poss%C3%ADveis%20desdobramentos |
A crise financeira de 2008 foi a maior da história do capitalismo desde a grande depressão de 1929. Começou nos Estados Unidos após o colapso da bolha especulativa no mercado imobiliário, alimentada pelaenorme expansão de crédito bancário e potencializada pelo uso de novos instrumentos financeiros, a crise financeira se espalhou pelo mundo todo em poucos meses. O evento detonador da crise foi a falência do banco de investimento Lehman Brothers no dia 15 de setembro de 2008, após a recusa do Federal Reserve(Fed, banco central americano) em socorrer a instituição. Essa atitude do Fed teve um impacto tremendo sobre o estado de confiança dos mercados financeiros, rompendo a convenção dominante de que aautoridade monetária norte-americana iria socorrer todas as instituições financeiras afetadas pelo estouro da bolha especulativa no mercado imobiliário. O rompimento dessa convenção produziu pânico entre as instituições financeiras, o que resultou numaumento significativo da sua preferência pela liquidez, principalmente no caso dos bancos comerciais. Oaumento da procura pela liquidez detonou um processo de venda de ativos financeiros em larga escala, levando a um processo Minskiano de "deflação de ativos", com queda súbita e violenta dos preços dosativos financeiros, e contração do crédito bancário para transações comerciais e industriais. A "evaporação do crédito" resultou numa rápida e profunda queda da produção industrial e do comércio internacional em todo o mundo. Ampliar imagem Com efeito, no último trimestre de 2008 a produção industrial dos países desenvolvidos experimentou umaredução bastante significativa, apresentando, em alguns casos, uma queda de mais de 10 pontos base com respeito ao último trimestre de 2007. Mesmo os países em desenvolvimento, que não possuíam problemas como seus sistemas financeiros, como o Brasil, também constataram uma fortíssima queda na produção industrial e no Produto Interno Bruto (PIB). De fato, no caso brasileiro, a produção industrial caiu quase 30% no último trimestre de 2008 e o PIB apresentou uma contração anualizada de 14% durante esse período.As bolhas e a fragilidade financeira nasceram do capitalismo neoliberal adotado a partir dos anos 70. Os governos dos países desenvolvidos responderam a essa crise por meio do uso de políticas fiscal emonetária expansionistas. O Fed reduziu a taxa de juros de curto prazo para 0% e aumentou o seu balançoem cerca de 300% para proporcionar liquidez para os mercados financeiros nos EUA. Políticas similares foram adotadas pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo Banco do Japão. Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama conseguiu aprovar uma expansão fiscal de quase US$ 800 bilhões para estimulara demanda agregada. Na área do euro, os governos foram liberados das amarras fiscais do Tratado de Maastricht, sendo autorizados a aumentar os déficits fiscais além dos limites impostos pelo Tratado em consideração. Esforços similares foram realizados no Reino Unido e nos países em desenvolvimento. Na China, por exemplo, o governo aumentou o investimento público - fundamentalmente em infraestrutura- em mais de US$ 500 bilhões com o intuito de manter uma elevada taxa de crescimento econômico. No Brasil, a expansão fiscal começou antes da expansão monetária devido a um "comprometimento irracional" do Banco Central (BC) com um regime de metas de inflação muito rígido. Nesse contexto, o governo Lulaaprovou um pacote de estímulo fiscal no fim de 2008, constituído de aumento do investimento público, redução de impostos e aumento do salário mínimo e do seguro desemprego. A redução da taxa de juros começou apenas em janeiro de 2009, após o colapso da produção industrial e da disseminação de rumores quanto a possível demissão do presidente do BC. Como resultado da demora no relaxamento na políticamonetária, o PIB declinou 0,7% em 2009. Apesar da forte queda da produção industrial e do PIB tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, a severidade da crise de 2008 ficou muito aquém dos resultados catastróficos verificados na década de 1930. No fim de 2009, a economia americana começou a apresentar sinais positivos derecuperação, apontando para um crescimento modesto em 2010. França e Alemanha saíram da recessão técnica em meados de 2009, o mesmo ocorrendo com o Reino Unido no último trimestre desse ano. Os países em desenvolvimento tiveram um desempenho econômico muito superior ao dos países desenvolvidos durante a crise. O crescimento econômico da China foi de 8,5% em 2009, mostrando uma pequena redução com respeito a 2008, quando a economia cresceu 9%. A performance econômica da Índiatambém foi boa. Após uma expansão de 7,3% do PIB em 2008, o crescimento foi reduzido para 5,4% em 2009. A performance econômica do Brasil durante a crise não foi tão boa como a da China e da Índia. Após um crescimento robusto de 5,1% em 2008, o PIB caiu 0,7% em 2009. Em 2010, contudo, a economiabrasileira apresentou uma forte recuperação, apresentando um crescimento econômico superior a 7%.Entre os Brics, apenas a Rússia apresentou uma queda forte do nível de atividade econômica. Com efeito, o PIB da Rússia caiu 7,5% em 2009, após um crescimento de 5,6% em 2008. O regime de crescimento "wage-led" foi substituído por um "finance-led". A intensidade da crise financeira de 2008 coloca duas questões fundamentais para os economistas eformuladores de política econômica. A primeira questão se refere às origens da crise. A segunda se refere às consequências dessa crise para a economia mundial. Sobre essas questões se formou uma "sabedoriaconvencional", a qual será detalhada na sequência, mas que apresenta respostas essencialmente incorretaspara as mesmas. No que se refere à primeira questão a "sabedoria convencional" afirma que a crise financeira de 2008 foiapenas o resultado de uma regulação financeira inadequada, combinada com uma política monetária muito frouxa conduzida pelo Fed durante a administração Greenspan. Se assim for, então não será necessária aimplementação de políticas que revertam a tendência ao aumento da desigualdade na distribuição de rendanos países desenvolvidos, verificada nos últimos 30 anos. Uma mudança limitada na regulação financeira e aredefinição do regime de metas de inflação de maneira a incluir a estabilização dos preços dos ativos financeiros como um dos objetivos da política monetária, por intermédio de uma espécie de "regra deTaylor ampliada", seria suficiente para evitar uma nova crise financeira no futuro. No que se refere à segunda questão, a "sabedoria convencional" estabelece que a crise de 2008 foi apenas um desvio temporário no curso normal de eventos (um momento Minsky), de tal forma que, no futuro próximo, as economias capitalistas irão retomar a trajetória de crescimento observada antes da crise. O crescimento mundial poderá ser novamente puxado pela expansão de crédito nos Estados Unidos e apolítica econômica poderá voltar a ser conduzida com base no assim denominado "novo consenso macroeconômico", o qual estabelece que o objetivo fundamental, se não o único, da políticamacroeconômica é a estabilidade da taxa de inflação. A crise financeira de 2008 não foi apenas o resultado da combinação perversa entre desregulação financeirae política monetária frouxa. Essas são apenas as causas próximas da crise. Mas existe uma causa mais fundamental, qual seja: o padrão de capitalismo adotado nos Estados Unidos e na Europa a partir do final dadécada de 1970, o qual pode ser chamado de "capitalismo neoliberal". Entre 1950 e 1973, as economias capitalistas avançadas vivenciaram uma "época de ouro" de crescimento econômico, no qual a distribuição pessoal e funcional da renda era progressivamente mais equitativa, a taxa de acumulação de capital era mantida em patamares elevados devido à existência de um ambiente macroeconômico estável (inflação baixa, juros baixos, taxas de câmbio estáveis) e forte expansão da demanda agregada. Além disso, a taxade desemprego era inferior a 4% da força de trabalho em quase todos os países desenvolvidos (exceto, curiosamente, nos Estados Unidos). Durante esse período, os mercados financeiros eram pesadamenteregulados, a movimentação de capitais entre as fronteiras nacionais era bastante restrita, as taxas decâmbio eram fixas com respeito ao dólar americano e os salários reais cresciam aproximadamente ao mesmo ritmo da produtividade do trabalho. A combinação entre estabilidade macroeconômica, crescimento acelerado e baixo desemprego permitia queos governos dos países desenvolvidos operassem com baixos déficits fiscais e uma dívida pública reduzidacomo proporção do PIB. O "Estado do Bem-Estar Social" não representava um fardo para as contas públicas. Esse "capitalismo socialmente regulado" apresentava um regime de crescimento do tipo "wage-led", ou seja, um regime no qual o crescimento dos salários reais (num ritmo igual à produtividade do trabalho) permitia uma forte expansão da demanda de consumo, a qual induzia as firmas a realizar um volumeelevado de investimentos na ampliação de capacidade produtiva, ao mesmo tempo em que mantinha as pressões inflacionárias relativamente contidas devido à estabilidade do custo unitário do trabalho. Com o colapso do Sistema de Bretton Woods e os choques do petróleo em 1973 e 1979, o ambientemacroeconômico muda radicalmente e o mundo desenvolvido passa a conviver com o fenômeno da"estagflação". Esse ambiente macroeconômico permitiu o ressurgimento daquelas doutrinas liberais. Após a eleição de Margareth Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos Estados Unidos, as políticaseconômicas nos países desenvolvidos foram progressivamente pautadas pelos motes da desregulação, privatização e redução de impostos. Os mercados financeiros foram liberalizados, os controles de capitais foram abolidos nos países desenvolvidos e os impostos foram reduzidos, principalmente sobre os mais ricos. Os sindicatos de trabalhadores foram deliberadamente enfraquecidos pelas políticas adotadas por Reagan e Thatcher, registrando-se uma forte redução da filiação sindical da força de trabalho. O resultado macroeconômico desse novo "padrão de capitalismo" foi uma crescente desigualdade nadistribuição funcional e pessoal da renda, a medida que os salários passaram a crescer num ritmo bem inferior ao da produtividade do trabalho e o sistema tributário perdeu, em vários países, o seu caráter progressivo. O aumento da concentração de renda e o crescimento anêmico dos salários reais foi o responsável pela perda do dinamismo endógeno dos gastos de consumo, notadamente nos Estados Unidos, os quais passaram a depender cada vez mais do aumento do endividamento das famílias para a suasustentação a médio e longo prazo. Nesse contexto, a desregulação dos mercados financeiros tornou-se funcional, uma vez que a mesmapermitiu um aumento considerável da elasticidade da oferta de crédito bancário, viabilizando assim o crescimento do endividamento das famílias, necessário para a sustentação da expansão dos gastos deconsumo. O aumento extraordinário do crédito bancário resultou num processo cumulativo de aumento dos preços dos ativos reais e financeiros, permitindo assim a sustentação de posturas financeiras cada vez mais frágeis (especulativa e Ponzi) por parte das famílias, empresas e bancos. O regime de crescimento "wage-led" fora substituído por um regime "finance-led". Daqui se segue que no "capitalismo neoliberal" as bolhas e a fragilidade financeira não são "anomalias" no sistema, mas parteintegrante do seu modus operandi. No que se refere à tese de que a crise de 2008 seria apenas um desvio temporário da trajetória decrescimento de longo prazo das economias capitalistas, os eventos ocorridos depois de 2009 parecemapontar claramente para a falsidade dessa conjectura. Com efeito, a crise de 2008 não foi apenas um "curto circuito" na máquina capitalista, o qual poderia ser corrigido por intermédio da intervenção do Estado no "mecanismo de ignição" das economias capitalistas. Isso porque o regime de crescimento do tipo "finance-led" teve como contrapartida uma elevação significativa do endividamento do setor privado nos anos anteriores a crise de 2008. Considerando apenas os países da área do euro, constatamos que entre 1997 e 2008, a dívida dasempresas não financeiras passou de 250% para 280% do PIB, o endividamento dos bancos aumentou de190% para 250% do PIB e o endividamento das famílias aumentou em quase 50%. Após o colapso do Lehman Brothers o setor privado nos países desenvolvidos iniciou um processo de"deflação de dívidas", no qual a "propensão a poupar" dos agentes privados é aumentada com o intuito depermitir uma redução do estoque de endividamento. Esse aumento da propensão a poupar do setor privadoatuou no sentido de anular (parcialmente) o efeito sobre a produção e o emprego do aumento dos déficits fiscais. O resultado combinado do aumento da propensão a poupar do setor privado e redução da poupança do setor público foi uma pequena recuperação do nível de atividade econômica e uma "socialização na prática" de parcela considerável da dívida privada, transferida agora para o setor público. Essa "socialização das dívidas privadas" é uma das causas da crise fiscal da área do Euro, a qual, na ausência de uma monetização parcial do endividamento do setor público dos países por ela afetados, irá resultar em vários anos decontração fiscal, retardando assim a recuperação econômica do mundo desenvolvido. A perspectiva para os países da área do Euro (e em menor medida para os Estados Unidos) é de vários anos de estagnaçãoeconômica. Em suma, a crise financeira de 2008 foi o resultado do modus operandi do "capitalismo neoliberal" implantado no final da década de 1970 e os seus efeitos sobre o nível de produção e de emprego nos países desenvolvidos serão duradouros devido ao elevado endividamento do setor privado, gerado por um regime de crescimento do tipo "finance-led". José Luís Oreiro Professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, diretor da Associação KeynesianaBrasileira e co-editor do livro "The financial crisis: origins and implications", Palgrave Macmillan, 2011. Este é o segundo de uma série de artigos feitos por renomados economistas brasileiros e estrangeiros convidados pelo Valor para discutir a crise financeira internacional e avaliar seus possíveis desdobramentos. |
A crise e o juro: deslocar a curva
Autor(es): Por Gustavo H. B. Franco | ||||
Valor Econômico - 14/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/14/a-crise-e-o-juro-deslocar-a-curva | ||||
Ampliar imagem A discussão sobre a natureza e extensão da crise internacional, e mesmo sobre se esta designação tão sombria serve também para o momento pelo qual passa o país, foi atropelada pela decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de 31 de agosto que, para alguns, decretou o fim do regime de metas para a inflação. Os membros do comitê, nas justificativas para a decisão, colocam o Banco Central (BC) um tanto ardilosamente ao lado da prudência, pois se antecipam não apenas aos analistas que acompanham o desenrolar dos eventos europeus, como à própria crise, deixando a forte impressão de que os senhores do Copom sabem mais do que o mercado sobre o que se passa nos subterrâneos bancários da Europa. Na verdade, este é o aspecto mais inquietante da decisão: o que o presidente Tombini teria ouvido em Jackson Hole (onde esteve na semana anterior à decisão, junto com os dirigentes de outros BCs do mundo inteiro)? O que tem conversado com seus colegas no exterior? Estamos no limiar de decisões importantes na Europa, tendentes a produzir turbulência nos mercados? Ou será que estamos apenas provocando a chuva ao vestir-nos para ela? Esses mistérios - e não há quem se atreva a contestar o tamanho dos riscos de que fala o nosso BC - suspenderam as considerações habituais que compõem a liturgia do regime de metas e o suspense foi ainda mais ampliado pela discreta ofensiva de imprensa por parte de altos escalões da República procurando estabelecer a firme intenção governamental de melhorar as contas fiscais com o intuito de abrir espaço para a redução de juros. Este é um raciocínio novo, talvez mesmo revolucionário, para um governo que procura, frequentemente de forma debochada, se distanciar de tudo que pareça convencional no terreno da política macroeconômica. Em princípio, a tese, segundo a qual a melhora na situação fiscal representa o caminho para a convergência dos juros brasileiros para níveis internacionais, não tem nada que ver com a crise, mas parece prevalecer a noção de que perdemos uma oportunidade em 2008, quando podíamos ter explorado este caminho mais a fundo e não o fizemos por conta das gabolices pseudo-keynesianas e de uma gastança de motivação eleitoral. Assim sendo, uma nova crise internacional traria, quem sabe, a chance de jogar novamente esta mão, e fazer a coisa certa desta vez. É preciso, todavia, não esquecer que as circunstâncias de 2008 foram muito singulares, e que não existem duas crises iguais. Em 2008 o choque deflacionista sobre as commodities foi tão forte que, mesmo com a desvalorização cambial, os índices de preço por atacado assinalaram quedas e os juros puderam ser reduzidos sem qualquer ofensa ao sistema de metas. O colapso nas commodities foi uma espécie de "bônus" (tratando-se de inflação, evidentemente) que não parece se repetir desta vez. Na verdade, se as commodities resistirem, bem como o nível de atividade local, o panorama inflacionário será radicalmente diferente daquele de 2008, de modo que será fundamental o trabalho na melhoria das contas públicas para abrir espaço para a queda nos juros. É meio surpreendente que o governo tenha, afinal, abraçado a tese da convergência dos juros, se é que realmente o fez. A tese, na verdade, contradiz frontalmente as falas do ministro da Fazenda sobre os assuntos fiscais, mas nem mesmo ele parece se importar. É curioso vê-lo amuado, em seu novo papel, mais forte, falando de medidas de contenção fiscal, com o sotaque carregado que é próprio dos estrangeiros a estas práticas. Mas é simpático, como brasileiro naturalizado, que alega ser mais brasileiro do que os nativos, porque escolheu esta condição. Mas será mesmo verdadeira esta nova prioridade para os resultados fiscais, considerando todas as ambições de investimento declaradas ou mesmo já contratadas, as promessas com relação ao salário mínimo e o tanto de argamassa necessária para manter unida a base governista? Enquanto não se tem certeza sobre o que realmente se passa, seja na Europa, seja nas mentes das autoridades brasileiras no capítulo das contas públicas, a explicação mais fácil para a decisão de 31 de agosto continua a ser a doutrina Costa e Silva: o Palácio assumiu as rédeas da política monetária, na linha da célebre bravata do general presidente, que, a propósito das funções do Banco Central e do destino do primeiro presidente do BC, Dênio Nogueira, teria dito: "O guardião da moeda sou eu". Em termos estritamente formais, pouca coisa mudou desde então: é a presidente da República quem detém o poder sobre a política monetária, pois a sistemática de metas para a inflação foi criada por um decreto, isto é, por um ato presidencial, e todos os membros do Conselho Monetário Nacional (CMN), o órgão que possui a competência para formular a política monetária seguindo as diretrizes da presidência, são ministros de Estado que devem obediência à presidente. Mas é tão fácil como enganoso deixar-se levar por especulações sobre um novo modelo de relacionamento entre a presidente e seu banco central. É sempre mais sensato assumir que atores nesse jogo têm bom senso, e nenhum presidente da República com este atributo há de cogitar acumular as duas presidências. A maior parte das coisas que o BC faz é de natureza restritiva, é sempre melhor que sejam executadas por alguém distante da presidência da República. Especialmente quando o governo pode estar passando por uma espécie de indigestão de fisiologia em seu relacionamento com o Legislativo, ou pela sensação de que a coalizão governista se tornou tão pesada e cara que o governo Dilma corre o risco de sucumbir às exigências da governabilidade. Adicionalmente à ameaça de faxina, uma carta difícil de ser jogada por inteiro, faria muito sentido que uma urgência externa servisse como pretexto para o Executivo diminuir as benesses para todos de forma horizontal. O bom senso indicará à presidente que é muito mais fácil negociar com o Parlamento quando os cintos estão mais apertados. Indicará também que não há keynesianismo acadêmico que consiga resguardar sua inocência ao ver-se diante das demandas da base aliada. A decisão do BC veio ao encontro a outro debate sobre se já não estava na hora de deslocar o trade-off entre juros e atividade econômica, decorrente da aplicação da mecânica de metas para a inflação. Os presidentes (da República), sem exceção, detestam fazer escolhas, preferem decisões econômicas que se resolvem sozinhas, e diante de dilemas difíceis trazidos pelos seus economistas, sempre querem mudar os termos do problema. Traduzindo para o economês: eles nunca querem andar ao longo das curvas, dando alguma coisa em troca de algo que querem, mas querem sempre deslocá-las, na ilusão de que podem ganhar o que querem sem nada perder. E pode ser exatamente isso o que está se passando com os juros no Brasil. Há um inconformismo legítimo e crescente com a naturalidade com que se pratica, há vários anos, juros de 10% ou 12% anuais para a taxa Selic, equivalentes a juros reais superiores a 5% ao ano, para não falar em compulsórios e direcionamentos que ampliam o "spread" bancário e fazem as taxas para o crédito serem ainda mais absurdas. Será que não está mesmo na hora de atacar os fatores que efetivamente fazem do Brasil o campeão mundial de juros? Não teríamos permanecido tempo demais achando que podíamos praticar metas de inflação tal como na Nova Zelândia, como se os juros "neutros", ou "de longo prazo", no Brasil, não fossem inaceitavelmente altos? Ao pretendermos que isto era a normalidade, para não falar em "spreads" bancários e no custo do crédito, não teríamos provocado a presidência a determinar que seus economistas mudem "os termos do problema", com todos os riscos aí envolvidos e sem ter ainda os fundamentos fiscais alinhados? Para melhor entender os dilemas assim colocados, e sua recorrência histórica, é interessante observar um gráfico simples através do qual podemos enxergar tanto os dilemas brasileiros da época da hiperinflação quanto os de hoje, bastando trocar a variável do eixo vertical no gráfico. Se medirmos a inflação no eixo vertical e o desemprego no eixo horizontal, a reta negativamente inclinada no gráfico é a famosa Curva de Phillips, que estabelece a relação negativa entre inflação e desemprego, ou o quanto de desemprego é necessário para reduzir um tanto de inflação. O drama brasileiro no passado inflacionário residia no fato de que esta curva estava "muito alta". O intercepto no eixo vertical era interpretado como a "inflação passada", que determinava a "altura" da curva. Caminhar ao longo da curva parecia um despropósito, pois seriam necessárias recessões cavalares para obter resultados relevantes no combate à inflação. Esta era a crítica procedente e recorrente às "políticas de estabilização ortodoxas". Foi este o problema que motivou políticos e economistas a estudar maneiras de "deslocar a curva" para baixo, e com este propósito entramos no terreno dos mecanismos institucionais de coordenação, das "políticas de rendas", da administração centralizada da correção monetária, das pré-fixações e suas variantes. Assim começou a era dos pacotões. Foram muitas tentativas desastradas de "deslocar a curva" via congelamentos, e muitas teorias tolas e sedutoras sobre a natureza inercial da inflação, até chegarmos ao Plano Real. Foi um longo e penoso aprendizado, muitos pacotes foram piores que o mal que procuravam combater, a história é bem conhecida. Pois bem, os contornos do drama atual em torno dos juros são tão parecidos que podemos usar exatamente o mesmo gráfico para descrevê-lo, basta medir os juros nominais no eixo vertical, em vez da inflação, e reparar que a curva, agora, é a que se conhece como Regra de Taylor, a relação que descreve o modo como os juros são fixados pelo BC no âmbito do sistema de metas para diferentes níveis de desemprego. Quanto mais alto o desemprego, menor os juros fixados pelo Banco Central. São várias as estimativas econométricas para esta relação no Brasil, das quais são retirados os parâmetros básicos para a resposta do nível de atividade aos movimentos nos juros, sua estrutura de defasagens, e também as estimativas para a "taxa de juros de equilíbrio de longo prazo", ou a "taxa neutra", vale dizer, a taxa i* no gráfico, que vigora quando o desemprego está no nível, que supomos ser U*, onde não pressiona a inflação. Pois bem, as estimativas para o Brasil chegam a números entre 7,7% e 10% para esta "taxa de juros real de longo prazo"1, números que em hipótese alguma deveriam ser considerados normais. Na verdade, a despeito dessa evidência, o efetivo comportamento da taxa de juros parece revelar uma clara tendência gradual de queda da "taxa neutra", a despeito das oscilações determinadas pela operação do sistema de metas, sugerindo a existência de outros fatores, ou de outro teatro de operações onde se pode trabalhar o problema da "taxa de juros real de longo prazo". O fato é que, durante os últimos anos, não tem havido qualquer reflexão sobre "deslocar a curva" talvez porque os interessados não queriam que essa discussão fosse interpretada como uma crítica ao regime de metas, exatamente como antigamente, quando os economistas tinham receios que as fórmulas para deslocar a Curva de Phillips decaíssem para um experimentalismo heterodoxo, como de fato ocorreu. Entretanto, o silêncio dos economistas (com honrosas exceções2) diante do problema dos juros produziu uma perigosa impaciência acumulada entre as lideranças políticas no Congresso e do Executivo, todos ansiosos por alguma fórmula para destravar o assunto. A ansiedade atingiu tal ponto que o Executivo admite até mesmo reduzir despesa para abrir espaço para "deslocar a curva". Essas observações podem tornar mais compreensível a decisão recente do BC, contudo, deixam mais claros os riscos do movimento. Se a cavalaria do ajuste fiscal estiver logo atrás da autoridade monetária, uma ofensiva que parecia temerária em seus primeiros contornos passará a fazer parte dos anais do heroísmo militar. Se números em um patamar convincentemente melhor para o superávit primário de fato se materializarem, esta redução de juros poderá abrir espaço para um círculo virtuoso como o que começou em 2003 e pelo qual, uma vez mais, um governo petista trilharia com sucesso os caminhos ortodoxos que a história lhe oferece como oportunidade a despeito de inconsistentes com a sua retórica anterior. Entretanto, como o histórico da nossa cavalaria fiscal é péssimo, e diversas vezes o BC foi abandonado à sua própria sorte em batalhas associadas à estabilização, sobretudo quando o trabalho a ser feito é no plano fiscal, não há muita razão para otimismo. Isso para não falar da fé das nossas autoridades econômicas, que aponta para outras direções. As consequências da combinação entre redução de juros e desajuste fiscal será a de nos colocar em território argentino, com um crescimento meio confuso, com uma inflação de dois dígitos e testando tolerância da sociedade brasileira a um patamar superior de inflação. Talvez a nossa presidente tenha ouvido lições de sua colega mais ao Sul: esse trauma todo com a inflação é uma fabricação dos economistas neoliberais, veja a minha popularidade, teria dito Cristina para Dilma. O fato é que esta é apenas a primeira tentativa explícita de se "deslocar a curva" em divergência com a abordagem gradualista dos últimos anos. Vale lembrar que as tentativas de se deslocar a Curva de Phillips apenas funcionaram depois da oitava tentativa, e os custos do aprendizado sob a forma dos choques heterodoxos foram terríveis. Espero que o Brasil não esteja no início de uma nova fase de improviso e experimentação no terreno monetário, no âmbito da qual, parafraseando Churchill, vamos certamente chegar à fórmula correta, mas não sem antes experimentar todas as outras. 1 João José Silveira Soares e Fernando de Holanda Barbosa ("Regra de Taylor no Brasil: 1999 - 2005", Encontro Anual da ANPCE, 2006) encontram valores entre 8% e 10%. Fabia A. de Carvalho e André Minella ("Previsões de Mercado no Brasil: desempenho e determinantes" em Banco Central do Brasil, Dez Anos de Metas para a Inflação - 1999-2009 Brasília: Banco Central do Brasil, 2011, p. 214) encontram o valor de 7,7% para a taxa de juros real de equilíbrio. Ilan Goldfajn e Aurelio Bicalho ("A longa travessia para a normalidade: os juros reais no Brasil" em Edmar L. Bacha e Monica B. de Bolle (orgs.), Novos Dilemas da Política Econômica Ensaios em Homenagem a Dionísio Dias Carneiro IEPE/CdG, GEN LTC, Rio de Janeiro, 2011) estimam a taxa de juros real de longo prazo em 8,0%. 2 Um exemplo representativo é o trabalho de Edmar Bacha, o mais recente "Além da tríade: como reduzir os juros?" em Bacha & Bolle, op. cit.. Gustavo Franco, sócio fundador da Rio Bravo Investimentos e ex-presidente do Banco Central (BC). Este é o terceiro de uma série de artigos feitos por renomados economistas brasileiros e estrangeiros convidados pelo Valor para discutir a crise financeira internacional e avaliar seus possíveis desdobramentos. O Brasil frente ao recrudescimento da crise internacional
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O privilégio exorbitante dos EUA
Autor(es): Por Michael Pettis |
Valor Econômico - 15/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/15/o-privilegio-exorbitante-dos-eua |
Certa vez, um economista francês me disse que, muito frequentemente, os planejadores econômicos franceses pensam que estão falando de economia, quando na verdade estão falando de política. Talvez um caso em questão seja a afirmação, feita pela primeira vez por Valéry Giscard d"Estaing, em 1965, de que o domínio do dólar americano como moeda global de reserva deu aos Estados Unidos um "privilégio exorbitante". Giscard não estava falando de privilégios econômicos, embora ele pudesse ter pensado que estava. Durante a Guerra Fria, o status dominante do dólar proporcionou vantagens políticas, mas ao contrário da crença popular os privilégios econômicos foram poucos para os Estados Unidos. No entanto, o dólar proporcionou benefícios importantes aos parceiros comerciais que se dispunham a tirar proveito do sistema. Também levou, várias vezes - mais recentemente na última década -, a desequilíbrios comerciais e de capital que criaram um sério risco para o sistema financeiro global. Para eliminar esses riscos será necessário reformar o sistema cambial global - por exemplo, substituindo o dólar pelos Special Drawing Rights (SDRs, ou direitos especiais de saque) do Fundo Monetário Internacional (FMI), conforme vêm defendendo o Brasil, França, Alemanha, China, Rússia e outros países. No entanto, as consequências não serão as que eles esperam. Apesar de toda a discussão animada de políticos e jornalistas (e dos ocasionais generais chineses), a substituição do dólar provavelmente significaria um crescimento mais acelerado e menos dívida para os Estados Unidos. Mas isso ocorreria às custas de um crescimento menor, especialmente para a Ásia e o mundo em desenvolvimento. Isso fica claro quando examinamos o impacto do acúmulo de reservas no comércio internacional. Segundo a maioria dos comentaristas políticos, há dois "privilégios" principais para os Estados Unidos como consequência do status do dólar de moeda de reserva. Primeiro, ele permite aos EUA consumir além do que pode. Segundo, como os bancos centrais estrangeiros precisam comprar bônus do governo dos EUA para manter como reserva, a taxa de juros sobre os bônus do Tesouro americano é menor do que de outra forma seria. As duas alegações são confusas. Pegue a primeira. Pode ser correto dizer que a função do dólar permite aos americanos consumir além de seus meios, mas também é correto dizer (provavelmente mais) que o acúmulo de dólares por estrangeiros força os americanos a consumir além do que eles podem. Será que os estrangeiros podem realmente fazer isso? Muitos comentaristas, e até mesmo economistas, vão rejeitar esse argumento com uma afirmação curta a grossa: "Ninguém coloca uma arma na cabeça do consumidor americano e o força a comprar qualquer coisa". Mas isso apenas mostra o quanto eles estão confusos com as limitações do balanço de pagamentos. A balança comercial de um país não é simplesmente um resíduo da atividade doméstica, mesmo para uma grande economia como os EUA. Ela é determinada em parte pelas políticas e condições domésticas, mas também pelas políticas e condições internacionais, e, neste último caso, isso afeta diretamente as relações entre o consumo e a poupança. Como assim? Quando um banco central compra grandes quantidades de dólares ao mesmo tempo em que contém os bancos domésticos, ele automaticamente aumenta a poupança nacional. Se essas economias superam os investimentos domésticos, o país precisa exportar economias para fora (e assim automaticamente fica com um superávit em conta corrente). Mas, em termos globais, a poupança e os investimentos precisam se equilibrar, de modo que se a taxa global de investimento não subir, a taxa de poupança de seus parceiros comerciais precisa cair. Isso vai acontecer gostem ou não os parceiros comerciais, a menos que eles intervenham um após o outro em igual medida. Poupanças estrangeiras maiores podem deprimir a poupança nos EUA? Vamos supor, por exemplo, que, de uma hora para outra, o Banco da Inglaterra decida intervir na libra comprando centenas de bilhões de dólares em bônus do governo dos EUA e limita a compensação dos fluxos de capital. A taxa de poupança da Inglaterra aumentaria dramaticamente, uma vez que o consumo doméstico seria afetados pelos custos de importação maiores e os fabricantes beneficiados com o aumento da competitividade internacional. Seu déficit comercial passaria a superávit com a queda do valor da libra. Mas a história não termina aqui. Como o Banco da Inglaterra estaria comprando dólares, o déficit comercial dos EUA automaticamente aumentaria. E com o aumento do déficit comercial americano, os investimentos dos EUA aumentariam (algo improvável, uma vez que o dólar mais forte prejudica o setor industrial do país), ou a taxa de poupança cairia no país. Não há outra possibilidade - isso é simplesmente uma identidade contábil. Neste caso, as políticas do Banco da Inglaterra quase que certamente forçariam uma queda na taxa de poupança dos EUA. Os americanos poderiam fazer alguma coisa - concordando patrioticamente em aumentar a poupança reduzindo o consumo, por exemplo? Não, porque as compras pelo Banco da Inglaterra de ativos em dólar levariam de qualquer maneira a um desequilíbrio da balança comercial, e, se os americanos reduzissem o consumo, o único resultado seria um aumento maior da taxa de desemprego nos EUA. A poupança dos americanos de fato aumentaria patrioticamente, mas como a renda cairia, o volume total da poupança continuaria em queda. Quando os analistas insistem que somente convencendo os americanos a reduzir o consumo desnecessário o déficit comercial poderá ser reduzido, eles mostram que não entendem o mecanismo global de balanço de pagamentos. A taxa de poupança dos EUA - assim como de qualquer outra economia aberta - precisa responder às mudanças no equilíbrio global de poupança e investimentos. Isso segue automaticamente a maneira como o mundo se abre ao comércio e como os fluxos de capital agem. Em resumo, se seus parceiros comerciais acumulam dólares e evitam uma retaliação, os EUA precisam ter um déficit em conta corrente correspondente. A demanda total nos EUA precisa superar a produção total dos EUA. É assim que os americanos vão "consumir" mais do que podem. Então, onde está o privilégio? Peça a qualquer economista para citar as maiores fraquezas da economia americana e é quase certo que ele incluirá em sua lista o grande déficit comercial, a taxa de poupança baixa e os níveis elevados do déficit público. Na melhor das hipóteses, é o acúmulo por uma economia internacional de ativos em dólares que permite essas três condições, e, na pior das hipóteses provoca, sua deterioração. E o mundo inteiro parece saber isso, mesmo quando não entende exatamente por que. Quando recentemente certos bancos centrais começaram a diversificar suas posições para além do dólar, aumentando suas compras de bônus do governo japonês, ninguém sugeriu que o sortudo Japão estava pelo menos conseguindo participar do exorbitante privilégio americano. As compras de ienes por outros países forçariam a alta do iene, reduziriam o superávit comercial japonês e possibilitaria um aumento do consumo no Japão, em relação à produção. Certamente as autoridades japonesas não receberam bem esse privilégio. Elas começaram a vender ienes contra o dólar para reduzir o valor do iene - efetivamente convertendo aquisições internacionais de iene em aquisições de dólares. Eles resolutamente devolveram o "privilégio" para os EUA. O Brasil teve a mesma reação. As compras internacionais de bônus brasileiros levaram o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a não receber bem a participação do Brasil no privilégio exorbitante, preferindo ele reclamar das guerras cambiais. Conforme ficou claro, consumir além dos meios não é considerado um privilégio para outras economias, mesmo com muitas delas insistindo que é para os EUA. Os estrangeiros ajudam a financiar o governo dos EUA? E o segundo privilégio - as enormes aquisições de bônus do governo americano por outros países não provocam pelo menos uma queda das taxas de juros nos EUA e isso não é bom para as empresas americanas? Afinal, qualquer aumento da demanda por bônus, assumindo que não haja mudança na oferta, deve provocar uma alta nos preços dos bônus e uma queda nas taxas de juros. Mas é claro que isso pressupõe que não haja aumento na oferta, e aqui o argumento se desfaz. Lembre-se de como as compras internacionais forçam uma alta no valor do dólar e assim prejudicam o setor industrial americano, a única maneira de os EUA manterem o pleno emprego é aumentando os financiamentos imobiliários ou os empréstimos públicos (tecnicamente eles também podem aumentar a tomada de empréstimos pelas empresas para investimentos, mas isso é improvável quando o setor industrial está sendo minado pelo dólar forte). Portanto, a oferta de bônus em dólar aumenta junto com a maior demanda estrangeira por bônus em dólar. Em outras palavras, as compras de títulos de dívida dos EUA por investidores estrangeiros são automaticamente equilibradas pela dívida adicional emitida pelos americanos. Na verdade, caso se acreditar, como a maioria dos economistas, que o comércio é uma maneira mais eficiente de criar empregos do que os gastos do governo ou os financiamentos ao consumidor, a quantidade de dívida adicional americana emitida, na verdade, vai superar as compras líquidas pelos investidores estrangeiros. Na verdade, o aumento das compras pelos investidores estrangeiros de títulos da dívida americana em dólar pode levar a um aumento dos juros nos EUA. Confuso? Não precisa ficar. Outra maneira de pensar sobre isso é lembrar que um aumento nas compras líquidas de ativos americanos em dólares por investidores estrangeiros é a mesma coisa que um aumento do déficit em conta corrente dos EUA - esta é uma identidade contábil bem conhecida. Portanto, déficits comerciais maiores realmente levam a taxas de juros menores? Claramente não. Na verdade, é bem mais provável ocorrer o inverso. Os países com a balança comercial equilibrada ou com superávit comercial tendem a ter em média taxas de juros mais baixas que os países com grandes déficits em conta corrente. E o motivo é que o último caso exige um crescimento menor ou um endividamento maior. Conforme ficou claro, os EUA não precisam que investidores estrangeiros comprem bônus do governo para manter as taxas de juros baixas, mais do que precisam de um grande déficit comercial para manter os juros em baixa. A menos que os EUA estivessem famintos por capital, a poupança e os investimentos se equilibrariam com a mesma facilidade sem um déficit comercial do que com um - ou seja, pelo menos tão facilmente sem as compras por investidores estrangeiros de bônus do governo americano, do que com elas. A reforma cambial deve preceder o reequilíbrio global. O fato do mundo ter um moeda bastante líquida amplamente disponível para o comércio global é um bem comum, mas assim como todos os bens comuns, ele pode ser explorado para se obter vantagens. Quando os países usam a condição de moeda de reserva do dólar para obter vantagens comerciais, os EUA sofrem economicamente. E o que é pior, quanto maiores forem os desequilíbrios comerciais subsequentes, mais frágil o sistema financeiro global ficará e maior a probabilidade de uma crise financeira. Se o mundo quiser resolver os desequilíbrios globais, não poderá fazer isso sem resolver a questão do acúmulo de moeda. Setenta anos atrás John Maynard Keynes tentou fazer o mundo entender isso quando argumentou contra o dólar e a favor do Bancor como moeda supranacional a ser usada no comércio internacional. Ele não conseguiu e, desde então, vivemos com as consequências. As coisas estão melhorando? Na superfície parece que o mundo começa a entender a questão da moeda de reserva. Por exemplo, funcionários dos governos de muitos países falam em promover os SDRs como alternativa ao dólar, mas grande parte do raciocínio por trás disso é confuso. O mundo não mantém mais SDRs, afirma o argumento, em grande parte porque não há um mecanismo formal melhor para criar mais SDRs. Dê um jeito neste último ponto e o primeiro será resolvido. Mas não é por isso que os bancos centrais mundiais não têm SDRs. Se, no fundo, qualquer grande banco central realmente quisesse se expor aos SDRs, poderia fazer isso facilmente. Ele precisaria apenas copiar a fórmula facilmente disponível em seu próprio acúmulo de reservas. Em vez de comprar principalmente dólares, ele poderia comprar dólares, euros, libras e ienes, e talvez algum dia até mesmo yuan, segundo a fórmula de SDR. Mas os bancos centrais com a maior parte das reservas internacionais jamais farão isso se não forem forçados, e o motivo são as restrições comerciais. Ao comprar, esses bancos centrais estão implicitamente espalhando suas reservas, afastando-se do dólar em direção a essas outras moedas. Isso significa que qualquer país que tentar gerar grandes superávits comerciais acumulando reservas forçará o déficit correspondente não só à economia dos EUA, mas a outros países de acordo com o componente cambial do SDR. Mas a Europa, o Japão e outros países têm deixado bem claro que se opõem e essas práticas comerciais e vão intervir, ou ameaçam sanções comerciais para impedí-las. Em outras palavras, o mundo acumula dólares por uma razão muito simples. Somente a economia e o sistema financeiro dos EUA são grandes o suficiente, abertos o suficiente e flexíveis o suficiente para acomodar grandes déficits comerciais, e, assim, os países que querem ter grandes superávits comerciais precisam comprar dólares. Mas o custo dessa flexibilidade é o crescimento de longo prazo da economia americana e sua capacidade de administrar os níveis de endividamento. Sem uma reforma significativa na maneira como os países podem manter ativos em dólares - ou seja, restrições à capacidade do mundo de forçar os EUA a aceitarem seu "privilégio exorbitante" -, não poderá haver uma reforma significativa da economia mundial. Se o SDR vai realmente substituir o dólar como moeda dominante de reserva, isso não vai acontecer simplesmente porque há um modelo institucional mais robusto em torno do SDR. Isso somente vai acontecer porque o mundo, ou talvez os EUA, cria regras compulsórias que impedem os países de acumular dólares. Isso acontecerá em breve? Provavelmente não. Os EUA misteriosamente são contra qualquer redução do papel do dólar enquanto principal moeda de reserva, talvez porque isso seria visto como uma indicação de queda de status, e países como a China, Japão, Coreia do Sul, Rússia e provavelmente Brasil nunca abrirão mão voluntariamente das vantagens comerciais do acúmulo de dólares. Mas pelo menos poderemos abolir a frase "privilégio exorbitante". (Tradução Mario Zamarian) Michael Pettis Professor de finanças da Peking University e associado sênior da Carnegie Endowment. Este é o quarto de uma série de artigos feitos por renomados economistas brasileiros e estrangeiros convidados pelo Valor para discutir a crise financeira internacional e avaliar seus possíveis desdobramentos. |
Origens da crise e perspectivas futuras
Autor(es): Por Carlos da Silva Costa |
Valor Econômico - 19/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/19/origens-da-crise-e-perspectivas-futuras |
Quatro anos após o início da maior crise financeira desde a Grande Depressão, a estabilidade financeira mundial ainda está por ser garantida e muitos desafios políticos continuam a ser enfrentados. De fato: - A recuperação mundial não está avançando a um ritmo equilibrado; - Persistem grandes desequilíbrios no mundo; - Surgiram amplas preocupações quanto à sustentabilidade da dívida pública; - Vínculos entre os balanços patrimoniais frágeis, de governos e bancos, produziram novas tensões nos mercados financeiros, afetando particularmente a área do euro. O que aconteceu? As causas da crise financeira mundial são, agora, bem compreendidas. A partir de meados dos anos 1990, teve início uma década de crescimento econômico sustentado e baixa inflação - um período que tornou-se conhecido como a "Grande Moderação". A globalização favoreceu condições macroeconômicas benignas, criando a ilusão de um novo paradigma na economia. Baixa inflação nos preços ao consumidor aliviou a pressão sobre os bancos centrais - especialmente o Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) - no sentido de apertar a política monetária e frear o crescimento do crédito. Ao invés de se traduzir em inflação nos preços ao consumidor, a expansão do crédito decorrente de ampla liquidez e juros baixos resultaram em rápida alta nos preços dos ativos. Em particular, os juros muito baixos nos EUA promoveram rápida expansão do crédito ao consumidor e do financiamento habitacional, alimentando uma bolha imobiliária generalizada. Falhas de regulamentação e fiscalização ampliaram esses desdobramentos. Na verdade, diversos fatores relevantes explicam a magnitude da bolha financeira e as instabilidades subsequentes: - Ampla desregulamentação financeira; - Componentes pró-cíclicos em arcabouços regulatórios; - E, por fim, a falta de transparência nos mercados. A acumulação de desequilíbrios na economia americana espelhou o acúmulo de grandes desequilíbrios no mundo. Superávits em conta corrente em países emergentes, principalmente na China, foram investidos em títulos do governo dos EUA e em outros ativos de baixo risco, ampliando mais a liquidez e deprimindo os rendimentos. Isso tem incentivado os investidores a buscar rendimentos mais altos em ativos de maior risco. Na Europa, o mais significativo foi o surgimento da União Econômica e Monetária (UME), cuja perspectiva de criação fomentou uma rápida convergência das taxas de juro para os níveis vigentes na Alemanha, a partir de meados dos anos 1990. Os paises aspirantes a membros da zona do euro - especialmente aqueles com piores históricos de estabilidade - beneficiaram-se, inicialmente, de um ciclo virtuoso entre convergência nominal e a perspectiva de participação. Os esforços de consolidação fiscal e inflação mais baixa elevaram a probabilidade de participação na zona do euro (atendendo os critérios de Maastricht). A maior probabilidade de adesão facilitou a estabilidade do câmbio, a convergência dos juros para os níveis mais baixos e a melhoria dos balanços orçamentários. As ordens de grandeza foram notáveis: os juros de longo prazo em Portugal caíram de mais de 12%, em abril de 1995, para cerca de 4% em dezembro de 1998, às vésperas de o país adotar o euro. As despesas com juros caíram para menos da metade, passando de 5,6% do PIB em 1995 para 2,4% em 2005. Evoluções similares ocorreram em outros países, como Itália, Irlanda, Espanha e, com algum atraso, a Grécia. O alívio nas restrições de liquidez resultou em grande aquecimento no crédito ao setor privado e em menor poupança. O consumo de bens duráveis pelas famílias e os investimentos em habitação dispararam e a alavancagem das empresas aumentou significativamente. Grandes déficits em conta corrente surgiram como contrapartida ao crescimento dos gastos privados. Esse "novo mundo" de juros baixos e financiamento abundante parecia oferecer um almoço grátis aos países convergentes. Mas surgiram vários desequilíbrios, que assumiram diferentes formas: - Em países como Portugal ou Grécia, os desequilíbrios fiscais tornaram-se um grande problema. A poupança decorrente de juros mais baixos e de receitas resultantes do crescimento acelerado foi usada para financiar políticas expansionistas. Quando a convergência dos juros foi concluída e o impacto inicial do euro sobre o crescimento desapareceu, ficou evidente a fragilidade das políticas fiscais. Além disso, gargalos estruturais decorrentes de falta de competição e o peso excessivo do setor público contribuíram para a expansão excessiva dos bens não comercializáveis, prejudicando a competitividade e agravando desequilíbrios externos. - Em países como a Espanha e a Irlanda, as políticas fiscais foram mais prudentes. Mas surgiu uma bolha no mercado imobiliário. Na Irlanda, o setor financeiro inchou. À medida que a crise financeira começou a manifestar-se, em meados de 2007, e depois progrediu até transformar-se em recessão mundial, a reação das autoridades econômicas em todo o mundo foi disponibilizar enorme volumes de liquidez pelos bancos centrais, paralelamente a uma enorme expansão fiscal, além de os governos terem assumido ou garantido as dívidas dos bancos. O objetivo era atenuar o impacto da crise sobre a produção e o emprego e evitar uma crise generalizada que poderia assemelhar-se à de 1929. A consequência foi uma deterioração no balanço patrimonial do setor público. As preocupações com a sustentabilidade, especialmente nos países onde a margem de manobra era mais limitada, nos levaram à terceira fase da crise, onde estamos agora: a crise da dívida soberana, que até agora afetou principalmente as economias periféricas da área do euro. Como explicar o que aconteceu? Como déficits em conta corrente elevados persistiram em alguns países da área do euro sem questionamentos? Em primeiro lugar, não se pode ignorar que a zona do euro teve um grande impacto sobre a formação de expectativas. Muitos economistas e autoridades afirmavam que os desequilíbrios em conta corrente eram o resultado esperado de uma integração mais profunda entre os países com diferentes níveis de desenvolvimento econômico. Em uma união monetária, um déficit em conta corrente que reflita o balanço financeiro do setor privado não seria motivo de preocupação. A monitoração do risco de crédito asseguraria adequada determinação do preço de riscos e não haveria desequilíbrio macroeconômico. Essa visão encontrou apoio em previsões na teoria ortodoxa. Em um modelo neoclássico de crescimento, a queda de juros causada pela redução do prêmio de risco em um país resulta em maior consumo e estimula o investimento. A perturbação inicial também causa o aumento dos preços de bens não comercializáveis (apreciação do câmbio real) e aumento dos salários reais. O crescimento potencial elevado não se concretizou, pois o boom de investimentos concentrou-se, em grande parte, em investimentos não produtivos (construção civil) e logo foi revertido. Com efeito, uma explicação alternativa para o ajuste dos países convergentes à UME pode ser obtida com base em um modelo macroeconômico intertemporal clássico. Esse modelo ilustra a importância dos efeitos de substituição intertemporal no consumo que dominou a UME nos primeiros anos. Também nesse modelo, o processo de ajuste, que acaba sendo deflagrado pelo acumulo de dívida externa, é lento e benigno. De uma perspectiva de política econômica, os pressupostos subjacentes à abordagem benigna revelaram-se irrealistas e ilusórios. Com efeito, o arcabouço conceitual não contempla realidades fundamentais da vida - como complexos mecanismos de formação de expectativas, a possibilidade de inadimplência, a ausência de fricções nos mercados de produtos e de mão de obra ou comportamento fiscal imprudente. Expectativas otimistas sobre perspectivas de crescimento futuro e miopia, fracas instituições nacionais e fricções reais e financeiras deveriam ter se constituído para intervenção na política econômica visando atenuar o padrão de "expansão acelerada seguida de colapso brusco" decorrente da integração monetária. Os amortecedores, que levariam ao menor endividamento do setor público e de maior solidez de capital no setor bancário, teriam colocado as economias convergentes em posição mais sólida para enfrentar a crise financeira. Além disso, uma abordagem mais ambiciosa e coerente a uma reforma estrutural teria deixado essas economias melhor equipadas para enfrentar os desafios da globalização e do envelhecimento populacional. Deveríamos inferir que somente a política interna e falhas institucionais devem ser responsabilizadas pela atual situação na Europa? A resposta é negativa. Embora políticas internas inadequadas e irresponsáveis expliquem onde estamos, é preciso reconhecer que uma arquitetura incompleta para a zona do euro é fundamental para explicar a situação atual. O modelo de governança econômica da zona do euro repousa em quatro princípios fundamentais: - Soberania fiscal: os Estados membros mantêm responsabilidade por sua política fiscal, sujeita a regras e procedimentos comuns; - Inadimplência desconsiderada: a possibilidade de reestruturação controlada de dívida soberana não foi considerada no modelo; - Socorro desconsiderado: não foi estabelecido nenhum mecanismo de gestão de crises; - Saída desconsiderada: não é contemplada a possibilidade de um membro abandonar o euro. Os responsáveis pela elaboração do Tratado de Maastricht estavam conscientes de que não poderíamos depender das forças de mercado para assegurar disciplina e a correção de desequilíbrios. Episódios históricos mostraram que os mercados financeiros tendem a ser lentos e frouxos na penalização de prodigalidade em tempos normais, e podem, repentinamente, virar e deflagrar movimentos exagerados durante crises. A fim de conter o risco moral e prevenir turbulências, o Pacto de Estabilidade e Crescimento foi acordado como um complemento à arquitetura de Maastricht. O Pacto estabelece regras e procedimentos orçamentários para reforçar a disciplina fiscal em nível nacional. Com o Pacto, pretendeu-se evitar erros graves de política fiscal mediante monitoração e pressão dos Estados-membros, bem como por meio de ameaças de sanções. No entanto, a implementação do Pacto foi frouxa nos primeiros anos da UME. Tensões surgiram no início de 2000, e em novembro de 2003, quando ações deveriam ter sido tomadas contra a França e a Alemanha, o Conselho Ecofin decidiu não agir, prevalecendo sobre a Comissão Europeia. Essa indisposição para aplicar as regras foi um "pecado mortal": um recado foi enviado aos membros da área do euro, dizendo que o Pacto "não era para valer". De modo mais geral, eu diria que a débil governança econômica na área do euro teve três consequências importantes: - Primeiro, políticas fiscais domésticas inadequadas foram toleradas, resultando em situações orçamentárias insustentáveis em alguns países e tensões na condução da política monetária única; - Segundo, atenção insuficiente a perdas de competitividade e ao acúmulo de desequilíbrios em conta corrente na zona euro; - Terceiro, e provavelmente mais importante, a correlação entre a capacidade do setor financeiro e dos Estados soberanos de obterem financiamento foi, em larga medida, ignorada. Por um lado, o mercado para captação de recursos financeiros estava extremamente integrado, na área do euro (isto é, o mercado financeiro de curto prazo e o mercado de dívida soberana); por outro lado, o controle proprietário de bancos e a concessão de crédito pelos bancos continuaram a ser operados em ´âmbito nacional. O fato de o sistema bancário e os Estados soberanos compartilharem as mesmas fronteiras implicava que sua capacidade de tomar empréstimos apoiava-se no mesmo conjunto de fundamentos. Essa interdependência acabou por ser uma importante fonte de risco macrossistêmico na área do euro. A crise da dívida soberana trouxe para o primeiro plano as falhas na governança econômica da área do euro e expôs a vulnerabilidade dos Estados da área do euro a mudanças na percepção de riscos soberanos nos mercados. Com efeito, quando um país tem a sua moeda em livre flutuação, uma perda de confiança do mercado traduz-se em uma onda de vendas de títulos, que dispara rendimentos mais elevados e desvalorização cambial, deixando praticamente não afetadas as ofertas monetária e de crédito ao setor privado. Além disso, o banco central nacional funciona como um emprestador de última instância. Por isso, os investidores não podem precipitar uma crise de liquidez capaz de impor ao país uma posição inadimplente. Em contraste, para um país pertencente a uma união monetária, uma perda de confiança e a resultante onda de vendas de seus títulos implica não apenas rendimentos mais elevados, mas uma escassez de liquidez, o que pode facilmente transformar-se em problemas de solvência. A administração de crises pela UE não foi eficaz no sentido de restaurar a confiança do mercado. Embora medidas rápidas e resolutas tenham sido tomadas para fortalecer a arquitetura financeira da UE, a União tem ficado correndo "atrás da curva" no enfrentamento da crise da dívida soberana. Como resultado, o BCE tem sido confrontado com a inevitabilidade de desempenhar um papel corretivo, testando os limites de sua missão. O que precisamos fazer? Conforme mencionado, as raízes da crise, tanto da crise financeira mundial como de suas ramificações na área do euro, são agora compreendidas. A questão a considerar, agora, é o que fazer. Medidas devem ser tomadas em nível nacional como no nível da UE. Para serem bem sucedidas, as medidas precisam ser coerentes, tanto no que diz respeito a sua arquitetura como ao momento inaugural de sua vigência. Em nível nacional, é claro que a prioridade máxima deve ser a restauração da sustentabilidade da dívida pública, aumentando a poupança doméstica e melhorando crescimento potencial nos países impactados pela crise. Essas são as condições para estabilizar a dívida externa e colocá-la numa trajetória descendente. Esses objetivos estão no cerne do programa de assistência financeira recentemente aprovado para Portugal. Um novo modelo de governança econômica é necessário para assegurar disciplina fiscal, evitar perdas sustentadas de competitividade e estimular a estabilidade financeira. Para esse fim, em outubro de 2010 o Conselho Europeu aprovou as propostas apresentadas por uma força-tarefa especial, coordenada pelo presidente Van Rumpuy, para um novo modelo de governança econômica, que envolverá: - Um Pacto de Estabilidade e Crescimento reformado, visando melhorar a supervisão das políticas fiscais e aplicar as medidas coercitivas com maior coerência e antecipação; - Novas disposições destinadas a reforçar arcabouços orçamentários nacionais; e - Um novo mecanismo de vigilância de desequilíbrios macroeconômicos. O pacote legislativo que estabelecerá o novo modelo de governança econômica está sendo negociado entre o Conselho e o Parlamento Europeu. O "Euro Pact +", acordado em março pelos Estados membros da zona do euro e por outros seis países da UE, visa reforçar a coordenação de políticas econômicas. O Pacto concentra-se nas áreas abrangidas por competências nacionais que são fundamentais para melhorar a competitividade e evitar desequilíbrios potencialmente perturbadores. Resta ver se o novo arcabouço de vigilância que será adotado será suficiente para assegurar o bom funcionamento da área do euro. O BCE enfatizou a importância de assegurar maior automatização na vigilância e em procedimentos de sanções e de incrementar os custos políticos e reputacionais associados a descumprimento. Os procedimentos de vigilância econômicos e orçamentários reforçados serão complementados por um referencial de regulamentação e supervisão em nível de UE. Cumprindo as recomendações do Grupo de Larosière, foi criado o Sistema Europeu de Supervisão Financeira, compreendendo 1) novas Autoridades Supervisoras Europeias (as denominadas AES, em inglês) para o setores bancário, segurador e para mercados de valores mobiliários e 2) a Diretoria Europeia para Risco Sistêmico (ESRB, em inglês) para cuidar de questões macroprudenciais. Além disso, um referencial para o gerenciamento de crises inter-nacionais no setor bancário da UE está sendo considerado e um Mecanismo de Estabilidade Europeu (ESM, em inglês) - uma linha permanente de prestação de socorro financeiro aos Estados membros da área do euro sujeitos a rigorosas condicionalidades - deverão entrar em vigência operacional no início de 2013. A ESM disporá de uma capacidade efetiva para emprestar €500 bilhões, a ser revista regularmente. O detalhamento concreto do ESM está sendo negociado, ainda que suas características gerais já tenham sido anunciadas pelo Conselho Europeu. Restam algumas incógnitas, em especial no que diz respeito à amplitude do envolvimento do setor privado: se o ESM deverá agir mais como ferramenta preventiva ou de socorro, e quando podem ocorrer intervenções em mercados primários de dívida. O principal desafio é como evitar que problemas de liquidez temporária se transformem em problemas de solvência e, ao mesmo tempo, minimizar o risco moral implícito em qualquer socorro antecipadamente assegurado. Outras inovações institucionais foram propostas, entre as quais a eventual criação de eurotítulos, que não foi recebida com entusiasmo por muitos membros da UE. Mas o Parlamento Europeu, a Comissão Europeia e alguns Estados membros demonstraram algum interesse e eu acredito que o debate sobre essa questão está longe de terminado. Estes são, sem dúvida, tempos desafiadores. A crise mostrou a necessidade de melhor cooperação internacional, melhor governança, supervisão fortalecida dos mercados e maior transparência. Isso é relevante não apenas para governos, mas também para bancos centrais e autoridades supervisoras. Como bem salientado no relatório de De Larosière, "As autoridades monetárias em todo o mundo e suas autoridades encarregadas de regulamentação e fiscalização financeira podem e devem atuar melhor, no futuro, para reduzir as chances de que eventos como esses se repitam". (Tradução de Sergio Blum e Sabino Ahumada) Carlos da Silva Costa, doutor em Economia pela Universidade de Paris, é presidente do Banco de Portugal desde junho de 2010. Este é o sexto e último de uma série de artigos feitos por renomados economistas brasileiros e estrangeiros convidados pelo Valor para discutir a crise financeira internacional e avaliar seus possíveis desdobramentos. |
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