terça-feira, 26 de julho de 2011

As razões dos juros exorbitantes

Veja - 25/07/2011
 

Economistas que estiveram no BC explicam por que a taxa brasileira é a maior do mundo – e como reduzi-la a níveis normais.
Brasil substituiu a hiperinflação hiper-taxa de juros. O país não aparece mais entre os líderes em reajustes de preços. No que diz respeito aos juros, no entanto, é campeão por margem ampla. A liderança se alargou na semana passada, depois de o Banco Central ter elevado a taxa básica de juros, a Taxa Selic, para 12,5%. Foi a quinta alta no ano. O BC resistiu quanto pôde. Evitou aumentar os juros e, alternativamente, impôs medidas que restringiram a concessão de crédito. Não resolveu. Diante da pressão renitente da inflação, mais uma vez os consumidores e empresários brasileiros tiveram de engolir a pílula amarga dos juros. .
O aumento na taxa básica eleva o custo do dinheiro para os bancos. Como reflexo, os juros dos financiamentos também sobem. Menos dinheiro circula pela economia, resfriando a atividade econômica e comendo a inflação. É assim que funciona em todos os países com economia minimamente bem administrada. Até aí, nada de anormal. A exorbitância nacional está no faro de a taxa de juros necessária para calibrar o ritmo de crescimento ser muito elevada. Isso na comparação não apenas com nações avançadas, mas também com relação àqueles países em estágio de desenvolvimento similar ao brasileiro. A maneira mais precisa para comparar países é a análise dos juros reais (a taxa descontada a inflação. Por esse critério, os juros no Brasil são de 7%. No segundo lugar no ranking aparece a Hungria, com uma taxa de 2,4% - pouco mais de um terço da brasileira ( veja o quadro abaixo). Todos os demais países apresentam taxas inferiores a 2%. Decerto, é injusto comparar os juros brasileiros com os americanos ou europeus, cujas taxas chegam a ficar abaixo da inflação (juros reais negativos). Europa e Estados Unidos, além de ser economias maduras, não se levantaram da crise. Mas mesmo países de crescimento rápido conseguem manter a inflação sob controle com doses mais moderadas de juros que as brasileiras. O maior exemplo disso é a China.
Por que o Brasil, não sendo o pior país do mundo, tem os maiores juros reais do mundo? _

ARMÍNIO FRAGA
Ex-presidente do BC e sócio da Gávea Investimentos
"O nível da taxa de juros real no Brasil ocorre em função da baixa poupança interna, de uma situação fiscal ainda não resolvida de maneira definitiva, de um receio que persiste sobre a inflação e, de uns anos para cá, do crescimento acelerado do crédito - um fator transitório. A nossa taxa real de longo prazo está em 6% ao ano, 3 pontos acima da do Chile, um país mais bem administrado. Tem havido uma convergência ao longo dos anos. Para eliminarmos a diferença que ainda resta, temos de dar respostas convincentes aos itens listados acima. Mesmo acertando tudo isso, deve demorar um tempo, pois sempre há alguma inércia de comportamento. A subida recente é mais cíclica do que estrutural"
GUSTAVO FRANCO
Ex-presidente do BC e sócio da Rio Branco
“A taxa de juros no Brasil, ao que tudo indica, é um fenômeno fiscal. A mudança dessa situação que vemos hoje depende, consequentemente, de condições substancialmente melhores nesse setor. O país precisa também de uma explícita inversão das prioridades em relação ao que temos visto nos últimos anos: um maior apoio ao mercado de capitais em detrimento do financiamento da dívida pública. Mas é impossível imaginar isso ocorrendo sem que o Tesouro enfrente dificuldades no refinanciamento de sua dívida.”
CARLOS THADEU DE FREITAS
Ex-diretor do BC e economista da Confederação Nacional do Comércio
“Temos escassez de poupança doméstica. A China, ao contrário, vive uma situação de excesso de poupança, o que faz com que os juros lá sejam mínimos. No setor privado, o que observamos é que existe uma propensão muito alta a consumir – até por causa da demanda reprimida. O setor público também gasta muito. A discussão que cabe aqui, e que é polêmica, é se os juros precisam ser tão elevados assim. Talvez seja a hora de o BC ter mais ousadia e começar a trabalhar com juros mais baixos. O risco Brasil hoje é menor que de alguns países desenvolvidos. A tendência é que os juros caíam.”
ALEXANDRE SCHWARTSMAN
Ex-diretor do BC
“A hipótese mais promissora para explicar os juros aponta para o peso e o tamanho do crédito subsidiado por aqui. Cerca de um terço do crédito é concedido a taxas muito inferiores à Selic. O principal (mas longe de ser o único) exemplo é o crédito concedido pelo BNDES. O mesmo vale para o crédito rural e para o habitacional. A taxa reduzida dessas modalidades de financiamento, acoplada ao seu peso elevado no conjunto de empréstimos, obrigaria a uma taxa Selic maior para compensar o efeito expansionista do crédito direcionado. Isso explicaria o aparente paradoxo que faz com que a alta taxa de juros do Brasil coexista com uma expansão vigorosa da demanda.”
PAULO VIEIRA DA CUNHA
Ex-diretor do BC e sócio da Tandem
“O Brasil tem um histórico de inflação elevada e de volatilidade persistente. De outro lado, existe a pressão exercida pelo grande estoque da dívida pública, que hoje está ao redor de 66% do PIB. Não é muito, em comparação com a Itália ou Japão, mas o Brasil tem uma taxa de poupança bem inferior à dessas economias e mercados de capitais bem menos desenvolvidos. Por fim, a meta de inflação brasileira, de 4,5%, com tolerância de até 6,5%, é muito branda e traz incertezas. Tudo isso aumenta o prêmio de inflação embutido nas taxas, mesmo depois de décadas de inflação relativamente baixa.”
CLAUDIO HADDAD
Ex-diretor do BC e presidente do Insper
“A poupança e o investimento são os fatores que determinam qual será a taxa de juros de equilíbrio de uma economia. E o governo brasileiro não poupa. Gastamos 12,5% do PIB em previdência e pensões, num país em que apenas 7% da população tem mais de 65 anos. O conjunto de baixa poupança e alto investimento exige uma taxa de equilíbrio elevada. A equação só fecha com a atração do dinheiro dos investimentos externos. A situação é esquizofrênica. O governo reclama que o dólar está baixo, mas, em vez de conter gastos e criar incentivos para o consumidor poupar, age no sentido contrário. Aí os juros permanecem nas alturas, e o dólar caí.”

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