CORTE DE 0,5 PONTO NO JURO PÕE META DE INFLAÇÃO NA BERLINDA |
Autor(es): Por Fernando Travaglini, Lucinda Pinto, Eduardo Campos e Mônica Izaguirre | De São Paulo |
Valor Econômico - 01/09/2011 |
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central surpreendeu o mercado e decidiu reduzir a taxa de juros básica Selic em 0,5 ponto percentual, para 12% ao ano. A decisão, porém, não foi unânime. Cinco integrantes votaram pela opção ganhadora, enquanto dois queriam a manutenção da taxa em 12,5%. "O cenário internacional mudou muito depois da última reunião do Copom, está demolidor e pegou nossa economia em franca desaceleração", disse ao Valor uma fonte do governo. A visão preponderante foi de que a crise nos países centrais terá efeitos sobre a economia brasileira: por um lado, de moderar o crescimento e, por outro, de conter a inflação. E haveria abertura para baixar juro. Em uma atitude sem precedentes no sistema de metas de inflação brasileiro, o Comitê de Política Monetária (Copom) surpreendeu até as previsões mais agressivas e decidiu reduzir a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, para 12% ao ano. Sob o argumento de que a crise externa começa a afetar o desempenho da economia doméstica, o Copom interrompeu o ciclo de aperto monetário que vigorava desde o início do ano para iniciar, sem qualquer intervalo, um processo de alívio monetário - atitude também inédita, que vai na contramão do gradualismo que, historicamente, marcou a condução da política monetária no Brasil. A reunião de ontem também foi uma das longas da história: foram quatro horas de discussão. Por fim, o placar apresentado foi dividido: dois diretores do comitê votaram a favor da manutenção da taxa Selic - confirmando o caráter polêmico da decisão. O corte de juros definido ontem conseguiu surpreender até o "ousado" mercado financeiro, que tradicionalmente busca apostas alternativas ao consenso, em busca de ganhos potenciais. Nos contratos de juros futuros, as apostas de baixa se concentravam em redução de 0,25 ponto. Ou seja, o pregão hoje deve ser bastante movimentado, com espaço para ajustes em todos os contratos. A expectativa é que os vencimentos de curto prazo se ajustem para baixo, captando não só a decisão de ontem, mas, também, colocando no preço a percepção de que a taxa cai, ainda mais, até o fim do ano. Já nos contratos de longo prazo, a tendência é de alta das taxas, em uma atitude típica dos momentos em que o mercado põe em dúvida o compromisso do BC com o cumprimento da meta de inflação. A queda de agora, que surpreendeu, aumenta a incerteza quanto ao comportamento da inflação no futuro. Se o quadro que se espera é de incerteza, o mercado pede mais prêmio para emprestar dinheiro. No comunicado divulgado após a reunião, o Banco Central mostrou que acredita em um cenário externo muito mais difícil do que o imaginado anteriormente, com possibilidade de uma recessão global ou de um duplo mergulho. Na avaliação do economista do Santander, Cristiano Souza, a autoridade monetária sinalizou um pessimismo maior até do que o previsto pelo mercado. "Esperávamos que o corte da Selic acontecesse mais para frente, em novembro. O BC está com um cenário mais pessimista que o nosso e talvez que o mercado inteiro", disse Souza. Souza não vê um momento tão ruim para o mundo, mas só uma visão extremamente pessimista do BC justificaria um movimento tão brusco na taxa. Souza lembra que os efeitos da política monetária têm um atraso de seis a nove meses sobre a atividade. Assim, o BC estaria prevendo que os efeitos da crise internacional poderiam atingir a atividade doméstica no mesmo momento em que os efeitos da alta de 1,75 ponto percentual do primeiro semestre estariam com mais intensos, diz Souza. Para o ex-diretor do BC e atual estrategista da Tandem Global Partners, Paulo Viera da Cunha, a opção do Copom foi "precipitada" e tornará o esforço da autoridade monetária para colocara inflação na trajetória da meta ainda mais difícil. "Essa decisão é um equívoco. O lado real da economia está desacelerando, mas não acredito que esse impulso monetário vá ajudar", afirma, lembrando que o crédito ainda aquecido, o reajuste do salário mínimo previsto para 2012 e a expansão fiscal devem continuar alimentando a inflação. "Acho que a situação da inflação no início de 2012 vai se complicar ainda mais", afirma. Viera da Cunha observa que há uma clara preocupação do BC com a transmissão da fraqueza da atividade global, mas que essa postura é "exagerada". "O presidente do Fed, Ben Bernanke, já afirmou que o cenário da atividade americana é fraca, mas não é nada fora do previsto, nada que justifique mais estímulos monetários", observa. "O nosso BC foi precipitado. Está fazendo uma aposta de que a retração da economia vai ajudar a derrubar a inflação, mas essa é uma aposta difícil. A probabilidade não está do lado deles", afirmou. Para o estrategista do Banco Nomura, Tony Volpon, ao decidir cortar a taxa de juros em 0,5 ponto, o Copom mostrou ter cedido a pressões políticas e, com isso, "jogou a meta de inflação para o espaço". "Agora, a perspectiva de a inflação convergir para a meta ficou para 2013, ou sabe Deus quando", afirmou. Para ele, os argumentos usados pelo comunicado do Copom, divulgado após a reunião, mostram que o BC está trabalhando com um cenário parecido com o de 2008 - quando a crise financeira fez a liquidez global "secar" e impôs ações de alívio monetário e fiscal pelos governos. Mas, em sua avaliação, o mundo não vive uma situação sequer parecida com a assistida naquele momento. "As commodities não estão caindo, as bolsas estão se recuperando, enfim, não há uma crise como a de 2008", afirma. Para Inês Filipa, economista-chefe da corretora Icap, a decisão, além de surpreendente, foi equivocada. "Não acho que o cenário externo vai ser tão desafiador e desinflacionário, a não ser que tenhamos uma piora da crise, que não é o meu cenário principal", disse. "A decisão foi um equívoco. As expectativas devem piorar. Não sei o que esperar da próxima reunião, pois não há histórico para que eu possa comparar", disse. Em 2008, continua Filipa, a queda ocorreu após a queda do Lehman Brothers, que levou a uma forte desaceleração da economia brasileira, agravada por problemas com derivativos cambiais. "Hoje não há um cenário internacional tão ruim que impacte o Brasil tão fortemente e que contribua para trazer a inflação à meta", disse. A conclusão da economista é que o BC hoje olha apenas para o crescimento da economia. "Ele diz que tem que trabalhar com regime de metas, mas o foco parece ser o PIB", completa Filipa. |
Caminho foi aberto
Correio Braziliense - 01/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/1/caminho-foi-aberto |
O esforço do governo para dotar o Banco Central (BC) de musculatura suficiente para continuar com a queda da taxa básica de juros (Selic), que baixou ontem de 12,50% para 12% ao ano terá de levar em conta diferentes variáveis, como a remuneração de aplicações financeiras. Heron do Carmo, economista da USP, defende que a Selic só deveria começar a cair entre o fim do ano e o começo de 2012, quando a inflação oficial (IPCA) em 12 meses estiver mais próxima do centro da meta (4,5%) e não do seu teto (6,5%). "Mas é claro que a autoridade monetária tem autonomia para fazer os cortes que quiser", pondera. João Paulo dos Reis Velloso, ex-ministro do Planejamento, acha que a trilha do juro baixo foi aberta com o aumento do superavit primário. Mas acha que o maior desafio está na redução do custo da máquina. "O Estado gasta demais. Por isso, cobra demais do contribuinte e se endivida muito. A prioridade deve ser poupar, seja para baixar juro ou para investir", diz. Velloso torce para que a previsão orçamentária de 2012 permaneça inalterada, permitindo o controle de gastos correntes. "Reduzir juros é a chance de desvalorizar o real e ajudar o comércio exterior", resume. Nem todos, contudo, estão confiantes com a disposição de Dilma em ajustar as contas para permitir juros menores. São agentes do mercado financeiro que aguardam sinais concretos de cortes de gastos. "Na perspectiva longa, os juros até cederam, mas ainda não houve medidas que contivessem os gastos correntes", comenta Jason Vieira, analista da Corretora Cruzeiro do Sul. |
A íntegra do comunicado do Copom
Valor Econômico - 01/09/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/9/1/a-integra-do-comunicado-do-copom |
O Copom decidiu reduzir a taxa Selic para 12,00% a.a., sem viés, por cinco votos a favor e dois votos pela manutenção da taxa Selic em 12,50% a.a. Reavaliando o cenário internacional, o Copom considera que houve substancial deterioração, consubstanciada, por exemplo, em reduções generalizadas e de grande magnitude nas projeções de crescimento para os principais blocos econômicos. O Comitê entende que aumentaram as chances de que restrições às quais hoje estão expostas diversas economias maduras se prolonguem por um período de tempo maior do que o antecipado. Nota ainda que, nessas economias, parece limitado o espaço para utilização de política monetária e prevalece um cenário de restrição fiscal. Dessa forma, o Comitê avalia que o cenário internacional manifesta viés desinflacionário no horizonte relevante. Para o Copom, a transmissão dos desenvolvimentos externos para a economia brasileira pode se materializar por intermédio de diversos canais, entre outros, redução da corrente de comércio, moderação do fluxo de investimentos, condições de crédito mais restritivas e piora no sentimento de consumidores e empresários. O Comitê entende que a complexidade que cerca o ambiente internacional contribuirá para intensificar e acelerar o processo em curso de moderação da atividade doméstica, que já se manifesta, por exemplo, no recuo das projeções para o crescimento da economia brasileira. Dessa forma, no horizonte relevante, o balanço de riscos para a inflação se torna mais favorável. A propósito, também aponta nessa direção a revisão do cenário para a política fiscal. Nesse contexto, o Copom entende que, ao tempestivamente mitigar os efeitos vindos de um ambiente global mais restritivo, um ajuste moderado no nível da taxa básica é consistente com o cenário de convergência da inflação para a meta em 2012. O Comitê irá monitorar atentamente a evolução do ambiente macroeconômico e os desdobramentos do cenário internacional para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária. Brasília, 31 de agosto de 2011 /Banco Central do Brasil |
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