quinta-feira, 21 de julho de 2011

Drible na baixa

Autor(es): Antonio Peres, Daniele Camba e Silvia Rosa | De São Paulo
Valor Econômico - 20/07/2011

Nem só de tristezas vive a elite da bolsa brasileira este ano. Entre as 67 ações do Índice Bovespa, o principal termômetro do mercado acionário local, cuja queda em 2011 já chega a 14,75%, um grupo seleto de 16 ações consegue se manter à tona, com valorizações que vão dos 4,55% de Ultrapar a 39,71% de TIM este ano.
Enquanto o Ibovespa como um todo sofre com problemas lá fora - como a crise da dívida soberana na Europa e a novela do teto do endividamento americano - e a inflação aqui dentro, esses papéis, verdadeiros "heróis da resistência" se beneficiam de duas características em comum. Primeiro, fazem parte dos setores chamados defensivos, como energia elétrica e telecomunicações, que têm resultados menos sujeitos às oscilações da atividade econômica, receitas atreladas à inflação e dividendos elevados. Segundo, passaram este ano por algum evento societário que turbinou seus ganhos.
É o caso dos papéis da TIM, campeões de rentabilidade este ano. As ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da companhia sobem 39,71% e as ordinárias (ON, com direito a voto), 32,98%. A arrancada veio após a empresa anunciar, em maio, a migração para o Novo Mercado, o nível mais elevado de governança corporativa da BM&FBovespa. A companhia vai converter cada ação PN por 0,8406 papel ON, passando a ser a única empresa de telefonia listada nesse segmento da bolsa. Segundo o analista da Planner Rafael Andreata, a migração favorece a empresa, já que muitos investidores estrangeiros que têm restrições para comprar ações PNs passaram a olhar para o papel.
Caso parecido é o da ação PN da Telesp, com alta de 20,25% este ano. A valorização do papel reflete a incorporação da Vivo pela Telesp, concluída em junho deste ano. A integração das operações das duas empresas promete trazer os tão propalados ganhos de sinergia, ou seja, aumentar a lucratividade da companhia.
As valorizações tantos das ações da TIM quanto da Telesp são mais do que justificadas pela performance das companhias e a expectativa de bons resultados daqui para frente, afirma Ivan Guetta, gestor de ações da GAP Asset Management. "No caso da Telesp, houve a combinação de um resultado operacional muito forte com uma incorporação feita com alta governança", afirma. "O papel ainda tem espaço para subir, pois há ganhos de sinergias que não estão refletidos nos preços", afirma.
Além disso, os analistas destacam que a companhia costuma pagar bons dividendos. De acordo com projeção da Ágora, é esperado um "dividend yield" (relação entre o dividendo distribuído por ação e o preço do papel na bolsa) de 10,3% para Telesp este ano.
O setor elétrico abriga cinco das 16 "sobreviventes" do Ibovespa. O destaque é a ação PN da Eletropaulo, com valorização de 31,18%. Também apresentam altas de dois dígitos este ano Light ON (22,68%), Cemig PN (21,54%) e Cesp PNB (19,21%). Para os analistas ouvidos pelo Valor, a maior promessa no setor daqui para frente, contudo, não é a Eletropaulo, mas a Cemig.
Segundo Marco Melo, analista-chefe da Ágora e Bradesco para o segmento de varejo, o papel está sendo negociado com desconto em relação a seus pares. A relação Preço/Lucro da Cemig, uma das medidas que indicam o prazo para reaver o retorno do investimento, projetada para 2012 é de 9,3 vezes, contra a média do setor de 12 vezes. "A empresa já começa a apresentar retornos com a compra da Terna e projetamos um potencial de valorização de 25% para o papel para 2012", destaca Melo.
No caso da Eletropaulo, as opiniões se dividem. Para o gestor de uma asset independente, que prefere não ter seu nome citado, a ação subiu mais do que deveria. "O papel da Eletropaulo está caríssimo", afirma. "É até possível encontrar alguns "players" interessantes no setor elétrico, mas, no geral, já subiram muito".
Já Andreata, da Planner destaca que, apesar da alta de 30,93% até 18 de julho, é esperado um "dividend yield" maior para a empresa, por conta de pagamentos de dividendos extraordinários em função da venda da participação da Eletropaulo na Atimus para a TIM, que deve trazer um ganho de R$ 450 milhões para o lucro líquido da empresa neste ano.
Além dos setores de telecomunicações e energia elétrica, também resistiram à maré negativa do índice os papéis ON de Cielo e Redecard, boas pagadoras de dividendos, ambas com altas de dois dígitos. Segundo Luciana Leocádio, chefe de análise da Ativa Corretora, esse papéis haviam caído muito no ano passado com os investidores se antecipando aos impactos da abertura desse setor para a entrada de concorrentes.
Como os resultados do primeiro trimestre foram bons, apesar do aumento da competição, houve uma recuperação das ações. "No curto prazo, as empresas não devem sofrer, mas no médio prazo a pressão competitiva vai piorar", afirma ela, que recomenda aos investidores "cautela" com as ações de Cielo e Redecard. "Já subiram demais", afirma
Outra que entrou no rol das sobreviventes foi a ação da BR Foods. O papel sobe 5,54% no ano, graças à arrancada de 7,51% este mês, fruto da aprovação da fusão entre Sadia e Perdigão, que deu origem a empresa, pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
E daqui para frente? Será que o grupo continuará na liderança? Com o cenário internacional bastante conturbado, os investidores devem continuar dando preferência aos papéis mais defensivos, como as teles, as elétricas e as concessões de rodovias, acredita a chefe de análise da Fator Corretora, Lika Takahashi.
Além de pagarem bons dividendos, elas caem menos que a bolsa em momentos de baixa e são consideradas como um tipo de proteção contra a inflação. Lika explica, no entanto, que essa proteção não é perfeita, já que as tarifas são reajustadas anualmente com base na inflação, enquanto os custos crescem mais rapidamente.
A chefe de análise da Fator alerta que os investidores precisam ter cuidado para escolher ações defensivas, uma vez que boa parte delas já subiu bastante. "As teles, de forma geral, ainda apresentam certo desconto em relação ao mercado", afirma ela. "Já as elétricas me parecem estar no preço justo delas ou muito próximo disso", diz a executiva.
Se os setores defensivos serão os mais valorizados neste segundo semestre, isso significa que o Índice Bovespa continuará com um desempenho desanimador. As teles e as elétricas já foram bem importantes dentro do índice, mas agora são pouco representativas.
Para Melo, da Ágora, o potencial de valorização desses papéis deve ser menor no segundo semestre. "O ideal é o investidor mesclar a carteira com ativos que estão com preços baratos, que devem ser beneficiados à medida que o fluxo de recursos dos investidores estrangeiros retorne para a bolsa brasileira", diz.

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