quinta-feira, 14 de abril de 2011

O impacto do ajuste fiscal na inflação

Autor(es): Ribamar Oliveira
Valor Econômico - 14/04/2011
 

Dois boxes do último Relatório Trimestral de Inflação, divulgado pelo Banco Central, não tiveram a repercussão que mereciam. Em um, o BC sugere que o impacto da política fiscal no combate à inflação pode ser bem maior do que os analistas de mercado previram. No outro, o BC projetou as principais variáveis fiscais até 2014 e concluiu que há uma tendência de redução do custo médio do endividamento e do pagamento de juros nominais em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).
Em novembro do ano passado, a Gerência-Executiva de Relacionamento com Investidores (Gerin), do BC, fez uma pesquisa sobre as hipóteses de trabalho consideradas pelos analistas na construção de seus respectivos cenários de inflação. Os participantes do mercado consultados disseram, entre outras coisas, que um esforço fiscal por um ano, equivalente a 1% do PIB, combinado com política monetária acomodatícia no primeiro ano (ou seja, com juros nominais constantes nos primeiros 12 meses da simulação) determinaria, em média, recuo de 0,34 ponto percentual na taxa de inflação. No máximo, o efeito seria de 0,8 ponto percentual, segundo as respostas.
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A consulta identificou uma grande heterogeneidade entre os efeitos esperados pelos participantes de mercado. Isso indicou, segundo o BC, um considerável grau de incerteza acerca das estimativas para o multiplicador fiscal no país, como sugere também a evidência empírica para outras economias. O multiplicador fiscal representa o impacto sobre a demanda agregada de um determinado esforço fiscal.
A novidade do box é que dessa vez foi o BC que apresentou a sua própria estimativa para o multiplicador. E, para surpresa de alguns, há indicações de que o impacto é maior do que o prognosticado pelos participantes do mercado, na pesquisa da Gerin. Segundo o BC, um corte efetivo do gasto público de 1% do PIB reduz a taxa de crescimento da economia em 0,9 ponto percentual no período de um ano, com uma política monetária não acomodatícia (na qual a taxa básica de juros reage ao esforço fiscal, ou seja, os juros nominais são reduzidos ao longo do ajuste).
O BC, porém, não divulgou o efeito dessa contração do gasto sobre a inflação, sob o argumento de que são estimativas imprecisas. A autoridade monetária concluiu, no entanto, que "uma contenção fiscal tende a impactar significativa e rapidamente a inflação, por um período de tempo prolongado, e que o efeito máximo sobre a inflação ocorreria cerca de seis trimestres após o início da contenção fiscal".
O box do BC não estimou o multiplicador fiscal no caso de a redução do gasto ser seguida de uma política monetária acomodatícia (juros nominais constantes no primeiro ano do esforço fiscal), que, aliada à queda da expectativa de inflação, provocaria aumento maior na taxa real de juros do que o verificado na hipótese da política monetária não acomodatícia. Uma taxa real de juro mais alta amplifica os efeitos da contenção fiscal sobre a inflação.
O gráfico apresentado no box indica que o efeito sobre o PIB seria maior do que 1, ou seja, para cada 1% do PIB de contenção fiscal efetiva, a economia perderia mais que 1 ponto percentual de crescimento. Nos dois exercícios, explica o BC, "a transmissão da política fiscal para preços se materializa essencialmente via desaceleração da demanda agregada (ou, de modo equivalente, pelo alargamento do hiato do produto).
Para o Banco Central, "é plausível afirmar que alterações mais duradouras no regime fiscal teriam implicações relevantes, no médio e longo prazo, sobre a sustentabilidade da dívida pública e, fundamental, sobre as condições de oferta de poupança na economia. Por conseguinte, certamente teriam repercussões ainda mais importantes sobre todo o sistema de preços da economia".
O segundo box do Relatório de Inflação também merece atenção. Ele analisa um fenômeno muito discutido na área acadêmica: a taxa de juro implícita da dívida líquida do setor público (DLSP) caiu, nos últimos anos, em ritmo muito menor do que a queda da Selic (a taxa básica de juros do BC). De 2003 a 2010, a Selic recuou 13,5 pontos percentuais enquanto a taxa implícita da DLSP decresceu só 2,6 pontos percentuais.
Esse descolamento decorreu do aumento expressivo de títulos pré-fixados, da acumulação de reservas internacionais e da elevação dos ativos internos vinculados à Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), principalmente em consequência dos empréstimos do governo federal ao BNDES. A novidade é a projeção do Banco Central para as principais variáveis até 2014, conforme a tabela abaixo.
Essas projeções foram feitas com base em informações coletadas pela Gerin junto a um conjunto de analistas, para indicadores como taxa Selic, taxa de câmbio, PIB, entre outros.
Esses parâmetros não foram explicitados pelo Banco Central no box, assim como também não foram o ritmo de aquisição de reservas. Pelo menos um dos parâmetros, no entanto, não é garantido: um superávit primário do setor público de 3,1% do PIB de 2012 a 2014.

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