Autor(es): Por Sophia Grene | Financial Times |
Valor Econômico - 17/11/2011 |
A mão invisível do mercado pode até resolver algum dia o problema da oferta de alimentos em um mundo superpovoado, mas os investidores não podem ser dispensados da responsabilidade de ajudar essa mão a atingir tal objetivo, segundo gestores de recursos especialistas em investimentos agrícolas. O problema precisa urgentemente de solução. Segundo a FAO, braço das Nações Unidas para agricultura e alimentação, nas próximas décadas será necessário produzir mais alimentos do que nos últimos 10 mil anos. A FAO calcula que até US$ 100 bilhões precisarão ser investidos na agricultura de países em desenvolvimento para elevar a produção mundial de alimentos em 70%, aumento que considera necessário para evitar que mais pessoas passem fome. Os investidores que se voltam ao setor agrícola possuem uma pletora de formas para alocar recursos. Entre as possibilidades estão o mercado futuro de commodities agrícolas, investimentos em propriedades como os realizados por fundos de "private equity", compras de ações e financiamento de dívidas. A decisão envolve não apenas estudos sobre como os investimentos podem se encaixar em suas carteiras, mas também a intenção dos agentes ao entrar com esses recursos. "Qual é o interesse, buscar soluções em vez de tentar lucrar com a situação?", pergunta Ralf Oberbannscheidt, que administra € 2,2 bilhões no Global Agribusiness Fund, da DWS. O debate sobre a ética de se investir em commodities no mercado futuro é permanente. A ala que sustenta que a especulação empurra os preços para cima e aumenta a volatilidade ganhou terreno ultimamente, uma vez que a opinião pública, em geral, passou a ficar mais contrária à negociação de derivativos. Mas a avaliação do mundo acadêmico, baseada nas evidências do único caso real testado - o impacto da lei americana de 1957 que proibiu a negociação de contratos futuros de cebola -, é inconclusiva. Para Oberbannscheidt, a negociação de contratos futuros não apenas é reprovada como uma "solução" para o problema da oferta de alimentos, mas também é indesejável porque o mercado é distorcido em seus fundamentos. "As commodities agrícolas são negociadas de forma muito ineficiente (...) Elas são retardatárias ao reagir aos eventos mundiais, principalmente porque o mercado é muito centrado nos EUA". Ele observa que esses mercados são em grande parte guiados por especialistas em mercados futuros, não em produção de alimentos. Em seu relatório "Perspectivas Alimentares", a FAO sustenta que "deixar os mercados internacionais continuarem em seu estado atual, volátil e imprevisível, apenas agravará as perspectivas já sombrias para a segurança alimentar mundial". Nos últimos três ou quatro anos, aumentou o interesse em investir em terras cultiváveis, porém mais recentemente esse tipo de negócio passou a sofrer uma avaliação mais crítica de organizações não governamentais como a Oxfam, que promove campanha chamada "Grow" (cultive, em inglês) para colocar em evidência o impacto dos investimentos internacionais em terras sobre as populações locais. Para suavizar alguns desses problemas, um grupo de trabalho ligado aos Princípios para o Investimento Responsável, da ONU, elaborou um conjunto de diretrizes para guiar investimentos em terras agrícolas. Porém, além das possíveis questões éticas, muitos investidores ficaram decepcionados com os retornos de seus primeiros investimentos em terras. "A maioria tinha projeções de retornos pouco realistas, carecia de capacidade administrativa, não tinha o horizonte de tempo apropriado ou encontrava problemas de documentação", afirma Oberbannscheidt. Outro problema é que em algumas regiões, como no Brasil, os valores das terras dispararam, tornando o investimento menos atraente. "Houve um pouco de disputa pela propriedade das terras", observa David Creighton, executivo-chefe da canadense Cordiant Capital, especializada em dívidas do setor privado em países emergentes. "Os preços decolaram no Brasil, a ponto de o modelo não ser mais tão sólido." Em vez disso, a Cordiant Capital, que vem concedendo crédito a projetos de agronegócios há dez anos, concentra-se em segmentos como produção de maquinário e equipamentos, produção de fertilizantes e silos para grãos. Creighton diz que a Cordiant Capital normalmente oferece rendimentos de 3 a 6 pontos percentuais acima taxa interbancária do mercado de Londres (Libor) para dívidas sênior com garantia. Em termos de risco de crédito, Creighton afirma que a Cordiant Capital explora "o telhado de vidro de empresas em mercados emergentes, cuja percepção de "rating" de crédito é limitada à de seus países". Com a análise apropriada das contas, é possível buscar investimentos para sua carteira em oportunidades de concessão de crédito para empresas que, na prática, são de "grau de investimento", particularmente porque em geral são garantidas por ativos reais, como terras e maquinário. Embora o financiamento de dívidas possa oferecer oportunidades de investimento que não estão nos mercados de ações, nem todos os investidores sentem-se confortáveis com a ideia de investir em títulos do setor privado em países emergentes. É possível encontrar mais transparência e liquidez nas ações. Oberbannscheidt está convencido de que as ações negociadas publicamente são a melhor forma para os investidores participarem tanto de uma oportunidade de investimento como de uma solução para o problema. "Precisamos melhorar a eficiência de toda a cadeia de valor". Um obstáculo é que os investidores em renda variável raramente pensam em um horizonte suficientemente longo para que o aporte no setor tenha melhor eficiência. |
Mesmo após baixa, índice de preços da FAO segue elevado
Valor Econômico - 04/11/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/11/4/mesmo-apos-baixa-indice-de-precos-da-fao-segue-elevado/?searchterm=fao |
O Índice de Preços de Alimentos da FAO, o braço das Nações Unidas para agricultura e alimentação, confirmou as expectativas e registrou retração expressiva em outubro. Com o resultado, o indicador desceu ao menor patamar desde novembro de 2010, mas as cotações permanecem elevadas e a preocupação do órgão com a "agroinflação" continua viva, como ficou claro nas discussões em torno do crescimento da população mundial, que acaba de superar a marca de 7 bilhões de pessoas. Em maior ou menor grau, todos os grupos de produtos que compõem o índice da FAO (carnes, lácteos, cereais, óleo e gorduras e açúcar) colaboraram para que a resultante caísse para 216 pontos, 9 pontos a menos que em setembro. Em relação à média de 2010 (185 pontos), contudo, o número atual ainda é 31 pontos superior, o que não deixa dúvidas sobre o novo recorde anual que será batido em 2011. O índice da FAO corroborou o último balanço de preços médios mensais de commodities negociadas nas bolsas de Nova York (açúcar, café, cacau, suco de laranja e algodão) e Chicago (soja, milho e trigo) realizado pelo Valor Data. Publicado na terça-feira, este mostrou que as médias de outubro caíram - exceto o suco de laranja, que subiu no mês passado -, mas retornaram a patamares de preços relativamente recentes. No caso do açúcar, por exemplo, a média dos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente os de maior liquidez) foi a menor desde junho; no da soja, desde outubro de 2010. O único produto da lista que voltou mais no tempo foi o cacau, cuja média apurada foi a mais baixa desde junho de 2009. Vale realçar que a grande elevação de patamar nos preços médios das commodities no mercado internacional aconteceu entre 2007 e 2008, puxada pela demanda dos países emergentes e pelo maior interesse dos fundos de investimento nesses mercados. Do ponto de vista dos fundamentos de oferta e demanda das commodities agropecuárias, a FAO alerta que, apesar da proliferação de estimativas que mostram que a produção em geral está em expansão ao mesmo tempo em que se aprofundam as incertezas em relação ao consumo, o quadro permanece apertado. A própria estimativa do braço da ONU para a produção mundial de cereais (incluindo trigo e milho) nesta safra 2011/12 foi revisada para cima e agora está em 2,325 bilhões de toneladas, 3,7% mais que em 2010/11. O consumo foi ampliado para 2,309 bilhões, aumento de 1,6% em igual comparação, e os estoques finais passaram a ser calculados em 506,6 milhões de toneladas, um crescimento de 3,3%. Para as oleaginosas - a soja, carro-chefe do agronegócio brasileiro, entre elas -, a FAO espera produção de 472 milhões de toneladas em 2011/12, 0,4%% acima da temporada anterior. No açúcar, o órgão prevê produção de 173,1 milhões de toneladas em 2011/12, alta de 4,1%. No caso das carnes (bovina, suína e de frango), a expectativa é de produção de 294,7 milhões de toneladas no ano civil 2011, um aumento de 1,3%. |
O preço dos alimentos e o 'dilema do prisioneiro'
Autor(es): Louise Lucas e Alan Rappeport | Financial Times, de Londres e Nova York |
Valor Econômico - 25/10/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/10/25/o-preco-dos-alimentos-e-o-dilema-do-prisioneiro/?searchterm=fao |
O declínio de 5,3% no preço dos alimentos - de acordo com índice da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês) - em relação ao pico verificado em fevereiro é uma faca de dois gumes paras as empresas de processamento de alimentos e bebidas às voltas com a inflação de insumos. A queda é vista por muitos, incluindo a FAO, como um abalo temporário. Além disso, a indústria alimentícia compra commodities em contratos de longo prazo e costuma fazer operações de hedge para proteger-se de sua exposição às variações - de forma que o impacto dos preços mais baixos pode levar seis meses ou mais para chegar aos lucros em seus balanços. A mudança de direção tem pouco impacto em comparação à pressão que a indústria processadora enfrenta no outro lado de suas operações: consumidores com menos dinheiro disponível. Portanto, o que pareceria ser uma pausa para descanso provavelmente será aproveitado pelas redes varejistas para tentar atrair compradores, segundo analistas. "As commodities agrícolas claramente retrocederam um pouco e geralmente isso é boa notícia para a indústria", afirma Jamie Isenwater, analista do Deutsche Bank. "No entanto, isso de fato exige uma decisão difícil e, de certa forma, poderíamos argumentar que sair de uma alta nas commodities é mais difícil de administrar do que seguir atravessando uma", acrescenta. A decisão se resume a aproveitar os ganhos, dando fôlego a suas pressionadas margens de lucros, ou repassá-los aos consumidores para ampliar as vendas em volume. Para os grandes grupos alimentícios europeus, como Nestlé, Unilever e Danone, a primeira opção seria a preferível, de acordo com analistas. A escolha, entretanto, não é exclusiva deles: redes varejistas e outras companhias alimentícias complicam ainda mais a equação. O analista Alan Erskine, do UBS, chama a situação de " dilema do prisioneiro". "Quando você tem um ambiente "macro" como o que temos hoje e promiscuidade [ou indiferença] dos consumidores em relação aos preços, então sempre haverá alguém que cederá saindo das fileiras." Andrew Lazar, analista do Barclays Capital, especializado em consumo, acrescenta que os "varejistas estão sempre pressionando os processadores" de alimentos. As empresas alimentícias deveriam aprender com os erros cometidos em 2009, quando reduziram os preços depois do declínio das commodities para tentar impulsionar os volumes, afirma Lazar. Como os consumidores dos Estados Unidos continuavam fragilizados, os descontos não geraram crescimento no volume de vendas e levaram à queda nos lucros. Erskine concorda. A indústria de alimentos não conseguiu manter as margens em 2009 "e muitos dos que tentaram aprenderam rapidamente a lição". Outro problema com a deflação, acrescenta, é seu caráter de novidade: com exceção de 2009-2010, o setor não tem muita experiência em lidar com a situação. "Quando há qualquer pressão inflacionária, eles têm manuais de sobra [...], mas para a deflação não há tantos." O declínio no índice da FAO é resultado do recuo na cotação de grãos, açúcar e óleos vegetais, em meio aos receios de queda na demanda e desaceleração da economia mundial, algo exacerbado pelo fato de que os preços estavam perto de patamares recorde. De qualquer forma, os operadores continuam acreditando que o preço de alimentos, como milho, carne bovina ou arroz, poderia atingir novos recordes, por falta de oferta. Apesar do recente recuo, o índice de preços de alimentos da FAO continua 16% acima de onde estava há 12 meses. Historicamente, as empresas de produtos embalados geraram cerca de 50% do valor para os acionistas quando elevaram os preços em tempos de alta das matérias-primas e, depois, os mantiveram durante quedas subsequentes, afirma o consultor Richard Benson-Armer, da McKinsey. Muitos conglomerados ligados ao setor de alimentos, ao repassar apenas aumentos modestos nos preços que cobram, absorveram a alta de custos quando as commodities subiram e deveriam recuperar isso quando os custos recuam, acrescenta. Concretizar isso, contudo, nem sempre é fácil, especialmente com os supermercados envolvidos em guerras de preço e os consumidores em situação de instabilidade financeira. Além disso, preços baixos nem sempre equivalem a grandes vendas. Como observa Erskine, a elasticidade é uma mão de duas vias. "As pessoas sempre compram a mesma quantidade de papel higiênico, não importa o preço", afirma. (Colaborou Jack Farchy) |
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