quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O debate da desindustrialização

http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/8/25/o-debate-da-desindustrializacao
Brasil - Cristiano Romero
Valor Econômico - 25/08/2010

Vários dados desmentem a tese de desindustrialização, mas é importante ficar atento à indústria do pós-crise
Há sinais de que a indústria brasileira vem perdendo competitividade no pós-crise. Aparentemente, as exportações subsidiadas da China, principalmente para mercados tradicionais do Brasil na América Latina, e a valorização do real frente ao dólar explicam parte do problema. É cedo, no entanto, para falar em desindustrialização e, portanto, na necessidade de adoção de medidas anacrônicas, como o fechamento do mercado nacional sugerido pelo presidente da Fiesp, Benjamin Steinbruch.
Dados compilados pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) mostram que, depois de gerar superávits comerciais por cinco anos consecutivos, a indústria começou a acumular déficits em 2008. No primeiro semestre daquele ano, o resultado negativo foi de US$ 997 milhões. No mesmo período de 2009, o déficit ampliou-se para US$ 2,1 bilhões e, entre janeiro e junho deste ano, saltou para US$ 14,3 bilhões, o maior desde 1989.
Estudiosos do assunto, os economistas Régis Bonelli e Samuel Pessoa, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas, afirmam que não dá para falar em desindustrialização no período que vai até 2008, ano em que o país sofreu os efeitos da crise financeira internacional. O processo de redução da participação da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) resultou, nos últimos 40 anos, de fatores conjunturais e, especialmente, das transformações estruturais ocorridas na economia - aqui e no mundo.
Em 1947, a indústria de transformação respondia por 20% do PIB no Brasil. Em 1985, essa participação chegou ao pico - 36%. Em 2008, caiu para 16% do PIB. Para entender o contexto dessa mudança, Bonelli e Pessoa estudaram, de forma meticulosa, as experiências brasileira e internacional e constataram que o encolhimento da indústria é um fenômeno global.
Considerando um grupo de 185 países, portanto, quase a totalidade das nações, observa-se que, em 1970, o produto industrial era responsável por 25% do PIB mundial. Em 2007, a participação caiu para pouco menos de 17%. Ao analisar o que ocorreu em 16 países semelhantes ao Brasil, Bonelli e Pessoa concluíram que o país estava "sobreindustrializado" no início dos anos 70 do século passado, ou seja, tinha uma participação da indústria no PIB bem superior, na média, à das outras economias. Um das razões para isso foi o aprofundamento do modelo de substituição de importações nos anos 70 e 80.
No período 1970-1972, a indústria representava 25,3% do PIB brasileiro, face a uma média de 20,4% nos 16 países avaliados. Já em 2005-2007, os percentuais caíram, respectivamente, para 15,7% e 14,6% do PIB. É verdade que o recuo da indústria foi mais intenso no Brasil, mas o que Bonelli e Pessoa sustentam é que, enquanto esteve acima da média nos anos 70 e 80, o Brasil voltou à "normalidade" em termos de produção industrial nos anos 90, levando-se em conta suas características socio-econômicas e tecnológicas.
Quando se observa o comportamento recente, vê-se que o emprego industrial cresceu de 12,8% do total em 1992 para 14,4% em 2008, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). A Pesquisa Industrial Anual (PIA), feita também pelo IBGE, revela, por sua vez, que o emprego na indústria aumentou de 7,44% da população ocupada total em 1996 para 8,35% em 2008. No mesmo período, a participação do investimento da indústria na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) pulou de 14,4% para 18,5%. Tudo isso desmente a tese da desindustrialização.
Bonelli e Pessoa, que tratam do tema na Carta do Ibre que será divulgada nos próximos dias, reconhecem que é preciso examinar de forma rigorosa a tendência daqui em diante, ou seja, do pós-crise de 2008. No ciclo de crescimento iniciado em 2003 e interrompido em 2008 pela turbulência mundial, a economia brasileira acelerou puxada principalmente pela demanda externa. No ciclo atual, é o mercado interno que está liderando a alta do PIB.
Nesse contexto, o déficit em transações correntes está crescendo de forma acelerada - de 1,72% do PIB em 2008 para 2,5% do PIB em 2010, segundo projeção do Banco Central. Com déficits externos crescentes e com a valorização do câmbio, que permite o financiamento internacional do excesso de consumo e investimento, é "natural", assinalam os dois economistas da FGV, "que ressurjam preocupações sobre o impacto da moeda forte no setor industrial".
Bonelli e Pessoa lembram que, no pós-crise, a exportação brasileira de produtos manufaturados não retornou ao padrão de 2008, "o que é preocupante". "Como se sabe, a China reagiu à crise mantendo o nível do seu câmbio nominal, tanto no momento inicial de desvalorização das moedas em geral em relação ao dólar, quanto na subsequente reapreciação. À medida que os efeitos da turbulência foram se dissipando, processo particularmente rápido no mundo emergente, as moedas desses países - e, especialmente a daqueles, como o Brasil, que se beneficiam da alta das commodities - valorizaram-se ante o dólar, e, consequentemente, diante do yuan", explicam os economistas. "Por outro lado, com a retração do consumo nos países ricos, cujo tecido econômico foi danificado de forma mais duradoura pela crise, a China tende naturalmente a voltar suas baterias exportadoras para países emergentes."
O "efeito China" pode estar por trás da "primarização" da pauta de exportações do Brasil. A perda de competitividade, medida pelo déficit comercial no primeiro semestre, é maior nos bens de média-alta tecnologia e naqueles fabricados por atividades consideradas de alta intensidade. É prematuro, no entanto, afirmar que o Brasil sofre de desindustrialização. "Não se trata de uma sangria desatada, e reações precipitadas - especialmente no sentido de alterar o regime macroeconômico e o cambial - seriam certamente equivocadas", comentam Bonelli e Pessoa. O câmbio, como se sabe, é mais um sintoma do que a causa dos problemas estruturais da economia brasileira.


Demanda asiática garante PIB do Brasil, diz Conceição

Valor Econômico - 25/08/2010
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O crescimento da Ásia deve garantir a blindagem do Brasil em relação à atual crise econômica mundial, segundo a ex-deputada federal pelo Rio de Janeiro e economista Maria da Conceição Tavares, que foi homenageada ontem pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde fez uma palestra. Para Conceição, há um horizonte de longo prazo de demanda asiática, sobretudo chinesa, por matérias-primas fabricadas no Brasil.
"Não há nenhuma armadilha no modelo, porque o país não está parado, dependente de exportações primárias, como é o caso da Venezuela. O que acontece é que estamos aproveitando um ciclo de longo prazo de alta nos produtos. A China domina a indústria de transformação no mundo e não tem matérias-primas. A China está obrigada a crescer rápido ainda por muitos anos e não vai parar de crescer pelo menos nas próximas três décadas", afirmou a economista, para quem o Brasil passou por uma curta, embora intensa, recessão no começo do ano passado, da qual saiu ainda em 2009 em razão da demanda chinesa.
"É como ocorreu em relação à Inglaterra no passado, sendo que dessa vez a China tem dimensões continentais", comentou Conceição, para quem " a mudança do centro econômico do Reino Unido para os Estados Unidos não nos foi favorável historicamente, porque os Estados Unidos sempre foram grandes produtores concorrentes de matérias-primas".
Para Conceição, o cenário para o país é o mais favorável "desde o governo de Juscelino Kubitschek", afirmou, referindo-se ao presidente que governou entre 1956 e 1961. A economista afirmou que o crescimento econômico brasileiro, ainda que abaixo do registrado na Ásia, não acentua desigualdades sociais. Conceição afirmou que, diferentemente do que se divulgou, o aumento do salário mínimo superou, em termos proporcionais, a rentabilidade das instituições financeiras nos últimos anos. "É preciso não confundir crescimento com melhoria de vida do povo. São coisas que não andam necessariamente juntas. Vive-se melhor em qualquer acampamento do MST do que na China rural", disse.
O ciclo favorável da economia brasileira, contudo, tem limites no contexto internacional, de acordo com a economista de origem portuguesa. "Não temos vocação para ser potência dominante mundial. Ninguém pode imaginar que o real será a nova moeda internacional. Quando muito, o Brasil será potência regional", afirmou.
A economista completou 80 anos em abril, com uma festa no Rio de Janeiro, que reuniu os dois principais candidatos presidenciais, José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), ambos também economistas. Conceição lecionou na Unicamp, onde conviveu com ambos. Ainda ligada ao PT, partido pelo qual elegeu-se deputada federal em 1994, Conceição já gravou uma mensagem de apoio a Dilma este ano e ontem ironizou Serra. "No Brasil, a direita vem a reboque da social-democracia. O Serra no meu tempo não era tão conservador. Algumas pessoas, quando envelhecem, ficam burras", disse.
Ao comentar a questão da independência do Banco Central, Conceição afirmou que já tratou do tema com a candidata do PT. "Sou contra a independência formal do Banco Central, isso não pode existir na política econômica, como na prática não existe em relação ao Fed. Falei sobre isso com a Dilma e ela fala não sobre o assunto agora por razões que me parecem óbvias", afirmou. O Fed, Federal Reserve System, é a autoridade monetária dos Estados Unidos.

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