domingo, 18 de dezembro de 2011

Coreana Hyundai turbina Piracicaba

São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2011Mercado
Mercado


Polo automotivo leva cidade a decisão inédita, de orientar novos investidores a procurar outras cidades da região
Município avalia que impacto econômico da montadora levará pelo menos dez anos para ser assimilado
AGNALDO BRITO
ENVIADO ESPECIAL A PIRACICABA
Deok Soo Kim tem 29 anos. Simpático, tenta ensinar ao repórter a pronúncia correta, em coreano, de "obrigado". Em vão. Kim é um dos 700 expatriados coreanos que transitam ligeiros e quietos pelos mais de 70 mil metros quadrados do mais novo polo automotivo do Brasil.
Instalado em Piracicaba, município distante 160 quilômetros a noroeste de São Paulo, a fábrica da coreana Hyundai está mudando o status industrial da velha cidade canavieira.
Mudou tanto que o município decidiu adotar uma posição, no mínimo, curiosa: Piracicaba está recusando novas indústrias e orientando-as a buscar abrigo nas cidades vizinhas.
"Se a indústria quiser vir para Piracicaba, tudo bem. Mas agora não tem benefício, não tem terreno. Só com a Hyundai vamos precisar de dez anos para assimilar tudo o que veio para cá", diz José Antônio de Godoy, secretário de governo de Piracicaba.
Com investimento de US$ 600 milhões, a Hyundai corre para começar a testar a fábrica em abril de 2012 e inaugurá-la em novembro do próximo ano. Pelas esteiras e elevadores passará um veículo compacto inédito em qualquer uma das seis fábricas da montadora no mundo: o Projeto HB (Hyundai Brasil).
O plano é produzir em Piracicaba 150 mil veículos por ano. Para isso, a montadora vai contratar 2.000 funcionários. A marca já atraiu nove autopeças para o parque automotivo. Mais fornecedoras brasileiras do novo carro da Hyundai estão habilitadas para o projeto HB.
Toda a estrutura está sendo erguida numa área de 1,84 milhão de metros quadrados, onde antes brotava cana-de-açúcar.
EFEITOS
Resultado do plano Investe São Paulo, criado pelo governo estadual, o projeto da Hyundai dará novo impulso à cidade de Piracicaba. A desapropriação da área rural para a instalação do parque automotivo custou R$ 5,5 milhões. A cidade calcula que vai recuperar cada centavo.
A meta de produzir 150 mil veículos por ano resultará no aumento da participação da cidade no bolo do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Piracicaba estima que só a Hyundai vai incrementar as receitas desse imposto em mais de R$ 30 milhões por ano. Hoje, a cidade arrecada R$ 350 milhões. "O valor deve ser maior, mas não temos como estimar os efeitos das fornecedoras", diz Godoy.
Os efeitos econômicos já começaram. A cidade vai ganhar novo shopping. Quinze novos condomínios já foram lançados.
"São investimentos que não possuem o benefício fiscal do setor automotivo e que, portanto, já geram efeitos nas receitas da cidade."
A formação técnica também avançou. Instituições dos governos federal e estadual e da indústria (o Senai) ampliaram a oferta de cursos de 1.200 para mais de 2.500 vagas por ano.
Todos correm. O brasileiro Jairo Pierin, 33, e o amigo coreano Kim vão ajustando os robôs enfileirados na seção de montagem dos chassis. E ambos sabem que estão próximos de um recorde: erguer uma fábrica de automóvel em um ano e nove meses.



Nem coreano, nem português; vale o inglês
DO ENVIADO A PIRACICABA
Funcionários brasileiros e coreanos da Hyundai criaram uma lista com 67 verbetes para facilitar o diálogo imprescindível ao processo de construção do complexo industrial de US$ 600 milhões.
Expressões cotidianas, como "bom dia", "boa tarde", ou perguntas do tipo "qual o seu nome", fazem parte da lista. Acharam de incluir até a frase "Sarán rêio" (pronúncia, em língua coreana, para "Eu te amo").
Mas, entre as línguas coreana e portuguesa, o que mais se ouve no canteiro de obras da fábrica da Hyundai em Piracicaba é o inglês.
Eui Hwan Jin, diretor-executivo de administração -um dos quatro diretores da montadora no Brasil-, tem uma missão bastante importante, e usa o inglês para isso.
A meta é introduzir a cultura da península sul-coreana no dia a dia dos 2.000 funcionários brasileiros que a montadora se prepara para começar a contratar.
Há 26 anos na companhia, Jin tem experiência internacional em novos projetos e em novos mercados. Ele foi executivo na implantação das fábricas dos Estados Unidos e da Índia, e sabe que cada país tem suas peculiaridades.
"O grande desafio é trazer a cultura da organização. A recepção local é sempre muito boa, afinal estamos montando uma fábrica. Mas há desafios para fazer o projeto funcionar", afirma Jin.
Os brasileiros envolvidos na instalação da fábrica já perceberam que hierarquia é um conceito central na cultura coreana. "Jamais poderei ser mais velho do que meu chefe", explica um brasileiro. A presença coreana em Piracicaba vai diminuir, mas a meta é ter a onipresença.
Dos 700 coreanos expatriados que rodam o complexo automotivo (o que inclui 400 só na Hyundai e 300 das demais nove autopeças), poucos ficarão. Após a montagem da maquinaria, a maior parte volta para a Coreia.
A Prefeitura de Piracicaba avalia que cerca de 150 coreanos devem ficar na cidade. A ideia inicial de que Piracicaba seria "invadida" por coreanos começa a diluir.
Dos quatro restaurantes inaugurados para a "colônia" coreana, apenas dois estão abertos. Uma igreja metodista missionária para a comunidade daquele país também surgiu na cidade. A igreja metodista tem tradição em Piracicaba. Possui até uma universidade.
(AB)




São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2011Mercado
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MERCADO ABERTO
MARIA CRISTINA FRIAS - cristina.frias@uol.com.br
POR DENTRO DA EMPRESA
TRÊS CARROS POR MINUTO
Fábrica em Minas produz 15 modelos e mais de 50 versões
'Chinês quer baixo conteúdo nacional'
Cledorvino Belini, presidente da Anfavea (associação dos fabricantes de veículos automotores) e da Fiat, afirma que chineses que anunciam fábrica no país não planejam produzir carros com alto conteúdo nacional.
"A Jac Motors disse que vai fazer uma fábrica na Bahia com R$ 900 milhões. Fico pensando, mas nós somos idiotas aqui. Gastei R$ 1 bilhão para fazer um carro [o novo Palio], e o cara vai fazer fábrica e produto? O diferencial é o índice de nacionalização. Trabalhamos com índice muito alto e quem está chegando está pensando em índice baixo", afirma.
"Quem entra acha fácil atender [aos 65% de nacionalização exigidos]. Pode produzir na Argentina, no México e trazer."
O percentual de carros que montadoras no Brasil trazem do Mercosul e do México é de cerca 13%.
"Os próprios fornecedores e montadoras estavam comprando componentes na Ásia. A tendência agora é reduzir essas importações."
O setor, com caminhões e ônibus, deve crescer em torno de 5% em 2011, estima. O Brasil já fecha como quinto mercado, "atrás da Alemanha, mas mais atrás, do ponto de vista industrial. O país está importando muito".
Em 2011, o Brasil deve trazer cerca de 850 mil veículos e exportar 500 mil, estima.
Belini afirma que não basta o governo exigir investimentos em pesquisa e inovação. "No mundo, essa área é muito subsidiada. A 'Lei do Bem' talvez não seja suficiente ainda", diz.
"Uma coisa é exigir e outra é realmente investir. Temos custo de capital alto, enquanto o de nossos concorrentes é próximo de 1%."
A empresa começou em 2011 a investir R$ 10 bilhões (do plano até 2014), sendo R$ 7 bilhões na fábrica em Betim (MG), para elevar a produção. O resto irá para a nova unidade em Pernambuco.
"A tendência é fazermos aporte similar em 2015."
A Fiat, como a indústria em geral, reclama do custo da energia. "Em Minas, é mais cara que em outros Estados, como SP. A única solução que encontrei é que em Pernambuco a energia é mais barata", ironiza, em alusão à crítica mineira pela escolha do Estado para a nova planta.
Com relação à crise, Belini afirma não temer grande efeito negativo, dado o forte mercado interno. "O cenário [ante 2009] é outro hoje. Não acredito que se toque em IPI."
com JOANA CUNHAVITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ



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