segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Belo Monte: coerção nos canteiros de obra. Entrevista especial com Ruy Sposati

5/12/2011

O clima no canteiro de obras de Belo Monte é tenso e a greve iniciada na última semana está suspensa. Depois de apresentarem a pauta de reivindicações, os trabalhadores foram convencidos de que retornar ao trabalho seria a melhor opção. Entretanto, nem todos aderiram à decisão e alguns ainda prometem outra greve nos próximos dias.
Para compreender as condições de trabalho e as razões que originaram a paralisação, a IHU On-Line conversou por telefone com o jornalista Ruy Sposati, do Movimento Xingu Vivo para Sempre, que há sete meses está em Altamira acompanhando os debates sobre Belo Monte. Segundo ele, “após uma tarde de conversa, o sindicato conseguiu convencer os trabalhadores de que seria melhor suspender a greve do que negociar, porque a empresa ficou de resolver imediatamente o problema da água e da comida, mas o restante da pauta só seria discutido se a greve fosse suspensa”.
Ruy Sposati diz ainda que a negociação “foi acompanhada por um assessor da Secretaria de Articulação Social, da Secretaria Geral da Presidência da República, Avelino Ganzer, ligado à CUT. Ele é um petista da articulação antiga e durante a reunião distribuiu cartões para os trabalhadores e disse que estava ali para ajudar. É inexplicável”. E reitera: “Esse aparato do sindicato, dizendo que a melhor tática era suspender a greve, a figura do governo insistindo para que a greve fosse suspensa e a empresa pressionando, fez com que aquelas manifestações espontâneas dos trabalhadores acabasse. Então, eles suspenderam a greve, apesar de dizer que ela pode voltar a qualquer momento. Daqui para frente sempre haverá duas disputas: a dos trabalhadores, que querem melhorias, e a do sindicato, governo e empresa, que formam um bloco pelo fim da greve”. Os conflitos entre os trabalhadores e o consórcio que administra a obra ocorrem desde o mês passado. No dia 16-11-2011, informa, 138 trabalhadores foram demitidos como forma de represália por parte do consórcio que administra a obra, porque alguns operários reclamaram das condições de trabalho. “40 policiais da Rotam, a polícia de elite de Belém, foram ao canteiro de obras e colocaram 137 dos 138 trabalhadores dentro de ônibus e mandaram todos de volta para o Maranhão”, relata.
O jornalista também lamenta o desinteresse da imprensa local em noticiar as greves e a precária situação de trabalho dos operários. “Esta foi uma das principais greves que estão ocorrendo na obra mais polêmica do Brasil e do mundo, mas não teve cobertura da imprensa local. Na verdade, eles ignoraram Belo Monte completamente”.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual a atual situação da greve dos trabalhadores da hidrelétrica de Belo Monte?
Ruy Sposati – Os trabalhadores agendaram mais uma rodada de negociação com a empresa no dia 1-12-2011, mas eu não consegui descobrir onde seria feita a reunião. A primeira rodada formal de negociação com a empresa aconteceu no dia 30-11-2011 através do sindicado. Segundo os trabalhadores, nesta reunião não foi discutida a pauta econômica. Eles discutiram apenas os pontos administrativos: a questão da água, que, segundo eles, está insalubre; a alimentação; as faltas excessivas registradas porque o relógio de ponto estava com problemas. As pautas econômicas que têm a ver com reajuste salarial, com as horas extras que não são pagas, e a baixada (tempo de retorno que os trabalhadores têm para voltar para a sua terra de origem) não foram discutidas.
A princípio, segundo o acordo que o sindicato fez com a empresa, a greve está suspensa. Em contrapartida, no dia 30-11-2011, por exemplo, cerca de 2/3 dos trabalhadores não foram para o canteiro de obras de Belo Monte. Eles moram descentralizadamente, em repúblicas e nem todos foram avisados de que a greve tinha sido suspensa para iniciar as negociações. Entretanto,aproximadamente 800 trabalhadores voltaram para os canteiros. De acordo com um dos diretores do sindicato, foi muito difícil entrar no canteiro de obras, porque os trabalhadores tinham feito um piquete com um ônibus na entrada do canteiro.
IHU On-Line – Quais foram as razões que motivaram a greve dos trabalhadores da hidrelétrica de Belo Monte? Como tudo começou?
Ruy Sposati – Essa já é a segunda greve que acontece nas obras da hidrelétrica. No dia 12-11-2011 eles fizeram a primeira greve por causa da demissão, segundo os trabalhadores, de quatro operários no dia anterior, 11-11-2011. Parece que o encarregado principal do canteiro exigiu que quatro trabalhadores fizessem o deslocamento de algumas madeiras, que eles chamam de pranchões, toras de madeira muito grandes que só podem ser retiradas dos caminhões com máquina ou trator. Esses trabalhadores eram pedreiros, e, de acordo com o contrato de trabalho, não pode haver desvio de função. Inclusive na própria integração que o consórcio faz com os trabalhadores, foi-lhes orientado a não realizar funções que não sejam suas. Esses trabalhadores se negaram a fazer o trabalho que, segundo eles, configurava desvio de função e, então, foram demitidos imediatamente. Isso gerou um rebuliço e alguns trabalhadores ameaçaram colocar fogonos alojamentos, mas outros tiveram a ideia de tentar negociar com a empresa a readmissão desses quatro trabalhadores.
Tropa de elite nos canteiros de obra
Eles conseguiram conversar com a diretoria do canteiro e contaram que havia desvio de função e que as questões postas no contrato não estavam sendo cumpridas. No dia 12-11-2011, a empresa pediu que eles elegessem uma comissão e o próprio consórcio sugeriu que quatro operários que estavam ajudando a conter os ânimos participassem. Nesta primeira rodada de reunião, os trabalhadores apresentaram a pauta e a empresa se comprometeu a trazer as respostas no dia 24-11-2011. A questão é que, no dia 16-11-2011, uma semana antes do dia 24-11-2011, apareceu uma lista de demissões, com 138 nomes. 40 policiais da Rotam, a polícia de elite de Belém, foram ao canteiro de obras e colocaram 137 dos 138 trabalhadores dentro de ônibus e mandou todos de volta para o Maranhão. As quatro lideranças que estavam na comissão de trabalhadores ficaram o dia inteiro no canteiro, passando por várias humilhações, porque a chefia do canteiro começou a dizer publicamente que, por causa desses quatro, os outros tinham sido demitidos. Os trabalhadores pediram para ir a Altamira, porque aqui tem mais acesso a telefone, internet, defensoria pública, imprensa, Ministério do Trabalho, mas o pedido não foi atendido e eles receberam passagens para Marabá, e de lá, eles foram para Estreito, cidade de origem.
Pauta de reivindicações
Entre as reivindicações, os trabalhadores pediram reajuste salarial de 30%: o piso salarial é de 900 reais líquidos; as horas extras que não estão sendo pagas, especialmente no sábado, que deveriam receber 100%; e a questão da baixada. Outro aspecto que contribuiu para que estourasse a greve foi o fato de que não vai haver recesso no Natal e no Ano Novo. Além disso, têm os problemas com a alimentação, que é feita em Altamira, ou seja, a 50 km do canteiro de obras. Segundo os trabalhadores, a comida chega podre nos canteiros. Eu encontrei cinco trabalhadores hospitalizados por intoxicação alimentar, e o que eles dizem é que entre 200 e 250 pessoas tiveram problemas gastrointestinais por conta da comida e da água.
Então, num primeiro momento houve um levante grevista, em que os trabalhadores tentaram começar um processo de negociação. A resposta da empresa foi extremamente autoritária, para não dizer absurda. O caso foi abafado e, por acaso, consegui conversar com os trabalhadores, porque, um dia antes, eu os conheci em um barzinho. Nós trocamos telefones e eu disse que sempre que eles tivessem uma notícia podiam me telefonar. No dia seguinte, eles telefonaram contando da demissão.
IHU On-Line – Como é a rotina dos trabalhadores? O que eles relatam?
Ruy Sposati – A rotina é pesada. Os trabalhadores que não moram nos canteiros de obras costumam acordar às 4 horas da manhã. Eles tomam café nos refeitórios da empresa e às 5 horas pegam o ônibus e vão para os canteiros. Apesar de acordarem tão cedo para se prepararem para o trabalho, eles são obrigados a preencher a folha de ponto às 7 horas da manhã, horário em que começam as atividades. Eles saem do canteiro por volta das 17h30min, jantam no refeitório e chegam em casa por volta das 18h30, 19h.
IHU On-Line – O Sindicato dos Trabalhadores da Construção Pesada do Pará – Sintrapav esteve presente no canteiro de obras. Porém, como você informou, alguns trabalhadores não reconhecem o sindicato como entidade negociadora da categoria. Quem está representando os trabalhadores e como o Consórcio Construtor Belo Monte tem se manifestado a respeito das reivindicações?
Ruy Sposati – O sindicato representa legalmente esta categoria, e já estava negociando o reajuste salarial, muito embora os trabalhadores não soubessem disto. Alguns trabalhadores não reconhecem o sindicato no sentido da legitimidade porque nenhum diretor da instituição é da base. Quando estourou a primeira greve, o sindicato não mandou nenhum representante. Então, se vê uma distância muito grande entre o modo como o sindicato está operando e o que os trabalhadores querem.
O sindicato tomou frente nas negociações porque os trabalhadores não se sentiram à vontade para montar uma comissão ou um comando de greve por causa das demissões que ocorreram. Isso gerou uma necessidade de criar o padrão do anonimato, mas, em contrapartida, isso gera um novo problema na hora de indicar o caminho das coisas. De acordo com o sindicato, foram realizadas assembleias nos canteiros para poder subsidiar a pauta de reivindicações que seria protocolada na Superintendência Geral do Trabalho. A partir das assembleias, montou-se uma comissão com três trabalhadores do canteiro Pimental, dois trabalhadores do canteiro de Belo Monte e um trabalhador de outro canteiro. Após uma tarde de conversa, o sindicato conseguiu convencer os trabalhadores de que seria melhor suspender a greve do que negociar, porque a empresa ficou de resolver imediatamente o problema da água e da comida, mas o restante da pauta só seria discutido se a greve fosse suspensa.
Olheiro governista
Outro fator muito esquisito foi o fato de que essa negociação foi acompanhada por um assessor da Secretaria de Articulação Social, da Secretaria Geral da Presidência da República, Avelino Ganzer, ligado à CUT. Ele é um petista da articulação antiga e durante a reunião distribuiu cartões para os trabalhadores e disse que estava ali para ajudar. É inexplicável.
Esse aparato do sindicato, dizendo que a melhor tática era suspender a greve, e a figura do governo insistindo para que a greve fosse suspensa, e a empresa pressionando, fez com que aquelas manifestações espontâneas dos trabalhadores acabasse. Então, eles suspenderam a greve, apesar de dizer que ela pode voltar a qualquer momento. Daqui para frente sempre haverá duas disputas: a dos trabalhadores, que querem melhorias, e a do sindicato, governo e empresa, que formam um bloco pelo fim da greve.
IHU On-Line – Como você analisa a cobertura da imprensa local em relação à construção de Belo Monte e à greve dos trabalhadores?
Ruy Sposati – Essa é uma questão muito esquisita, porque apenas a TV da Prelazia, que aceita nossas pautas, visitou o canteiro de obras. O intrigante é que a emissora publicou a matéria sobre a greve dias depois, apesar de ela ter sido a principal pauta regional. Foi uma das principais greves que está ocorrendo na obra mais polêmica do Brasil e do mundo, mas não teve cobertura da imprensa local. Na verdade eles ignoraram Belo Monte completamente.
Para divulgar os problemas trabalhistas, os trabalhadores sequestram uma van da empresa e tentam buscar alguém de lá (da empresa). Essa foi a maneira como eu fui pela primeira vez em um canteiro de obras: eles vieram me buscar.
A maioria das matérias que circulam é paga pelo consórcio e daí se veem várias informações esquisitas, dizendo que não havia greve, que era apenas uma manifestação de um grupo pequeno de trabalhadores. Mesmo eu, que estou aqui, tenho dificuldade de conseguir informações. Soube há poucos dias que os trabalhadores do canteiro Pimentel também entraram em greve, mas como os canteiros são distantes, não há muita comunicação entre os trabalhadores.
O que existe é um silêncio absoluto da imprensa local. Como a afiliada da Rede Globo não cobriu a greve, a Globo nacional não tinha imagens para divulgar. Isso enfraquece as greves. Os trabalhadores esperavam que houvesse uma cobertura jornalística que ajudasse outros trabalhadores a se solidarizarem e incorporarem à greve.
Agora, na hora em que é preciso tentar apunhalar um obstáculo dos planos das construtoras, como fizeram com o Felício Pontes Júnior no final da semana passada em relação ao diálogo do MPF com os xikrin do rio Bacajá  afluente do Xingu, que não foi estudado no EIA da hidrelétrica , ou difamar em manchetes quem minimamente se engaja para discutir Belo Monte, como fizeram com o pessoal da Gota d'Água, aí a imprensa é brilhante.
IHU On-Line – Depois da última greve, percebe uma articulação entre os trabalhadores dos três canteiros de obras de Belo Monte?
Ruy Sposati – Acredito que isso aconteça entre o grupo da comissão. Os trabalhadores estão espalhados, cada grupo diz, pensa e planeja uma coisa diferente. Por exemplo, vários dizem que a greve vai terminar na segunda; outros acham que a greve vai continuar; outro grupo diz que farão nova greve nos próximos dias.
Como eles estão recebendo uma parcela do 13º salário esta semana, muitos não estão trabalhando, mas isto não configura greve. Por outro lado, muitos dizem que continuam em greve, e ainda existe um esforço trágico da comissão, do sindicato e da empresa de colocar os trabalhadores para trabalhar. No dia 1-12-2011, houve uma briga longa no canteiro Pimental para colocar os trabalhadores de volta nos canteiros, porque eles não queriam trabalhar até as coisas estarem resolvidas.
IHU On-Line – Como você vê a iniciativa do movimento Gota d’Água e como ele está repercutindo na região?
Ruy Sposati – É um movimento que contribui com a discussão e com a trincheira de luta contraBelo Monte. É um grupo que veio a calhar num momento em que se tinham certo desmerecimento e várias derrotas judiciais. O Gota d’água voltou a tencionar a corda no campo social. Agora, ele, por si só, não vai resolver o problema de Belo Monte ou realmente solucionar a discussão de como se explora a Amazônia.
Localmente fizemos um esforço de propagandear o vídeo da campanha do movimento Gota d’Água, mas ele não passa na televisão. O acesso à internet em Altamira é muito precário: nós estamos isolados, mas copiamos o vídeo e o distribuímos nas comunidades indígenas. Quando visitei o canteiro de obras, perguntei para os trabalhadores se eles conheciam o movimento; porém, ninguém tinha visto o vídeo. Percebo que na região há uma ausência deste conjunto de informações que rola na internet.
IHU On-Line – Como os indígenas e a população estão se mobilizando em relação a Belo Monte? Qual a expectativa para o encontro dos 300 indígenas com a Norte Energia?
Ruy Sposati – Durante um longo período a população de Altamira era contrária a Belo Monte e houve um grande período de resistência. Em função das alterações do projeto inicial e o esforço do governo de construir as hidrelétricas, algumas pessoas passaram a receber indenizações e a divulgar os planejamentos de realocação das famílias e isso criou um clima dual na cidade.
O movimento de resistência à construção de Belo Monte era o mesmo movimento do Partido dos Trabalhadores, da CUT e dos movimentos que estavam em torno do grupo político do atual governo federal. À medida que o governo assumiu para si a pauta de Belo Monte, houve uma crise interna na luta. 90% da militância que estava na política de luta contra Belo Monte deixou de estar à medida em que passou a apoiar o projeto do governo. Esses grupos, no entanto, têm dificuldade de defender publicamente o projeto.
Apesar da crise interna do movimento, a população criou um clima esperançoso. Parte da população pensa que Belo Monte poderá gerar mais empregos e a cidade irá se modernizar; outros pensam que a hidrelétrica é prejudicial porque irá prejudicar o rio Xingu e espoliar as populações locais.
Consequências
Em certa medida, quando as obras iniciaram e o consórcio começou a cadastrar os empregos, aumentou a sensação de que Altamira iria melhorar por causa do consenso de que a Norte Energia iria construir escolas, hospitais, pavimentar as ruas, fazer tratamento de água, etc. Três, quatro meses depois, várias sinalizações demonstraram que a situação não estava engrenando. A prefeitura de Altamira foi acionada por mais de 40 sindicatos e por grupos econômicos; ela e assinou um documento para o Ministério Público Federal, denunciando que as obras que beneficiariam a população não estavam sendo feitas e pedindo a suspensão da licença de instalação. As pessoas passaram a perceber que ninguém estava sendo bem indenizado, porque os valores de indenização para que as pessoas deixem suas casas são de 6 mil reais. Com o boomimobiliário que está acontecendo em Altamira, ninguém consegue comprar nada com esse valor. As pessoas também começaram a perceber que não haveria muitos empregos, porque os moradores locais só conseguem trabalhar como ajudantes de pedreiro. Essa é uma atividade que tem bastante rotatividade porque todos os dias várias pessoas são demitidas. Contratam muitas mulheres para serem ajudantes de carpinteiro e pedreiro. Demissão e assédio acontecem a “rodo”.
Paralelamente a essa situação, tem a questão dos índios, que passaram pelo mesmo processo. Eles dizem que não pediram Belo Monte e, portanto, não querem a hidrelétrica. Mas, na medida em que o governo insiste em construir a usina e eles não têm como impedir a obra, tentam reduzir os danos e cobram o cumprimento das condicionantes estabelecidas pela Funai. Eles estabeleceram uma verba mensal de 30 mil reais para cada aldeia poder fazer listas de compras do que eles quisessem e a Funai faria a intermediação. Assim, a Norte Energia compraria e a Funaientregaria as compras para os indígenas. Eles receberam essa verba durante um ano e alguns meses. Várias aldeias pediram cestas básicas e alguns índios começaram a ficar sedentários, ficaram doentes e ninguém trabalhava. Algumas lideranças começaram a pedir coisas específicas, de interesse pessoal, independentemente da vontade do restante da aldeia, o que gerou briga e divisão entre eles. Inicialmente, quando foram feitos os cadastros para pagar o plano emergencial de 30 mil, 26 aldeias se cadastraram, mas agora outras oito reivindicam o dinheiro.
Surgiram novos conflitos e a Funai decidiu não trabalhar mais com essas listas, mas sim com projetos. Elaboraram projetos para plantio, transporte, habitação, etc. O debate agora está em torno do posicionamento dos indígenas, que reivindicam uma renda vitalícia, ou seja, eles querem receber um valor em dinheiro enquanto existir Belo Monte. Eles deram um ultimato: ou a situação se resolve, ou eles ficarão radicalmente contra Belo Monte. Eles estão pedindo, desde o início de novembro, uma reunião com o Márcio Meira, acompanhado do presidente da Norte Energia, para colocar em pauta essas reivindicações. Eles estão preparando uma reunião e esperam a participação da Norte Energia, da Funai, do Incra e de algum representante da Casa Civil.
IHU On-Line – Algum representante dessas instituições confirmou participação na reunião?
Ruy Sposati – Até a noite do dia 30-11-2011, ninguém havia confirmado presença. Quem está fazendo essa convocação é um dos procuradores da República, e ele disse que possivelmente não venha ninguém de Brasília. Esse é o padrão das respostas. Com os trabalhadores foi o mesmo. Foi muita sorte não ter acontecido uma tragédia nos canteiros de obras.
Os trabalhadores fizeram greve e, por questão de segurança, as chefias do PT evacuaram, por medo de acontecer alguma tragédia. Apesar de o clima ser tranquilo na maioria dos dias, várias vezes os trabalhadores assumem uma posição radical e dizem que vão detonar os canteiros de obras.
O governo vai “empurrando com a barriga”, mandam alguém que é o “sub do sub do sub”, como diz o Lula, responder que o encarregado de conversar com os trabalhadores ou com os indígenas não teve tempo de comparecer. A Norte Energia sempre joga a culpa para a Funai, a qual não se manifesta. Essa situação está gerando uma crise entre os índios e a Funai. As comunidades entendem que a Funai está atrapalhando a transferência das verbas e já pediram para que não haja mais intermediação do órgão. Querem que a verba seja repassada diretamente pela Norte Energia.
IHU On-Line – Como foi a reunião?
Ruy Sposati – Foi uma reunião fechada e terrível. Em primeiro lugar, o governo federal e a Funai de Brasília  que foram expressamente convidados pelos indígenas  não estiveram presentes. Ao contrário disso, enviaram representantes do Comitê Gestor do PDRS Xingu, que se reunia na mesma data em Altamira, para conversar com os índios. Essas figuras "sub do sub do sub" do governo, como diz o Lula, forçaram os indígenas a se desarmar, quer dizer, eles tiveram de guardar seus arcos, flechas, bordunas e lanças, o que foi bastante humilhante. Disseram que não se sentiam seguros. Exigiram também que todos os movimentos sociais, antropólogos, professores e apoiadores, além de toda a imprensa  todos convidados pelos próprios indígenas! saíssem da Casa do Índio, onde aconteceu a reunião. Os índios ficaram acuados, com medo de perder o espaço de discussão, e realizaram ali mesmo um encontro no melhor sabor "tudo certo, nada resolvido". Nesse contexto, algumas poucas lideranças citadinas  questionadas por alguns indígenas, em termos de representatividade  que estão mais interessadas em discutir a "comida de porco", como falou um Arara da Volta Grande uma vez se referindo às toscas mitigações oferecidas a eles, aproveitaram ficar na pauta-espelinho, a predileta do governo e da concessionária.
(Por Patricia Fachin, Rafaela Kley, Stefánie Telles e Natália Schollz) 
Para ler mais:

5/12/2011
 
Calote brasileiro obriga OEA a apertar o cinto
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=50156

Os três principais prédios da Organização dos Estados Americanos (OEA) em Washington não trazem ainda as marcas da asfixia financeira vivida pela entidade internacional, a única a agregar todos os países do Hemisfério Ocidental, exceto Cuba. Mas, nas próximas semanas, salas vazias deverão compor o ambiente interno, após a demissão de 15 funcionários de confiança do secretário-geral, José Miguel Insulza, e a eliminação de diretorias conduzidas por vários deles.

A reportagem é de Denise Chrispim Marin e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 04-12-2011.

A crise nas finanças da OEA tem no Brasil sua razão principal. Desde abril, o governo brasileiro suspendeu o pagamento de sua cota anual, de US$ 6,5 milhões, como represália à decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) de obrigar Brasília a parar a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.

Nas últimas semanas, os representantes dos 34 países-membros tiveram de lidar com a falta de recursos para fechar as contas de 2011. Além de determinar as demissões, os embaixadores proibiram Insulza de buscar empréstimos para cobrir a folha de pagamento de dezembro. A OEA não poderia se endividar, argumentaram alguns, por causa de um calote do Brasil e também de US$ 2 milhões devidos pela Venezuela.

Na quarta-feira, inesperadamente, Insulza afirmou ter conseguido os recursos para cobrir os salários dos cerca de 600 funcionários este mês. Não mencionou, porém, como os conseguiu e nem foi questionado pelos embaixadores sobre isso. Em novembro, os salários haviam sido pagos graças ao adiantamento do Chile e dos EUA de parte de suas cotas de 2012.

A retaliação brasileira deverá perder eficácia a partir de janeiro, quando os membros da OEA começarem a pagar suas parcelas de 2012 - especialmente os EUA, responsáveis por US$ 48,5 milhões, quase 60% do orçamento da organização, em 2011.

O Brasil continuará devedor, promete o governo Dilma Rousseff, a menos que a CIDH tenha seu poder de fogo limitado e siga procedimentos mais rigorosos. A decisão sobre essa reforma é esperada para este mês e tem sido objeto de intensas negociações do Itamaraty.

Nos últimos anos, a OEA vinha perdendo poder financeiro devido ao reajuste do salário de seus funcionários de acordo com inflações locais - uma regra aplicada a servidores da ONU. Sem aumento nas cotas dos países e contribuições voluntárias, a OEA encolheu-se e deu prioridade ao atendimento da América Central e do Caribe - regiões mais vulneráveis que a América do Sul, com focos de instabilidade política e graves problemas de segurança.

Falta de consenso

Peter Hakim, presidente do Diálogo Interamericano, afirma que, entre os motivos do desgate da organização está o "forte desentendimento" entre os seus principais membros: EUA, Canadá, Brasil e México. Esse clima pouco consensual foi observado na crise política de Honduras e na pressão brasileira pelo fim da suspensão de Cuba. A falta de atenção de Washington na América Latina igualmente contribuiu para a menor eficácia da OEA, segundo o analista.

Ainda assim, defende Hakim, a OEA não encontra rival com tamanho grau de institucionalização entre os arranjos regionais. Nem no Mercosul, nem na Unasul, nem no Nafta, nem na embrionária Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac).

"A OEA precisaria montar uma espécie de conselho de segurança, com poder de tomar resoluções, manter um secretário executivo forte e aumentar as contribuições", receitaHakim
5/12/2011
 
Brasil aplica intervenção branca na OEA
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=50157

Chamado a Brasília como sinal de contrariedade do governo brasileiro com aComissão Interamericana de Direitos Humanos, o embaixador Ruy Casaesretornou à missão do Brasil junto à Organização dos Estados Americanos (OEA) no final de novembro. Mas destituído da atribuição de se reportar ou de apresentar na OEA. Essa intervenção branca na missão é apenas uma das represálias aplicadas pelo Brasil contra a organização.

A reportagem é de Denise Chrispim Marin e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 04-12-2011.

O retorno de Casaes tem sido tratado como uma das situações mais bizarras da história da diplomacia brasileira. A rigor, o Brasil continua a ser representado no Conselho Permanente da OEA pelo conselheiro José Wilson Moreira e pelo primeiro-secretário Michel Arslanian. Os demais países, em geral, enviaram embaixadores. Em diplomacia, apresentar um interlocutor de menor rango hierárquico equivale a uma mensagem de desprestígio.

Desde a emissão da medida cautelar da CIDH contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, em abril, episódios similares têm surgido. O mais estranho ocorreu durante a visita a Brasília de Adam Blackwell, secretário para Segurança Multidimensional da OEA, em meados de setembro. Apesar de ser portador de uma carta na qual a CIDH revia a medida cautelar contra Belo MonteBlackwell não chegou a ser atendido nem mesmo pelo ministro da Justiça, que repassou a atribuição a seu secretário executivo.

Em novembro, a reunião de ministros sobre Segurança nas Américas contou com a participação de formuladores de políticas públicas dessa área, entre eles o procurador-geral dos EUA, Eric Holder. O Brasil enviou somente o diretor executivo da PF, Paulo de Tarso Teixeira.

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