Autor(es): Luiz Fernando de Paula |
Valor Econômico - 09/12/2011 |
Desde 1999 o Brasil vem adotando um modelo de política econômica inspirado no "Novo Consenso em Macroeconomia": câmbio flexível, regime de metas de inflação e metas de superávit primário. Nesse modelo, a política fiscal está subordinada à política monetária, sendo que o principal objetivo de política econômica é a estabilidade de preços, já que crescimento do produto e do emprego é visto como um fenômeno puramente do lado da oferta, e inflação um fenômeno essencialmente de demanda. Ademais, no fim dos anos 1990 vigorava no Brasil uma situação de conversibilidade de fato da conta capital. Deve-se ressaltar que esse não é o único regime de política macroeconômica existente: China e Índia, países com crescimento vigoroso nas últimas décadas, utilizam outro regime de política macroeconômica, com conversibilidade restrita da conta capital, câmbio administrado e sem regime de metas de inflação. A partir de 1999, a economia brasileira passou por dois momentos distintos: forte instabilidade em 1999/2003, marcado por choques externos, e crescimento em 2004/2010, puxado inicialmente pelo boom de commodities. O governo Lula, na gestão Palocci/Meirelles, adotou uma política ortodoxa com manutenção de juros e superávits primários elevados. Já na gestão Mantega/Meirelles não se alterou o perfil da política, mas algumas iniciativas importantes foram tomadas para reduzir a vulnerabilidade externa, como a política de acumulação de reservas e redução na dívida externa pública. Assim, houve uma redução na razão dívida líquida do setor público externa sobre o Produto Interno Bruto (PIB), que passou de uma posição passiva equivalente a 15% em 2002 para uma posição ativa de cerca de 10% em 2007. Face ao contágio da crise do Lehman Brothers, o governo pôde responder com políticas anticíclicas, em especial com política fiscal expansionista e expansão do crédito dos bancos públicos. Com uma posição ativa em dólares, o governo não foi obrigado a responder à desvalorização cambial com elevação na taxa de juros e no superávit primário fiscal, fazendo política contracionista em momento de desaceleração. A nota destoante foi a manutenção de juros elevados até o fim de 2008 pelo Banco Central, o que acabou gerando uma desnecessária recessão, ainda que curta, ao longo de 2009. Uma vez enfrentada a crise, o governo perdeu uma janela de oportunidade ao não reduzir de forma mais acentuada a taxa de juros em 2009. O governo Dilma se defrontou com um contexto internacional problemático: pressões inflacionárias causadas pela combinação entre aumento nos preços das commodities e crescimento da participação dos produtos não comercializáveis na cesta de consumo; em que pese a piora no cenário internacional, os fluxos de capitais, dado o diferencial de juros, vieram abundantemente agravando o problema da apreciação cambial; consequentemente, os sinais de desindustrialização ficaram ainda mais evidentes: as indústrias se tornaram similares a "maquiladoras" mexicanas. Procurando diminuir a entrada abundante de capitais o governo aumentou o IOF sobre entrada de capitais, de 2% para 6% em outubro de 2010, e em julho de 2011 estabeleceu uma taxação de 25% sobre operações com derivativos de câmbio, e para arrefecer o crescimento do consumo, adotou em dezembro de 2010 um conjunto de medidas macroprudenciais. Recentemente, o governo anunciou uma mudança no mix da política econômica, buscando combinar fortalecimento da situação fiscal com gradual afrouxamento da política monetária, em meio a grita geral dos "falcões de mercado". O cenário Tombini de agravamento da crise internacional e de desaceleração doméstica acabou se confirmando e o BC evitou assim aprofundar ainda mais a desaceleração. Houve uma certa flexibilização na política econômica na gestão Mantega/Tombini, com melhor coordenação de políticas entre Ministério da Fazenda e o BC. Alguns desafios se colocam. Em primeiro lugar, deve-se aproveitar o cenário de redução da taxa de juros para promover uma mudança no perfil da dívida pública, já que cerca de 30% estão ainda indexados à Selic. A existência de LFTs entope os canais de transmissão da política monetária e não permite a formação de uma curva normal de rendimentos. Ainda que isso gere um custo fiscal (o Tesouro ganha agora com os efeitos da redução dos juros sobre as LFTs), é fundamental que se aproveite essa janela de oportunidade para termos uma estrutura de dívida mais saudável. Adicionalmente será necessário revisar a remuneração da caderneta de poupança, que impõe um piso para a queda na taxa de juros. Em segundo lugar, há sinais de que a taxa de investimento está se desacelerando. Junto com a desaceleração no consumo, a perspectiva é de um semestre de estagnação, contra o qual o governo lançou recentemente um minipacote de estímulos fiscais. Para enfrentar o cenário de desaceleração, contudo, o governo deverá combinar redução nos juros, medidas mais efetivas para reverter a tendência de volatilidade cambial e crescimento nos investimentos públicos. Neste caso, deverá estimular investimentos públicos em infraestrutura e insumos básicos (com destaque para Petrobras e Eletrobras), usando assim o investimento autônomo de forma contracíclica. Luiz Fernando de Paula é professor titular da FCE/UERJ e presidente da Associação Keynesiana Brasileira (AKB). O autor expressa seus pontos de vista em caráter pessoal. |
sexta-feira, 9 de dezembro de 2011
Uma janela de oportunidade?
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