Autor(es): Carlos Melo e José Roberto Mendonça de Barros |
O Estado de S. Paulo - 05/12/2011 |
Em 25 anos, o Brasil saiu da moratória e da superinflação, da dívida e da recessão para uma economia vigorosa e moderna; livrou-se dos militares e superou o impeachment a caminho da democracia que se consolida. Os anos Itamar, FHC e Lula foram admiráveis em mudanças e grandes transformações: privatizações, concorrência, estabilização, distribuição de renda - com a inclusão de novos grupos de consumidores - e formação de um pujante mercado interno. O potencial do País é enorme e os bons tempos não acabaram. O desafio, porém, é aproveitá-lo: os últimos anos mostram que o crescimento que se pode sustentar, sem elevar a inflação, não é superior a 4%, até porque o investimento tem ficado teimosamente abaixo de 20% do PIB. Além disso, o mundo mudou e há um esgotamento dos instrumentos do passado. É ilusão imaginar que os impasses possam se resolver sozinhos. O processo carece de renovação. O foco quase exclusivo na tríade "juros, câmbio e ajuste fiscal" denuncia a mesmice do debate. É importante crescer, mas de modo sustentável. O exemplo argentino talvez seja eloquente de uma longa perda de dinamismo e importância do país, cada vez mais fechado e provinciano, relevante apenas como produtor de soja. Não basta apenas querer o crescimento, gargalos precisam ser alargados e entraves, removidos. Urge iniciar um novo ciclo de mudança. Isso não se fará por acomodação, sociedade é conflito. Os "16 anos de ouro" de FHC e Lula estão irremediavelmente para trás; foi o tempo em que qualquer melhora se traduzia num significativo salto. Hoje, a agenda é mais complexa. Há um sério problema na expansão da oferta: a produtividade, total e do trabalho, está estagnada; os custos de produção e de investimento sobem velozmente; a competitividade sistêmica cai nas classificações internacionais, como o Doing Business do Banco Mundial; o investimento perde vigor. A despeito disso, a grande resposta do governo é estimular a demanda. Precisamos de poupança, investimento, infraestrutura, ambiente de negócios, regulação e formação de capital humano - e mais investimento. Precisamos muito de uma substancial melhora na governança pública; precisamos recuperar a credibilidade do sistema político e fazer reformas. Precisamos crescer de uma vez por todas e a isso se dá o nome de maturidade. Há um conhecido rol de propostas, ainda não totalmente desenvolvidas e articuladas. Diante do esmaecimento do processo, seria de supor que o momento de implementá-lo chegou. Todavia, sua oportunidade política parece cada vez mais distante. A conciliação - virtude de FHC e Lula - se configura num vício, nestes tempos de Dilma. Aumentar a capacidade produtiva implicará remover entulhos, contrariar interesses... Não se fará sem algum grau de trauma. Governadores e prefeitos, por exemplo, são refratários a reformas tributárias; sindicatos são avessos a alterações na legislação trabalhista e previdenciária; corporações e movimentos sociais não aceitam racionalizações e cortes de gastos; à burocracia não interessam sistemas simplificados; esquemas se organizam contra a transparência; políticos reagem a reduções de espaços de poder e à reforma da organização e representação políticas. Não é fácil fazer reformas. A presidente, mesmo que as quisesse - e aparentemente não quer -, dificilmente conseguiria emplacar agenda nessa direção. Sua base política é enorme, porém fragmentada e contraditória; seus aliados, beneficiados do status quo, são reativos; e mesmo seu "Estado maior" - incluindo aí o ex-presidente Lula - se mostra temeroso de conflitos capazes de afetar o obsessivo indicador da popularidade. Eis o impasse: a história indica que chegou o momento de seguir em diante, mas a falta de consenso e disposição para o enfrentamento paralisa o processo. Não há, ainda, o dínamo da mudança e talvez só mesmo a crise, quando chegar, possa vir a sê-lo. Evitá-la diminuiria custos, mas para isso seria necessário arbitrar impasses, redefinir regras. A isso chamam de "A Política". Mas o sistema se deteriora, sua turbulência gera gigantescas ondas de escândalos e descrédito. O País perde instrumentos políticos. Os impasses permanecem e a perspectiva é de que se mantenham por mais algum tempo. Na História, contudo, não há águas para sempre paradas. Em algum momento, a força represada se liberta pela emergência do novo, com nova disposição e propostas. Um líder ou um aventureiro, outra institucionalidade ou o caos, ninguém sabe. O novo ainda não surgiu. No final da década de 1980, num ambiente de crise mais aguda, o impasse pariu Fernando Collor de Mello, cuja história é conhecida - FHC e Lula aprenderam e superaram o infortúnio do antecessor. Nesta segunda década dos anos 2000, quem ou o que será o novo? As alternativas que a História gera podem ser boas, mas nem sempre são necessariamente boas. |
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
Os impasses e a História
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