segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Por que o brasileiro gosta tanto de investir diretamente no banco?

http://www.abbc.org.br/IMAGENS/ANALISE/por_que_o_brasileiro_gosta_tanto_de_investir_diretamente_no_banco.pdf
Há alguns anos acompanho a indústria de fundos de investimento e percebi que bancos se fundem, novas empresas gestoras de recursos chegam ao mercado, mas nada de realmente significativo muda no mapa de
ranqueamento disponível no site da Anbima com relação ao "market share" das três maiores gestoras de recursos do país.
De acordo com dados divulgados, Banco do Brasil, Itaú e Bradesco juntos detêm sempre perto dos 50% desse mercado. Para ser mais precisa, esse volume atingiu 50,1% no fim de agosto.
Sempre me pergunto o porquê de o brasileiro agir assim. Afinal, quando estamos com um problema de coração, procuramos um cardiologista. Se temos problemas na pele, um dermatologista, e assim por diante. Ou seja, estamos sempre buscando especialistas. Daí vem minha inquietação: por que os brasileiros investem em fundos de investimento geridos por instituições generalistas e não por especialistas, no caso as empresas de gestão de recursos independentes?


A indústria de fundos de investimento é muito grande e já supera R$ 1,5 trilhão.

Um trilhão de reais é um valor um tanto grande para nos fazer parar alguns
instantes para refletir sobre esse mercado. A tabela da Anbima mostra que as oito maiores gestoras de fundos são responsáveis por 74,9% desse mercado, ou R$ 1.122,8 bilhão sob gestão. São todas ligadas a bancos ou o próprio banco. Apenas em nono lugar aparece a BNY Mellon Arx. Finalmente alguém independente no Brasil. Ufa!

Depois de tanto refletir e do "feedback" recebido de alunos e investidores, cheguei a algumas conclusões. Em primeiro lugar, e pela experiência que tenho em lidar com investidores, percebi que muitos deles não têm o correto entendimento do papel de cada participante do mercado de capitais. O que faz uma corretora? O que é uma distribuidora, uma asset ou um agente autônomo de investimentos?
De repente, com o modismo dos IPOs, alguns já entendem que para comprar ações na bolsa, só por intermédio de uma corretora. Entretanto, sei que diversos investidores de bolsa se utilizam de bancos para comprar ações. Nada contra o fato, porém faço aqui uma ressalva. Muitos se utilizam de instituições
que não têm corretora e esses bancos terceirizam o serviço, recebendo parte da corretagem gerada.
Acredito que os clientes devem ter assinado algum documento tomando ciência do fato, mas, pela minha experiência em sala de aula e ouvindo investidores, muitos deles não se dão conta disso. O problema não está em usar o serviço de terceiros, mas sim em não saber que está utilizando o serviço de uma
corretora que não faz parte do grupo do banco.
Também, por não compreenderem corretamente que um fundo de investimento encontra-se apartado do banco, sendo um condomínio de pessoas com objetivos comuns de investimento e com demonstrativos financeiros a parte, a percepção que esses clientes têm sobre o produto "fundos" é que o risco que
correm ao aplicar em um fundo de investimento é o risco do banco. Em outras palavras, ao investir em um fundo, muitos investidores acreditam que estão investindo no banco.

Posso falar com muita clareza sobre esse tema porque treino executivos do
mercado financeiro para as provas de certificação. Se nem mesmo muitos
gerentes de bancos têm essa compreensão clara sobre fundos, que dirá os
clientes, que, na sua maioria, aplicam sem ler o prospecto do fundo.
Toda essa questão passa por educação financeira. Por já ter morado no
exterior e trabalhado com o mercado internacional, vejo que estamos
engatinhando nesse campo minado de gestão de recursos. Ainda temos uma
longa caminhada até atingirmos a maturidade de ambos os participantes:
investidores e profissionais. Mas tenho certeza de que estamos no caminho
certo desse amadurecimento.
De um lado temos as exigências dos órgãos reguladores em termos das
certificações exigidas dos profissionais. Do outro lado, temos investidores cada
vez mais informados. Oxalá tudo dê certo no longo prazo (tomara que não seja
tão longo!) e vejamos mais investidores aplicando seus recursos nas assets
especialistas através de seus distribuidores.
Se uma dor no coração nos remete ao cardiologista, por que não buscar fundos
geridos por assets especialistas para realizar um investimento?

Lilian Gallagher - Sócia da Investotal Educação e autora do livro "Planeje seu
Futuro Financeiro". Artigo publicado no jornal Valor Econômico em 10/11/2010.

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