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Autor(es): Agencia o Globo/ Frei Betto |
O Globo - 16/11/2010 |
Houve uma grita na mídia quando a Rússia, há pouco, vendeu à Venezuela cerca de US$4 bilhões em armas. Interrogações acima de qualquer suspeita logo brotaram: o que pretende Chávez? Declarar guerra à vizinha Colômbia? Dar um golpe de estado e governar como ditador? Em setembro de 2010, o Congresso dos EUA divulgou relatório sobre os países em desenvolvimento que, em 2009, mais compraram armas. O Brasil é o primeiro da lista. Gastou US$7,2 bilhões (cerca de R$12,24 bilhões) em armamentos. Preste atenção: o orçamento do Bolsa Família, em 2010, foi de R$13,7 bilhões. Em gastos bélicos, atrás do Brasil seguem Venezuela (US$6,4 bilhões), Arábia Saudita (US$4,2 bilhões) e Taiwan (US$3,8 bilhões). No período entre 2002 e 2009, Brasil e Venezuela aparecem entre os 10 primeiros compradores de armas no mundo em desenvolvimento. Entre 2006 e 2009, a América Latina quadruplicou seus gastos em armamentos: pulou de US$5,763 bilhões para US$23,726 bilhões. Outra novidade é a Rússia suplantar os EUA como principal vendedora de armas para a América Latina. Entre 2002 e 2005, Moscou vendeu apenas US$600 milhões, enquanto Tio Sam faturou US$1,362 bilhão. Mas, entre 2006 e 2009, a Rússia vendeu US$11,1 bilhões - quase 50% do mercado latino-americano - e os EUA apenas US$2,426 bilhões, pouco mais de 10% do mercado continental. O segundo lugar pertence, agora, à França. Até 2005, este país abocanhava apenas 5% do mercado latino-americano, com vendas que não ultrapassavam US$300 milhões. Entre 2006 e 2009, passou a vender US$6,3 bilhões, cerca de 25% do total, superando os EUA. Segundo o Ministério da Defesa da França, o Brasil é, hoje, o maior importador de armas fabricadas por aquele país. Os contratos assinados entre os governos Lula e Sarkozy, de 2005 a 2009, somam R$12,8 bilhões. As importações brasileiras de armas da França pularam de US$101 milhões, em 2005, para US$3,8 bilhões, em 2009, salto de 3.700%. O relatório francês revela que a predominância do Brasil se deu graças sobretudo à aquisição de submarinos do tipo Scopèrne. Em Brasília, o Ministério do Desenvolvimento não divulga valores de importação de armas estratégicas. As compras de armas comuns (fuzis, bombas e artilharia) feitas pelo Brasil de diversos parceiros subiram de R$8,5 milhões em 2005 para R$46 milhões em 2009, um aumento de 440%. A conta exclui equipamentos pesados, como submarinos e aviões. Em dezembro de 2002, quando Bush pediu a Lula o apoio do Brasil à invasão do Iraque, o presidente eleito respondeu: "Nossa guerra não é para tirar vidas e sim para salvá-las. Vamos combater a fome!" Por que, em vez de volta da CPMF, não se aplica igual valor do orçamento militar na melhoria da saúde, da educação, da preservação ambiental e da qualidade de vida de nossa população? O relatório mostra ainda que a França exportou, em 2009, 7,2% dos armamentos no mundo. Ficou atrás dos EUA, responsáveis por 52% das exportações mundiais; do Reino Unido, com 13,4%; e da Rússia, com 8,4%. O lobby bélico é mundialmente poderoso, pois a indústria da morte assegura a vida abastada dos que obtêm, graças a ela, abundantes lucros. Contudo, já não multiplica empregos, como o comprova a atual conjuntura dos EUA. As novas tecnologias dispensam mão de obra numerosa. Lamento que os bispos que se indignam com a proposta de descriminalização do aborto não digam uma palavra quando se trata da produção e do comércio de armas. Segundo o TSE, no Brasil os fabricantes de armas destinaram, nas últimas eleições, R$1,55 milhão a candidatos. É a "bancada da bala", empenhada em evitar qualquer restrição legal ao setor. E quem agradece são os narcotraficantes, que, refugiados no alto de favelas, possuem armas de última geração, a ponto de derrubarem helicópteros da polícia. Cerca de 40 mil pessoas morrem assassinadas, por ano, no Brasil, vítimas de armas de fogo. A paz jamais virá do equilíbrio de forças. Como profetizava Isaías há séculos, ela resultará, sim, da promoção da justiça, o que supõe desarmamento de espíritos e fim dos arsenais. |
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