Na expansão do ensino técnico, maior desafio é manter qualidade |
Autor(es): agência o globo:Alessandra Duarte, Carolina Benevides e Odilon Rios |
O Globo - 03/10/2011 |
Até 2014, rede federal terá 562 unidades; especialistas alertam para formação dos professores MACEIÓ e RIO. Em expansão no Brasil depois de décadas de atraso, o ensino profissionalizante vive entre extremos: tem desde centros de excelência, disputados em seus estados, até problemas tão básicos quanto falta de professores e laboratórios. Em 93 anos, de 1909 a 2002, o país construiu apenas 140 escolas profissionalizantes. O projeto de expansão começou, ainda timidamente, segundo especialistas, no governo Lula, quando 214 unidades foram inauguradas. Agora, na gestão de Dilma Rousseff, a meta é chegar a 2014 com 562 unidades, apenas da rede federal, espalhadas pelo país, além dos 38 Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Esse aumento na oferta de vagas permitirá, segundo a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec), do Ministério da Educação (MEC), matricular 600 mil alunos na rede técnica e profissionalizante. A expansão faz parte do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), criado para democratizar a oferta dos cursos e ampliar também a oferta nas redes públicas - estaduais e municipais - e no Sistema S (Sesi, Senai, Sesc e Senac). Segundo Francisco Cordão, educador há mais de 40 anos e presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE), "o país precisa urgentemente dessa mão de obra": - A educação técnica no Brasil nunca foi valorizada. Mas, hoje, o ensino médio não atende à aspiração de grande parte da juventude, que não está voltada para a vida universitária. No Brasil, o ensino médio está cada vez mais ligado ao vestibular, ao Enem, e isso não atinge 20% da população que frequenta o curso. Existe uma grande parte que quer ser preparada para o mercado de trabalho. País tem atraso de 50 anos, diz especialista No entanto, de acordo com Cordão, não basta expandir a oferta oferecendo mais cursos, é preciso criar escolas com laboratórios específicos e fazer com que os estudantes dominem "conhecimentos e valores culturais de maneira integrada": - O CNE define agora as diretrizes para a formar a educação profissionalizante. O professor, por exemplo, não basta que seja licenciado, tem que dominar a prática. Esse é um grande desafio, e hoje não temos número suficiente de professores, não nos preparamos. Calculo que se dobrarmos o número, ainda assim será insuficiente. - O país descuidou do ensino técnico, e hoje temos pelo menos 50 anos de atraso. Essa expansão acelerada da escola técnica e tecnológica de ensino médio, de pós-médio e universitário é importante. O país não pode mais ficar esperando as condições ideais, tem que correr atrás da formação docente, que ainda recebe atenção aquém do que deveria. E educação, acredito, se resolve com formação docente qualificada - diz Fernando Becker, professor da Faculdade de Educação da UFRS, lembrando que, para que a expansão dê certo, é preciso ainda boa infraestrutura: - As escolas devem ter laboratórios e menos aulas expositivas, com alunos decorando teoria. Devem fazer com que os estudantes possam participar de oficinas, de projetos, devem habilitar para uma profissão. Aprovado em 2009 para o curso de Farmácia do campus Realengo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Gustavo Simão já teve que ir para a unidade de Nilópolis para ter aula. Isso porque, em Realengo, não tinha sala suficiente. Segundo o MEC, a construção de uma escola técnica custa R$7,2 milhões. - Às vezes, a aula tem que ser no campus do Maracanã. Além disso, não há laboratório de Farmácia em funcionamento atualmente - conta Simão. Mas falta de laboratório não é privilégio de quem cursa Farmácia. O problema, segundo as alunas Nathalia Oliveira e Élida Miranda, se repete no curso de Fisioterapia. - Todos os laboratórios estão sendo usados como sala de aula, pois desde 2009 nenhuma turma se formou. Só entram alunos - diz Nathalia. - A gente já teve que ter aula do lado de fora, no sol, e no refeitório. A biblioteca também é improvisada numa sala de aula. Além da falta de laboratórios, os alunos enfrentaram a infraestrutura precária da unidade. - Quando entrei, em 2009, as salas não tinham cortina, persiana, ventilador ou aparelho de ar-condicionado. O teto é de telhas, e o que mais tinha era aluno passando mal por conta do calor - lembra Eric Borges, aluno de Farmácia. Na unidade, a sala de informática também serve como sala de aula. Mas o pior, segundo os alunos, é a aula inaugural. Para todos os cursos, ela acontece no pátio da Igreja Nossa Senhora da Conceição, próxima ao campus. O auditório, no qual as aulas inaugurais deveriam ocorrer, ainda não foi construído. Fincado na periferia de Maceió, o centro profissionalizante Aurélio Buarque de Holanda Ferreira foi construído para funcionar no conjunto Medeiros Neto. No entanto, a unidade, com capacidade para receber dois mil alunos em cursos como o técnico de informática, está abandonada há dois anos, por problemas burocráticos. O prédio já foi arrombado várias vezes, e os ladrões levaram parte dos computadores. - Esse lugar é um perigo. Mesmo que ele seja inaugurado, quem vai estudar aí à noite? O pessoal tem medo - diz Pedro dos Santos, de 19 anos, que gostaria de ter aulas de informática. Segundo a assessoria de imprensa, o secretário de Educação e Esportes, Adriano Soares, nega o abandono e diz que o centro deve ser inaugurado ainda este mês. Aberto, ele será o segundo centro profissionalizante de Alagoas, mantido pelo governo estadual. Hoje, o único que funciona fica em Coruripe, no litoral Sul do estado. |
Professores cada vez mais esquecidos
Professor batalha pelo piso |
Autor(es): Cristiane Bonfanti |
Correio Braziliense - 03/10/2011 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/10/3/professores-cada-vez-mais-esquecidos |
As distorções no serviço público federal continuam: enquanto um docente ganhará R$ 1.384 em 2012, um técnico administrativo embolsará R$ 4,7 mil. Reajustes já concedidos de até 300% acima da inflação tornam ainda mais expressivas as diferença entre as remunerações previstas para o setor público em 2012. Educadores brigam por 16,6% no próximo ano Entra ano, sai ano, as distorções salariais entre os servidores ficam cada vez mais claras. Em vez de resolver a insatisfação entre as categorias, aumentos de até 300% acima da inflação concedidos aos funcionários públicos nos oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva ampliaram o fosso entre as remunerações dos trabalhadores, com prejuízo, sobretudo, para os considerados fundamentais para o bom desempenho da economia. Um dos sinais mais evidentes disso é a previsão do reajuste de 16,6% do piso dos professores de escolas públicas em todo o Brasil, atualmente de R$ 1.187. Enquanto um docente deve entrar em 2012 com salário-base de R$ 1.384, um técnico administrativo das agências reguladoras, com igual formação, receberá um vencimento inicial de R$ 4,7 mil. Um técnico legislativo do Senado, por sua vez, vai começar o ano embolsando remuneração inicial de R$ 13,8 mil, incluindo vencimento básico e gratificações. Para os cargos de nível médio do Banco Central (BC), de 2002 para cá, a remuneração saltou 233,7%, de R$ 2.532,16 para R$ 8.449,13. Os servidores técnicos do Judiciário, que hoje ganham de R$ 3,9 mil a R$ 6,3 mil, pedem aumento de 56% em seus contracheques. Já os técnicos do Ministério Público da União (MPU) querem que a sua remuneração inicial passe para R$ 8,2 mil. Enquanto isso, bombeiros e policiais militares em todo o Brasil brigam pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 300, que estabelece um piso único no país. No Rio de Janeiro, estado com um dos problemas mais graves de violência do país, os policiais ganham R$ 1,1 mil, valor quase quatro vezes menor do que o pago no Distrito Federal. "O salário é a base da valorização dos servidores. No caso dos professores, a lei do piso foi um avanço. Mas eles precisam ter também um plano de carreira e investimentos na formação", defende Dalila Andrade Oliveira, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped). Os problemas não se restringem ao valor baixo do piso salarial dos professores. Embora a regra para a elevação do valor tenha sido estabelecida em 2008, por meio da Lei nº 11.738, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão, denuncia que ao menos nove estados não pagam sequer o salário-base. "Minas Gerais é um dos exemplos do absoluto descaso e desrespeito à lei e aos servidores. Além disso, na maioria dos estados e municípios que dizem cumprir o piso, a norma não é seguida como deveria, pois não estruturaram uma carreira para os profissionais", diz Leão. Greve Em Minas Gerais, os profissionais da rede estadual de ensino suspenderam na última quarta-feira uma greve de 112 dias, após a reabertura das negociações com o governo estadual. Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação em Minas Gerais (SindUte), explica que, hoje, o vencimento básico dos professores na rede é de R$ 369. Para chegar ao salário mínimo do país, de R$ 545, eles contam com gratificações e abonos. "O governo se comprometeu a pagar o piso estabelecido em lei (atualmente de R$ 1.187) a partir de 2012 e a reverter as punições durante o período de greve, inclusive a cobrança de multas. Mas estamos acompanhando o cumprimento do acordo e podemos parar de novo", ameaça Beatriz. Leão explica que, a partir da elaboração do Orçamento da União e da definição de quanto deve ser o reajuste a cada ano, estados e municípios devem fazer suas previsões orçamentárias para pagar o reajuste aos professores. "O problema é que eles não fazem isso. Eles jogam com a morosidade da Justiça. E os docentes continuam ganhando a metade da média do que é pago para outras profissões que exigem a mesma formação", afirma. Federalismo O Ministério da Educação informou que o estabelecimento do piso buscou justamente valorizar os professores. No entanto, disse que não cabe a ele supervisionar a organização do serviço público nos estados e municípios. "O federalismo de cooperação brasileiro não interpôs uma hierarquia nesse sentido. Mesmo assim, por derivação da lei, aqueles municípios e estados que comprovarem insuficiência de recursos para o cumprimento do piso poderão receber recursos complementares", informou o órgão. Entre as condições para estados e municípios receberem ajuda da União estão a aplicação de 25% das receitas na manutenção e no desenvolvimento do ensino e a existência de um plano de carreira para o magistério. Até hoje, porém, nenhum governador ou prefeito conseguiu comprovar que atendia os requisitos para ganhar a complementação. Regra nacional A variação do piso nacional dos professores, que leva em conta o docente com formação de nível médio, cumpre a Lei nº 11.738, de 2008, que prevê aumento no salário-base conforme a variação do custo anual por aluno previsto no Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização do Magistério (Fundeb). Segundo dados do Ministério do Planejamento, a estimativa é que o total investido por aluno do ensino fundamental suba de R$ 1.722,05 para R$ 2.009,45. Altos e baixos Exemplos de salários variados pagos a funções diferentes R$ 1.187 Piso salarial nacional dos professores em escolas públicas R$ 3,9 mil Remuneração básica de servidores técnicos do Judiciário R$ 4,7 mil Salário-base de técnico administrativo de agência reguladora R$ 8,4 mil Quanto ganha funcionário de nível médio do Banco Central R$ 13,8 mil Vencimento de técnico legislativo do Senado, com gratificações |
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