quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Cortes do BCE tornam o euro a moeda preferida para 'carry trade'

Autor(es): Por Masaki Kondo e Hiroko Komiya | Bloomberg
Valor Econômico - 24/01/2012
 

Apostar contra o euro pode ser o negócio mais rentável do mercado de câmbio, num momento em que os esforços de política monetária para rechaçar uma recessão na União Europeia (UE) depreciam a moeda única. Tomar empréstimos em euros e investir nas moedas de Austrália, Brasil, México, África do Sul e Coreia do Sul deu um retorno de 7,8% desde 3 de novembro, quando o Banco Central Europeu (BCE) reduziu sua taxa de juros referencial pela primeira vez em mais de dois anos.
Essas operações, conhecidas como "carry trade", custeadas com ienes recuaram 0,3%, e subiram 1% quando financiada com dólares. Embora a crise da dívida tenha empurrado as ações da zona do euro para suas cotações mais baixas desde 2004 e o mercado de bônus soberanos tenha alcançado sua maior alta no mês passado, o mercado baixista do euro indica que a divisa não vai se recuperar em curto prazo para estragar os lucros com o "carry trade".
Com as medidas de austeridade dos governos ameaçando o crescimento, o presidente do BCE, Mario Draghi, poderá ter de reduzir as taxas de juros para impulsionar uma economia que, segundo o Banco Mundial, vai se contrair. "Estamos vendo um rompimento muito claro na correlação entre o euro e os ativos de risco", disse Ian Stannard, diretor de estratégia cambial para a Europa do Morgan Stanley de Londres. "Isso chama a atenção para o fato de o euro estar cada vez mais se tornando uma moeda de financiamento."
A mediana das estimativas dos economistas consultados pela "Bloomberg" é de que a taxa referencial do BCE cairá para 0,75% em 2012, em relação ao 1% atual. Draghi reverteu a estratégia de seu antecessor, Jean-Claude Trichet, ao reduzir a taxa em 0,25 ponto percentual em novembro e novamente no mês passado. O euro, compartilhado por 17 países, perdeu 3,8% de seu valor nos últimos três meses, no pior desempenho entre as dez moedas monitoradas pelo índices Bloomberg ponderados pela correlação.
A moeda comum estava sendo negociada ontem acima de US$ 1,30, o maior preço do ano, mas com queda considerável em relação à alta recorde de US$ 1,4940, observada em maio. Na semana passada, a divisa europeia chegou a ser negociada a 100,44 ienes, após ter resvalado para 97,04 ienes, sua maior baixa de 11 anos.
Os "carry trades" custeados com €1 milhão e destinados à aquisição de dólares australianos, reais brasileiros, pesos mexicanos, rands sul-africanos e wons sul-coreanos deram retornos de 27%, ou de € 270 mil, durante os dois anos em que o BCE manteve a taxa referencial a 1% até abril de 2011. A operação perdeu 2,8% quando o BCE enrijeceu a política monetária, de abril a novembro. "É pouco provável que as autoridades façam algo para evitar o enfraquecimento da moeda, portanto, ela se torna um "carry trade" mais atraente", disse Tim Riddell, diretor do Australia & New Zealand Banking Group, em Cingapura. "Outras moedas que têm taxas, na prática, baixas ou iguais a zero, como o dólar e o iene, estão revelando um perfil de crescimento ligeiramente melhor."
A disparada de déficits e de dívidas levou Grécia, Irlanda e Portugal a pedirem operações de socorro financeiro junto à UE e ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O contágio se disseminou para economias maiores no ano passado, puxando para cima os rendimentos praticados na região para uma média de 4,28% em novembro, o mais elevado desde 2009, apesar de as taxas pagas pelos títulos do Tesouro dos Estados Unidos terem caído para baixas recordes.
Dirigentes como Draghi e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, vão se reunir em Davos, na Suíça, esta semana para discutir a possibilidade de administrar a crise sem deprimir a economia.
Apesar da preocupação com a Europa, o euro continua mais elevado que a média de US$ 1,2055 registrada desde sua estreia, em janeiro de 1999. A mediana das projeções dos analistas mostra que este ano a moeda vai se fortalecer para US$ 1,29 e 100 ienes.
Os exportadores europeus estão se beneficiando dessa depreciação. A fragilização da moeda ajuda a fabricante italiana de bolsas e sapatos Salvatore Ferragamo a ampliar sua competitividade externa e a aumentar suas margens, disse seu principal executivo, Michele Norsa, numa feira de moda em Milão.
Depois que as ações europeias despencaram no ano passado, ceifando € 751 bilhões em valor de mercado do índice Stoxx Europe 600, estão surgindo sinais de recuperação. O índice subiu 4% este ano, e os bônus soberanos da zona do euro deram um retorno de 0,6% depois de disparar 4% em dezembro, segundo o Índice Direto EMU Bank of America Merrill Lynch de Governos. Isso poderá fazer os investidores que lucram com quedas a reverter essas operações.
"As posições vendidas se acumularam, e os dados positivos tendem a desencadear uma onda de reversão dessas posições no curto prazo", disse Masashi Murata, estrategista cambial, em Tóquio, da Brown Brothers Harriman & Co. Os operadores de contratos futuros aumentaram a um recorde suas apostas de que o euro vai se desvalorizar no câmbio com o dólar. A diferença entre as apostas de que a moeda comum vai cair e as de que vai subir disparou para 160.030 na semana encerrada em 17 de janeiro, segundo revelaram dados da Comissão de Negociação de Contratos Futuros de Commodities (CFTC, pelas iniciais em inglês).

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