terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Projetos de celulose correm risco

Cenário de incerteza traz riscos para investimentos de US$ 20 bi no Brasil
Autor(es): Stella Fontes | De São Paulo
Valor Econômico - 16/01/2012
 

A deterioração do cenário econômico internacional e o limitado fôlego financeiro das maiores companhias brasileiras de celulose e papel aumentaram as incertezas sobre a execução de projetos de novas fábricas já anunciados para o Brasil. Até 2020, há quase uma dezena de empreendimentos planejados, oficializados ou em estudo, com investimentos de US$ 20 bilhões, incluindo a área florestal. Para analistas especializados e a Fitch Ratings, é consenso que deve haver atrasos ou até congelamento de alguns desses projetos

A deterioração do cenário econômico internacional, com destaque para a crise de dívida soberana na Europa, e o limitado fôlego financeiro das maiores companhias brasileiras de celulose e papel neste momento, em razão de amarras relacionadas ao nível de alavancagem, fizeram aumentar as incertezas sobre a execução de projetos de novas fábricas já anunciados para o Brasil.
Até o fim da década, são quase 10 empreendimentos planejados, oficializados ou em estudo, com investimentos de US$ 20 bilhões incluindo a área florestal. Contudo, entre analistas que acompanham o setor e para a Fitch Ratings, é consenso que deve haver atrasos ou até congelamento de alguns projetos, sob pena de consequências negativas ao mercado e às companhias.
Em relatório recente, a Fitch Ratings alertou sobre os "sérios desafios" que a indústria latino-americana de celulose e papel tem de enfrentar em razão da crise na Europa, principal mercado para a celulose branqueada de eucalipto produzida no país. Conforme a agência de classificação de risco, o crescimento do mercado não poderia absorver a nova oferta de celulose - considerando-se projetos em curso ou em estudo na região - "nem na melhor das épocas".
"Com a ausência de fechamento de fábricas existentes ou de atraso no início das operações de novas unidades, os preços podem cair ainda mais e a reconstrução de balanços mais saudáveis poderia ser postergada", avalia a Fitch. Nesse cenário, as notas de classificação das companhias poderiam ser rebaixadas, já a partir da segunda metade deste ano.
No fim do ano, entra em operação em Três Lagoas (MS) a fábrica de celulose de eucalipto da Eldorado Celulose e Papel, controlada pela J&F Holding, do frigorífico JBS Friboi. A unidade, cujos investimentos totalizam R$ 5,1 bilhões, colocará no mercado mais 1,5 milhão de toneladas anuais da matéria-prima. Um ano depois, no quarto trimestre de 2013, a Suzano Papel e Celulose planeja iniciar as atividades de uma nova fábrica, do mesmo tamanho da unidade da concorrente, no Maranhão.
A empresa garante que não vai adiar seus planos para o Maranhão - mas admite que poderá vender parcelas em empreendimentos e determinados ativos de papel como parte da estratégia de redução de alavancagem. Outro projeto da Suzano, para o Piauí, já foi postergado, do fim de 2014 para o primeiro semestre 2016.
A iniciativa da Suzano relativa à unidade do Piauí foi bem recebida pelos analistas, uma vez que, em 2014, a Fibria pretende dar início às operações da segunda linha de produção de Três Lagoas (MS), adicionando 1,5 milhão de toneladas por ano de celulose no mercado. No mesmo ano, a Celulose Riograndense (da chilena CMPC) poderá tirar do papel seus planos de expansão, ampliando a oferta de matéria-prima, e a Klabin também deve iniciar as atividades de uma nova fábrica, que produzirá três tipos de fibra.
Fibria e Suzano, as duas maiores produtoras mundiais de celulose branqueada de eucalipto, já renegociaram com credores compromissos relativos a debêntures e limites de alavancagem, que desde o terceiro trimestre ficaram acima do limite em razão do câmbio (com a alta do dólar, a dívida líquida das empresas, que está fortemente atrelada à moeda estrangeira, ficou maior).
Para alguns analistas, é provável que empreendimentos programados a partir de 2014 passem por algum tipo de ajuste, seja em razão da sobreoferta de celulose, seja pelas condições financeiras das empresas.
No curtíssimo prazo, as notícias tampouco são positivas para a indústria. Os preços da celulose encerraram o ano em queda, o viés para 2012 permanece negativo e há dúvidas quanto à capacidade de sustentação das elevadas taxas de crescimento da demanda chinesa por celulose - o país asiático corresponde, individualmente, ao maior comprador da fibra nacional.
Para analistas do Citigroup, a China será responsável pelo consumo de 70% da oferta adicional de celulose de mercado nos próximos anos, com vistas a abastecer novas fábricas de papel.
Em relatório de perspectivas para o setor, os analistas Rodrigo Fernandes e Renato Maruichi, da Fator Corretora, afirmam que as cotações da celulose devem se manter voláteis ao longo do ano. A Fitch, por sua vez, chama a atenção para outro movimento no setor: o fechamento de fábricas integradas de papel na Europa, com venda da celulose para clientes asiáticos. Diante de tantas incertezas, a Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa) ainda não traçou projeções para o desempenho da indústria neste ano. De acordo com a presidente da entidade, Elizabeth de Carvalhaes, serão necessários alguns meses para que se possa tentar traçar uma estimativa.

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