sexta-feira, 16 de julho de 2010

Balança comercial e especialização regressiva

http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/7/16/balanca-comercial-e-especializacao-regressiva
Autor(es): Renaut Michel e Gabriel Coelho Squeff
Valor Econômico - 16/07/2010

Em 2009, nenhum dos cinco principais itens das exportações (29,2% do total) era manufaturado
A balança comercial brasileira tem recebido especial atenção dos analistas no período recente. Isso decorre, sobretudo, do fato que, depois de atingir o maior saldo positivo desde o início da série histórica, de US$ 46,4 bilhões em 2006, o superávit comercial vem se reduzindo em função de um maior crescimento das importações vis-à-vis as vendas externas.
Diversos argumentos têm sido apontados como justificativa para esse comportamento, notadamente o binômio juros-câmbio. Em linhas gerais, os juros elevados atraem capitais externos que valorizam a taxa de câmbio que, por sua vez, desestimula as exportações e barateia as importações, resultando num saldo comercial menor. Adicionalmente, como desdobramento dessa relação, aparece a hipótese da primarização da pauta de exportações brasileira, qual seja, que o país vem se especializando na produção e exportação de produtos de baixo valor agregado.
No presente artigo destacaremos algumas especificidades da composição do saldo comercial brasileiro no período recente no sentido de mostrar que, embora seja difícil sustentar que esteja em curso um processo de desindustrialização, existem indícios de concentração da pauta exportadora em produtos de baixo valor agregado.
A categoria de uso de bens de capital, por exemplo, depois dos saldos comerciais positivos entre 2003 e 2007, passou a apresentar déficits nos dois anos seguintes e a participação desses itens no total exportado caiu de 13% em 2004 para 9% no ano passado. A variação dos preços dos bens de capital foi de pequena relevância para explicar esses saldos comerciais. Todavia, a variação na quantidade exportada foi determinante: enquanto no período 2003-2006 o quantum exportado de bens de capital foi superior à variação do quantum importado (101% contra 66%), entre 2007-2009 o déficit comercial decorreu de um processo diametralmente oposto (- 40% contra 19%).
Já a leitura dos indicadores de comércio exterior por setores da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) também apontam para uma especialização na produção de bens de baixo valor agregado. Dos cinco setores mais "exportadores" (que respondem em conjunto por mais de 50% das vendas externas) somente "veículos automotores, reboques e carrocerias" são itens tipicamente industriais. Por sua vez, os cinco setores mais "importadores" apresentam maior conteúdo tecnológico: produtos químicos, máquinas e equipamentos, extração de petróleo, material eletrônico e de comunicações e, novamente, veículos automotores, reboques e carrocerias.
Merece destaque que, enquanto os setores exportadores têm apresentado um robusto superávit comercial, os importadores apresentam uma forte deterioração em seus respectivos saldos, já historicamente deficitários. A fragilidade desse modelo fica mais evidente quando se considera o efeito dos preços nos resultados comerciais dos produtos exportadores, haja vista que a variação do índice de preço foi bem superior à variação do índice de quantum.
O reflexo dessa dinâmica também pode ser verificado quando se observa com detalhes a (concentrada) pauta exportadora brasileira. Em 2000, os cinco principais itens exportados pelo Brasil respondiam por 21,3% do total de vendas externas, entre as quais dois produtos eram manufaturados (aviões e automóveis de passageiros). No ano passado, os cinco principais itens das exportações responderam por 29,2% do total exportado e nenhum desses produtos era manufaturado.
Por fim, vale destacar o comportamento das exportações e importações segundo o conteúdo tecnológico. Apesar de reconhecermos que entre 2003 e 2006 houve um crescimento elevado tanto das exportações de produtos "não industriais" (107%) quanto de produtos de intensidade tecnológica "alta" (86%), a avaliação da composição das exportações mostra resultados inquietantes. Comparando-se o ano de 2000 com o ano de 2008 verifica-se que os produtos "não industriais" aumentaram sua participação no total exportado, de 20 para 28%. Já os produtos de "média-alta" e "alta" tecnologia reduziram suas respectivas participações de 24% para 22% e de 6% para 5%, respectivamente.
Analogamente, enquanto o superávit comercial dos "não industriais" aumentou 3,8 vezes no período analisado, o déficit comercial dos produtos de "alta" intensidade tecnológica se deteriorou em 4,9 vezes e dos produtos de "média-alta" em 6,4 vezes.
Muito embora reconheçamos que alguns desses indicadores não apontam definitivamente para um processo de primarização da economia brasileira, entendemos que está em curso um processo de fragilização do setor exportador industrial. Nesse sentido, é necessária uma avaliação pormenorizada acerca da composição e tendência da balança comercial brasileira no período recente a fim de assegurar que a dimensão tecnológica desta não comprometa a trajetória de longo prazo do processo de desenvolvimento econômico do Brasil. Não por acaso, o Ministério da Fazenda lançou no dia 05/05/10 um pacote de medidas de incentivo à competitividade do setor industrial, com destaque para a criação da Agência de Crédito à Exportação (EXIMBrasil). Como se sabe, é pouco crível um modelo de desenvolvimento econômico cuja pauta de exportações seja caracterizada pelo baixo dinamismo tecnológico. Ademais, como mostra nosso passado recente, no que concerne ao setor externo todo cuidado é pouco.


Exportação de manufaturado está estagnada há sete meses

Autor(es): Sergio Lamucci, de São Paulo
Valor Econômico - 16/07/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/7/16/exportacao-de-manufaturado-esta-estagnada-ha-sete-meses
 
As exportações de manufaturados patinam neste ano, depois da recuperação razoável ocorrida ao longo do segundo semestre de 2009. Embora superior ao resultado do primeiro semestre do ano passado, o valor da média diária das vendas desses produtos tem oscilado pouco acima de US$ 300 milhões desde dezembro do ano passado, quando se olha para uma série com ajuste sazonal. A evolução do volume exportado em termos dessazonalizados também mostra um quadro de estagnação, mais evidente a partir de fevereiro. Há sinais de fôlego fraco nas vendas de produtos como material eletrônico e de comunicações, máquinas, aparelhos e materiais elétricos, vestuário e calçados. A análise por destino indica que vai mal o volume exportado para os EUA, tradicional comprador de manufaturados do Brasil.
A comparação com o mesmo período do ano passado, porém, mostra recuperação do volume e dos preços de exportação de manufaturados. No primeiro semestre, o volume aumentou 9% sobre a primeira metade de 2009 e os preços, 9,2%. Com isso, os exportadores obtiveram ganhos significativos em relação ao que foi vendido no ano passado.
O câmbio valorizado, que afeta a competitividade dos produtos brasileiros no exterior, e o crescimento ainda modesto da economia global ajudam a explicar o resultado. A forte demanda doméstica também contribui para um desempenho mais fraco das exportações, num quadro em que a rentabilidade das vendas externas é baixa e cai a ociosidade na indústria, dizem analistas como o economista-chefe da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), Fernando Ribeiro, e Júlio Callegari, do J.P. Morgan. Com isso, as empresas tendem a direcionar uma parcela maior da produção para o mercado interno. Segundo Ribeiro, as vendas de manufaturados costumam sofrer um baque quando a demanda interna cresce bastante e há um aumento simultâneo da capacidade instalada. "Isso ocorre desde os anos 80."
O consultor do Instituto para Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Gomes de Almeida, vê uma "nítida estagnação da exportação de manufaturados desde a entrada de 2010". O valor da média diária das vendas dos produtos, ressalta, pouco saiu do lugar desde dezembro de 2009, quando atingiu US$ 310 milhões, na série livre de influências sazonais calculada pelo Iedi. Em junho, o número ficou em US$ 302 milhões. Antes do agravamento da crise global, em setembro de 2008, a média diária ficava entre US$ 380 milhões e US$ 390 milhões.
Para ele, a perda de competitividade das exportações brasileiras explica essa estagnação. Num momento em que a demanda externa não é das mais robustas, atrapalham as vendas fatores como o câmbio valorizado, a carga tributária, o custo do capital e a infraestrutura deficiente, diz Almeida.
O volume de exportação de manufaturados reforça o quadro de falta de dinamismo retratado nos números do Iedi. Na série calculada com ajuste sazonal da LCA Consultores, as quantidades exportadas patinam desde o começo do ano, e ainda estão 22% abaixo do nível de setembro de 2008. Estão bastante fracas as vendas de material eletrônico e de comunicações. O volume exportado pouco se mexe desde o fim de 2009, encontrando-se em junho 44% abaixo da média do terceiro trimestre de 2008.
Há também uma clara estagnação das quantidades exportadas de bens de capital desde março. Para Callegari, a recuperação ainda fraca da economia mundial faz com que as empresas em muitos países invistam pouco, tornando baixa a demanda por máquinas e equipamentos. Fica ainda mais difícil para os produtos de bens de capital brasileiros competirem com fabricantes tradicionais como os alemães, num momento em que o real está valorizado, diz ele.
As exportações de veículos mostram alguma recuperação nos últimos meses, com vendas em alta para países da América Latina como Argentina, Chile e México. Ainda assim, o volume exportado segue bastante abaixo do alcançado no pré-crise - algo como 20% menor que o do setembro de 2008.
Se o volume de vendas de manufaturados cresce bastante para os países latino-americanos, especialmente para a Argentina, o mesmo não se pode dizer do que se passa com as exportações para os Estados Unidos. Números da Funcex referentes ao primeiro semestre mostram queda no volume exportado de alguns produtos manufaturados para os EUA - as vendas de bens de capital caíram 36,9% em relação ao mesmo período do ano passado, enquanto as de bens duráveis recuaram 1,67%. As exportações de materiais elétricos caíram 15,3% e as de produtos têxteis, 3,4%. Para a Argentina, há altas consistentes no primeiro semestre, de 37,1% em bens de capital e 60,6% em bens duráveis.
Para Ribeiro, a demanda mais fraca nos EUA é a principal explicação para o fenômeno, coadjuvada pela perda de mercado para outros concorrentes, como os asiáticos. Callegari também vê o crescimento mais fraco como o maior responsável. Segundo ele, o J. P. Morgan acabou de reduzir a previsão de crescimento da economia americana no segundo trimestre, de 3,2% para 2,2% em relação ao trimestre anterior, em termos anualizados. É um crescimento fraco, e inferior aos 2,7% registrados no primeiro. "Já a Argentina cresce muito mais. Avançou 12,5% anualizados no primeiro trimestre e a estimativa é de 8% no segundo."

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