quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Indústria

Novo benefício tributário para matéria-prima já vale em fevereiro

Autor(es): Luciana Otoni | De Brasília
Valor Econômico - 22/12/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/novo-beneficio-tributario-para-materia-prima-ja-vale-em-fevereiro


O setor industrial terá isenção no pagamento de tributos federais tanto na compra de insumos para fabricação destinada ao exterior quanto para venda no mercado interno. O benefício tributário foi instituído por meio do Drawback Reposição de Estoque e será válido para a importação de matérias-primas e itens intermediários e para as compras que forem feitas de fornecedores nacionais.
As condições do incentivo foram publicadas ontem no "Diário Oficial da União" na Portaria nº 3, em ato conjunto da Receita Federal e da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). O benefício entrará em vigor no fim do mês de fevereiro.
Para ter acesso à isenção tributária, a indústria terá, primeiramente, que comprovar a importação de matéria-prima, insumo ou produto usado na fabricação de item destinado ao exterior. A empresa terá, também, que ter recolhido os tributos federais referentes a essa operação de importação.
Executados esses procedimentos, o fabricante solicitará à Secex, por intermédio das agências do Banco do Brasil, a habilitação ao Drawback Reposição de Estoque. Para isso, terá que pedir a isenção de tributos para a importação ou para a compra no mercado interno do mesmo item importado anteriormente (ou item equivalente), com o mesmo padrão de qualidade observado na primeira operação.
Obtida a autorização, o fabricante terá um ano para fazer a compra. Se for importação, o industrial não recolherá o Imposto de Importação, que tem alíquota média de 10%, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), cuja maior alíquota é 20% e também o PIS/Cofins Importação, que tem alíquota de 9,25%. Se a compra do item for no mercado interno, o fabricante não pagará o IPI e o PIS/Cofins.
A isenção também se aplica à aquisição, no mercado interno ou externo, de mercadorias empregadas em reparo, criação, cultivo ou atividade extrativista de produto já exportado.
A avaliação do governo é que com essas modificações o regime tributário da modalidade drawback direcionado à reposição de estoque será acionado com maior frequência por parte do setor industrial e também pela agroindústria, já que esse regime tributário poderá ser usado não somente para a fabricação de itens destinados à exportação, mas, também, para a produção que é destinada à demanda doméstica.
O Drawback Reposição de Estoque estará em vigor em 60 dias a contar da data de hoje.
Segundo informou a Receita Federal, a Secretaria de Comércio Exterior solicitou um prazo para a efetiva operacionalização do regime tributário, porque é necessário preparar os formulários e o sistema a partir dos quais os industriais solicitarão a habilitação ao novo regime.


Votorantim importa alumínio para conseguir atender demanda

Autor(es): Ivo Ribeiro | De São Paulo
Valor Econômico - 22/12/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/votorantim-importa-aluminio-para-conseguir-atender-demanda

Limitada no aumento da produção, devido ao elevado custo da energia no país, e diante de um mercado doméstico que fecha 2010 com expansão média de quase 30%, a divisão de alumínio da Votorantim Metais, que era operada pela antiga Cia. Brasileira do Alumínio-CBA, acaba de entrar no segmento de reciclagem e já vem recorrendo a importações de alumínio primário para suprir suas linhas de fabricação de produtos transformados. Esse é um dos caminhos para conseguir atender o consumo interno, fortemente aquecido em vários setores - desde chapas para embalagens e perfis para a construção civil e indústria de ônibus até fios e cabos usados em linhas de transmissão de energia e peças fundidas para automóveis.
Marco Antônio Palmieri, diretor do negócio alumínio da VM, dá a exata dimensão do desempenho nos vários mercados da indústria de alumínio no país, que está batendo novo recorde de vendas. "Estamos com nossa fábrica operando à plena capacidade", informa o executivo, engenheiro metalúrgico formado em Ouro Preto (MG) que está no grupo desde 2006, depois de uma longa passagem pela concorrente Alcan, que hoje não compete mais nesse mercado no Brasil.
Em outubro, a VM adquiriu do grupo Silver, a concorrente Metalex, produtora de tarugos de alumínio à base de metal reciclado. O valor do negócio não é revelado. Os clientes da Metalex são inúmeros fabricantes de perfis. "Foi uma aquisição estratégica ", explica Palmieri. A VM-CBA desejava há tempo entrar na reciclagem. "Isso nos dá mais acesso a metal para suprir nossas linhas de produção, num mercado que está crescendo e onde as fontes de metal primário estão escasseando", afirma.
A questão do preço da energia para o setor industrial é o nó enfrentado pela indústria de alumínio no país. Sem competitividade para continuar fabricando, a Valesul, no ano passado, e a unidade de Aratu, na Bahia, da Novelis, há duas semanas, fecharam suas operações de metal primário. Os dois casos somam mais de 150 mil toneladas de capacidade de oferta de metal desativada. A VM-CBA tem um projeto de expansão que depende de encontrar alternativas de gerar energia a custo competitivo.
Enquanto isso, a empresa assegura ter planos ainda mais agressivos para crescer na reciclagem. Nem bem acabou de comprar a Metalex- em outubro - e a VM já está ampliando sua capacidade em 30%, para 65 mil toneladas de produção de tarugos de alumínio, no segundo trimestre. A sucata usada é formada por rebarbas de produção de perfis, peças de motor, panelas descartadas, entre outros bens obsoletos. A VM é o maior fornecedor de tarugos no país, com 35% de participação (140 mil toneladas).
Ante o descompasso entre oferta e demanda no mercado nacional, a empresa recorreu à importação de metal primário (mais de 40 mil toneladas de lingotes e bobinas) para beneficiar na fábrica situada em Alumínio (região de Sorocaba-SP), e suprir suas linhas fabris. Por exemplo, da Argentina. Com o consumo aquecido, a VM está fechando o ano com venda total de 511 mil toneladas de produtos - incluindo exportações -, ante sua produção de metal primário de 474 mil l toneladas.
"Nossas vendas, neste ano, cresceram muito", disse Palmieri. No mercado interno, a empresa fechará com cerca de 415 mil toneladas. Esse volume dará à VM uma participação 32% do total comercializado no ano, de 1,3 milhão de toneladas, conforme balanço da Associação Brasileira do Alumínio (Abal).
A demanda local superaquecida forçará a VM a reduzir à metade as exportações em 2011, que representaram 20% das vendas totais neste ano. "Nosso objetivo é atender o mercado brasileiro e nossa vocação é cada vez mais crescer em produtos transformados", diz o executivo. Segundo ele, o setor projeta aumento médio no consumo nacional de alumínio de 8% a 9% no próximo ano.
No negócio de extrudados (fabricação de perfis), a VM está investindo R$ 243 milhões na instalação de dois equipamentos que vão elevar sua capacidade fabril em 66% e garantir uma participação de mercado em torno de 25%. A primeira prensa acaba de entrar em operação e a segunda virá em março. Esse segmento é o de maior demanda no país em produtos de alumínio, puxada em grande parte pelo boom imobiliário. Vai encerrar o ano com alta de 34,5%, em 280 mil toneladas, conforme dados da Abal.
O investimento responde por 60% dos R$ 400 milhões totais da empresa no ano passado. Com isso, a capacidade de produção saltará das atuais 42,5 mil toneladas para 70 mil a partir de meados de 2011. Das vendas desse produto, quase dois terços são no mercado imobiliário - o restante para indústrias de transporte e moveleira. Nesse negócio, os concorrentes de peso são as gigantes multinacionais Alcoae Norsk Hydro
O projeto contemplou também uma linha de anodização, o que permite fazer perfis de cores variadas - indo além do cinza e preto para vermelho, vinho, azul, verde... Ao todo, pode alcançar 28 diferentes opções de acabamento, usando tecnologia italiana. "Com isso, ganhamos mais espaço na indústria moveleira, em fachadas e em interiores".
Para 2011, a VM-CBA tem previsão de investir outros R$ 400 milhões, em várias áreas, incluindo mineração de bauxita. Embora sem grandes aportes, as linhas de laminação de chapas e folhas, com programas de otimização, estão obtendo neste ano expansão de 25% na capacidade, explica Palmieri. "O benefício virá em 2011".
A VM, com três unidades de negócio - alumínio, zinco e níquel - faturou R$ 5,2 bilhões em 2009. O grupo não abre por negócio.

Eletrobras investe R$47,5 bi até 2014

Autor(es): A gencia O globo:Ramona Ordoñez
O Globo - 22/12/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/eletrobras-investe-r-47-5-bi-ate-2014


Para garantir o atendimento ao consumo de energia elétrica no país, a Eletrobras e suas principais subsidiárias (Eletronorte, Chesf, Furnas e Eletrosul) vão aumentar os investimentos nos próximos anos. O presidente da Eletrobras, José Antônio Muniz Lopes, disse ontem que o grupo investirá R$47,5 bilhões até 2014, acima dos R$45 bilhões previstos inicialmente.

- O consumo está crescendo forte. Um crescimento médio de 10% ao ano, nos próximos sete anos, significa que o mercado vai dobrar. Então, tem que investir mesmo - afirmou Muniz.

Usina no Pará deve ir a leilão somente em 2012

Neste ano os investimentos da Eletrobras deverão ficar em torno de R$6 bilhões, abaixo dos R$8 bilhões previstos, devido principalmente à demora na obtenção de licenças ambientais.

As cinco usinas hidrelétricas que formarão o chamado Complexo Tapajós, no Rio Tapajós (PA), terão uma potência instalada total da ordem de 12 mil megawatts (MW), superior aos 10 mil MW previstos inicialmente. O presidente da Eletrobras explicou que, com os novos dados de hidrologia e os estudos de viabilidade da primeira das cinco hidrelétricas, a usina São Luis de Tapajós poderá ter uma potência de 7.880 MW contra os 6.188 MW iniciais.

- Tivemos uma surpresa maravilhosa. Estudos mais recentes de hidrologia mostraram que tem mais água na região do que se pensava. Então, as usinas serão maiores - explicou Muniz.

Apesar de o projeto da usina de São Luis do Tapajós estar concluído, ela não irá a leilão no próximo ano. Isto porque o plano de impacto ambiental (Eia-Rima) não está pronto. Essa usina só deverá ser licitada em 2012.

Chineses compram distribuidoras
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/notasA estatal chinesa State Grid (SGCC) comprou sete distribuidoras de energia elétrica brasileiras por US$ 1 bilhão. A aquisição deve trazer ganhos anuais de US$ 110 milhões e servirá como porta de entrada para produtos eletromecânicos chineses no mercado sul-americano, afirmou a SGCC em comunicado. A companhia vai administrar ativos de transmissão de energia, incluindo 16 linhas que totalizam 3.173 quilômetros e subestações na Região Sudeste, além de fornecer eletricidade a Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Ainda segundo o texto, a State Grid obteve a concessão para operar por 30 anos, que pode ser ampliada para mais 20 anos com a aprovação das autoridades nacionais. “O Brasil conta com um ambiente político estável, grande potencial de desenvolvimento e um mercado imenso, com uma demanda elétrica que aumenta rapidamente”, assinalou a nota.

Múltis elevam investimentos no País

Autor(es): Raquel Landim; Fabio Graner e Fernando Nakagawa
O Estado de S. Paulo - 22/12/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/multis-elevam-investimentos-no-pais

Brasil atrai 3,4% do investimento produtivo global, o melhor resultado desde 1998; mesmo assim, cresce o rombo nas contas externas

O Brasil vai ficar com 3,4% do fluxo de investimento produtivo global este ano - a maior taxa da década. As multinacionais estão trazendo ao País US$ 38 bilhões para construir novas fábricas e investir em infraestrutura. Só que mesmo isso não compensará o rombo nas contas externas, que pode chegar a US$ 49 bilhões.
O volume de investimento estrangeiro direto (IED) no País previsto para 2010 supera os US$ 25,9 bilhões de 2009 e recupera o patamar de 2007. É inferior apenas ao recorde de US$ 45 bilhões de 2008. Em termos relativos, porém, o desempenho só foi melhor no período das privatizações. Em 1997 e 1998, o País atraiu 3,9% e 4,1% dos investimentos diretos do mundo.
O investimento estrangeiro na produção somou US$ 3,73 bilhões em novembro, o segundo melhor para o mês da história. O ingresso mais forte de capital produtivo nos últimos meses fez o BC elevar a projeção de IED para 2010 de US$ 30 bilhões para US$ 38 bilhões. "Ouso dizer que esse número pode até ser superado", disse Altamir Lopes, chefe do departamento econômico do BC. Para ele, o desempenho dos últimos meses sinaliza que é "factível" esperar entradas de US$ 45 bilhões em IED no próximo ano, projeção que foi mantida pela autoridade monetária.
O forte ritmo da economia, que foi pouco atingida pela crise, funcionou como um ímã para as múltis. "Com os fluxos de capitais ainda retraídos e as matrizes repatriando recursos, é um excelente resultado", disse Luis Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transacionais e da Globalização Econômica (Sobeet).
Outro fator relevante é o fraco desempenho global, provocado pela incipiente recuperação dos EUA e da Europa. Devem circular pelo planeta US$ 1,1 trilhão em investimentos produtivos este ano, mesmo nível de 1999 e muito abaixo do pico de US$ 2,1 trilhão de 2007. Segundo a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), os fluxos globais só vão recuperar o terreno em 2015.
Por causa da crise, a origem dos capitais mudou. Estão se destacando Suíça (16,9% do total), Países Baixos (12,3%) e Áustria (8,9%). As empresas usam subsidiárias para aproveitar os acordos bilaterais e proteger seus investimentos. Os analistas acreditam que boa parte desses capitais venha da Ásia.
Boa parte dos investimentos vai para os setores de recursos naturais. De janeiro a novembro, agricultura, mineração e petróleo receberam 43% do total, ante 27% no mesmo período de 2009.
Apesar do excelente desempenho, pela primeira vez, o IED não vai compensar o déficit em conta corrente, provocado pela alta do consumo e das importações. Para Antonio Correa de Lacerda, da PUC-SP, se nada for feito, o rombo pode dobrar e chegar a US$ 100 bilhões em 2012. "A velocidade de deterioração é impressionante."

Bacha descarta desindustrialização e vê economia 'trabalhando no limite'

"A economia tem limites e o país está no limite", diz Bacha
Autor(es): João Villaverde | Do Rio
Valor Econômico - 22/12/2010
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/12/22/bacha-descarta-desindustrializacao-e-ve-economia-trabalhando-no-limite

Para Edmar Bacha, formulador do Plano Real, ainda falta poupança para o Brasil crescer de forma mais consistente
Aumentamos as importações não porque a indústria não tem capacidade instalada, mas porque a mão de obra está cara" Temos um problema com essa emergência da classe média, que todo mundo está achando uma maravilha"
Em 1974, quando Edmar Bacha criou o termo "Belíndia" para designar o modelo econômico brasileiro - que unia a riqueza da Bélgica, um país pequeno, com a pobreza da Índia, um país continental - o Produto Interno Bruto (PIB) havia crescido 8,1%, mas a inflação dobrara, passando de 15,5% para 34,5% de 1973 a 1974. Era o fim do "milagre" produzido pela ditadura militar a partir de 1967, e início de um período que mesclaria crescimento acelerado com endividamento externo e inflação crescente. Vinte anos mais tarde, Bacha, doutor em economia por Yale (EUA) em 1968, integrava o grupo de economistas formado por Persio Arida, Gustavo Franco e André Lara Resende na formulação e implementação do Plano Real, que trouxe a inflação dos 2.477,1% registrados em 1993 para menos de dois dígitos a partir de 1996. Hoje, com a economia caminhando para repetir a alta de 8% registrada pelo PIB nos anos 1970, Bacha avalia que o Brasil está no limite.
"O Brasil está mais complexo que nos anos 1970 e 90. Superamos os grandes problemas da ditadura, da hiperinflação e da perspectiva para um governo de esquerda. Não há mais um grande problema, mas uma série de questões para serem atacadas", avalia Bacha, para quem o país conta "com uma produtividade ainda fraca, o setor público ainda abocanha uma parcela muito grande do PIB e não entrega de volta no mesmo nível, o sistema político brasileiro é um horror, o sistema tributário é uma vergonha, e a Previdência, se não for reformada, vai quebrar o país em 2050".
Na entrevista que deu no prédio projetado por Oscar Niemeyer, com jardins de Roberto Burle Marx ao fundo, onde funciona o Instituto de Estudos de Pesquisa Econômica Casa das Garças, Bacha, diretor do centro e até a semana que vem consultor sênior do Itaú BBA, fez um balanço dos oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, e avaliou os principais desafios de Dilma Rousseff. E foi contundente em dizer que não vê risco de desindustrialização no país, mesmo com os indicadores de produção industrial andando de lado desde abril. "Como podemos falar em desindustrialização quando estamos com pleno emprego?", pergunta, se referindo à demanda por mão de obra, que acaba por elevar os salários. A seguir os principais trechos de sua entrevista:
Valor: Com o atual ritmo de crescimento do PIB, câmbio valorizado, inflação acima da meta do BC e financiamento externo elevado, como é possível se alterar esse modelo sem que se bata em um gargalo?
Edmar Bacha: A economia tem limites, apesar do Antônio Delfim Netto achar que não existe produto potencial. Claramente estamos trabalhando nos limites. Como sair disso sem aumentar a poupança interna? Com produtividade. O que temos a oferecer para aumentar a produtividade? Os avanços tecnológicos não caem do céu, é preciso ir atrás deles e isso vai na contramão da tese de desindustrialização, afinal estamos importando mais tecnologia, justamente para ampliar a produtividade.
Valor: O sr. então refuta a ideia de que o Brasil está se desindustrializando?
Bacha: Estamos em pleno emprego, que desindustrialização é essa? A verdade é que por estar em pleno emprego e a mão de obra em escassez, e por estarmos nos especializando em serviços, comércio e construção civil, a indústria não consegue concorrer na disputa pelo trabalhador.
Valor: Por isso os indicadores de produção industrial estão tão fracos desde abril?
Bacha: No Brasil, nunca olhamos direito para a questão do emprego, mas sempre para a utilização da capacidade produtiva. Acho que é uma novidade o que está ocorrendo. Nunca tivemos uma taxa de desemprego tão baixa. A indústria se anima porque a demanda está mais alta e tenta contratar mais mão de obra, e aí o preço sobe. O próprio Valorfez uma matéria chamando atenção para os acordos salariais recordes neste ano. Isso representa aumento do custo da mão de obra e consequentemente reduz a rentabilidade da indústria. Então a indústria não tem por quê produzir mais. Não há pressão sobre a capacidade instalada, mas sobre mão de obra. E não é só na indústria, o pessoal de construção civil também. Não tem engenheiro e também não tem pedreiro.
Valor: Essa dificuldade em produzir, então, facilita a entrada de importados?
Bacha: Ao tentar produzir mais o salário sobe, e com isso diminui a rentabilidade, então ela não produz além de certo patamar. Aumentamos as importações não porque a indústria não tem condições de concorrência, mas porque ela está plenamente empregada.
Valor: Onde isso pode chegar?
Bacha: Essa falta de mão de obra pode extravasar para aumento da inflação ou um déficit não financiável nas transações correntes. Esse é que é o problema, não é a desindustrialização.
Valor: Não estamos dependendo muito da demanda chinesa por commodities?
Bacha: A ideia de que os preços estão em alta e podem cair e gerar um problema é exagerada. Se daqui a cinco anos a China parar de consumir, a Índia assume a demanda. Vivemos uma mudança estrutural profunda, semelhante a que ocorreu na passagem do século XIX para o XX, quando o país líder era consumidor de commodities, a Inglaterra, e passou a ser os Estados Unidos, um país produtor de commodities. Passamos, então, cem anos com os preços das commodities no chão, o que deu caminho para a industrialização. Agora está saindo dos EUA e indo para China e Índia, que, como a Inglaterra antigamente, demandam commodities.
Valor: O Brasil, então, continuará sendo o país do futuro?
Bacha: Não temos um terço da humanidade, como têm China e Índia. Mas temos diversos desafios vencidos, o que é ótimo, o que deixa o caminho aberto. Superamos a ideia de que o Brasil só crescia de maneira estável com ditadura, primeiro com a industrialização induzida por Vargas e depois com os militares. Superamos essa fase, podemos ser uma economia que não vai por saltos, mas cresce e com democracia. Depois a ideia de que a única maneira de crescer era com inflação. Eu me lembro do Celso Furtado dizendo que 17% de inflação é mais ou menos igual a zero nos países desenvolvidos. Superamos isso também. A terceira questão é a esquerda no Brasil, e essa é a importância do Lula.
Valor: Como assim?
Bacha: Até dezembro de 2001, quando o PT teve o manifesto de Olinda e ignorou o fim da Guerra Fria, ninguém poderia saber como seria um governo de esquerda. Aí vem o Lula e joga com todos os velhos vícios da política brasileira. Nós passamos por esse teste.
Valor: O que falta, então?
Bacha: Faltava demanda por recursos naturais, mas até isso superamos, com o surgimento da Ásia, com forte demanda pelos produtos que os latino-americanos têm à oferecer. Nossos problemas agora não têm a dramaticidade que tinham quando as questões eram hiperinflação, ditadura, a perspectiva de um governo de esquerda e a falta de demanda por nossas commodities. Isso é passado.
Valor: O Brasil está mais complexo. Mas ainda não superou todos os problemas do passado, como a desigualdade de renda...
Bacha: Concordo. Continuamos com um problema de distribuição de renda, que é coisa que precisa sempre ser priorizada. Mas não é só isso, temos outros problemas, antigos, que não foram resolvidos. Temos uma produtividade ainda fraca, o setor público ainda abocanha uma parcela muito grande do produto e não entrega no mesmo nível, o sistema político é um horror, o sistema tributário é uma vergonha e a Previdência, se não for reformada, vai quebrar o país em 2050. Uma quantidade enorme de problemas que precisam ser atacados, mas nós temos o know-how.
Valor: Este é o momento para discutir essas questões?
Bacha: Nas épocas eleitorais claramente não é. Quando você vê o nível do debate que tivemos em 2010 dá vontade de correr. Especialmente quando o principal debate se deu em torno do aborto. Temos um problema aí com essa emergência da classe média, que todo mundo está achando uma maravilha, mas ela não necessariamente tem uma face bonita, basta ver nos EUA com o Tea Party. Acho que está fora de cogitação pensar que essa classe média pode pensar em ditadura, mas estará ela disposta a discutir a fundo esses diferentes problemas? Em alguns temas já formamos consensos, como na questão dos tributos, que foi levantada depois das eleições, quando falaram sobre o financiamento da saúde.
Valor: O sr. concorda com o retorno da CPMF?
Bacha: É claro que não concordo. Acho absurdo pensar em criar mais um imposto quando o governo está arrecadando barbaridades. É preciso arrumar os gastos, não a arrecadação.
Valor: O caso da Previdência é um exemplo?
Bacha: Exatamente. Gastamos 11% do PIB com Previdência quando o normal seria 5%. Dentro da Previdência, o equivalente a 3,5 pontos percentuais são gastos com pensões, quando o normal seria 1% do PIB. Temos esses privilégios adquiridos que têm uma força enorme e representam uma parcela muito grande dos impostos.
Valor: Mas programas como o Bolsa Família são baratos, não?
Bacha: Sim, o Bolsa Família atinge 12 milhões de famílias e custa apenas 0,4% do PIB. O Loas, que atinge quantidade enorme de idosos, custa só 0,6% do PIB. Então, quando o governo fala em financiar os programas sociais, não pode estar se referindo a esses, que são muito baratos. O que ocorre é uma usurpação dos gastos sociais, dando a todo tipo de gasto o nome de social.
Valor: Dê um exemplo, por favor.
Bacha: Na educação, o grosso dos gastos públicos vai para universidades gratuitas. Não tem a mínima razão para as universidades serem gratuitas no Brasil.
Valor: Nenhuma?
Bacha: Não, nenhuma. Desde que se tenha uma política de bolsas, não precisamos ter universidades gratuitas.
Valor: Então seria possível privatizar as universidades públicas?
Bacha: Eu não gosto dessa palavra "privatizar", há mecanismos em que os beneficiários dos gastos públicos têm co-participação desde que tenham renda para tal, seja por bolsa, seja por empréstimos escolares. Os argumentos que estão por trás desses privilégios, tanto na Previdência quanto na educação superior, vêm da Constituição, que prevê que o ensino deve ser universal e gratuito. É gratuito, mas não pode ser universal e nem pode ser, e o dia que for o país arrebenta, porque não dá para atender todo mundo de graça. Essa é a dificuldade do PT para comandar o próximo passo.
Valor: E esse passo seria qual?
Bacha: O processo que vêm pela frente está baseado na eficiência do setor público e na equidade nos gastos, porque eles não gostam de falar em privatização.
Valor: O país deixaria então de ser a "Belíndia"?
Bacha: Se continuarmos no ritmo desses últimos dez anos, daqui a 15 anos estaremos perto dos Estados Unidos de hoje. O índice de Gini do Brasil passou de 0,65 para 0,56, mas o padrão americano é de 0,40, e o europeu é de 0,25, então ainda há muito a ser feito. Temos trilhado esse caminho, mas as coisas vão ficar mais difíceis. Os desafios que temos hoje na área social são mais caros e mais complexos. Uma coisa era resolver o problema da vacinação e da mortalidade infantil, algo razoavelmente simples, mas dar SUS para todos é muito mais complicado. Com educação, uma coisa era colocar todo mundo na escola, agora é preciso fazer as crianças aprender alguma coisa.
Valor: E o Estado consegue dar conta de tudo?
Bacha: Claro que não. Boa parte do desafio agora é encontrar formas de maior participação do setor privado nessa área social. E aí tem esse grande entrave do PT. A pior coisa do governo que termina foi ter demonizado a ideia de privatização. Nós não conseguimos resolver o problema dos aeroportos porque qualquer coisa que mexe com privatização é travado. Isso é terrível porque nessa nova fase o setor público não consegue dar conta, seja do ponto de vista administrativo, seja do lado financeiro. Talvez a Dilma nos surpreenda.
Valor: Você acha que ela vai surpreender?
Bacha: Não sei. Até agora o ministério é muito velho, não? Não vejo uma cara de estar preparado para uma nova fase, parece quatro anos do mesmo.
Valor: A inflação deve fechar o ano em torno de 6%, acima da meta de 4,5% do Banco Central. Em 2002, quando a inflação dobrou, o sr. defendeu uma meta mais branda. O que acha hoje?
Bacha: Naquela época tivemos um choque de oferta, não era a economia trabalhando a mil, como hoje. Com choque de oferta se justifica um tratamento mais brando na hora de trazer inflação para a meta. Não é que o BC não tenha de atacar a inflação, mas atacar de forma compatível com o problema. Em 2010 é outra história, é basicamente demanda. Tem um ciclo de alimentos, que ajudou por três meses a inflação e agora está incomodando.
Valor: Isso quer dizer que a maior taxa de juros do mundo vai subir ainda mais?
Bacha: Seria ótimo que o lado fiscal ajudasse, mas não acho que isso vai acontecer. Quem dera que o "neomanteguismo" me surpreenda com um ajuste fiscal forte, mas vai sobrar para o BC. O que é ruim, porque já temos a maior taxa de juros do mundo.
Valor: Mas o PIB deve crescer fortemente nos próximos anos, não? Não só pelo carry-over de 2010, mas também pela perspectiva de pré-sal, Copa do Mundo, Olimpíada etc.
Bacha: Não acho que o PIB vá crescer tudo isso que está sendo projetado pelo governo e pelo mercado.
Valor: Por quê?
Bacha: Porque não temos poupança para isso.
Valor: Mas podemos continuar ampliando nosso déficit em transações correntes para sustentar o crescimento, não?
Bacha: Podemos, claro, nessa hipótese o PIB crescerá mesmo, e imitaremos a Austrália, que cresce há muitos anos, mesmo com um endividamento externo elevado, de 5% a 7% do PIB. Mas se chegarmos nesse nível o mercado pode achar que somos mais Hungria que Austrália, e a confiança se esvai rapidamente.
Valor: Como tornar o crescimento sustentável, como incentivar poupança?
Bacha: É mais fácil ter um diagnóstico da poupança do setor público que do privado. O setor público já chegou a poupar 7% do PIB, hoje poupa 1,5%. Quando se controla o gasto corrente sobra mais para poupar e investir, não tem muito mistério nisso. A questão do setor privado é mais complexa. Pense na China. O problema deles não é como aumentar a poupança, mas diminuí-la. Sabe como?
Valor: Como?
Bacha: Dê a eles um sistema universal de saúde, educação e previdência. A poupança das famílias, das empresas e do Estado vai embora rapidinho. Precisamos pensar além da poupança, os EUA nunca pouparam muito. Precisamos pensar na inovação, essa foi a razão do sucesso dos americanos.
Valor: O que deve fazer o Estado?
Bacha: Precisa fazer coisas básicas, como ocupar o Morro do Alemão (RJ). Esse é um caso quase patético de como o Estado deve agir. É como quando acabamos com a inflação, havia todo um nundo novo à nossa frente.
Valor: Que balanço o sr. faz do governo Lula?
Bacha: Teve dois grandes méritos. O PT nasceu longe das bases comunistas e populistas, mais ligado à social-democracia, a um sindicalismo mais avançado, às bases da Igreja. O que vai ser quando chegar no poder? O discurso era péssimo, assustador. Mas chegou lá e demonstrou que é possível ter governo de esquerda no Brasil. Outra coisa é o pragmatismo do Lula. Começou a atacar a pobreza com o Fome Zero. Quando viu que o programa era ruim, foi para o Bolsa Família, que deu muito certo.
Valor: E o que o sr. avalia mal?
Bacha: Um dos erros nem foi propriamente do Lula, que foi o caso do mensalão, quando o governo resolveu fazer as reformas do começo de governo, reformas difíceis de fazer e de passar pelo Congresso e resolveram utilizar o método tradicional, mais fácil, de comprar os parlamentares. A partir daí [quando estouraram as denúncias], Lula resolveu desistir de passar reformas. Ter abandonado as reformas foi algo muito ruim. Outro problema foi a demonização da privatização. Como Lula ganhou em 2006 do Alckmin com essa plataforma, percebeu que esse ideário funciona, é eleitoralmente impotente. É uma coisa muito ruim isso, porque o Brasil não vai conseguir fazer a Copa do Mundo do jeito que os aeroportos estão. Quantas PPPs o governo fez? Não sei se a Dilma vai ter a capacidade de fazer as coisas de outra forma.

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