Papa reconhece perda de fiéis pela Igreja Católica brasileira e pede a bispos esforços de evangelização
Publicada em 10/09/2010 às 14h08m
AP, O GloboCIDADE DO VATICANO - O papa Bento XVI denunciou nesta sexta-feira a crescente perda de fiéis pela Igreja Católica brasileira e a rápida expansão no país das comunidades evangélicas e neopentecostais.
- Se observa uma crescente influência de novos elementos na sociedade, que até poucos anos não existiam. Isto provoca um crescente abandono por parte de muitos católicos, ao mesmo tempo em que se observa no panorama religioso do Brasil a rápida expansão das comunidades evangélicas e neopentecostais - disse o Papa.
Bento XVI recebeu bispos brasileiros dos estados da Bahia e Sergipe no Castelo Gandolfo, a 30 km de Roma, na visita ''ad limina'', em que, a cada cinco anos, o Pontífice se encontra com bispos de cada país.
O Papa afirmou que este afastamento da Igreja se deve a uma "evangelização, a nível pessoal, às vezes superficial".
- Às vezes os batizados não são suficientemente evangelizados, e as pessoas se tornam facilmente influenciáveis, possuem uma fé frágil, baseada em uma ingênua devoção - disse.
Bento XVI pediu à Igreja Católica que se empenhe na hora da evangelição e que não poupe esforços na busca por católicos que tenham se afastado da igreja e por pessoas que conhecem pouco ou nada da mensagem evangélica.
O Papa assinalou que é necessário reforçar o "diálogo ecumênico" diante da multiplicação incessante de novos grupos, que às vezes fazem uso de um proselitismo agressivo.
A visita dos bispos da Bahia e Sergipe começou no último dia 1º e termina neste sábado, dia 11. Participam o bispo de Bonfim, dom Francisco Canindé Palhano; o bispo de Irecê, dom Tommaso Cascianelli; o bispo de Juazeiro, dom José Geraldo da Cruz; o bispo de Paulo Afonso, dom Guido Zendron, e o bispo de Ruy Barbosa, dom André de Witte.
De acordo com o site da CNBB, em entrevista à Rádio Vaticano, o bispo auxiliar de Salvador, dom João Carlos Petrini, falou sobre algumas recomendações dadas pelo Papa aos bispos.
- Nas Congregações que passamos, durante a visita, estamos sendo lembrados de termos um cuidado amoroso com o povo para não passarmos por cima da religiosidade popular. Somos pedidos para respeitar e valorizar a riqueza de fé que espontaneamente o povo brasileiro tem e para acolher e abraçar com o Evangelho de Jesus toda essa realidade de sofrimento e riqueza humana que o povo brasileiro carrega - disse o bispo.
O Papa recebe ainda este ano os bispos do Rio de Janeiro (de 20 a 27 de setembro), do Amazonas e Roraima (1 a 9 de outubro) e do Paraná (4 a 13 de novembro).
Leia a íntegra do discurso do Papa aos bispos:Saúdo calorosamente a todos vós, por ocasião da vossa visita ad Limina a Roma, aonde viestes reforçar os vossos vínculos de comunhão fraterna com o Sucessor de Pedro e por ele serdes animados na condução do rebanho de Cristo. Agradeço as amáveis palavras que Dom Ceslau Stanula, Bispo de Itabuna, dirigiu-me em vosso nome, e vos asseguro as minhas orações pelas vossas intenções e pelo amado povo nordestino, do vosso regional Nordeste 3.
Há mais de cinco séculos, justamente na vossa região, se celebrava a primeira Missa no Brasil, tornando realmente presente o Corpo e o Sangue de Cristo para a santificação dos homens e das mulheres desta bendita nação que nasceu sob os auspícios da Santa Cruz. Era a primeira vez que o Evangelho de Cristo vinha a ser proclamado a este povo, iluminando a sua vida diária. Esta ação evangelizadora da Igreja Católica foi e continua sendo fundamental na constituição da identidade do povo brasileiro caracterizada pela convivência harmônica entre pessoas vindas de diferentes regiões e culturas. Porém, ainda que os valores da fé católica tenham moldado o coração e o espírito brasileiros, hoje se observa uma crescente influência de novos elementos na sociedade, que há algumas décadas eram-lhe praticamente alheios. Isso provoca um consistente abandono de muitos católicos da vida eclesial ou mesmo da Igreja, enquanto no panorama religioso do Brasil, se assiste à rápida expansão de comunidades evangélicas e neopentecostais.
Em certo sentido, as razões que estão na raiz do êxito destes grupos são um sinal da difundida sede de Deus entre o vosso povo. É também um indício de uma evangelização, a nível pessoal, às vezes superficial; de fato, os batizados não suficientemente evangelizados são facilmente influenciáveis, pois possuem uma fé fragilizada e muitas vezes baseada num devocionismo ingênuo, embora, como disse, conservem uma religiosidade inata. Diante deste quadro emerge, por um lado, a clara necessidade que a Igreja católica no Brasil se empenhe numa nova evangelização que não poupe esforços na busca de católicos afastados bem como daquelas pessoas que pouco ou nada conhecem sobre a mensagem evangélica, conduzindo-os a um encontro pessoal com Jesus Cristo, vivo e operante na sua Igreja. Por outro lado, com o crescimento de novos grupos que se dizem seguidores de Cristo, ainda que divididos em diversas comunidades e confissões, faz-se mais imperioso, da parte dos pastores católicos, o compromisso de estabelecer pontes de contato através de um sadio diálogo ecumênico na verdade.
Tal esforço é necessário, antes de qualquer coisa, porque a divisão entre os cristãos está em contraste com a vontade do Senhor de que «todos sejam um» (Jo 17,21). Além disso, a falta de unidade é causa de escândalo que acaba por minar a credibilidade da mensagem cristã proclamada na sociedade. E hoje, a sua proclamação é talvez ainda mais necessária do que há alguns anos, pois, como bem demonstram os vossos relatórios, mesmo nas pequenas cidades do interior do Brasil, observa-se uma crescente influência negativa do relativismo intelectual e moral na vida das pessoas. [Do que eu posso testemunhar, os católicos são os remediados e famílias proprietárias. No meio rural, no interior, os fazendeiros e políticos tradicionais. Nas cidades, não o poderia afirmar com certeza, mas creio que a situação não difere. Os trabalhadores cujo nível de vida, por mais de uma geração, eleva-se sobre a média têm o catolicismo como rito de distinção de classe. Afora isto, não sei dizer da religiosidade propriamente dita, que, entre nós, sincrética, indica a um só tempo a consistência do Grande Outro e a relação do indivíduo com o Estado, que impele ao personalismo e à dependência pessoal a um potentado ou trabalhador de renda média ou alta; isto é, a religiosidade abriu-se como a liberdade de consumo e de iniciativa, formal e informal, ao mesmo tempo em que se fecha dentro do ambiente privado, de onde o vínculo, e o tipo de, com o Desejo. A verificar.]
Não são poucos os obstáculos que a busca da unidade dos cristãos tem por diante. Primeiramente, deve-se rejeitar uma visão errônea do ecumenismo, que induz a um certo indiferentismo doutrinal que procura nivelar, num irenismo acrítico, todas as "opiniões" numa espécie de relativismo eclesiológico. Paralelamente a isto está o desafio da multiplicação incessante de novos grupos cristãos, alguns deles fazendo uso de um proselitismo agressivo, o que mostra como a paisagem do ecumenismo seja ainda muito diferenciada e confusa.
Em tal contexto - como afirmei em 2007, na Catedral da Sé em São Paulo, no inesquecível encontro que tive convosco, bispos brasileiros - «é indispensável uma boa formação histórica e doutrinal, que habilite ao necessário discernimento e ajude a entender a identidade específica de cada uma das comunidades, os elementos que dividem e aqueles que ajudam no caminho da construção da unidade. O grande campo comum de colaboração devia ser a defesa dos fundamentais valores morais, transmitidos pela tradição bíblica, contra a sua destruição numa cultura relativista e consumista; mais ainda, a fé em Deus criador e em Jesus Cristo, seu Filho encarnado» (n. 6). Por essa razão, vos incentivo a prosseguir dando passos positivos nesta direção, como é o caso do diálogo com as igrejas e comunidades eclesiais pertencentes ao Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, que com iniciativas como a Campanha da Fraternidade Ecumênica ajudam a promover os valores do Evangelho na sociedade brasileira.
Prezados irmãos, o diálogo entre os cristãos é um imperativo do tempo presente e uma opção irreversível da Igreja. Entretanto, como lembra o Concílio Vaticano II, o coração de todos os esforços em prol da unidade há de ser a oração, a conversão e a santificação da vida (cf. Unitatis redintegratio, 8). É o Senhor quem doa a unidade, esta não é uma criação dos homens; aos pastores lhes corresponde a obediência à vontade do Senhor, promovendo iniciativas concretas, livres de qualquer reducionismo conformista, mas realizadas com sinceridade e realismo, com paciência e perseverança que brotam da fé na ação providencial do Espírito Santo.
Queridos e venerados irmãos, procurei evidenciar brevemente neste nosso encontro alguns aspectos do grande desafio do ecumenismo confiado à vossa solicitude apostólica. Ao despedir-me de vós, reafirmo uma vez mais a minha estima e a certeza das minhas orações por todos vós e pelas vossas dioceses. De modo particular, quero aqui renovar a expressão da minha solidariedade paterna aos fiéis da diocese de Barreiras, recentemente privados da guia do seu primeiro e zeloso pastor Dom Ricardo José Weberberger, que partiu para a casa do Pai, meta dos passos de todos nós. Que repouse em paz! Invocando a intercessão de Nossa Senhora Aparecida, concedo a cada um de vós, aos sacerdotes, aos religiosos, às religiosas, aos seminaristas, aos catequistas e a todo povo a vós confiado uma afetuosa Bênção Apostólica.
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